PN 4271.05-5; Ag.: TC Penafiel, 3.ºJ (1766/03.1TBPNF-P) Ag.e: António José Pinto do Fundo cc Graça Maria Santos Rocha 1 Rua Alfredo Pereira, 198 Penafiel Ag.a: Massa falida de António Justino da Costa Luís do Fundo 2, Rep. Adm. Dr.º Armando Rocha Gonçalves Av. dos Combatentes da Grande Guerra, 366, Porto Em Conferência no Tribunal da Relação do Porto I- INTRODUÇÃO: (a) O Ag.e não se conforma com o indeferimento ao abrigo dos art.s 386/1 e 387/1 CPC da Providência Cautelar não especificada que intentou contra a Ag.a. (b) Do despacho recorrido: 1. a apreensão dos bens para a massa falida só pode ser atacada através do recurso ao mecanismo do art.º205 CPEREF, acção a propor contra a massa e os credores do falido. 2. Entretanto, não são admissíveis embargos de terceiro contra a apreensão levada a cabo em processo de falência, art.351/2 CPC, enquanto os requerentes não dizem qual a acção definitiva que viria a suceder á presente providência cautelar. 3. Ora, de acordo com o art.205/2 CPEREF, o prazo para requerer a separação de bens da massa falida o seu desarrolamento ou o 1 Adv.: Dr. Bruchado Teixeira, Rua do Bom Jardim, 325 3.º, 4000-124 Porto [bruxadoteixeira- 756p@adv.ao.pt] 2 Adv.: Dr.ª Sónia de Jesus Fernandes, Largo Nuno Alvares, 11C, 4580-170 Paredes [soniadejesus- 9416p@adv.ao.pt] 1
desapossamento é de um ano a contar do trânsito em julgado da sentença que decretou a falência: mostra-se excedido 3. 4. Por outro lado, nada se alega, no requerimento inicial que permita concluir pela existência de indícios de o normal decurso dos autos de falência vir a causar lesão grave e dificilmente reparável aos requerentes: existem meios processuais próprios para acautelar os riscos da apreensão e venda dos bens falimentares. II- MATÉRIA ASSENTE: 1. Por escritura pública, 03.03.03, foi doado ao recorrente marido, por sua avó Ana Maria da Costa Carvalho, com reserva de usufruto para a doadora, o prédio urbano sito na Rua Alfredo Pereira, 198-208, Penafiel, insc. mat. urb. art. 744, desc. C.Reg.P. n.º45342, LB 129. 2. Do mesmo modo, por escritura de 03.03.10, o prédio misto Quinta de Ribelos, sita no Lugar do nome, São Mamede de Recezinhos, Penafiel, insc. mat. urb. art. 239 e rust. art. 753, 754 e 755, desc. C.Reg.P., n.º56315, LB 158. 3. Ambos os prédios estão inscritos em favor do Ag.e. que não é herdeiro legitimário da doadora, falecida em 03.04.20, porque à avó sobreviveu o filho António Justino da Costa Luís do Fundo, quem não suscitou a inoficiosidade eventual das ditas doações. 4. Mas os prédios em questão vieram a ser apreendidos na massa falida de António Justino, 04.03.15 4. 5. Em 05.02.02, o recorrente e mulher intentaram o presente procedimento cautelar pedindo que o Administrador da falência se abstivesse de praticar qualquer acto relacionado com os bens acima identificados. 6. O liquidatário judicial da falência em causa foi citado, depois, em 05.02.22. III- CLS/ALEGAÇÕES: 3 Sentença de 05.04.07 4 Sentença de falência de 04.02.02, pub. DR. 49, 3.ª Série, 04.02.27 2
(a) A resolução só pode ser declarada em relação a actos e contratos celebrados pelo falido. (b) Ora, a apreensão dos bens doados ao recorrente marido resultou da declaração resolutiva dos respectivos contratos: é a validade e eficácia desta resolução que tem de ser judicial e previamente apreciada. (c) Com efeito, a separação da massa falida desses bens é mera consequência dessa e só dessa pode resultar: pode apenas ser requerida após a anulação da resolução de que a providência cautelar em causa constitui acto preparatório. (d) Por conseguinte, o despacho em crise infringe o disposto no art. 156 CPEREF e o art. 381 CPC. (e) Deve ser ordenado o prosseguimento da causa com a produção de prova. IV- CONTRA-ALEGAÇÕES: 1. Acaso os recorrentes gozem do direito de propriedade sobre os prédios em discussão, deveriam ter intentado acção de separação ou de restituição desses bens da massa: art.205 ss., CPEREF. 2. Porém, tal como a acção deveria a providência cautelar ter sido intentada contra a recorrida e os credores da massa falida. 3. Mas há muito que expirou o prazo para ser instaurada acção de separação de bens, que é de um ano a contar do trânsito em julgado da sentença de falência. 4. Assim, sendo a acção o meio adequado para retirar os ditos bens da massa falida, perante o prazo de caducidade, mesmo a ser julgada procedente a presente providência cautelar não teria qualquer efeito útil. 5. Por outro lado, a resolução do contrato operada pelo liquidatário judicial não pode ser declarada nula: não foram violados legítimos direitos e interesses dos recorrentes, nem o art.156 CPEREF. 6. Na verdade, as doações levadas a cabo pela mãe do falido ao recorrente António José são negócios jurídicos gratuitos celebrados dentro do prazo dos dois anos anteriores á data da abertura do processo de falência, 03.07.03, os quais envolvem a diminuição do património do falido. 7. Soçobram pois todas as conclusões do recurso: deve ser mantido o despacho impugnado. 3
V- RECURSO: pronto para julgamento nos termos do art.705 CPC VI SEQUÊNCIA: (a) A decisão recorrida louva-se de certa maneira na perda de oportunidade do pedido e no inviesamento problemático de uma pretensão que deveria ter sido oposta ao falido 5 e aos credores deste, pois se trataria, em boa verdade, de um caso de separação de bens apreendidos. (b) Porém, só devem ser apreendidos para a massa falida bens que de uma forma ou doutra estejam na disponibilidade do insolvente, e de entre estes é que se separará aqueles que não respondem pelas dívidas em jogo 6. (c) Não foi este o caso, pois os bens apreendidos não estavam nem nunca estiveram na disponibilidade do pai do recorrente marido, tendo passado directamente da avó para o neto, por doação. (d) Ora, esta doação, muito menos na vertente da doadora ou mesmo na vertente do aceitante pode, por qualquer modo, ser revogada pelo liquidatário judicial nomeado por via da falência: poderá porventura fazer submeta-la á colação, substituindo-se ao falido junto dos tribunais. (e) Por conseguinte, a apreensão operada no processo de falência, porque radicalmente contra o direito, não é motivo de inutilidade superveniente da providência cautelar, tanto mais que o pedido não se bastou apenas no impedimento da apreensão, mas esculpiu uma fórmula mais geral: abst[erse o liquidatário judicial] de praticar qualquer acto relacionado com os bens acima identificados. (f) Contudo, se não cabem em espécie os embargos de terceiro, como resulta da lei, apenas caberá a acção de separação? E a resposta tem de ser negativa, porque como dissemos não se trata de separar, mas de opor ao liquidatário o meio acionário comum de defesa da propriedade alheia, sob protecção constitucional. 5 Contra: AC RL 96.06.04, BMJ, 458/387 6 Vd. Art.201/1a.c. CPEREF, alíneas que terão de ser lidas de modo coordenado e tendo em atenção os art. 18/3 e 62/1/2 CRP, prevalecendo o modelo subjacente, que emerge de todo em a.. 4
(g) È oportuna portanto, e só contra a massa falida é de propor, acção de reivindicação de que a presente providencia cautelar pode muito bem ser antelóquio. (h) Ora bem! o liquidatário exerce sobre os bens apreendidos para a massa falida os poderes de administração judicial desse património e, mais importante, tem o poder-dever de os orientar á venda forçada e universal, atendendo ás melhores condições de mercado conjugadas com o formalismo: poder-se-lhe-á opor uma medida inibitória, pelo menos neste ultimo itinerário, por iniciativa exterior e antecipadora da reivindicação? (i) È justamente este o problema que deve ser encarado sob a arquitectura deste caso e não aquele que foi predefinido para a criticada decisão negativa da 1.ª instância. (j) A resposta é sim, pois o liquidatário age no plano da administração dos bens da falência a par e par de qualquer gestão comum, sob o mesmo tipo de responsabilidade; ora, é possível embargar a um qualquer administrador de bens disposições conducentes á alienação de prédios quando emerge um litígio sobre a titularidade desses bens, como é este o caso, afinal. (k) Por outro lado, um dos efeitos da citação é fazer cessar a boa-fé do possuidor 7, má-fé inicial, pois, neste caso, porque a posse foi tomada apesar do chamamento cautelar a juízo: este efeito proactivo de lei exige remédio, naturalmente, que se não vê outro senão nesta providência de cautela não especificada, coeva, e sequencial pedido reivindicativo. (l) Entretanto, terá de estar verificada a urgência e o perigo de prejuízo irrecuperável, a vantagem superior ao status quo: parecem de todo evidentes perante a dissolução eminente da propriedade, esse vínculo concreto das pessoas às coisas que sobretudo nesse sentido é direito fundamental ( há antes de mais tempo excedente para a liquidação falimentar ). (m) De qualquer modo, não vá sem se dizer que a questão do prazo de um ano subsequente ao trânsito em julgado da sentença de declaração de falência no qual há-de ser proposta acção de restituição de bens nos termos do art.205 CPEREF está longe de ter o entendimento pacífico da decisão recorrida: o Ac STJ de 96.04.16 8 decidiu justamente que esse n.º2 não lhe é aplicável 9. 7 Vd. art. 481a. CPC; 8 CJ/STJ (1996) II, p.17 5
(n) Por conseguinte, e visto o disposto nos art.s 381/1.2 CPC e 62/1 CRP, 1305 e 1311 CC, vai substituída a decisão de 1.ª instância por este despacho no qual se ordena a providência requerida, no contexto antecipatório acima definido, que implicando ou não apenso ao processo de falência, de certo se constitui como protesto, tendo em conta os já chamados a depor efeitos da citação. VII CUSTAS: pelo requerente, a levar à conta das responsabilidades finais. 9 Tem anotação desfavorável de Fernandes&Labareda, Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e de Falência Anotado, 3.ª Ed. (Reimp), Quid Júris, Lisboa, p.493: nada justificando um regime para a restituição e separação diverso da reclamação de créditos, é igualmente aplicável o regime do n.º 2; acode, em favor do entendimento exposto, a regra geral do corpo do n.1 do art.201, ao estatuir a aplicação, á restituição e reclamação de bens, das disposições relativas á verificação de créditos, e é esta, de igual modo, a solução que dá conteúdo útil ao determinado no art.206b 6