05 UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO Faculdade de Zootecna e Engenhara de Almentos Deartamento de Zootecna Economa básca ara os cursos de graduação em Zootecna, Engenhara de Almentos e Engenhara de Bossstemas. Tetos de aoo ara as dsclnas ZAZ03 ANÁLISE ECONÔMICA DA AGROPECUÁRIA ZAZ0763 - ECONOMIA ZAZ036 - ECONOMIA APLICADA À ENGENHARIA DE BIOSSISTEMAS Prof. Rubens Nunes rnunes@us.br Prassununga, feverero de 0
06 7. Teora do consumdor 7.. Um ouco de hstóra do ensamento econômco A teora mcroeconômca do consumdor tem raízes no utltarsmo, que é uma corrente flosófca do século XVII ara a qual a melhor ação é a que busca a maor felcdade ara o maor número de ndvíduos. Para os utltarstas, o valor moral de uma ação qualquer deende de suas conseqüêncas, e não de sua conformdade com normas ou mandamentos abstratos. Segundo Jeremy Bentham, o ndvíduo, no governo de seus atos, rocura semre buscar mamzar seu róro razer e mnmzar seu sofrmento, colocou no razer e na dor ambos a causa das ações humanas e as bases de um crtéro normatvo da ação. O rncío da utldade, ou rncío da maor felcdade ara o maor número, [...] arova ou desarova qualquer ação, segundo a tendênca que tem a aumentar ou a dmnur a felcdade da essoa cuo nteresse está em ogo, ou, o que é a mesma cosa em outros termos, segundo a tendênca a romover ou a comrometer a referda felcdade. Dgo qualquer ação, com o que tencono dzer que sto vale não somente ara qualquer ação de um ndvíduo artcular, mas também de qualquer ato ou medda de governo [...] 3. Segundo Bentham, a Natureza colocou a humandade sob o governo de dos senhores soberanos, dor e razer... eles nos governam em tudo o que fazemos, em tudo o que dzemos, em tudo o que ensamos... Os rmeros utltarstas ensavam que a utldade era uma grandeza cardnal, sto é, uma quantdade que ode ser medda, como a temeratura ou a dstânca. Chegou-se até a nventar um nome ara a undade de medda: um útl, dos útles, etc. Se a utldade ou bemestar ode ser meddo, é ossível fazer comarações entre as utldades vvencadas or dferentes ndvíduos e agregar as utldades ndvduas. Os utltarstas acredtavam que a utldade margnal do consumo é decrescente, sto é, orções adconas de um bem consumdo tem contrbuções cada vez menores ara a utldade total. Juntando a ossbldade de agregar as utldades ndvduas e a utldade margnal decrescente, ode-se chegar à conclusão de que a realzação do rncío utltarsta acontecerá quando a rqueza da socedade for dvdda gualmente entre seus membros. No níco do século XX o economsta talano Pareto 4 negou a ossbldade de comarar e, consequentemente, de agregar utldades ndvduas, e reconstruu a teora do consumdor sobre uma nova base, a utldade entendda como a ordenação das referêncas dos ndvíduos. O conceto de utldade ordnal (em contraosção à utldade cardnal) ermte afrmar que, ara um ndvíduo determnado, três edaços de zza tem mas utldade do que um edaço, mas não ermte dzer que a utldade dos três edaços sea o trlo da utldade Frase de Francs Hutcheson, que recedeu os flósofos utltarstas, e eerceu grande nfluênca em Adam Smth. Jeremy Bentham (748 83) é consderado o fundador do utltarsmo. 3 Jeremy Bentham. The Prncles of Morals and Legslaton. "As ações são corretas na medda em que tendem a romover a felcdade, erradas na medda em que tendem a romover o reverso da felcdade." John Stuart Mll (806-873) 4 Vlfredo Pareto (848-93)
07 de um edaço. Além dsso, na abordagem ordnal, é mossível fazer comarações da utldade entre ndvíduos. A teora do consumdor contemorânea adota a abordagem da utldade ordnal. 7.. A abordagem ordnal da teora do consumdor e a função utldade O roblema tratado ela teora do consumdor é a escolha dos bens que serão consumdos em determnado eríodo. De um lado, o consumdor tem referêncas em relação às alternatvas de consumo oferecdas ela economa; de outro lado, o consumdor deara-se com um montante lmtado de rqueza (ou renda) que servrá ara obter os bens de consumo or meo da troca. O obeto da escolha do consumdor são cestas de bens, que odem ser reresentadas como vetores () de quantdades dos dversos bens da economa = (,,..., n ) = (, 0,..., 5) = (,,..., n ) = (,,..., 3) em que os caracteres em negrto reresentam vetores e o subscrto dentfca cada vetor ( é a cesta de consumo ). O comonente do vetor é a quantdade do -ésmo roduto contda na -ésma cesta. Uma das hóteses do modelo de escolha é que o consumdor é caaz de estabelecer relações de referênca entre duas quasquer cestas de bens. Preferênca Fraca: ara o consumdor, a cesta é elo menos tão boa quanto a cesta A relação de referênca fraca defne uma ordenação arcal, ou ré-ordenação, do conunto de cestas estentes na economa (do onto de vsta de um consumdor determnado) A relação de referênca fraca é Transtva: Não-smétrca Refleva:
08 Indferença: Preferênca forte (ou referênca estrta) A relação de referênca forte ermte uma ordenação comleta do conunto de cestas de bens e é: Transtva: Ant-smétrca Não refleva: Outras hóteses sobre o comortamento do consumdor são Não-sacedade (quanto mas, melhor): Dadas duas cestas = (,,..., n ) e = (,,..., n ), se > ara elo menos um bem, e = ara os demas bens, então >. Convedade (referênca ela varedade): seam 0 > > e I Contnudade das referêncas: Seam duas cestas dstntas tas que I. Este uma sequênca contínua de cestas que arte de e converge ara, em que todos os elementos são ndferentes a e. Curva de Indferença: é o conunto de cestas de bens que são ndferentes entre s ara um determnado consumdor.
09 (a) (b) (c) Volações dos ressuostos: (a) contnudade; (b) convedade; (c) transtvdade Maa de Indferença: conunto de curvas de ndferença I 3 I I A Função Utldade é uma reresentação das referêncas do consumdor. A cada cesta de bens é assocado um número real U() de modo que, se é estrtamente referda a, então U( ) > U( ).
0 Qualquer transformação monotônca 5 de uma função utldade é também uma função utldade que reresenta as mesmas referêncas. O que morta é a ORDEM das cestas de bem, do onto de vsta das referêncas do consumdor, não a MÉTRICA. Assm, não se odem comarar dretamente valores de dferentes funções utldade. Suonha que as referêncas de um consumdor seam reresentadas or U() =, sto é, elo roduto das quantdades consumdas dos dos bens estentes na economa. As seguntes funções reresentam as mesmas referêncas: U() = U() = 0,5 0,5 U() = ln + ln, U() = e () A transformação de uma função utldade em outra que reresenta as mesmas referêncas reserva a ordem das cestas de bens segundo as relações de referênca forte (e de ndferença). Consequentemente, as curvas de ndferença são nvarantes em qualquer transformação monotônca de uma função utldade. 5 Transformação monotônca é aquela que reserva a ordem: se f() > f(y) e g() > g(y), ara todo e y, então, a transformação de f em g é monotônca.
7.3. O roblema do consumdor O consumdor tem referêncas reresentadas or uma função utldade. Ele ou ela tem uma renda (ou rqueza) fnta, que é sua restrção orçamentára. O roblema do consumdor é encontrar, dentro de seu conunto de escolhas factíves (sto é, ertencentes ao conunto de cestas que satsfazem a restrção orçamentára), a cesta de bens que mamza o valor da função utldade. ma U,..., suetoa... n n n y Função obetvo (no roblema do consumdor, é a função utldade): atrbu um valor a cada escolha factível. A varável ndeendente (controle) da função utldade é a cesta de bens; a varável deendente é a utldade Restrção orçamentára: defne o conunto de cestas factíves (que odem ser comradas elo consumdor) e deende da renda do consumdor e dos reços dos bens. Alternatvamente, o roblema do consumdor ode ser reresentado como a mnmzação do dsêndo ou do custo da cesta de bens que ermte alcançar o nível de utldade rédetermnado U*. Nesse caso, a função obetvo será o dsêndo E (eendture), que é o valor do gasto na aqusção da cesta de bens. Para cada nível de utldade, o consumdor escolherá a cesta de menor custo, dados os reços dos bens. A restrção é o nível de utldade mínmo a ser alcançado com o valor gasto. 7.4. Demanda ordnára (marshallana) e demanda comensada (hcksana) No caso de dos bens, a restrção orçamentára é dada or + y. A nclnação da reta de orçamento é /.
Um aumento da renda do consumdor rovoca um deslocamento aralelo da restrção, ao asso que um aumento de um dos reços muda a nclnação da reta. Quando famos o valor da função utldade, defnmos uma curva de ndferença, sto é, o conunto de cestas de bens que roorconam, ara o consumdor, o mesmo nível de bemestar ou utldade. A solução do roblema do consumdor, sto é, a escolha da cesta que ermte alcançar o maor nível de utldade dados a renda e os reços, ou alternatvamente, a cesta de menor custo que ermte alcançar certo nível de utldade, dados os reços, ocorre no onto em que a lnha de restrção orçamentára é tangente à curva de ndferença (onto C). No onto C, a Taa Margnal de Substtução entre os bens é gual à razão entre seus reços. A Taa Margnal de Substtução é a razão entre as utldades margnas dos bens.
3 A artr da solução do roblema do consumdor, odemos obter a demanda dos bens (or arte desse consumdor). A cada reço do bem está assocada uma quantdade demandada. Observe que o aumento do reço torna a escolha anteror nacessível. Como o oder de comra da renda deende dos reços, o nível de utldade não se mantém constante, reduzndo-se à medda que o reço se eleva. Essa demanda é chamada de marshallana, em homenagem a Alfred Marshall, ou ordnára (orque a únca varável observável que muda é o reço do róro bem; a utldade muda, mas não é observável). Vamos encontrar a demanda marshallana corresondente à segunte função utldade: ma U( ) sueto a m 0 Na solução, as utldades margnas dos dos bens são roorconas aos reços, então: Substtundo essa gualdade na restrção orçamentára, temos Isolando encontramos a demanda do bem Para solar o efeto da varação dos reços sobre a restrção orçamentára, Sr John Hcks roôs construr uma função demanda na qual o nível de utldade do consumdor fosse
4 mantdo constante, fazendo-se varar a renda do consumdor de modo a comensar o efeto das varações dos reços. A demanda comensada ou hcksana ode ser obtda a artr do roblema do consumdor de mnmzar o gasto ara alcançar o nível de utldade ré-fado (dual do roblema de mamzação da utldade sueto à restrção orçamentára). mn E( ) sueto a u* 0 Na solução do roblema, encontra-se a mesma condção de tangênca entre a curva de ndferença e a restrção orçamentára, e, ortanto, a mesma relação entre as quantdades dos bens e. A artr da função utldade de valor u* obtém-se: 7.5. Efetos renda e substtução: a equação de Slutsky A equação de Slutsky seara a varação da quantdade demandada causada or uma varação do reço do róro bem em dos efetos, o efeto substtução (em geral, redução da quantdade demandada do roduto que se tornou relatvamente mas caro), e o efeto renda (que cata a resosta do consumdor a mudanças em seu oder de comra quando os reços se alteram). A demanda ordnára ou marshallana cata o efeto total da varação do reço do róro bem sobre a quantdade demandada. A demanda hcksana ou comensada reflete aenas o efeto
5 substtução (ou efeto reço). Para determnado nível de utldade e de renda do consumdor e ara um vetor de reços dos rodutos, as demandas hcksana e marshallana tem o mesmo valor. quantdade 4 3,5 3,5,5 reço 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9,,,3,4,5,6 hcksana marshallana Calculando-se as dervadas das demandas marshallana e hcksana em relação ao reço obtem-se, resectvamente () o efeto total da varação margnal do reço sobre a quantdade demandada, e () o efeto substtução ou efeto reço. A dferença entre os dos efetos é o efeto renda. Consdere as seguntes funções: h e, m: demanda marshallana, u: demanda hcksana comensada, u: dsêndo mínmo necessáro ara atngr u aos reços Suonha que * mamza a utldade aos reços. h, u* *, e*, u* então, h, u* *, e*, u* Dferenca ndo com relação a : h * m Mas *, u * *, m* *, m* e*, u e*, u *
6 m m u h m m m u h m * *, * *, * *, * *, * *, * *, 7.6. Varações na renda e nos reços e comortamento do consumdor Em 857 Engel 6 relatou a constatação emírca de que quanto mas obre uma famíla, maor é a artcação do dsêndo com almentos em seu orçamento total. A Le de Engel dz que quando a renda se eleva, a arcela da renda destnada à aqusção de almentos ca, mesmo que o montante gasto com almentos aumente. Em outras alavras, demanda or almentos é nelástca em relação à renda. 6 Ernst Engel (8 896) estatístco e economsta alemão.
7 A Curva de Engel, ou curva renda-consumo, mostra o camnho da eansão da demanda assocado ao crescmento da renda do consumdor. Um bem de necessdade é aquele cua quantdade demandada cresce menos que roorconalmente à renda (elastcdade-renda maor que zero, mas menor que um); á um bem de luo tem a demanda elástca à renda. Os bens cua demanda resonde ostvamente à renda são chamados de bens normas. A quantdade demandada de um bem nferor dmnu quando a renda aumenta, os o consumdor substtu esse bem or outros à medda que a renda aumenta. Você deve ter em mente que essa classfcação não se refere aos bens em s, mas à relação de um consumdor ou de um gruo de consumdores com os dversos bens. Um mesmo bem ode ser nferor ara alguns consumdores e ser um bem de luo ara outros. Observe que a carne bovna de segunda é um bem normal ara consumdores com renda famlar mensal de até R$ 3.000 em 00-003, e um bem nferor ara consumdores com renda famlar mensal maor que R$ 3.000. Aqusção de carne bovna de segunda domclar er cata anual, or classes de rendmento mensal famlar - Brasl - eríodo 00-003 0 9 8 7 6 5 4 3 0 5,969 6,976 Até 400 Mas de 400 a 600 7,336 Mas de 600 a 000 7,79 8,765 Mas de Mas de 000 a 600 600 a 3000 5,58 Mas de 3000 Fonte: IBGE POF 00-003
8 Quando os reços dos bens mudam, os consumdores não aresentam a mesma resosta ara todos os bens. Em geral, a redução do reço do bem está assocada a um aumento da quantdade demandada: esse é o caso dos bens ordnáros. Um bem de Gffen caracterza-se or aresentar redução da quantdade demandada quando os reços caem sgnfcatvamente. O efeto renda na demanda (marshallana) de um bem de Gffen é muto forte, de modo que a redução do reço do bem lbera renda, que é alocada em bens que substtuem o bem de Gffen 7. Novamente, o fato de o bem ser ordnáro ou de Gffen está assocado às característcas ntrínsecas do roduto, mas ao conteto em que o consumdor tem referêncas sobre dferentes alternatvas de escolha, e uma renda fnta (e or vezes reduzda) que lmta o conunto de escolhas. 7 Robert Gffen (837 90), estatístco e economsta escocês. Marshall escreveu na 3 a edção dos Prncíos de Economa: Como o Senhor Gffen observou, um aumento no reço do ão drena tantos recursos das famílas trabalhadoras obres, e aumenta tanto a utldade margnal do dnhero ara elas, que elas são forçadas a cortar o consumo de carne e de almentos farnáceos mas caros: e, sendo o ão o almento mas barato que elas odem obter, elas consumrão mas, e não menos desse roduto.
9 Índces de seleção ara o melhoramento genétco e a função utldade: uma analoga A teora dos índces de seleção basea-se no fato de que cada ndvíduo ossu um valor genétco global (H) que lhe é ecular (HAZEL & LUSH 94). Tal valor genétco, ara fns de seleção, corresonde ao somatóro dos valores de melhoramento ("breedng value") (H ) assocado a n caracteres de mortânca econômca, onderados or valores econômcos relatvos (a ) corresondentes a cada caráter, (SMITH 936; HAZEL 943; KEMPTHORNE 957), ou sea: Como o valor de melhoramento de cada ndvíduo é de dfícl mensuração, H não ode ser determnado e a seleção deve basear-se num valor fenotíco do ndvíduo. Esse corresonde a: sendo I o índce de seleção que corresonde a função lnear dos valores fenotícos dos város caracteres e b, o coefcente assocado ao valor X do caráter. Assm como o valor da função utldade calculada em uma cesta de bens ndca a ordenação das referêncas do consumdor, o índce de seleção faz uma ordenação dos ndvíduos segundo o mérto genétco, eresso em característcas fenotícas. Fazendo-se uma analoga com a teora do consumdor, o índce de seleção ocua o lugar da função utldade, ao asso que as característcas fenotícas fazem o ael dos bens à dsosção do consumdor. O que a teora dos índces de seleção e a teora do consumdor tem em comum é o fato de que ambas tratam de roblemas de escolha. Contudo, o índce de seleção consttu uma função utldade esecal, os as característcas fenotícas são consderadas substtutas erfetas umas das outras. O ressuosto mlícto é a de que as característcas são ndeendentes entre s. As curvas de ndferença seram lnhas retas, defnndo-se taas margnas de substtução constantes entre característcas, guas à razão de seus valores econômcos. HAZEL, L.N. & LUSH, J.L. The effcency of three methods of selecton. J. Hered, 33, 94. KEMPTHORNE, O. An ntroducton to genetc statstcs. New York, J.Wley, 957. 545. SMITH, H.F. A dscrmnant functon for lant selecton. Ann Eugen, London, 7:40-50, 936.