Palavras-chave: Teoria da Estrutura Retórica; parentetização, relação parentética, leitura; ensino.

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A RELAÇÃO RETÓRICA PARENTÉTICA NA ANÁLISE DE TEXTOS: NOVAS POSSIBILIDADES DE PRÁTICAS PEDAGÓGICAS. Doutoranda Angela Maria Alves Lemos JAMALі Doutoranda Maria Risolina de Fátima Ribeiro CORREIAii Resumo Entendendo que a Teoria da Estrutura Retórica (RST) tem o objetivo de identificar as partes que constituem um texto, com foco na coerência textual, objetivamos, com este estudo, mostrar a relevância dessa teoria no que se refere à compreensão de um texto, mediante a discussão da relação retórica parentética. A partir dos estudos da Teoria da Estrutura Retórica, tal como desenvolvida por Mann e Thompson (1988), buscamos estabelecer conexão entre a relação parentética, cunhada por Pardo (2005), que a caracteriza como apresentação de uma informação extra que não está expressa no fluxo principal do texto, e os estudos propostos por Jubran (2006), que considera a parentetização como inserção, no segmento tópico, de informações relevantes, em dado momento do texto, de modo a promover um desvio tópico discursivo. O estudo se fundamenta, ainda, na ideia de que todo texto se instaura em uma função comunicativa e de que a leitura, como parte da interação verbal, constrói-se a partir da participação cooperativa do leitor ao interpretar e reconstruir o sentido das possíveis intenções do autor, conforme sinaliza Antunes (2010). Para tanto, pretendemos desenvolver a análise de textos pertencentes aos gêneros resenha acadêmica e artigo de opinião, para identificar a relação parentética em sua função textualinterativa, e, sobretudo, verificar a contribuição dessa relação para a compreensão textual. Dessa forma, entendemos que a RST, priorizada como uma das teorias que alicerçam as práticas pedagógicas, poderá contribuir substancialmente para a aprendizagem da leitura e compreensão de textos de diferentes gêneros, tanto no que se refere à identificação de unidades ou tópicos discursivos, quanto na compreensão global do texto. Palavras-chave: Teoria da Estrutura Retórica; parentetização, relação parentética, leitura; ensino. Introdução Considerando a linha textual-interativa, pode-se constatar a ocorrência de inserções de frases, conforme postula Jubran (2006), no decorrer da fala ou do texto escrito, promovendo uma interrupção do tópico discursivo, porém, essas inserções não afetam o evento comunicativo. Diante de tal observação, percebemos a pertinência e a importância de se discutir esse fato, visto que esse é um recurso que ocorre em diferentes eventos comunicativos. Esse mecanismo denomina-se, segundo Jubran (2006, p. 304), inserção parentética, uma vez que tem a peculiaridade do desvio tópico, por se constituir como informações paralelas ao tópico discursivo em curso. Vistas a partir da análise da estrutura retórica do texto, desenvolvida à luz da RST, no texto escrito, as inserções parentéticas são analisadas como ocorrência de uma relação parentética,

proposta por Pardo (2005), e podem se concretizar mediante diferentes marcas linguísticas como o sinal indicador dos parênteses, uso de travessões, ocorrência de orações intercaladas, dentre outros. Neste artigo busca-se focalizar uma modalidade de inserção, que é a dos parênteses, no sentido de verificar, especificar e demonstrar suas propriedades, através da análise dessas ocorrências em porções de textos pertencentes ao gênero artigo de opinião e resenha acadêmica. Nos dizeres de Pardo (op. cit), a relação parentética é um satélite que veicula uma informação extra, relacionada ao núcleo, porém não pertencente ao fluxo principal do texto. Diante disso, busca-se um paralelo entre a proposta de Jubran (2006) e de Pardo (2005), uma vez que esses teóricos discutem, mediante enfoques diferentes, recursos que possibilitariam a ocorrência da parentetização como um dos mecanismos de construção textual. 1 A língua falada e a língua escrita: diferentes eventos comunicativos Embora este artigo tenha como objetivo central analisar textos escritos, avaliamos ser pertinente abordar, ainda que de forma sucinta, características tanto da língua oral quanto da escrita. Isso se justifica pelo fato de desenvolvermos nosso trabalho, no que concerne à parentetização, à luz dos estudos de Jubran, que priorizam a língua oral. No que se refere à situação textual interativa, em alguns aspectos, a linguagem falada apresenta características bem diferentes da linguagem escrita. Conforme postula Kock (2010, p. 77), a linguagem falada, é não planejada, fragmentária, pouco elaborada, com predominância de frases curtas, simples ou coordenadas, dentre outros. Já a linguagem falada é planejada, não fragmentária, completa, com predominância de frases complexas, com subordinação abundante. Contudo, a autora afirma que essas diferenças nem sempre são tão marcantes uma vez que há fala mais formal e uma escrita mais informal. Dessa forma, a teórica defende que essas duas formas de interação constituem dois polos de um contínuo, ao longo do qual se situam os diversos tipos de interação verbal. Por outro lado, a elaboração de um texto escrito está diretamente ligada à intenção comunicativa do autor, uma vez que esse busca garantir a interação autor/leitor. Essa intenção relaciona-se aos aspectos sintáticos, semânticos e pragmáticos, uma vez que o texto apresenta uma organização gramatical dos elementos que o constituem, bem como um conteúdo semântico advindo dessa organização textual, além da pragmática entendida como as escolhas linguísticas assumidas pelo falante/escritor para atingir sua intenção comunicativa.

No que concerne à compreensão de um texto, vale afirmar que essa não está apenas direcionada à organização apresentada, mas à percepção das marcas de seu processo de produção, (FÁVERO, et all, 2007 p. 25), que atuam como pistas linguísticas e orientam o leitor no processo de compreensão leitora. Ainda referindo-se à leitura na concepção interacional (dialógica), Koch (2008, p. 11) também tece considerações importantes ao trazermos em cena uma discussão sobre a relação parentética. Segundo ela, há em um texto variedade de implícitos dos mais variados tipos. Esses só podem ser percebidos quando se tem, como pano de fundo, o contexto sociocognitivo dos participantes da interação. É fato que nenhum texto acontece no vazio, sem uma finalidade, sem que se tenha um objetivo. Assim, considerar a figura do possível leitor, ao se analisar um texto, conforme sinalizam Mann, Matthiessen e Thompson (1988), é importante. Nunca é demais lembrar que sem destinatário não há escrita, bem como sem produtor não há leitura. Portanto, escrever [e ler], na perspectiva da interação, só pode ser uma atividade cooperativa (ANTUNES, 2005, p. 29). 2 A parentetização na linha textual-interativa Neste artigo, a análise desenvolvida concentra-se na linha textual-interativa, considerando a ocorrência de inserções parentéticas em porções constituídas pelas unidades de informação que formam um texto, portanto, os dados da parentetização são concebidos no contexto de uma unidade textual, o segmento tópico que é recortado com base na categoria tópico discursivo (JUBRAN, 2006, p. 302). (Destaques da teórica). Nessa perspectiva, tópico discursivo caracterizase, principalmente, por um dos seus traços básicos, delineados por Jubran (2006, p. 302) como a propriedade de centração da interação verbal em um determinado conjunto de referentes concernentes entre si. A partir da propriedade tópica da centração, identificam-se as inserções ocorridas nos segmentos tópicos, uma vez os elementos inseridos não são concernentes ao segmento tópico em questão, o que possibilita caracterizá-los como desvio tópico. Numa perspectiva textual-interativa os parênteses assumem função específica tornando-se integrantes do texto, não sendo, por isso, descartáveis, visto que a contextualização interacional do conteúdo do segmento tópico orienta a compreensão do que está sendo discutido. Sobre isso, Jubran (2006) argumenta que, ao contrário do que poderia ser entendido, os parênteses assumem uma função relevante no estabelecimento da significação de base informacional, sobre a qual se funda a centração do segmento-contexto, por provocarem avaliações e comentários laterais sobre o que está sendo dito e/ou sobre como se diz, e/ou sobre a situação interativa e o evento comunicativo. (JUBRAN, 2006, p.305).

A autora, ao considerar que os parênteses se estabelecem no texto por provocarem um desvio tópico, quanto à introdução de dados situacionais, eles se manifestam em graus diferentes de forma que, além de introduzirem fatores pragmáticos, acabam por estabelecer classes que se fundamentam nas duas particularidades aqui destacadas. Dessa forma, eles podem ser mais ou menos desviantes do tópico discursivo. Nessa perspectiva, para cada classe ou subclasses indicadas, advêm funções textual-interativas, representadas por Jubran (2006) em quatro classes e suas respectivas funções. Essas classes e funções serviram como suporte para a análise das ocorrências da relação parentética em suas devidas inserções nos dois textos por nós selecionados nesta pesquisa. A autora classifica essas classes com foco: i) na elaboração tópica; ii) no locutor; iii) no interlocutor; iv) no ato comunicativo. Ressaltamos, ainda que nossa proposta, conforme já descrita, será desenvolvida em extensões textuais nas quais estão localizadas as unidades de informação que provocam no referido segmento tópico uma divisão em partes não-contíguas na linearidade do texto, o que constituiria, segundo Jubran (2006, p. 302), um esquema como: tópico A (tópico B inserido) retorno ao tópico A. Nosso intento é, também, verificar o impacto da ocorrência das inserções parentéticas nas porções textuais, buscando identificar o papel delas em cada ocorrência, tal como propõe Jubran (2006), ao enumerar as possíveis funções dos parênteses em um texto. 3 Teoria da Estrutura Retórica (RST) A Teoria da Estrutura Retórica do texto originou-se do trabalho de investigação em geração automática de texto, realizado, por volta de 1983, por uma equipe de investigadores do Information Sciences Institute - University of South California, como Willian Mann, Sandra Thompson e Christian Matthiessen, dentre outros. Segundo Mann & Thompson (1983) e Mann & Thompson (1988), a RST é uma teoria descritiva que não entende o texto como uma mera sequência de frases e tem o objetivo de estudar a sua organização, para identificar e caracterizar as relações que se estabelecem entre as partes do texto, bem como explicar a coerência textual. Nessa perspectiva, a coerência é vista, em sentido bem geral, como a ausência, num texto, de quaisquer sequências ilógicas ou quaisquer lacunas (DECAT, 2010). Depois de analisar um número significativo de textos capaz de validar a proposta da Teoria da Estrutura Retórica, Mann & Thompson (1983) e Matthiessen & Thompson (1988) apresentam uma lista de aproximadamente 25 relações retóricas. Contudo, essa lista não é um rol fechado e

definitivo, mas um número suficiente para descrever as relações identificadas na maioria dos textos analisados, entretanto outras podem ser identificadas, caso o analista justifique tais ocorrências. Como já sinalizado, neste artigo, priorizamos, para análise dos textos, a relação retórica parentética, cunhada por Pardo (2005), que a caracteriza como apresentação de uma informação extra que não está expressa no fluxo principal do texto. Apresentamos, a seguir, as características da relação retórica parentética, proposta por Pardo (2005): QUADRO 1- Relação parentética Restrição sobre N Restrição sobre S Restrição sobre N + S Efeito Apresenta informação Apresenta informação O leitor reconhece extra relacionada ao extra relacionada, que S apresenta Não há. Núcleo (N), que não complementando N; O informação extra está expressa no fluxo Satélite (S) não pertence relacionada a N, principal do texto. ao fluxo principal do texto. complementando N. Fonte: PARDO, Tiago. Tese de Doutorado, (2005, p. 140). 4. Metodologia de análise dos dados Os dados para análise são originados do artigo de opinião Medo e preconceito de Lya Luft, publicado na revista Veja, de 10 de setembro, 2014, p. 24 (texto A), e da resenha acadêmica da obra de autoria do teórico Marcuschi, Luiz Antônio (2011), Da fala para a escrita: atividades de retextualização. 2. ed.são Paulo: Cortez, 133 p. (texto B). Para proceder à análise, os textos foram segmentados em porções, considerando as unidades menores que constituem a microestrutura do texto, contudo, foram destacadas, neste artigo, algumas unidades nas quais ocorre a relação parentética, de acordo com o modelo de Pardo (2005) e analisadas conforme Jubran (2006). 4.1 Análise dos dados Os dados foram coletados com amostras de ocorrências da relação parentética dos dois textos selecionados para análise. Dessa forma, foram analisadas seis ocorrências, sendo as três primeiras pertencentes ao artigo de opinião e as últimas, à resenha acadêmica. Optamos por apresentar apenas um exemplo, referente ao texto A, do diagrama da estrutura retórica em que se

deu a ocorrência da relação parentética, visto que as outras ocorrências são semelhantes ao exemplo apresentado. (1) O preconceito nasce do medo, sua raiz cultural, psíquica, antropológica está nos tempos mais primitivos por isso é uma postura primitiva -, em que todo diferente era um provável inimigo. DIAGRAMA 1 - Relação parentética Texto A 1-3 Elaboração 1-2 O preconceito nasce do medo, sua raiz cultural, psíquica, antropológica está nos tempos mais primitivos Parentética por isso é uma postura primitiva -, em que todo diferente era um provável inimigo. Fonte: Diagrama elaborado pelas pesquisadoras A primeira ocorrência identificada no segmento tópico que trata da origem do preconceito, situado no primeiro parágrafo, demonstra que emerge uma relação parentética, conforme Pardo (2005), entre o núcleo (N) O preconceito nasce do medo, sua raiz cultural, psíquica, antropológica está nos tempos mais primitivos, e o satélite (S) [- por isso é uma postura primitiva -]. Ao mesmo tempo, essa UI, que tem a função de S, se materializou mediante uma parentetização, na concepção de Jubran (2006) de forma que o parêntese, no nível formal do texto, apresenta um conectivo por isso que a introduz, contudo, não denota o motivo pelo qual o preconceito nasce do medo. Na verdade, S provoca um desvio tópico com o propósito de trazer para o segmento tópico, um esclarecimento, conforme Jubran (2006, p. 329,), sobre a origem primitiva do preconceito, dando continuidade à frase, através da UI seguinte: em que todo diferente era um provável inimigo. (2) Assim, se de um lado aniquilava, de outro esse medo nos protegia a perpetuação da espécie era o impulso primeiro." No mesmo segmento tópico, sobre a origem do preconceito, as duas UIs que constituem a porção textual Assim, se de um lado aniquilava, de outro esse medo nos protegia exercem a função de N para S, formado pela UI [a perpetuação da espécie era o impulso primeiro]. Entre a

porção anterior e a UI em destaque emerge uma relação parentética formalizada também mediante desvio tópico, através da parentetização. Nesse caso, a UI formada pelo parêntese, que não apresenta nenhuma marca formal no início desta porção, para Jubran (2006, p. 328), traz uma exemplificação uma vez que introduz, no texto, um dado factual comprovador do que está sendo dito: o medo tanto pode aniquilar como pode proteger ao assumir a função de mostrar que a perpetuação da espécie é o instinto primeiro do ser humano. (3) Hoje, quando de trogloditas passamos a ditos civilizados, o medo se revela no preconceito e continua atacando, mas não para nossa sobrevivência natural. A ocorrência da relação parentética concretizou-se pela presença de uma oração intercalada de forma que N é formado pela UI Hoje, o medo se revela no preconceito e S [quando de trogloditas passamos a ditos civilizado]. Nesse caso, S, caracterizado por uma inserção parentética, tendo os parênteses como focalizadores do ato comunicativo, causa um desvio tópico e, nos dizeres de Jubran (2006, p. 353), tem a função de intercalar uma ideia a fim de fazer uma avaliação sobre o comportamento das pessoas em determinadas situações, de forma que o ser humano deixa de ser civilizado e age como troglodita. Texto B (4) Desde que a diversidade linguística, com o desenvolvimento das ideias sociofuncionalistas e variacionistas modernas, passa a assumir uma real dimensão no âmbito das investigações sobre a linguagem humana evadindo da clausura milenar a que lhe havia condicionado a tradição dos estudos gramaticais, têm alguns professores de língua portuguesa se defrontado com uma questão crucial para o desempenho de seu papel na escola. Nesta ocorrência, a relação parentética indicada pela UI [evadindo da clausura milenar a que lhe havia condicionado a tradição dos estudos gramaticais] apresenta, conforme Jubran (2006, p. 325) um menor desvio do tópico discursivo, caracterizado como a diversidade linguística no segmento tópico em questão, uma vez que a UI em destaque assume a função de esclarecer sobre o tópico em pauta, pelo detalhamento de dados citados no enunciado: a linguagem humana. Nesse caso, trata-se de parênteses de esclarecimento (JUBRAN, 2006, p. 329).

(5) Distribuído em duas partes, o livro concentra-se nos seguintes grandes eixos temáticos: a discussão sobre oralidade e letramento mais especificamente sobre fala e escrita e uma nova proposta para sua caracterização, na primeira. No exemplo (5), a relação parentética se materializa mediante a UI [mais especificamente sobre fala e escrita] intercalada na UI núcleo: [Distribuído em duas partes, o livro concentra-se nos seguintes grandes eixos temáticos: a discussão sobre oralidade e letramento e uma nova proposta para sua caracterização, na primeira]. Desta vez, o parêntese presta um esclarecimento, conforme Jubran (2006, p. 329) e assume a função de chamar a atenção do leitor para um elemento tópico, no caso, a oralidade e o letramento, visto que a informação apontada na UI que constitui a relação parentética se torna uma informação relevante naquele segmento do texto. (6) As estratégias de retextualização, como apresentadas, pressupõem nove operações complexas que se dividem entre atividades de idealização (eliminação, completude e regularização). Na porção textual mostrada no exemplo 6, pode-se observar a ocorrência da relação parentética formada pela oração intercalada [como apresentadas]. Nesta situação, o parêntese assume o papel de fazer uma ressalva, ao inserir uma observação sobre a abrangência referencial do tópico: as estratégias discursivas, ou seja, da forma como elas são apresentadas. Dessa vez, os parênteses que têm a função de ressalva, podem, de acordo com o exemplo (6), operar uma redução da informação anterior. (JUBRAN, 2006, p. 329). Conclusão Conforme demonstrado na análise das porções textuais, foi possível observar que a relação parentética, materializada pelas inserções parentéticas, ocorre tanto no texto pertencente ao gênero artigo de opinião, quanto na resenha acadêmica, e pode ser caracterizada como uma estratégia significativa para o processo de compreensão leitora. Vale ressaltar, também, que o estudo do processo de parentetização, nos estudos desenvolvidos por Jubran (2006), bem como a consideração da relação parentética, pautada na RST, a partir de Pardo (2005), podem contribuir para a aprendizagem dos alunos no que se refere à compreensão leitora, uma vez que demonstram a relevância desse processo, no sentido de que, mesmo trazendo informações não pertencentes ao tópico discursivo, considerar a

parentetização/relação parentética, contribui para a interação texto/leitor e melhor compreensão do que se lê e do que se escreve. Referências bibliográficas ANTUNES, I. Lutar com palavras: coesão e coerência. São Paulo: Parábola, 2005. DECAT, M. B. N. Estrutura retórica e articulação de orações em gêneros textuais diversos: uma abordagem funcionalista. In: MARINHO, J. H. C; SARAIVA, M. E. (Org.) Estudos da Língua em uso: da gramática ao texto. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2010. FÁVERO, L. L; ANDRADE, M. L. C. V. O. Oralidade e escrita. São Paulo: Cortez, 2007. JUBRAN, C. C. A. P. Parentetização. In. JUBRAN, C. C. C. A. P; KOCK, I. G. V. Gramática do Português Falado, vol. 1, São Paulo: Editora Unicamp: 2006, p. 301-357. KOCH, I. G.V. Argumentação e linguagem. 11ª ed. São Paulo: Cortez, 2008. KOCK, I.V. A inter-ação pela linguagem. São Paulo: Editora Contexto, 2010. LUFT, l. Medo e preconceito, Revista Veja, 10 de setembro de 2014, p. 24. MANN, W. & THOMPSON, S. A. Relational propositions in discourse. California: University of Southen California: 1983, p.3-9. MANN, W. & THOMPSON, S. Rhetorical Structure Theory: Toward a functional theory of text organization. Text, v. 8, n. 3, p. 243-281, 1988. MARCUSCHI, L. A. Da fala para a escrita: atividades de retextualização. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2011, 133 p. MATTHIESSEN, C. & THOMPSON, S.A The structure of discourse and subordination. In: HAIMAN, J.; THOMPSON, S. A. (Eds.). Clause combining in grammar and discourse. Amsterdam: John Benjamins, 1988, p. 275-329. PARDO,T. A. S. Métodos para Análise Discursiva Automática. 2005. Tese (Doutorado). Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação, Universidade de São Paulo. São Carlos-SP: 2005, 211p. Autoras iangela Maria Alves Lemos JAMAL, Profª. Doutoranda. Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) angela.jamal@ig.com.br iimaria Risolina de Fátima Ribeiro CORREIA, Profª. Doutoranda. Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)

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