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Transcrição:

GESTACIONAL DIABETES MELLITUS DIABETES MELLITUS GESTACIONAL DIAGNÓSTICO E MANEJO PALAVRAS-CHAVE DIABETES MELLITUS GESTACIONAL; DIAGNÓSTICO; TRATAMENTO Laerson Hoff Lucas Luã Machado Pereira Pedro Luã Machado Pereira Maria José Zanella KEYWORDS GESTATIONAL DIABETES MELLITUS; DIAGNOSIS; TREATMENT SUMÁRIO As disglicemias são as anormalidades metabólicas atualmente mais prevalentes na gestação. É essencial para qualquer médico que realize pré-natal o conhecimento necessário para o diagnóstico e manejo correto do Diabetes Mellitus Gestacional (DMG), a fim de reduzir as suas complicações, tanto maternas quanto fetais. ABSTRACT Dysglycaemias are currently consider the most prevalent gestational metabolic disorders. It is essential to any physician that delivers prenatal care the knowledge required to properly diagnose and treat gestational diabetes mellitus, in order to reduce the risk of foetal and maternal complications. INTRODUÇÃO Com a crescente epidemia de obesidade e de diabetes mellitus tipo 2 (DM2), o DMG está cada vez mais prevalente, assim como as complicações associadas a essa enfermidade 1. O DMG é historicamente definido como a intolerância aos carboidratos diagnosticada pela primeira vez na gestação e que pode ou não persistir após o parto 1. Mais recentemente tem sido sugerido diferenciar as mulheres com provável diabetes pré-existente reconhecido durante a gestação daquelas cujo diabetes é uma manifestação transitória da resistência à insulina

decorrente da gestação. Assim, o termo Diabetes Gestacional relaciona-se ao diabetes diagnosticado na segunda metade da gestação e o termo Diabetes mellitus na gestação para descrever diabetes diagnosticado no inicio da gestação 2. Essa diferenciação é importante do ponto de vista clínico porque uma paciente com diabetes mellitus (DM) prévio à gestação possui o fator hiperglicemia interferindo na organogênese, podendo levar a malformações congênitas (como síndrome da regressão caudal) e a abortos espontâneos. Uma paciente que desenvolve DM durante a gestação, este tende a se desenvolver na segunda metade da gestação (período de maior insulino-resistência), podendo levar a alteração do ritmo de crescimento fetal sendo a macrossomia, a manifestação mais característica 3. GESTAÇÃO E METABOLISMO DOS CARBOHIDRATOS A gestação comprovadamente leva a uma série de alterações fisiológicas para permitir um adequado crescimento e desenvolvimento do feto no organismo materno. Dentre essas alterações, observam-se mudanças importantes no metabolismo dos carboidratos, as quais podem ser dividas didaticamente em dois momentos diferentes: Primeira Metade da Gestação Nesse período é observado uma maior utilização de glicose e aminoácidos (dentre eles a alanina, importante substrato gliconeogênico) pelo feto, assim como uma maior sensibilidade dos tecidos periféricos à insulina. Esses dois eventos levam a uma redução nos níveis maternos de glicemia de jejum 3. Segunda Metade da Gestação Ao contrário do que é observado na primeira metade da gestação, esse período é marcado por uma redução na tolerância à glicose e hiperinsulinismo materno, os quais decorrem basicamente de dois fatores: (1) insulinoresistência, que é mediada pela secreção de hormônios contra reguladores pela placenta (em media na 26ª semana de gestação), dentre eles o hormônio lactogênio placentário, a progesterona, o cortisol, a prolactina, o estrogênio e o hormônio de crescimento; e, (2) degradação da insulina, que ocorre por enzimas da membrana placentária, semelhantes às insulinases hepáticas. Em vista desses achados, conclui-se que a gestação é um estado diabetogênico. Para manter a homeostase dos carboidratos, frente a esta insulino-resistência, o pâncreas materno normal aumenta a liberação de insulina em 1,5 a 2,5 vezes. Quando a função pancreática materna for insuficiente para superar esta resistência à insulina, ocorre o DMG 4.

Rastreamento e Diagnóstico O objetivo de realizar rastreamento é para identificar gestantes assintomáticas com alta probabilidade de ter ou desenvolver DMG. O diagnóstico vai permitir uma terapia apropriada para diminuir a morbidade, principalmente a macrossomia, distocia de ombro e pré-eclampsia 4. Esse é um tópico bastante controverso. Não existe um consenso na literatura se o rastreamento deve universal ou apenas nas gestantes com fatores de risco para DMG, assim como nos pontos de corte para diagnóstico 1. Tem sido recomendado que o rastreamento deva ser universal, ou seja, todas as gestantes devem ser investigadas 4. A Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD) recomenda solicitar uma glicemia de jejum para todas as gestantes na primeira consulta pré-natal. Quando esta ocorre no primeiro trimestre da gestação, o diagnóstico será feito conforme ilustrado na tabela 1 1. Tabela 1: Critérios diagnósticos para diabetes na gestação Glicemia Diagnóstico 126mg/dL 92mg/dL e < 126mg/dl Adaptado da referência 1. Diabetes prévio a gestação Diabetes gestacional Em ambos os casos, o resultado deve ser confirmado com uma segunda glicemia de jejum, uma vez que uma serie de fatores pode alterar o resultado do exame: jejum maior que 8 horas (como os de 10-12 horas requerido para dosagem de triglicerídeos), ingestão de balas e/ou outros alimentos antes da realização do teste, entre outros 1. Nas pacientes com glicemia de jejum no primeiro trimestre < 92mg/dl, ou seja, todas as gestantes sem diagnóstico de diabetes devem ser investigadas com teste oral de tolerância a glicose (TOTG) com 75g de glicose entre a 24 a e 28 a semana de gestação 1. É importante lembrar que a paciente ao realizar o TOTG não pode estar em uma dieta com restrição de carboidratos, ou seja, ela deve ingerir no mínimo 150 gramas de carboidratos nos três dias anteriores ao teste, além de realizar o jejum de 8 horas e permanecer sentada/deitada durante o exame e não fumar 1. Os critérios atualmente usados no Brasil para o diagnóstico de DMG foram adaptados pelo International Association of Diabetes and Pregnancy Study Group (IADPSG) a partir do estudo Hyperglycemia and adverse pregnancy outcomes (HAPO) 2,5. Este foi um estudo prospectivo, observacional que acompanhou 25 mil

gestantes que realizaram TOTG (glicemia jejum, 1 e 2 horas após 75g glicose) que tinha como objetivo esclarecer quais níveis de glicemia materna levariam a resultados adversos na gestação, avaliando os resultados perinatais: peso ao nascer acima do percentil 90, cesárea, hipoglicemia neonatal e peptídeo-c no cordão umbilical acima do percentil 90. Encontraram que a associação entre glicemia materna (jejum, 1 e 2h após 75g glicose) e resultados perinatais adversos foi contínua, ou seja, não foi possível identificar um ponto de corte claro da glicemia onde aumentava o risco. Assim, a IADPSG transformou estes resultados numa proposta para a prática diagnóstica, calculando o risco relativo de 1,75 para estes efeitos adversos perinatais 2. Os critérios diagnósticos para DMG pelo TOTG são mostrados na tabela 2, sendo que apenas um dos valores alterados já é suficiente para fazer o diagnóstico. Tabela 2 Critérios diagnósticos para Diabete mellitus gestacional pelo Teste de Tolerância oral a Glicose Glicemia jejum 92mg/dL Adaptado da referência 1. Glicemia 1 h após 75g glicose Glicemia 2 h após 75g glicose 180mg/dL 153mg/dL Tratamento O objetivo principal do tratamento do DMG é a redução da incidência de complicações, tanto maternas, quanto fetais, especialmente a macrossomia, a pré-eclâmpsia, a ocorrência de cesárea e a adiposidade neonatal 5. Ambas podem ser atingidas pela melhor correção da disglicemia possível 1. Atualmente, existem duas modalidades de tratamento que podem ser utilizadas para controle da DMG: (1) Medidas não farmacológicas como dieta e atividade física; (2) Medidas farmacológicas como hipoglicemiantes orais e insulina. Dieta e Exercícios A primeira etapa de tratamento consiste de uma orientação dietética, de preferência feita por nutricionista, que tem como objetivo adquirir o controle da glicemia, prevenir cetose e proporcionar ganho de peso materno e fetal adequados 1,4,6. Para gestantes com DMG, recomenda-se o mesmo ganho ponderal daquelas sem diabetes. O Instituto de Medicina (IOM) recomenda o ganho de peso desejado conforme o estado nutricional pré-gestacional, apresentado na Tabela 3 3. Na prática clínica, as gestantes usualmente necessitam de 1800 a 2500 Kcal/dia, com programação alimentar individualizada, sendo que

a perda de peso não deve ser recomendada durante a gestação. A ingestão de carboidratos deve ser distribuída entre as principais refeições e os lanches para evitar as hiperglicemias pós prandiais, preferindo aqueles com baixos índices glicêmicos. Um lanche noturno deve ser oferecido para evitar jejum noturno prolongado e cetose 4. Tabela 3 Recomendação de ganho de peso conforme estado nutricional prévio (IMC=Índice da Massa Corporal: Peso/Altura²). Estado nutricional prévio Ganho de peso recomendado Baixo peso (IMC < 19,8Kg/m²) Peso normal (IMC 19,9 a 26Kg/m²) Sobrepeso (IMC 26,1 a 29/m²) Obesidade (IMC 29,1Kg/m²) Adaptado da referência 3. 12,7 a 18,2Kg 11,4 a 15,9Kg 6,8 a 11,4Kg 6,8Kg Se não houver contraindicação obstétrica, a gestante deve ser estimulada a prática de atividade física de pequeno impacto, preferencialmente nos períodos pós prandiais e respeitando as suas condições. Caminhadas, hidroginástica ou exercícios de braços já foram avaliados no DMG 1. Estas medidas não farmacológicas devem ser associadas a auto monitorização das glicemias capilares, sempre que for possível. A gestante deverá ser orientada a monitorizar suas glicemias capilares no jejum e 2h após as principais refeições. Tratamento Farmacológico Após duas semanas da instituição dessa terapêutica, se os níveis glicêmicos permanecerem elevados, isto é, jejum 95mg/d e/ou após 1 hora 140mg/dl e/ou após 2 horas 120mg/dl, devemos instituir o tratamento farmacológico 1. Outro critério para avaliar a necessidade de tratamento farmacológico é o crescimento fetal avaliado por ultrassonografia (US) obstétrica. Quando a medida da circunferência abdominal fetal for maior ou igual ao percentil 75 (em US de 29 a a 33 a semana de gestação), deve-se iniciar terapia farmacológica 3. Insulinoterapia Quando as metas glicêmicas não são obtidas com as medidas não farmacológicas, a insulina é considerada o padrão-ouro para o tratamento da DMG 1-3. Isso ocorre porque ela consegue normalizar os níveis glicêmicos e reduzir

a incidência de complicações decorrentes do DMG. A insulina praticamente não cruza a barreira hematoplacentária, não ocorrendo interação da droga com o feto que possa levar a complicações fetais 7. Classicamente as insulinas NPH e Regular são as de escolha para uso na gestação. Porém, os análogos de ação ultrarrápida como Lispro e Aspart mostraram ser seguros e possibilitam melhor controle pós prandial e menos hipoglicemia, em comparação com a insulina Regular 3. Os análogos de ação prolongada como a Insulina Glargina e a Insulina Detemir também podem ser usados, apesar de não terem sido extensivamente avaliados na gestação 4. Os esquemas de insulinoterapia e as doses para correção da disglicemia dependem de cada paciente, variando conforme o peso, a alimentação, fase da gestação e o grau de resistência insulínica 4. Pode-se iniciar o tratamento com insulina NPH 0,2UI/kg antes de dormir nos casos de hiperglicemia de jejum, com aumento ou acréscimo de segunda ou terceira dose, tendo em visto os alvos glicêmicos mencionados anteriormente 3,4. Quando houver hiperglicemia pós-prandial, pode-se se iniciar insulina regular ou ultrarrápida (lispro ou aspart) antes das refeições, na dose 1UI para cada 10g de carboidrato. As necessidades de insulina aumentam com a evolução da gestação. Sempre que ocorrer uma queda brusca na necessidade de insulina após o segundo trimestre devemos investigar o bem-estar fetal, pela possibilidade de insuficiência placentária ou morte fetal 3. Hipoglicemiantes Orais Sabemos, porém, que existem vários fatores que diminuem a adesão das pacientes e também a efetividade do tratamento. Barreiras tanto médica como da paciente podem dificultar a insulinoterapia: medo de aplicar as injeções, medo de ocorrer hipoglicemia, custo terapêutico mais elevado e a baixa cognição da paciente. Desse modo, apesar da insulina ser a preferida para o manejo da DMG na maioria das mulheres, nem sempre ela é a melhor opção para o manejo desta 8. A glibenclamida/gliburida (sulfonilureia) e a metformina (biguanida) são duas drogas amplamente utilizadas no tratamento do DM2, com ótimos resultados. Essa duas drogas, entretanto, atravessam a placenta e, consequentemente, podem interagir com o feto. Por esse e outros motivos, nenhum dos dois fármacos são aprovados pelo FDA e pela ANVISA para uso durante a gestação, apesar de serem consideradas drogas de categoria B 9. Não existem, contudo, evidências que estas drogas sejam teratogênicas. Devido à facilidade de uso das drogas orais, uma serie de ensaios clínicos e estudos retrospectivos vêm sendo feitos para elucidar a segurança dessas drogas. Até o presente momento, os dados disponíveis nos evidenciam que essas drogas são seguras para uso durante a gestação e que têm demonstrado equivalência destas em relação à insulina e aos desfechos da gestação 10.

Assim, é necessário considerar alguns aspectos antes de se prescrever tais medicações a uma gestante com DMG: (1) taxa de falha ambas as drogas possuem uma taxa de falha, ou seja, podem não atingir os níveis glicêmicos desejados, apesar de uso correto e dose máxima. Quando isso ocorrer, deve-se trocar a medicação prontamente para insulina; (2) eficácia a maioria dos estudos demonstrou não haver grandes diferenças entre a eficácia dos agentes orais em relação à insulina 7-10 ; 3) efeitos epigenéticos uma das grandes dúvidas em relação ao uso dos agentes orais são as possíveis repercussões em longo prazo, tanto no feto quanto na mãe; (4) efetividade sabemos que os agentes orais são mais baratos e que possuem maior adesão em relação à insulina. Apesar das dúvidas que ainda existem sobre o uso dos hipoglicemiantes orais durante a gestação, representam uma nova opção para obter um melhor controle glicêmico 8. Metformina (MTF) Pertence a classe das biguanidas, cujo principal mecanismo de ação parece ser a inibição de gliconeogênese hepática. Esta droga não estimula a secreção de insulina e, assim, apenas excepcionalmente pode causar hipoglicemia 3. Deve ser iniciada na dose de 500mg duas vezes ao dia, após as refeições para diminuir o seu principal efeito adverso que é a intolerância gastrointestinal e, após, ser titulada a dose máxima de 2500mg/dia conforme a necessidade 8. Seu efeito adverso mais temido é a acidose lática, que é, porém, muito raro. O estudo metformina no diabete gestacional (MiG) evidenciou que o tratamento com esta medicação não foi associado com mais complicações no período neonatal em comparação com a insulina e que as pacientes com MTF que necessitaram de insulina por falha terapêutica, necessitaram de dose menores de insulina do que as paciente em uso de apenas insulina e ganharam menos peso 11. As associações entre MTF e desfechos neonatais e maternos nos outros estudos diferiram em pequenos aspectos, mas todos apontam para a sua segurança e eficácia durante gestação 7-11. Glibenclamida/Gliburida É uma sulfonilureia, que possui como mecanismo de ação o aumento da secreção de insulina pelas células beta-pancreáticas. Nos Estados Unidos ela é a droga preferida por alguns centros médicos que tratam DMG. Os estudos sugerem que devemos iniciar na dose de 2,5mg a 5mg por dia e, após, titulada a uma dose máxima de 20mg dia conforme necessidade, sempre fracionada em duas vezes ao dia 8. Esta droga deve ser suspensa duas semanas (segundo FDA) ou, no mínimo, 36 horas antes do parto, devido ao risco de eventos hipoglicêmicos neonatais 9. A maioria dos estudos sugere que a glibenclamida como uma droga segura e com eficácia comparável a insulina na gestação; alguns,

entretanto, evidenciaram taxas significativas de falha terapêutica e associada a um maior risco de macrossomia e hipoglicemia neonatal 12. Logo, ela não deve ser usada como opção terapêutica caso insulina ou metformina estejam disponíveis para uso 10. CONCLUSÃO A insulina continua sendo a medicação mais avaliada e mais segura para uso no DMG, visto que não atravessa a barreira placentária de modo significativo. Contudo, estudos recentes têm mostrado que as medicações orais, especialmente a metformina e a glibenclamida, também podem fazer parte da terapêutica do controle da glicemia na gestante com DMG. REFERÊNCIAS 1. Diabetes mellitus gestacional: diagnostico, tratamento e acompanhamento pos-gestacao. Diretrizes da Sociedade Brasileira de Diabetes: 2014-2015;192-7. 2. International Association of Diabetes and Pregnancy Study Group. Recommendations on diagnosis and classification of hyperglycemia in pregnancy. Diabetes Care. 2010 Mar; 33(3): 676-682 3. Vilar L. et al. Doenças Endócrinas e Gravidez. Rio de Janeiro: Medbook; 2011. Cap.17:203-26. Cap. 18:227-40.cap. 19:241-8. Cap.20:249-56. 4. Couston DR, Jovanovic L. Diabetes mellitus in pregnancy: Screening and diagnosis. Glycemic control and maternal prognosis. [Database on internet]. 2015 [updated 2015 Jun; cited 2015 Mar 3]. In: UpTodate. Available: http://www.uptodate.com/online. 5. HAPO Study Cooperative Research Group, Metzer BE, Lowe LP, et al. Hyperglycemia and adverse pregnancy outcomes. N Engl J Med. 2008 May 8;358(19):1991-2002. 6. American Diabetes Association, Bantle JP, Wylie-Rosett J, et al. Nutrition recommendations and interventions for diabetes. Diabetes Care. 2008 Jan;31 Suppl 1:S61-78. 7. Li G, Zhao S, Cui S, et al. Effect comparison of metformin with insulin treatment for gestational diabetes: a meta-analysis based on RCTs. Arch Gynecol Obstet. 2014 Dec 30. doi: 10.1007/s00404-014-3566-0 8. Carroll DG, Kelley KW. Review of metformin and glyburide in the management of gestational diabetes. Pharm Pract (Granada). 2014 Oct;12(4):528. Epub 2014 Mar 15. 9. Buschur E, Brown F, Wyckoff J. using oral agents to manage gestational diabetes: what have we learned? Curr Diab Rep. 2015 Feb;15(2):570. doi: 10.1007/s11892-014-0570-5. 10. Balsells M, García-Patterson A, Solà I, et al. Glibenclamide, metformin, and insulin for the treatment of gestational diabetes: a systematic review and meta-analysis. BMJ. 2015 Jan 21;350:h102 DOI: 10.1136/bmj.h102 11. Rowan JA, Hague WM, Gao W, et al. Metformin versus insulin for the treament of gestational diabetes. N Engl J Med. 2008 May 8;358(19):2003-15 12. Zeng YC, Li MJ, Chen Y, et al. The use of glyburide in the management of gestational diabetes mellitus: a meta-analysis. Adv Med Sci. 2014 Mar;59(1):95-101.