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Transcrição:

Notas de Análise Complexa Ricardo Mamede Departamento de Matemática, Faculdade de Ciências e Tecnologia Universidade de Coimbra 205

Índice Números Complexos. O corpo dos números complexos..........................2 A forma polar dos complexos.......................... 4.3 Subconjuntos de C................................ 8 2 Sucessões e séries numéricas 2. Sucessões de números complexos......................... 2.2 Séries de números complexos........................... 20 2.3 Critérios de convergência............................. 23 3 Séries de Fourier 33 4 Funções Analíticas 4 4. Funções complexas e continuidade........................ 4 4.2 Diferenciabilidade e condições de Cauchy-Riemann.............. 46 4.3 Funções elementares............................... 5 5 Integração de Funções Complexas 59 5. Integração de funções complexas de variável real................ 59 5.2 Integrais de caminho............................... 60 5.3 Teorema de Cauchy-Goursat........................... 64 5.4 Fórmulas integrais de Cauchy.......................... 68 6 Séries de Potências 7 6. Série de potências................................. 7 6.2 Série de Taylor.................................. 73 6.3 Série de Laurent e o teorema dos resíduos................... 76 6.4 Classificação das singularidades isoladas.................... 78 Bibliografia 85

Capítulo Números Complexos. O corpo dos números complexos Um par (G, ), constituído por um conjunto não vazio G e por uma operação binária : G G G, diz-se um grupo se satisfaz as seguintes propriedades:. Associatividade: para quaisquer a, b, c G, (a b) c = a (b c). 2. Existência de elemento neutro: existe e G tal que para todo o a G, a e = e a = a. 3. Existência de inverso: para todo o a G existe a G tal que a a = a a = e. Um grupo (G, ) diz-se abeliano ou comutativo se para quaisquer a, b G, se verifica a b = b a. Exemplos familiares de grupos abelianos incluem (Z, +), os números inteiros sob a adição usual; (R, +), os números reais sob a adição usual; (R n, +), o conjuntos dos n-úplos de números reais sob a adição vetorial; ou (R \ {0}, ), os números reais não nulos sob a multiplicação. Como exemplo de um grupo não abeliano temos o grupo das matrizes não singulares. Um corpo (K, +, ) é constituído por um conjunto não vazio K e duas operações binárias + e em K, designadas resp. por adição e multiplicação, tais que (K, +) e (K\{0}, ) são grupos abelianos, onde 0 denota o elemento neutro da adição, e a multiplicação é distributiva em relação à adição: para quaisquer a, b, c K, a (b + c) = (a b) + (a c).

.. O CORPO DOS NÚMEROS COMPLEXOS O conjunto dos números reais R munido da adição e multiplicação usuais (R, +, ) é um corpo. Alem disso é um corpo ordenado mediante a relação de ordem usual entre números reais. Isto significa que existe uma relação < definida em R tal que:. Se x, y R, então exatamente uma das condições x < y, y < x e x = y é verdadeira. 2. Somas e produtos de números positivos (i.e. > 0) são igualmente positivos. Consideremos o conjunto R 2 seguintes operações: = {(a, b) : a, b R} dos pares ordenados, munido das (a, b) + (c, d) = (a + c, b + d) (a, b) (c, d) = (ac bd, ad + bc) Estas operações são comutativas, associativas e a multiplicação é distributiva relativamente à adição. Além disso, os pares (0, 0) e (, 0) são os elementos neutros da adição e multiplicação, respetivamente. Deste modo, (R 2, +, ) é um corpo que se designa por corpo dos números complexos e se denota por C. O subconjunto {(a, 0) : a R} de C identifica-se com o conjunto dos reais R através da bijecção (a, 0) a. Denotando então o par (a, 0) com o real a e o par (0, ) com a letra i, obtemos a representação algébrica dos números complexos (a, b) = (a, 0) + (0, ) (b, 0) = a + bi. O símbolo i é a unidade imaginária. Notemos que i 2 =. Se z = a + bi C, chamamos a a a parte real de z e escrevemos a = Re(z). Chamamos a b a parte imaginária de z e escrevemos b = Im(z). Quando Re(z) = 0 o número complexo z diz-se um imaginário puro. Notemos que sendo C um corpo, a multiplicação é comutativa, pelo que podemos também escrever (a, b) = a + ib. Ao contrário do que ocorre com os números reais, em C não existe qualquer relação de ordem compatível com as operações. De facto, notemos que se supusermos i > 0 ou i > 0, seremos forçados a concluir que = ii > 0. Mas também temos = 2 > 0. Logo, obtemos > 0 e < 0. Portanto, não faz sentido usar os símbolos < ou entre números complexos a menos que se trate de números reais. Calculando as sucessivas potências de expoente natural i m da unidade imaginária, obtêmse os valores i,, i,, consoante os restos da divisão de m N por 4 seja, 2, 3 ou 0:, r = 0 i, r = i n = i 4k+r = (i 4 ) k i r = i r =., r = 2 i, r = 3 2

.. O CORPO DOS NÚMEROS COMPLEXOS O módulo do número z = a + bi é o número real não negativo z = a 2 + b 2, e o conjugado de z é número z = a bi. Proposição.. Sejam z e w números complexos. Então:. z + z = 2Re(z) e z z = 2iIm(z). 2. z = z se e só se Im(z) = 0 se e só se z R. 3. z = z. 4. z ± w = z ± w, zw = z w e, se w 0, ( z ) = z w w. 5. zz = z 2 = (Re(z)) 2 + (Im(z)) 2. 6. z = 0 se e só se z = 0. 7. Se z 0, z = z = z z. 2 8. zw = z w e z = z se w 0. w w 9. z w z ± w z + w. Demonstração. Vamos provar apenas a propriedade 9. As restantes ficam a cargo do leitor. Começamos pela desigualdade z + w z + w, conhecida por desigualdade triangular. Da definição de módulo de um número complexo resulta z Re(z) z Pelas propriedades 5, 4 e, podemos escrever Usando agora (.) obtemos z Im(z) z. (.) z + w 2 = (z + w)(z + w) = zz + (zw + zw) + ww = z 2 + (zw + zw) + zw + w 2 = z 2 + 2Re(zw) + w 2 z + w 2 z 2 + 2 zw + w 2 = z 2 + 2 z w + w 2 = ( z + w ) 2 donde segue a desigualdade triangular. Uma vez que w = w, obtemos igualmente z w = z + ( w) z + w = z + w. 3

.2. A FORMA POLAR DOS COMPLEXOS Da desigualdade triangular resulta ainda z = (z w) + w z w + w, ou equivalentemente, z w z w. Analogamente, w z z w, donde se conclui que z w z w. A mesma estimativa pode ser aplicada a z + w, obtendo-se igualmente z w z + w. A desigualdade triangular pode ser estendida para somas com um número arbitrário de parcelas z + z 2 + + z n z + z 2 + + z n. Ocorre igualdade se e só se a razão entre dois quaisquer números não nulos for positiva. Se k e n são inteiros positivos tais que mdc(k, n) =, definimos ainda ( ) k ( z k =, z ) k n = z k n. z.2 A forma polar dos complexos Uma vez que o conjunto dos números complexos coincide com o conjuntos dos pontos do plano, um número complexo z = a + bi pode ser identificado com o ponto (a, b) no plano cartesiano, que vulgarmente se designa por afixo de z. Neste caso, é usual designar o plano cartesiano por plano complexo ou plano de Argand. Podemos ainda identificar o número z com o vetor com inicio na origem (0, 0) e ponto final o afixo (a, b). O comprimento de z é a distância de z à origem, i.e., é z = a 2 + b 2. Nesta representação, o módulo z w representa a distância de z a w. A interpretação geométrica da adição de vetores já nos é familiar, uma vez que corresponde à adição de vetores no plano. Para termos uma visualização geometrica da multiplicação vamos introduzir um sistema de coordenadas polares no plano do seguinte modo. Se z 0 então z/ z está situado algures sobre o circulo unitário e, portanto, existe um ângulo θ tal que z/ z = cos(θ) + i sin(θ). Podemos então escrever z na forma polar z = z (cos(θ) + i sin(θ)) 4

.2. A FORMA POLAR DOS COMPLEXOS y y z z z + w x w x z Figura.: Interpretação gráfica do conjugado e da soma de complexos onde θ é designado por argumento de z e denotado por arg(z). É importante ter presente que arg(z) NÃO é univocamente determinado por z; adicionando qualquer múltiplo de 2π a θ dá origem a outro valor para arg(z), igualmente válido. Quando nos referimos ao argumento de um número complexo, queremos dizer um de entre os infinitos possíveis valores do argumento. Portanto, arg(z) = {θ R : z = z (cos(θ) + i sin(θ))}. Ao (único) argumento de z pertencente ao intervalo ] π, π], chamamos argumento principal de z e representamo-lo por Arg(z). Uma outra ambiguidade é relativa ao número 0, pois não definimos qualquer argumento para este número, sendo vulgar considerar qualquer real como um argumento válido para 0. É frequente utilizar-se as formas abreviadas z = rcis(θ) = re iθ, onde r = z e cis(θ) = cos(θ)+i sin(θ) = e iθ. Esta última igualdade designa-se por fórmula de Euler e será justificada mais à frente. y r sin(θ) r z = re iθ θ r cos(θ) x Figura.2: Forma polar de um número complexo 5

.2. A FORMA POLAR DOS COMPLEXOS Designando por θ um valor do argumento de z = a + bi e sendo r = z, obtemos Re(z) = r cos(θ) Im(z) = r sin(θ). Portanto, o argumento de z 0 é determinado pelas equações cos(θ) = Re(z) r e sin(θ) = Im(z). r Exemplo.. O argumento do número complexo z = i é o conjunto arg(i) = {2kπ + π 2, k Z}, e o seu argumento principal é Arg(i) = π. Tem-se portanto i = cis(π/2). 2 Proposição.2 (Multiplicação e divisão de complexos na forma polar). Sejam z = r cis(θ ) e w = r 2 cis(θ 2 ) números complexos. Então:. zw = r r 2 cis(θ + θ 2 ). 2. z = r cis( θ ). 3. z = r cis( θ ). 4. z w = r r 2 cis(θ θ 2 ). 5. (z) n = r n cis(nθ ), n Z - Fórmula de De Moivre. Demonstração. Usando as fórmulas trigonométricas da adição do seno e do cosseno, obtemos zw = r (cos(θ ) + i sin(θ ))r 2 (cos(θ 2 ) + i sin(θ 2 )) = (r r 2 )(cos(θ + θ 2 ) + i sin(θ + θ 2 )) = (r r 2 )cis(θ + θ 2 ). A propriedade 2 resulta das definições e a 3 segue de 2 e da igualdade /z = z/ z 2. A propriedade 4 resulta de e de 3 e a última propriedade obtém-se por indução sobre n. Concluímos que se multiplicam número complexos multiplicando os respetivos módulos e somando os argumentos. Em particular, multiplicar um número complexo z por outro com módulo é equivalente a rodar z por um ângulo igual ao do argumento do segundo número. Notemos que apesar de arg(z z 2 ) = arg(z ) + arg(z 2 ), em geral Arg(z z 2 ) Arg(z ) + Arg(z 2 ), 6

.2. A FORMA POLAR DOS COMPLEXOS como se pode comprovar fazendo z = = cis(π) e z 2 = 5i = 5cis( π ). O argumento 2 principal de z z 2 = 5cis( π) é Arg(z 2 z 2 ) = π, mas Arg(z 2 ) + Arg(z 2 ) = π + π. 2 A fórmula de De Moivre pode ser usada para determinar as raízes índice n (n N) de um número complexo. Seja z 0 um número complexo. Dizemos que w é a n-ésima raiz de z se w n = z, onde n é um inteiro positivo. Dois números complexos escritos na forma polar são iguais se e só se têm o mesmo módulo e os argumentos diferem entre si num múltiplo de 2π. Assim, se w = w cis(φ) e z = z cis(θ), são tais que w n = z, temos w n = z w n = z se e só se nφ = θ + 2kπ, com k Z w = n z se e só se φ = θ+2kπ, k = 0,,..., n. n Para cada k = 0,,..., n, obtemos n raízes distintas, todas com o mesmo módulo n z mas com diferentes argumentos. Devido à periodicidade do seno e do cosseno, para k n obtemos as mesmas raízes, visto que se k = n + m, com m = 0,,..., n, obtemos e φ = θ + 2(n + m)π n = θ + 2mπ n ( ) θ + 2mπ sin(φ) = sin, cos(φ) = cos n + 2π ( θ + 2mπ Recapitulando, as raízes de índice n de z 0 são w k = n ( ) θ + 2kπ z cis, k = 0,,..., n, n n ). ou seja, n z = z /n = {w 0, w,..., w n }. Geometricamente, as raízes de índice n de um número complexo z 0 estão situadas sobre a circunferência de centro na origem e raio n z. Além disso, a diferença entre os argumentos de duas raízes consecutivas é 2π n. Em particular, a raiz quadrada de um número complexo z = rcis(θ) 0 tem dois valores, w = 2cis(θ/2) e w 2 = 2cis(θ/2 + π). Na forma algébrica, temos w = x + yi e w 2 = x yi. Se z 0 é real negativo, temos x = 0. No caso de x 0, as raízes de z não são imaginárias puras, pelo que uma das raízes tem parte real positiva e a outra negativa. Vamos designar por ramo principal da raiz quadrada complexa àquela que atribui à raiz quadrada de um número complexo o valor x + yi, com x > 0, ou então x = 0 e y 0. 7

.3. SUBCONJUNTOS DE C.3 Subconjuntos de C Seja z 0 = x 0 +y 0 i C. Como z z 0 = (x x 0 ) 2 + (y y 0 ) 2 é a distância entre z = x+yi e z 0, os números complexos z que satisfazem a equação z z 0 = ρ, ρ > 0, pertencem à circunferência de centro z 0 e raio ρ. Exemplo.2.. z = representa a circunferência de centro 0 e raio. 2. z + 3i = 5 z ( 3i) = 5 representa a circunferência de centro (, 3) e raio 5. Em coordenadas polares, a circunferência de centro na origem e raio ρ > 0 pode ser escrita como {ρcis(θ), 0 θ 2π} = {z : z = ρ}. Adicionando o número z 0 à expressão anterior, obtemos uma expressão para a circunferência de centro z 0 e raio ρ: {z 0 + ρcis(θ), 0 θ 2π}. Definição.. Seja z 0 C e r > 0. A bola aberta de centro z 0 e raio r é o conjunto B(z 0, r) = {z : z z 0 < r}. Também se chama vizinhança de z 0 à bola aberta B(z 0, r). A bola fechada de centro z 0 e raio r é o conjunto B(z 0, r) = {z : z z 0 r}. Definição.2. Dizemos que S C é um subconjunto aberto se qualquer ponto z S possui uma bola aberta contida em S, ou seja, z S r > 0 : B(z, r) A. Exemplo.3. O conjunto S = {z C : Re(z) > } é aberto. De facto, dado z = a + bi S com a >, tomemos r = a e notemos que B(z, r) S. Ou seja, qualquer ponto de S possui uma vizinhança contida em S, logo S é aberto. Exemplo.4. O conjunto S = {z C : Re(z) } não é aberto, pois qualquer vizinhança de z = possui pontos que não estão em S. 8

.3. SUBCONJUNTOS DE C Exemplo.5. A bola aberta B(z 0, r) é um conjunto aberto, mas a bola fechada B(z 0, r) não é um conjunto aberto. Já o conjunto C \ B(z 0, r) é aberto. Definição.3. Um ponto z 0 diz-se um ponto de acumulação de S C se qualquer bola aberta centrada em z 0 possui pontos de S diferentes de z 0, isto é, se S (B(z 0, r) \ {z 0 }) para todo o r > 0. Definição.4. Sejam z, w C. O segmento de reta que une os pontos z e w é o conjunto [z, w] = {( t)z + tw : 0 t }. Dados z, z 2,..., z n C, a linha poligonal [z, z 2,..., z n ] é o conjunto [z, z 2,..., z n ] = [z, z 2 ] [z 2, z 3 ] [z n, z n ]. Definição.5. Um conjunto S C diz-se conexo se, quaisquer que sejam z, w S, existir uma curva contínua totalmente contida em S, que une z a w. Chamamos região a qualquer subconjunto de C aberto e conexo. Exemplo.6. A bola aberta B(z 0, r) (bem como a bola fechada B(z 0, r)) é um conjunto conexo. Nota.. Se S C é aberto e conexo, então quaisquer que sejam z, w S, existe uma linha poligonal composta por segmentos horizontais e verticais, totalmente contida em S, que une z a w. Definição.6. Um conjunto S C diz-se limitado se existir r > 0 tal que S {z : z < r} = B(0, r). 9

.3. SUBCONJUNTOS DE C 0

Capítulo 2 Sucessões e séries numéricas 2. Sucessões de números complexos Definição 2.. Uma sucessão de números complexos é uma sequência (ordenada) infinita z, z 2,..., z n,... de números complexos (também consideramos sucessões que começam num inteiro k ). Formalmente, uma sucessão é uma função z : N C na variável independente n N e tomando valores em C. Ao termo z n chamamos termo geral da sucessão e denotamos a sucessão z, z 2,... por (z n ). Se z n R para todo o n, dizemos que (z n ) é uma sucessão de números reais. A sucessão (z n ) diz-se limitada se existir um número real M R tal que z n M, n N. Ou seja, (z n ) é limitada se todos os seus termos estão contidos na bola fechada B(0, M). Por exemplo, a sucessão de termo geral z n = in é limitada pois para todo o número 2n natural n N temos i n = 2. n 2 n Portanto, todos os termos de (z n ) estão contidos na bola B(0, ). Definição 2.2. Uma sucessão (z n ) tem limite l C, e escrevemos lim z n = l ou z n l se para qualquer ε > 0 existe um n ε N tal que z n l < ε para n > n ε. Se existir um número complexo l nestas condições dizemos que a sucessão converge; caso contrário diremos que a sucessão diverge.

2.. SUCESSÕES DE NÚMEROS COMPLEXOS Portanto, a sucessão (z n ) é convergente se pudermos tornar os seus termos z n tão perto de l quanto quisermos ao fazermos n suficientemente grande. Temos z n l se e só se z n l 0. A desigualdade z n l < ε significa que a partir de n ε todos os termos da sucessão estão contidos na bola B(l, ε). O significado geométrico desta definição pode ser visto na figura 2.. z 3 z 2 z z ε z n l ε Figura 2.: Convergência de uma sucessão complexa Exemplo 2.. A sucessão (i n /n) converge para 0. Seja ε > 0. Então, i n n 0 = n < ε sempre que n > /ε. Podemos tomar n ε > /ε. Exemplo 2.2. Consideremos a sucessão de termos geral z n = (n + 2i)/n. Então z n. Se ε > 0, temos n + 2i n = 2i n = 2 n < ε sempre que n > 2/ε. Podemos tomar n ε > 2/ε. É fácil constatar que a convergência e o limite de uma sucessão não se alteram se a ela retirarmos ou acrescentarmos um número finito de termos. Tal como no caso real, o limite de uma sucessão complexa, quando existe, é único. Teorema 2.. O limite de uma sucessão convergente é único. Demonstração. Suponhamos que z n l e z n l 2. Então, dado ε > 0 existem n, n 2 N tais que e z n l < ε 2, para n > n z n l 2 < ε 2, para n > n 2. Seja n ε = max{n, n 2 }. Então, para n n ε temos l l 2 = (l z n ) + (z n l 2 ) z n l + z n l 2 < ε 2 + ε 2 = ε. Ou seja, l l 2 é uma constante positiva menor do que qualquer ε > 0, logo l = l 2. 2

2.. SUCESSÕES DE NÚMEROS COMPLEXOS Teorema 2.2. Uma sucessão convergente é limitada. Demonstração. Suponhamos que z n l. Então existe n ε C tal que z n l < para n > n ε. Assim, z n = z n l + l z n l + l < + l. Seja M = max{ z, z 2,..., z ε, + l }. Então, z n M para qualquer n N. O reciproco do resultado anterior não é verdadeiro, ou seja, uma sucessão limitada não é, necessariamente, convergente. Exemplo 2.3. A sucessão de termo geral z n = ( ) n é limitada, com z n para todo o n N. Vamos mostrar que esta sucessão não é convergente. Seja l um número complexo e notemos que para todo o n N, temos z n+ z n = 2. Assim, podemos escrever 2 = z n+ z n = (z n+ l) + (l z n ) z n+ l + z n l. Isto significa que para todo o n N, pelo menos uma das duas desigualdades z n+ l e z n l se verifica. Portanto, a condição para a convergência não se verifica para ε =, pelo que (z n ) é divergente. Teorema 2.3 (Álgebra dos limites). Sejam (z n ) e (w n ) duas sucessões convergentes para z e w, resp., e seja c C. Então:. lim(z n ± w n ) = z ± w, 2. lim(z n w n ) = zw, ( ) zn 3. lim = z se w 0. w w n Demonstração.. Seja ε > 0. Então, existem n, n 2 N tais que z n z < ε 2, para n > n e w n z < ε 2, para n > n 2. Com n 0 = max{n, n 2 }, temos que para qualquer n > n 0, (z n ± w n ) (z ± w) = (z n z) ± (w n w) z n z + w n w < ε 2 + ε 2 = ε. Logo z n ± w n z ± w. 2. Como z n z, existe n N tal que z n z < para n > n, 3

2.. SUCESSÕES DE NÚMEROS COMPLEXOS pelo que z n < z + para n > n. Por outro lado, dado ε > 0 existem n 2, n 3 N tais que e z n z < w n w < Seja n 0 = max{n, n 2, n 3 }. Para n > n 0 temos Mostrámos assim que z n w n zw. ε 2( w + ), para n > n 2 ε 2( z + ), para n > n 3. z n w n zw = z n w n z n w + z n w zw = z n (w n w) + (z n z)w z n w n w + w z n z < ε 2 + ε 2 = ε. 3. Vamos começar por mostrar que /w n /w. Como w 0 e w n w, existe n N tal que para n > n todos os termos z n da sucessão estão dentro da bola de centro w e raio w /2, ou seja, Isto significa que w n w < w 2 para n > n. w n > w para n > n. 2 Por outro lado, dado ε > 0 existe n 2 N tal que w n w < w 2 ε 2 Seja n 0 = max{n, n 2 }. Para n > n 0 temos w n w = w n w w n w para n > n 2. 2 w n w w 2 < ε. Assim, /w n /w e pela alínea 2. concluímos que z n /w n = z n (/w n ) z/w. Definição 2.3. Dizemos que a sucessão (z n ) diverge para, e escrevemos z n, se para qualquer M > 0 existe n 0 N tal que z n > M sempre que n > n 0. Exemplo 2.4. A sucessão de termo geral z n = (2i) n satisfaz z n pois qualquer que seja o real M > 0 temos (2i) n = 2 n > M sempre que n > log 2 M. 4

2.. SUCESSÕES DE NÚMEROS COMPLEXOS É consequência das definições que z n se e só se /z n 0. Definição 2.4. Chamamos subsucessão da sucessão (z n ) a qualquer sequência infinita obtida a partir de (z n ) por eliminação de alguns termos. Proposição 2.4.. Se a sucessão (z n ) converge para l C, então qualquer subsucessão de (z n ) tem limite l. 2. Sejam (u n ) e (v n ) subsucessões da sucessão (z n ) que contêm todos os termos desta. Se (u n ) e (v n ) têm o mesmo limite l então (z n ) também tem limite l. Demonstração. A propriedade. resulta das definições de limite e de subsucessão. Quanto a 2., consideremos ε > 0. Então, existem n, n 2 N tais que u n l < ε para n > n e v n l < ε para n > n 2. Fazendo n 0 = max{n, n 2 }, temos que se n > n 0 então u n l < ε e v n l < ε. Como o conjunto dos termos de (z n ) é a união do conjunto dos termos de (u n ) e de (v n ), obtemos z n l < ε, ou seja, z n l. Exemplo 2.5. O resultado anterior fornece uma nova prova de que a sucessão de termo geral ( ) n é divergente, pois as suas subsucessões (( ) 2n ) e (( ) 2n+ ) têm limites e -, resp. As sucessões reais são particularmente interessantes devido ao corpo dos números reais ser ordenado. Este facto permite obter resultados que só se aplicam às sucessões reais. Vamos de seguida relembrar alguns resultados sobre convergência de sucessões reais que necessitaremos mais adiante. Sucessões de números reais Teorema 2.5 (Sucessões enquadradas). Sejam (a n ), (b n ) e (c n ) sucessões de números reais tais que. a n b n c n, para todo o n; 2. a n e c n são convergentes com igual limite l. Então b n é convergente e lim b n = l. 5

2.. SUCESSÕES DE NÚMEROS COMPLEXOS Demonstração. Como a n l e c n l, temos c n a n 0. Isto significa que dado ε > 0 existem n, n 2 N tais que c n a n < ε 2 para n > n e a n l < ε 2 para n > n 2. Seja n 0 = max{n, n 2 }. Então, para n > n 0 temos b n l b n a n + a n l c n a n + a n l < ε. Portanto, b n l. Exemplo 2.6. Utilizando o teorema das sucessões enquadradas é fácil verificar que lim n! n n = 0. De facto, temos 0 n! n = 2 n n n n n = ( 2 3 n n n n ) n n. Como lim 0 = lim /n = 0 temos o resultado. Definição 2.5. Seja (a n ) n N uma sucessão de números reais. Se a n a n+ para todo o n N, isto é, se a a 2 a 3 a n então (a n ) diz-se crescente. Se a n a n+ para todo o n N, isto é, se a a 2 a 3 a n então (a n ) diz-se decrescente. Uma sucessão que seja decrescente ou crescente diz-se monótona. Como vimos atrás, nem toda a sucessão limitada é convergente. No entanto, temos o seguinte resultado: Proposição 2.6. Toda a sucessão real monótona e limitada é convergente. 6

2.. SUCESSÕES DE NÚMEROS COMPLEXOS Demonstração. Suponhamos que (a n ) é uma sucessão crescente (o caso decrescente é análogo) e limitada. Seja l o supremo do conjunto {a n : n N}. Vamos mostrar que a n l. Dado ε > 0 existe n 0 N tal que l ε < a n0 l. Como (a n ) é crescente, temos l ε < a n0 a n l < l + ε para todo o n > n 0, pelo que a n l < ε. Exemplo 2.7. Vamos utilizar o resultado anterior para estudar o comportamento da sucessão (r n ), com r um número real fixo. Quando r >, temos r n+ r n = r n (r ) > 0, pelo que (r n ) é crescente. Além disso, escrevendo r = + h e utilizando o binómio de Newton, podemos escrever r n = ( + h) n = + nh + e, como todas as parcelas são positivas, n(n ) h 2 + 2 r n > + nh. Uma vez que lim + nh = +, também lim r n = +. Quando r = obtemos a sucessão constante r n = n = convergente para. Se 0 < r <, temos r n+ r n = r n (r ) < 0 pelo que (r n ) é decrescente. Além disso, Fazendo r = h, temos h > e 0 < r n = h <. n Ou seja (r n ) n N é monótona e limitada, logo convergente. Como lim h n = +, temos lim r n = 0. Quando r = 0 obtemos a sucessão constante r n = 0 n = 0 convergente para 0. Finalmente, se r < 0, temos r < 0, r 2 > 0, r 3 < 0,..., pelo que (r n ) não é monótona. Além disso, podemos escrever r n = ( ) n ( r) n. Se < r < 0, lim( r) n = 0, donde lim r n = 0. Se r = obtemos a sucessão divergente ( ) n e se r <, de (r n ) podemos extrair duas subsucessões a, a 3, a 5,... e a 2, a 4, a 6,... +, pelo que (r n ) é divergente. 7

2.. SUCESSÕES DE NÚMEROS COMPLEXOS Temos, portanto, +, se r >, se r = lim r n =. 0, se < r < não existe, se r Dado um número real a 0, facilmente obtemos +, se r > a, se r = lim ar n =. 0, se < r < não existe, se r Uma sucessão da forma (ar n ) diz-se uma progressão geométrica de razão r. Cada termo é obtido do anterior por multiplicação pelo número r, chamado razão. Exemplo 2.8. A sucessão (a n ), onde para cada n N, a n = ( + n) n, é convergente. De facto, pode provar-se que esta sucessão é monótona e limitada. Ao seu limite chamamos e (número de Euler): ( lim + n) n = e 2, 7828828459 Recordando que para uma função real de variável real f se tem lim f(x) = l ε > 0 M > 0 : x D f e x M f(x) l < ε, x + podemos concluir que a diferença entre esta e a definição de limite de uma sucessão está unicamente no domínio onde as funções estão definidas. Como N está contido em R podemos facilmente estabelecer o seguinte resultado: Proposição 2.7. Seja f : [, + [ R uma função real de variável real e seja l R. Se lim f(x) = l então a sucessão de números reais (f(n)) também converge para l. x + Este resultado pode ser usado para calcular limites de sucessões reais efetuando a sua extensão a uma função de R em R onde temos outros instrumentos para calcular limites. 8

2.. SUCESSÕES DE NÚMEROS COMPLEXOS ( ) ln n Exemplo 2.9. Se quisermos calcular o limite da sucessão, podemos considerar a n função f(x) = ln(x) definida em R + e calcular o seu limite quando x tende para +. x Como se trata de um limite indeterminado, podemos utilizar a regra de L Hôpital para mostrar que ln(x) lim x + x Pelo teorema anterior, segue que lim ln n n = 0. Testes de convergência Vamos agora usar as propriedades das sucessões reais para estudar sucessões complexas. = 0. Proposição 2.8. Seja (z n ) uma sucessão de números complexos.. lim z n = z se e só se lim Re(z n ) = Re(z) e lim Im(z n ) = Im(z). 2. z n 0 se e só se z n 0. 3. Se z n z então z n z. Demonstração.. Notemos que 0 Re(z n ) Re(z), Im(z n ) Im(z) (Re(z n ) Re(z))+i(Im(z n ) Im(z)) = z n z. Assim, se z n z 0, também Re(z n ) Re(z) 0 e Im(z n ) Im(z) 0. Reciprocamente, suponhamos que Re(z n ) Re(z) 0 e Im(z n ) Im(z) 0. Pela desigualdade triangular podemos escrever isto é, z n z 0. 0 z n z Re(z n ) Re(z) + Im(z n ) Im(z) 0, A propriedade 2. é consequência da definição. 3. Temos z n z se e só se z n z 0. Como 0 z n z z n z, concluímos que também z n z 0, ou seja, z n z. Exemplo 2.0. A sucessão de termo geral z n = in converge para 0 uma vez que n i n n = n 0. 9

2.2. SÉRIES DE NÚMEROS COMPLEXOS Exemplo 2.. Mostremos que a sucessão de termo geral z n = 3 + ni n + 2ni converge para 2 5 + 5 i. Para tal, comecemos por escrever z n na forma algébrica z n = 2n2 + 3n 5n 2 O resultado é consequência dos limites lim 2n2 + 3n 5n 2 = 2 5 e 6n + n2 + i. 5n 2 lim 6n + n2 5n 2 = 5. Exemplo 2.2. Seja z C, fixo, e consideremos a sucessão (z n ). É claro que se z <, então z n 0 visto que z n = z n 0. É fácil verificar que n e que se z =, z, z n não tem limite pois neste caso z n = cis(nθ), com θ 0, e a sucessão real cos(nθ) diverge. Além disso, como a sucessão de números reais z n é divergente para z >, pela alínea (3) da proposição anterior concluímos que z n é divergente. Ou seja, (z n ) é convergente se e só se z < ou z =. Proposição 2.9. Se z n 0 e (w n ) é limitada então z n w n 0. Demonstração. Sendo (w n ) uma sucessão limitada, existe M > 0 tal que w n < M para todo o n N. Além disso, dado ε > 0 existe n ε N tal que z n < ε/m para n > n 0. Assim, para n > n 0 temos Ou seja, z n w n 0. 0 < z n w n < ε. 2.2 Séries de números complexos Definição 2.6. Seja (z n ) uma sucessão de números complexos. Chama-se série numérica de termo geral z n à expressão z + z 2 + + z n + = z n. A sucessão (s n ) definida por s n = z + z 2 + + z n para todo o n N chama-se a sucessão das somas parciais da série z n. Se a sucessão (s n ) for convergente e lim s n = s, então a série z n é dita convergente e escrevemos z n = s. O número s diz-se a soma da série. Caso contrário, a série diz-se divergente. 20

2.2. SÉRIES DE NÚMEROS COMPLEXOS Exemplo 2.3. Chama-se série geométrica a uma série da forma rz n = r + rz + rz 2 + + rz n +, onde r, z C. Se r 0 e z (razão), o termo geral da sucessão das somas parciais desta série pode escrever-se na forma s n = r + rz + rz 2 + + rz n = r zn z. (2.) Usando o resultado do exemplo 2.2 podemos concluir que a sucessão (s n ) é convergente se e só se z < e neste caso Portanto, se r 0, a série geométrica a sua soma é ( ) lim s n = lim r z zn = r z z. rz n é convergente se e só se z < e, neste caso, rz n = r z. (2.2) Por outras palavras, a soma de uma série geométrica convergente é dada por primeiro termo. razão Exemplo 2.4. Chama-se série telescópica ou série de Mengoli a uma série da forma (z n z n+p ), onde (z n ) é uma sucessão de números complexos. Quando p =, a sua n-ésima soma parcial pode ser escrita como n s n = (z k z k+ ) k= = (z z 2 ) + (z 2 z 3 ) + + (z n z n+ ) = z z n+. Assim, a série converge se e só se a sucessão (z n ) converge e, nesse caso, a sua soma é z lim z n. 2

2.2. SÉRIES DE NÚMEROS COMPLEXOS Exemplo 2.5. A série harmónica n é divergente. De facto, consideremos a subsucessão (s 2 n) da sucessão das somas parciais (s n ) e notemos que s 2 = + 2 ) ) s 2 2 = + ( 2 + 3 + > + ( 4 2 + 4 + = + 2 4 2 s 2 3 = + ( 2 + 3 + ) ( + 4 5 + 6 + 7 + ) 8 > + ( 2 + 4 + ) ( + 4 8 + 8 + 8 + ) 8. = + 3 2 s 2 n > + n 2 Portanto, (s n ) possui uma subsucessão ilimitada, pelo que (s n ) não é convergente. Concluí-se então que a série harmónica é divergente. Uma vez que a noção de convergência de uma série está ligada à noção de limite da sucessão das somas parciais, obtemos o seguinte resultado. Proposição 2.0. A natureza (convergência ou divergência) de uma série não se altera se retirarmos, eliminarmos ou alterarmos um número finito dos seus termos. Note-se, no entanto, que se se retirarmos, eliminarmos ou alterarmos um número finito dos termos de uma série convergente, a série resultante converge mas não necessariamente para a soma da série original. Por exemplo, se k N e z n = s então série z n também é convergente mas tem soma z n = s (z + + z k ). n=k Proposição 2. (Álgebra das séries). Sejam z n e w n duas séries convergentes com somas s e t, respectivamente. Então, dado c C,. (z n + w n ) e cz n são ambas convergentes; 2. a soma de (z n + w n ) é s + t e a soma de cz n é cs. 22 n=k

2.3. CRITÉRIOS DE CONVERGÊNCIA Demonstração. As propriedades são consequência da álgebra dos limites de sucessões complexas. Corolário 2.2. Se z n é convergente e w n é divergente, então a série (z n + w n ) é divergente. Demonstração. Se (z n + w n ) fosse convergente, então pelo teorema anterior também a série w n = (z n + w n ) seria convergente, o que é um absurdo. Outro resultado que segue imediatamente da noção de limite é o seguinte: Teorema 2.3 (Convergência de séries complexas vs séries reais). A série de números complexos converge se e só se as séries de números reais Re(z n ) e Im(z n ) z n convergem e, nesse caso, z n z n = Re(z n ) + i Im(z n ). 2.3 Critérios de convergência Teorema 2.4 (Condição necessária de convergência). Se a série z n é convergente, então lim z n = 0. Demonstração. Seja (s n ) a sucessão das somas parciais associada à série. Considerando t n = s n, podemos considerar a sucessão (t n ) como uma subsucessão de (s n ) e, como tal, convergente para o mesmo limite. Assim, lim z n = lim s n t n = 0. A uma série associamos duas sucessões: a sucessão (s n ) das somas parciais associada à série e a sucessão (z n ) dos seus termos. Se z n for convergente, a sua soma é s = lim s n e lim z n = 0. O recíproco deste teorema é falso: se lim z n = 0 não podemos concluir que a série z n converge. De facto, a série n diverge e lim n = 0. Corolário 2.5 (Teste para a divergência). Se lim a n 0, então a série a n é divergente. Exemplo 2.6. As séries ( ) n, ni e gerais não convergem para zero. ni são divergentes, pois os seus termos n + 23

2.3. CRITÉRIOS DE CONVERGÊNCIA Séries reais Vamos seguidamente analisar o caso particular das séries de números reais. Como veremos mais adiante, as séries de números reais terão um papel importante no estudo da natureza de uma série complexa. Teorema 2.6 (Teste de comparação). Sejam reais tais que 0 a n b n, para todo o n n 0. Então, a n e. se b n é convergente, então a n é também convergente; 2. se a n é divergente, então b n é também divergente. b n duas séries de números Demonstração. Como. e 2. são equivalentes, provaremos apenas a condição. Sejam (s n ) e (t n ) as sucessões das somas parciais de a n e de b n = t, resp. Como ambas as séries têm termos positivos, as sucessões (s n ) e (t n ) são crescentes. Além disso, t n t, pelo que t n t. Como a n b n para todo o n N, temos s n t n para todo o n N, logo também s n t para todo o n N. Isto significa que a sucessão (s n ) é crescente e limitada, logo convergente. Exemplo 2.7. A série e a série é convergente, uma vez que 2 n + 0 2 n + 2 n 2 converge pois é uma série geométrica de razão 0 < <. n 2 Teorema 2.7 (Teste de comparação do limite). Sejam a n e b n duas séries de termos não-negativos. Se l = lim a n b n R + {0, + }, então:. Se l R +, isto é, não é zero nem +, então as séries têm a mesma natureza. 2. Se l = 0 e b n converge, então a n converge. 3. Se l = + e b n diverge, então a n diverge. Demonstração.. Sejam m e M números reais positivos tais que m < l < M. Como lim a n /b n = l, existe n 0 N tal que para n > n 0 se tem m < a n b n < M, 24

2.3. CRITÉRIOS DE CONVERGÊNCIA ou de forma equivalente, mb n < a n < Mb n. Se b n converge, também Mb n converge e, pelo o teste de comparação, também a série a n converge. Por outro lado, se b n diverge, também mb n diverge e mais uma vez pelo o teste de comparação, concluímos que a série a n diverge. 2. Se lim a n = 0 então dado ε > 0 existe n 0 N tal que para n > n 0 temos 0 < a n < ε, b n b n ou de forma equivalente, 0 < a n < εb n. Se b n converge, o mesmo se passa com a série εb n e, pelo teste de comparação, a n converge. 3. Finalmente, se lim a n = + então dado M > 0 existe n 0 N tal que para n > n 0 b n temos 0 < M < a n, ou seja, 0 < Mb n < a n. Mais uma vez o teste de comparação diz-nos b n que se b n diverge também a série a n diverge. Exemplo 2.8. A série 2 n é convergente. De facto, lim 2 n 2 n = lim 2n 2 n = R+ e a série 2 n é geométrica de razão 0 < 2 do limite, obtemos o resultado. <, logo convergente. Pelo teste de comparação Teorema 2.8 (Critério do integral). Seja f : [, + [ R uma função contínua, não negativa e decrescente. Então o integral impróprio + f(x)dx e a série f(n) têm a mesma natureza. Demonstração. Consideremos a área limitada pelo eixo dos xx s e o gráfico da função f(x) entre e n. Particionamos o intervalo [, n] em subintervalos de comprimento e tomamos o valor da função f no extremo direito de cada intervalo (cf. figura abaixo). Este procedimento define retângulos de área a i := f(i), para i = 2,..., n, cuja soma das áreas satisfaz a 2 + a 3 + + a n 25 n f(x)dx. (2.3)

2.3. CRITÉRIOS DE CONVERGÊNCIA y a 2 a 3 a 4 a 5 a n 2 3 4 5 n y = f(x) x Se o integral Portanto, + f(x)dx é convergente, então da desigualdade (2.3) segue que n a i i=2 s n = a + n f(x)dx n a i a + i=2 + + f(x)dx. f(x)dx = M, para algum M R. Isto significa que a sucessão das somas parciais (s n ) da série f(n) é limitada. Como esta sucessão é claramente crescente, podemos concluir que (s n ) é convergente, i.e., a série f(n) é convergente. n Suponhamos agora que o integral + f(x)dx é divergente. Como f(x) 0 temos f(x)dx + quando n +. De forma análoga ao caso anterior (cf figura abaixo), podemos concluir que n f(x)dx a + a 2 + + a n = s n. (2.4) y a n a a 2 a 3 a 4 2 3 4 5 n y = f(x) x A desigualdade (2.4) significa que s n +, pelo que a série f(n) diverge. 26

2.3. CRITÉRIOS DE CONVERGÊNCIA Exemplo 2.9. Dado p R designamos por série-p ou série de Dirichlet a série Vamos utilizar os critérios anteriores para estudar a natureza desta série. n. p Se p < 0 então lim /n p = e se p = 0 então lim /n p =. Em ambos os casos lim /n p 0, pelo que o teste para a divergência permite concluir que a série-p correspondente diverge. Se p > 0 a função f(x) = /x p é contínua, decrescente e positiva no intervalo [, + [. Uma vez que o integral impróprio + f(x)dx converge se p > e diverge se p, o teste do integral diz-nos que a série-p converge para p > e diverge se 0 < p. Resumindo, a série-p converge para p > e diverge para p. np Vamos de seguida analisar séries reais cujos termos não são necessariamente positivos. Designaremos estas séries por séries de termos de sinal não definido. De entre estas, existem umas especiais chamadas séries alternadas. Definição 2.7. Uma série da forma ( ) n b n ou o n, chama-se série alternada. ( ) n b n, onde b n R + para todo Teorema 2.9 (Critério de Leibniz). Se a sucessão de termos reais positivos (b n ) é decrescente e tal que lim b n = 0, então a série alternada ( ) n b n é convergente. Demonstração. Consideremos a sucessão das somas parciais (s n ) da série ( ) n b n. Uma vez que b n > 0 e que (b n ) é decrescente, não é difícil verificar que s s 3 s 5 s 2n s 2n s 6 s 4 s 2. Concluímos que a subsucessão dos termos ímpares (s 2n ) é decrescente e limitada inferiormente por s 2, enquanto que a subsucessão dos termos pares (s 2n ) é crescente e limitada superiormente por s. Portanto, ambas as subsucessões são convergentes. Além disso s 2n s 2n = b 2n 0, pelo que ambas as subsucessões têm o mesmo limite. Concluímos assim que (s n ) é convergente. Exemplo 2.20. A série alternada ( ) n n é convergente pois (b n) = (/n) é uma sucessão decrescente, isto é, b n b n+ para todo o n e lim b n = 0. Esta série designa-se por série harmónica alternada. 27

2.3. CRITÉRIOS DE CONVERGÊNCIA Exemplo 2.2. O critério de Leibniz não pode ser aplicado à série alternada ( ) n 2n 3n pois o limite lim 2n 3n = 2 0. No entanto, é fácil verificar que as subsucessões dos termos pares e dos termos ímpares têm limites diferentes, donde se conclui que não existe o 3 limite do termo geral ( ) n 2n. Assim, pelo teste para a divergência, a série dada é 3n divergente. Podemos usar uma soma parcial s n de uma série convergente para estimar a sua soma s. No entanto, o grau de precisão desta estimativa pode ser difícil de obter, o que torna a estimativa pouco eficiente. O erro que se comete ao aproximar s usando s n é a diferença R n = s s n. No caso das séries alternadas, é possível controlar o erro cometido nesta aproximação. Teorema 2.20 (Estimativa do erro para séries alternadas). Seja ( ) n b n uma série alternada convergente com soma s satisfazendo as hipóteses do critério de Leibniz. Se (s n ) é a sucessão das somas parciais da série, então R n = s s n b n+. Demonstração. Segue da prova do critério de Leibniz que a soma s se situa entre quaisquer dois termos consecutivos s n e s n+ da sucessão das somas parciais. Portanto, s s n s n+ s n = b n+. ( ) n Exemplo 2.22. A série alternada é convergente, pois satisfaz as condições do n! critério de Leibniz. Se aproximarmos a sua soma usando os primeiros 7 termos da série obtemos s s 6 = 0!! + 2! 3! + 4! 5! + 6! 0.368056. O erro que se comete nesta aproximação é menor do que o módulo do primeiro termo desprezado: R b 7 = 7! = 0.0002. Como o erro é menor do que 0.0002, a estimativa s 0.368056 tem pelo menos 3 casas decimais corretas. 28

Séries complexas 2.3. CRITÉRIOS DE CONVERGÊNCIA Dada uma série de números complexos z n podemos considerar a série de números reais z n = z + z 2 + + z n + cujos termos são os valores absolutos dos termos da série original. Definição 2.8. Uma série z n é dita absolutamente convergente se a série dos valores absolutos z n for convergente. O teorema seguinte mostra que uma série absolutamente convergente é também convergente. Isto significa que podemos usar critérios de convergência de séries reais para analisar séries complexas. Teorema 2.2. Se a série z n é absolutamente convergente, então a série z n é convergente e z n z n. Demonstração. Vamos provar em primeiro lugar que a convergência absoluta implica convergência para séries de números reais. Seja então a n uma série de números reais absolutamente convergente e notemos que 0 a n + a n 2 a n, para todo o n. Como por hipótese a n converge, também a série 2 a n converge e, pelo teste de comparação para série de termos positivos, podemos concluir que a série a n + a n também converge. Mas então a n converge, pois podemos expressar esta série como a soma de duas séries convergentes Seja agora a n = (a n + a n ) a n. z n uma série absolutamente convergente. Então, como Re(z n ) z n e Im(z n ) z n o critério de comparação para séries de termos positivos permite concluir que as séries Re(z n ) e Im(z n ) são convergentes. Ou seja, as séries reais Re(z n ) e Im(z n ) são absolutamente convergentes logo, pelo que vimos atrás, são também con- vergentes, o que implica a convergência da série z n. 29

2.3. CRITÉRIOS DE CONVERGÊNCIA Designemos por (s n ) e por (s n) as sucessões das somas parciais das séries z n e z n. Pela desigualdade triangular podemos escrever s n := z + z 2 + + z n z + z 2 + + z n = s n. Assim, obtemos lim s n lim s n, ou seja, z n z n. Portanto, convergência absoluta implica convergência. No entanto, o reciproco não é válido, isto é, a convergência de uma série não significa que esta é também absolutamente convergente. Por exemplo, a série harmónica alternada é convergente mas não é absolutamente convergente. Definição 2.9. Uma série é dita simplesmente convergente se for convergente mas não absolutamente convergente. Teorema 2.22 (Critério da razão ou d Alembert). Seja z n uma série de números complexos tal que lim z n+ z n = l R + {0, + }.. Se l < a série z n é absolutamente convergente. 2. Se l > ou l = + a série z n é divergente. 3. Se l = nenhuma conclusão pode ser retirada sobre a convergência ou divergência da série z n. Demonstração.. Suponhamos que l <. Seja L R tal que l < L <. Então, existe n 0 N tal que z n+ z n < L para n > n 0. Daqui segue que z n < z n0 L n para n > n 0. Como a série z n0 L n é convergente, pois é uma série geométrica de razão 0 < L <, pelo teste de comparação concluímos que a série z n é também convergente. 2. Se l > ou l = +, então existe n 0 N tal que z n+ z n > para n > n 0. Isto significa que z n+ > z n para n > n 0 e, portanto, lim z n 0. Logo lim z n 0 e pelo teste para a divergência concluímos que a série z n é divergente. 30

3. A série-p 2.3. CRITÉRIOS DE CONVERGÊNCIA /n 2 é absolutamente convergente e satisfaz lim z n+ /z n =, enquanto que a série harmónica /n é divergente mas também satisfaz lim z n+ /z n =. Portanto, se l = o teste da razão é inconclusivo. Teorema 2.23 (Critério da raiz ou de Cauchy). Seja complexos tal que lim n z n = l R + {0, + }.. Se l < a série z n é absolutamente convergente. 2. Se l > ou l = + a série z n é divergente. z n uma série de números 3. Se l = nenhuma conclusão pode ser retirada sobre a convergência ou divergência da série z n. Demonstração.. Se l < seja L R tal que l < L <. Então, existe n 0 N tal que n zn = z n /n < L para n > n 0, ou ainda, z n < L n para n > n 0. Como a série geométrica L n converge, pelo teste de comparação a série z n também converge. 2. Se l > ou l = +, então existe n 0 N tal que n zn = z n /n > para n > n 0. Isto significa que z n > n = para n > n 0 e, portanto, lim z n 0. Logo lim z n 0 e pelo teste para a divergência concluímos que a série z n é divergente. 3. A série-p /n 2 é absolutamente convergente enquanto que a série harmónica /n é divergente, mas em cada um destes casos temos l = lim n z n =. 3

2.3. CRITÉRIOS DE CONVERGÊNCIA 32

Capítulo 3 Séries de Fourier Séries de Fourier são ferramentas importantes para representar funções periódicas. Devem o seu nome a Jean-Baptiste Joseph Fourier, que as utilizou para solucionar um problema relacionado com a condução do calor numa placa de metal. Definição 3.. Uma função f : R R é dita periódica de período L R se f(x + L) = f(x), para todo o x R. Claro que se L é um período da função f, então também kl é um período de f, para todo o k Z, uma vez que e f(x + kl) = f(x + (k )L + L) = f(x + (k )L) = = f(x), se k Z + f(x L) = f(x L + L) = f(x). Portanto, sem perda de generalidade podemos considerar apenas períodos positivos. intervalo de regularidade de f é qualquer intervalo de comprimento L. Na maior parte dos casos, vamos considerar os intervalos de regularidade [ L 2, L 2 ]. Definição 3.2. Chamamos período fundamental de uma função periódica ao menor dos períodos positivos. Vamos, no entanto, daqui em diante chamar apenas período ao período fundamental. Exemplo 3.. As funções sin(x) e cos(x) são periódicas com período 2π. Exemplo 3.2. Para cada n N e cada L R \ {0}, fixos, as funções definidas por f(x) = ( nπx ) ( nπx ) sin e g(x) = cos são periódicas com período T = 2L L L n, pois ( ( nπ f(x + T ) = sin x + 2L )) ( nπx ) ( nπx ) = sin L n L + 2π = sin = f(x) L e analogamente g(x + T ) = g(x). 33 O

Definição 3.3. Uma função f diz-se seccionalmente contínua no intervalo [ L, L] se tiver neste intervalo apenas um número finito de descontinuidades, todas de primeira espécie. Isto é, se f tem um número finito de descontinuidade em a, a 2,..., a n, para algum n 0, com L = a 0 < a < a 2 < < a n < a n+ = L, é contínua em ]a i, a i+ [, i = 0,,..., n, e existem os limites laterais f(a + i ) := lim f(x) e f(a x a + i ) := lim f(x). i x a i Claro que se f é contínua em x i então f(x + i ) = f(x i ). Sabemos ainda da análise real que uma função seccionalmente contínua em [ L, L] é integrável neste intervalo. Definição 3.4. Seja f uma função seccionalmente contínua no intervalo [ L, L]. Então a série de Fourier de f é a série de funções a 0 2 + ( a n cos onde os coeficientes de Fourier são dados por a n = L L L f(x) cos ( nπx ) + b n sin L ( nπx )), L ( nπx ) dx e b n = L ( nπx ) f(x) sin dx. L L L L A presença do factor /2 na parcela a 0 serve para tornar a fórmula a n válida para todo o n 0. Note-se ainda que nesta definição não é dito que f(x) é a soma da sua série de Fourier. Apenas se diz que associada a uma qualquer função f seccionalmente contínua no intervalo [ L, L], existe uma certa série chamada série de Fourier. Coloca-se então a questão de saber qual a relação entre f e a sua série de Fourier. A resposta a esta questão é dada no próximo teorema. Antes, porém, vamos mostrar como deduzir as fórmulas para os coeficientes de Fourier, começando com uma função f periódica de período 2π, que supomos coincidir com a sua série de Fourier no intervalo [ π, π]: f(x) = a 0 2 + (a n cos(nx) + b n sin(nx)), π x π. Integrando termo a termo, obtemos π π f(x)dx = π π a 0 2 dx + π (a n 34 π cos(nx)dx + b n π π ) sin(nx)dx. (3.)

Uma vez que segue que π π cos(nx)dx = a 0 = π π π π π sin(nx)dx = 0, f(x)dx. Multiplicando a equação (3.) por cos(mx), m, obtemos π π π π f(x) cos(mx)dx = = a 0 π cos(mx)dx + 2 a n cos(nx) cos(mx)dx + b n sin(nx) cos(mx)dx. π }{{} π π }{{} =0 =0 Atendendo a que π π, n = m cos(nx) cos(mx)dx = π 0, n m, obtemos então a m = π π π f(x) cos(mx)dx, m. Analogamente, multiplicando a equação (3.) por sin(mx), m, obtemos b m = π π π f(x) sin(mx)dx, m. Se a função f tem período diferente de 2π, podemos obter a sua série de Fourier fazendo uma mudança de variável. Suponhamos então que f é uma função seccionalmente contínua em [ L, L] com período 2L, isto é, f(x + 2L) = f(x) para todo o x. Fazendo t = πx L e ( ) Lt f(x) f = g(t), π então a função g é seccionalmente contínua em [π, π], tem período 2π e x = ±L corresponde a t = ±π. Pelo caso anterior, a série de Fourier de g é então onde a n = π π a 0 2 + (a n cos(nt) + b n sin(nt)), π g(t) cos(nt)dt, b n = π π π g(t) sin(nt)dt. Substituindo a variável t = πx, obtemos então os coeficientes dados na definição. L 35

Exemplo 3.3. Consideremos a função definida em [ π, π] por 0, π x < 0 f(x) =, 0 x < π. Os coeficientes de Fourier de f são dados por e a n = π b n = π π π a 0 = π π f(x) cos(nx)dx = π π f(x) sin(nx)dx = π A série de Fourier de f é, então π π f(x)dx = π π 0 π 0 π 0 cos(nx)dx = π sin(nx)dx = π dx =, [ sin(nx) n [ cos(nx) n ] π 0 ] π 0 = 0, para n, 0, n par = 2, n ímpar. nπ a 0 2 + a cos(x) + a 2 cos(2x) + + b sin(x) + b 2 sin(2x) + b 3 sin(3x) + = 2 + 2 sin(2k )x. π(2k ) Teorema 3. (Convergência da série de Fourier). Seja f uma função periódica de período 2L. Se f e f forem seccionalmente contínuas no intervalo [ L, L], então a série de Fourier de f é convergente em R e a sua soma, em cada ponto x, é igual à média aritmética dos limites laterais de f, f(x + ) + f(x ). 2 Notemos que se f é contínua em x, então f(x + ) = f(x ) e f(x+ ) + f(x ) = f(x), ou 2 seja, a série de Fourier converge para f(x) nos pontos de continuidade da função f. Exemplo 3.4. Consideremos novamente a função f periódica de período 2π definida no intervalo [ π, π] por 0, π x < 0 f(x) =, 0 x < π. É fácil verificar que tanto f como a sua derivada são seccionalmente contínuas no intervalo [ π, π]. A função f é contínua no ponto x = e descontínua em x = 0, onde tem uma descontinuidade de primeira espécie. Assim, a sua série de Fourier, que determinámos no exemplo 3.3, converge para f() = no ponto x =, e converge para f(0+ ) + f(0 ) = 2 0 + = no ponto x = 0. 2 2 36

então Se f é uma função par em [ L, L], isto é, se f( x) = f(x) para todo o x [ L, L], L L f(x)dx = 2 L 0 f(x)dx. Se f é uma função ímpar em [ L, L], isto é, se f( x) = f(x) para todo o x [ L, L], então L L f(x)dx = 0. Além disso, o produto de duas funções pares ou de duas funções ímpares é uma função par, enquanto que o produto de uma função par por uma função ímpar é uma função ímpar. Daqui segue que se f é uma função par no intervalo [ π, π], então os coeficientes de Fourier b n são nulos para n, enquanto que se f é uma função ímpar em [ π, π], então os coeficientes de Fourier a n são nulos para n 0. Proposição 3.2.. Seja f uma função periódica de período 2L, par e seccionalmente contínua em [ L, L]. Então a série de Fourier de f é a série de cossenos π a 0 2 + a n cos( nπx L ), com a n = 2 f(x) cos( nπx )dx para n 0. L 0 L 2. Seja f uma função periódica de período 2L, ímpar e seccionalmente contínua em [ L, L]. Então a série de Fourier de f é a série de senos com b n = 2 L π 0 f(x) sin( nπx )dx para n 0. L b n sin( nπx L ), Exemplo 3.5. Determinemos a série de Fourier da função definida por f(x) = x, para x, e f(x + 2) = f(x) para todo o x. O gráfico desta função está indicado em baixo. y -2-2 x Tanto a função f como a sua derivada são seccionalmente contínuas no intervalo [, ]. Além disso, notemos que f é uma função par. Determinemos então os coeficientes a n de 37