AMBIENTE ECONÔMICO GLOBAL MÓDULO 11
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- Joaquim Regueira Monteiro
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1 AMBIENTE ECONÔMICO GLOBAL MÓDULO 11
2 Índice 1. Os movimentos relativos ao comércio exterior e a busca por relações comerciais justas...3 2
3 1. OS MOVIMENTOS RELATIVOS AO COMÉRCIO EXTERIOR E A BUSCA POR RELAÇÕES COMERCIAIS JUSTAS Segundo Stiglitz (2007), entre muitos motivos, a crise de 1929 foi disseminada (quer dizer, foi além dos efeitos imediatos da quebra da bolsa americana) pelo fechamento das barreiras comercias de países que viram suas economias entrarem em depressão. Esse processo prejudicou as exportações de outros países, que, com o objetivo de evitar o aumento dos déficits públicos, também dificultavam a entrada de produtos estrangeiros em seus territórios, causando o que os economistas chamam de círculo vicioso. Após 1945, com o fim da Segunda Grande Guerra, os Estados do mundo, buscando dar maior estabilidade ao sistema financeiro, criaram a Organização Internacional do Comércio. Em 1950, os Estados Unidos rejeitaram a proposta de uma OIC devido ao temor da parte de alguns conservadores e de algumas empresas de que ela levaria a uma violação da soberania nacional e uma regulamentação excessiva. A Organização Mundial do Comércio (OMC) ganhou existência somente 45 anos mais tarde (Stiglitz, 2007, p. 156). O Acordo Geral Sobre Tarifas e Comércio (GATT), por sua vez, foi um acordo feito entre os países de alta industrialização sobre produtos manufaturados, em que cada país trataria os produtos dos outros sobre o princípio da não discriminação. Durante a rodada do Uruguai (1986), finalizada na rodada de Marrakesh (1994), a OMC foi criada para propiciar uma expansão mais rápida dos acordos comerciais do que havia ocorrido sobre o GATT, alcançou novas áreas como serviços e direitos de propriedade intelectual (Stiglitz, 2007, p. 157). Embora com aplicação reduzida, a OMC proporcionava alguns mecanismos de retaliação aos países que ferissem as regras de comércio, embora os resultados mostrassem que países ricos e poderosos, normalmente, ganhavam as barganhas. Durante a rodada de Seattle, em 1999, intensos protestos acabaram por se transformar em grandes marcos históricos do início das lutas antiglobalização do capital. Dez anos após a rodada do Uruguai, os países industrializados ainda não tinham cumprido suas promessas de redução do subsídio agrícola e diminuição de tarifas a produtos têxteis. Em contrapartida, os países em desenvolvimento já tinham aberto seus mercados e concordado com as novas regras da propriedade intelectual, embora sofressem para concorrer com seus produtos no mercado global; afinal, os subsídios dentro dos países desenvolvidos continuavam. Essa conjuntura, apesar de desfavorável para alguns países em desenvolvimento, foi muito boa para nações como China e Índia, que, sabendo aproveitar a oportunidade, tiveram as portas dos mercados europeus e americanos abertas para os seus produtos manufaturados. A vantagem comparativa dos donos do jogo dizia respeito a produtos manufaturados, mas a indústria chinesa, por exemplo, deu um salto tremendo e tornou-se muito com petitiva quarenta anos depois, encontrando mercados abertos para os seus produtos. 3
4 Segundo Stiglitz (2007), uma nova rodada da OMC começou em Doha 1, no ano de 2001, sob o retórico nome de Rodada do Desenvolvimento. Embora realizada para tratar de questões mundiais relativas ao desenvolvimento, o cenário foi outro: os países pobres, ao invés de serem ouvidos e atendidos nas suas reivindicações, confrontaram-se com tentativas da UE e dos EUA de abrir os mercados para serviços dependentes de mão de obra muito qualificada como, por exemplo, no setor de serviços. Durante a reunião em Cancun (2003), também não houve acordo que beneficiasse os países em desenvolvimento, mas apenas muitas manifestações, além de uma tragédia: o presidente da Via Campesina da Coreia do Sul, o Sr. Lee, matou-se em protesto durante as manifestações. Segundo Stiglitz (2007, p. 1 63), Apesar de continuarem a se recusar a fazer concessões em agricultura ou em qualquer outra questão importante de interesses dos países em desenvolvimento deixando de cumprir suas promessas, os países desenvolvidos insistiram em impor seu temário próprio de dedução das tarifas e abertura do acesso aos bens e serviços que a União Europeia e os Estados Unidos queriam exportar. (...) Havia um risco real de que essa nova rodada, em vez de desfazer os desequilíbrios do passado, os piorasse. (...) em toda a sua história, as negociações sobre comércio jamais haviam acabado em tanto desarranjo. A globalização vem gerando muitos custos aos países em desenvolvimento, já que seus benefícios parecem não compensar problemas como a perda da soberania nacional, aumento do desemprego e perda do poder aquisitivo, entre outros. Segundo Stiglitz (2007, p. 139), várias barreiras sutis, mas eficazes, foram mantidas. Essa globalização assimétrica pôs os países em desenvolvimento em desvantagem e os deixou em situação pior do que estariam num regime de comércio realmente livre e justo. Mesmo assim, acordos comerciais mais justos não resolvem todos os efeitos negativos causados pela globalização: problemas infraestruturais, como o transporte e a adequação aos padrões dos mercados externos, são grandes impedimentos ao desenvolvimento dos países pobres. A abertura unilateral dos países desenvolvidos também não soluciona os problemas causados pela instabilidade advinda da globalização, já que os trabalhadores dos países em desenvolvimento não têm as mesmas facilidades que os dos países desenvolvidos, como, por exemplo, indenizações que facilitem a passagem de um emprego para o outro, ou oportunidades profissionais abertas por um sistema educacional eficiente. O modelo globalizador implica a existência de perdedores e entende que o livre comércio, embora traga riquezas para o país como um todo, acaba por parar na mão de poucos, criando economias ricas habitadas por povos pobres. Vejamos o exemplo do Acordo de Livre Comércio da América do Norte, NAFTA (representado na figura 3), criado em 1992 entre Estados Unidos, 1 Imaginou-se que, sendo Doha a cidade escolhida, seria mais fácil criar obstáculos para a ação dos manifestantes que protestavam contra decisões que, sabia-se, seriam tomadas. 4
5 Canadá e México, na época a maior área de livre comércio do mundo, com um PIB total de nove trilhões de dólares. Figura: NAFTA Fonte: _2000_1/geo_on_line/nafta.htm Segundo Stiglitz (2007), a equipe econômica americana considerou que o acordo não traria grandes efeitos para a economia americana: seu efeito mais positivo seria o nivelamento econômico trazido pelo livre comércio, diminuindo a imigração ilegal do México para os EUA. O NAFTA criou um maior grau de dependência entre as economias mexicana e americana e, nos primeiros dez anos de acordo, acarretou uma significativa baixa no crescimento da renda per capita do México, e as promessas de crescimento de 7% ao ano foram confrontadas com um crescimento efetivo de 1,6% ao ano. O descumprimento da promessa de crescimento e a manutenção de subsídios agrícolas dentro dos EUA fizeram com que os produtores mexicanos perdessem com a competição dentro do mercado mexicano. Um acordo mais justo teria eliminado os subsídios à agricultura americana e suas restrições de produtos agrícolas, como açúcar para os Estados Unidos (Stiglitz, 2007, p. 141). Ainda, barreiras não tarifárias são usadas pelos EUA para blindar seu mercado interno. Um exemplo: quando os tomates mexicanos chegaram ao mercado americano, passaram a competir com os de seus produtores. O congresso americano, pressionado, tentou acusar o governo mexicano de dumping. Houve distorção na avaliação dos preços e o governo mexicano, para evitar um processo, subiu o preço do tomate. A dependência mexicana gera distorções em certos setores de sua economia: a produção de pequenas peças acarretou, em certas regiões do México, o aumento do emprego; posteriormente, esse aumento, impulsionado pela alta da produção, foi freado e depois reduzido pela diminuição da produção de bens em que essas peças eram usadas e pela entrada da China no mercado, competindo com as mesmas peças. Segundo Stiglitz (2007), o NAFTA preocupa-se mais com as taxas tributárias do que com questões infraestruturais, e a redução de tarifas não resolve todos os problemas: a necessidade de investimentos infraestruturais é mais que necessária para o crescimento econômico. Como o NAFTA não 5
6 prevê investimentos nessa área, o México começou a sentir o peso da concorrência chinesa, que investe duas vezes mais em pesquisa e infraestrutura. Como então operacionalizar a proposta de livre comércio? O conceito foi formulado, ao menos teorica mente, pelo pai da economia moderna, o inglês Adam Smith. Ele imaginou que, em um mundo sem livre comércio, o trânsito de pessoas de países com menor aquisição de capital (na forma de maquinário e tecnologia ) e, portanto, com baixos salários para países que detêm capital necessário para investir em altas tecnologias por sua vez, com altos salários seria muito grande. Fazendo analogia com o ideário smithiniano e o modelo globalizador, poderíamos concluir: a globalização permite que as pessoas fiquem em seus países e tenham acesso aos bens produzidos em outros países. Um país cuja mão de obra é barata pode oferecer seus produtos de baixa tecnologia para os países de alta industrialização. Os países com mão de obra barata e baixa tecnologia, por sua vez, podem consumir os bens de alta tecnologia (inclusive bens de produção), o que causará um aumento da demanda por mão de obra, gerando, assim, aumento nos salários. No entanto, a correspondência entre os dois modelos (liberal e neoliberal) não se dá de forma completa: O lado negativo desse cenário cor-de-rosa é a possibilidade de que se percam empregos na medida em que eles se transferem de um país para outro por exemplo, os americanos compram bens baratos feitos na China em vez de em seu próprio país (Stiglitz, 2007, p. 145). Esse quadro é mais alarmante em países em desenvolvimento, que, devido à falta de infraestrutura, não dispõem dos meios necessários para criar novos postos de trabalho para os trabalhadores que ficam desempregados. Isso causa um problema político mesmo para os governos a favor da globalização: fomentar suas exportações significa conviver com as restrições às suas importações, tornando mais difícil a manutenção dos 5 postos de trabalho. A história provou que o mundo proposto por Adam Smith, com a sua teoria da liberalização dos mercados, está longe de ser aplicada de forma tranquila. Trabalhadores dos países desenvolvidos sofrem com a perda de direitos conquistados após anos de lutas trabalhistas; as empresas sugerem que a redução de salários e de outros direitos manterá a empresa no país e que no longo prazo as coisas vão se resolver. A verdade é que, após vinte anos de globalização, os trabalhadores têm motivos para descontentamento com a perda de seus direitos. Segundo Stiglitz (2007), o setor que mais sofre com a instabilidade causada pela globalização é o do emprego, já que qualquer aumento da produção no exterior pode gerar déficit no emprego local. Observa-se que a concorrência com produtos estrangeiros (barateados pelo baixo preço da mão de obra ou desvalorização da moeda) também provoca crises na indústria interna: empresas fecham e prejudicam seus fornecedores, observando-se um aumento da insegurança no sistema produtivo como um todo. 6
7 Quando a moeda da Coreia foi desvalorizada, as exportações coreanas de aço para os Estados Unidos aumentaram e os metalúrgicos americanos protestaram. Quando o Brasil tem uma boa safra de laranjas, os plantadores de laranja da Flórida pedem ajuda e, às vezes, a obtém por meio dos mecanismos protecionistas não tarifários (Stiglitz, 2007, p. 148). Para competir com a invasão de produtos estrangeiros, os governos são obrigados a reduzir outros impostos, além dos impostos alfandegários já reduzidos pelo processo de globalização, e essa redução busca aumentar a competitividade dos produtos internos, assim como diminuir os recursos para investimentos em infraestrutura. Ao final do processo, as deficiências geradas pela falta de investimentos minam as possibilidades de exportação de pequenos produtores, que veem seus custos aumentados pela falta de infraestrutura em setores como o transporte. Para Stiglitz (2007, p. 150), A questão é: qual é a melhor maneira de aprender? Alguns sustentam que a melhor maneira e provavelmente a única de aprender a produzir aço é produzir aço, como fez a Coreia do Sul quando investiu na siderurgia. Na época, sua vantagem comparativa era plantar arroz. Mas, mesmo que os agricultores coreanos se tornassem os produtores de arroz mais eficientes do mundo, suas rendas ainda seriam limitadas. O governo coreano deu-se conta de que, se quisesse desenvolver o país, teria de transformar sua economia de agrícola para industrial. Segundo Stiglitz (2007), o conceito de indústria nascente é um argumento dado por países que buscam blindar seu pátio industrial dos ataques dos produtos estrangeiros. Um país que busca aumentar a sua indústria têxtil impõe taxas mais altas à importação desses produtos. Isso é rebatido pelos defensores do livre mercado: empresas poderão dar lucro e se tornar competitivas a longo prazo, necessitando apenas de empréstimos para enfrentar os tempos difíceis. A realidade prova que as empresas têm dificuldades em encontrar crédito para esses empréstimos, e os próprios opositores ao argumento da economia nascente leia-se Estados Unidos e Japão já fizeram uso do crédito estatal e do mesmo argumento antes (vale lembrar que o argumento era muito comum na Europa do século XIX e no Japão durante os anos 1960). Para Stiglitz (2007), alguns governos efetivamente acabaram com essas políticas e retiram a blindagem de suas indústrias, porém, a boa vontade para acabar com as ditas táticas protecionistas depende do grau de barganha dentro de organizações como FMI e a OMC. Mais forte que o argumento da indústria nascente é o argumento da economia nascente. Trata-se de um argumento dado por países de matriz agrícola, que, buscando passar à matriz industrial, restringem, através de barreiras tarifárias, a entrada de bens manufaturados, criando melhores condições para o desenvolvimento da indústria interna. Ademais, um setor industrial grande e crescente (e as tarifas sobre os bens manufaturados) propicia receitas com as quais o governo pode financiar a educação, infraestrutura e outros ingredientes necessários para o crescimento de base ampla (Stiglitz, 2007, p. 152). O crescimento de base 7
8 ampla proporciona aos países aumento das exportações, o que se provou correto no caso do leste asiático. O livre comércio parece injusto porque há vantagens dos países desenvolvidos sobre os países desenvolvidos. Por terem matrizes agrícolas, os países em desenvolvimento sofrem com os subsídios que são permitidos nos setores produtivos dos países desenvolvidos, e participam da disputa comercial em desvantagem. Stiglitz (2007) lembra que há que se considerar também o aspecto das vantagens comparativas, ou seja, cada país desenvolve as suas potencialidades de acordo com suas possibilidades, e o confronto entre possibilidades de um país e impossibilidades de outro faz com que o mercado se mantenha equilibrado. A aplicação do conceito mostrou-se mais complexa do que o formulado teoricamente, pois a regulação do mercado implica que nenhuma empresa do mundo poderia, competindo em pé de igualdade, ganhar das empresas americanas que dispõem dos maiores recursos. A partir desse princípio, qualquer empresa que ganhasse dos EUA estaria praticando dumping, o que, na verdade, não acontece. Outra questão que diz respeito à justiça e à equidade nas relações comerciais está relacionada à propriedade intelectual. Sempre haverá a necessidade de contrabalançar o desejo dos inventores de proteger suas descobertas e os incentivos que essa proteção proporciona e as necessidades do público que se beneficia do acesso mais amplo do conhecimento, com uma resultante aceleração do ritmo de descoberta e os preços mais baixos que vêm da competição (Stiglitz, 2007, p. 196). Esse é um aspecto fundamental quando relacionado aos medicamentos de doenças que assolam todos os continentes do mundo, mas que atingem, de forma especial, os países em desenvolvimento, como pode ser visto na figura 4. Figura: Mapa da AIDS 8
9 Fonte: Segundo Judensnaider (2009), dados da FAO revelam que (...) mais de um bilhão de pessoas no mundo vivem com menos de um dólar por dia. Outros 2.7 bilhões lutam para sobreviver com menos de dois dólares por dia. A pobreza nos países em desenvolvimento, no entanto, vai muito além da pobreza de renda. (...) Todos os anos, morrem onze milhões de crianças, a maioria das quais com menos de cinco anos; e mais de seis milhões morrem devido a causas totalmente evitáveis como a malária, a diarréia e a pneumonia 2. Pior: a cada trinta segundos, morre uma criança na África vítima de alguma dessas doenças. O grande dilema dos países em desenvolvimento continua sendo: devem eles crescer no mercado internacional ou investir seus ganhos no subsídio do seu setor agrícola ou em infraestrutura, especialmente na saúde de suas populações? Essa é uma questão que o modelo globalizador ainda não respondeu. 2 Conforme apresentado em nu me roscrise.php 9
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