Comentário. Autor: Ramon Tomazela Santos Paulo Coviello Filho
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1 Autor: Ramon Tomazela Santos Paulo Coviello Filho CARF ANALISA USUFRUTO DE PARTICIPAÇÃO SOCIETÁRIA NA PERSPECTIVA DO USUFRUTUÁRIO E MANTÉM ISENÇÃO DOS DIVIDENDOS E TRIBUTAÇÃO EXCLUSIVA NA FONTE À ALÍQUOTA DE 15% PARA OS JUROS SOBRE CAPITAL PRÓPRIO No dia , a 1ª Turma Ordinária, da 4ª Câmara, da 1ª Seção do CARF, por meio do acórdão n , deu provimento ao recurso voluntário de determinado contribuinte, interposto no processo administrativo n / , cuja discussão versava sobre o tratamento tributário, pelo imposto de renda da pessoa física (IRPF), de rendimentos de juros sobre capital próprio (JCP) e dividendos, recebidos pelo usufrutuário pessoa física, em decorrência de direitos econômicos mantidos, após a constituição do usufruto. No caso, conforme relatório do acórdão, uma pessoa física, acionista de determinada pessoa jurídica operacional, em conjunto com outros acionistas dessa mesma pessoa jurídica, constituíram uma sociedade holding e capitalizaram essa sociedade, por meio de integralização da nua propriedade das ações da pessoa jurídica operacional, reservando para si o usufruto dos direitos econômicos de tais ações. Em razão do usufruto constituído, o usufrutuário recebeu da pessoa jurídica operacional (i) JCP, os quais foram tributados exclusivamente na fonte, nos termos do art. 9, parágrafo 3, inciso II, da Lei n. 9249, de , e (ii) dividendos, os quais não foram oferecidos à tributação, com base na isenção prevista no art. 10 da mesma Lei n Ao examinar o caso concreto, a fiscalização entendeu que o contribuinte, em razão da constituição do usufruto, não configurava mais como acionista da sociedade, de forma que não poderia conferir aos valores recebidos o tratamento tributário de dividendos e de JCP. Segundo a fiscalização, esses 1
2 rendimentos seriam decorrentes da condição de usufrutuário e não de acionista, de forma que deveriam ser submetidos ao regime de tributação anual de IRPF, às alíquotas da tabela progressiva (até 27,5%). O contribuinte se irresignou contra a autuação fiscal, argumentando que o instituto do usufruto, disciplinado nos art a do Código Civil, prevê justamente a divisão dos atributos da propriedade. Assim, a sociedade holding teria ficado com a nua-propriedade e os direitos políticos decorrentes das ações da pessoa jurídica operacional, enquanto o contribuinte teria mantido o direito aos frutos, neles incluídos aos JCP e os dividendos. A 1ª instância administrativa julgou a impugnação improcedente, mantendo integralmente a autuação fiscal. Em face dessa decisão, o contribuinte interpôs recurso voluntário, o qual foi julgado pela 1ª Turma Ordinária, da 4ª Câmara, da 1ª Seção do CARF, por meio do acórdão n Nesse julgamento, em decisão colhida por maioria, a Turma Julgadora entendeu que o tratamento conferido pelo contribuinte aos rendimentos recebidos a título de dividendos e JCP estava correto. O voto vencedor, de lavra do Conselheiro Cleberson Alex Friess, entendeu que o raciocínio da fiscalização não poderia prevalecer, eis que o usufruto é figura típica do direito privado, não havendo nenhuma norma tributária, relativa ao IRPF, conferindo tratamento diverso aos rendimentos de dividendos e JCP recebidos pelo usufrutuário. Ainda sob o ponto de vista do direito privado, o voto também destacou que o art do Código Civil 1 é claro ao definir os atributos da propriedade, sendo que os art e seguintes admitem expressamente a divisão das faculdades inerentes ao direito de propriedade, em razão do usufruto. A decisão também consignou que não foi identificada nenhuma irregularidade ou ilicitude pela fiscalização na constituição do usufruto. Adiante, consignou a decisão que a Lei n. 6404, de , possui uma série de disposições que tratam especificamente sobre a constituição de usufruto de participação societária, citando os art. 40, 114, 171 e 205. Nas 1 Art O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha. 2
3 palavras da decisão, conquanto não empregue uma linguagem uniforme em todos os artigos que tratam do usufruto, a Lei S/A reconhece, ao fim e ao cabo, que tanto nu-proprietário quanto usufrutuário estão legitimados a exercerem direitos de acionistas. Especificamente sobre o art. 205 da Lei n. 6404, a decisão chamou atenção para o fato de o dispositivo autorizar expressamente o pagamento de dividendos ao usufrutuário da ação. De modo semelhante, apesar da inexistência de disposição normativa similar para os JCP, até por se tratar de instituto jurídico criado posteriormente à edição da Lei n. 6404, a decisão destacou que tanto os dividendos quanto o JCP representam formas de remuneração do capital investido pelo acionista, a despeito das diferenças existentes em suas naturezas jurídicas e nos respectivos tratamentos tributários. Analisando especificamente o art. 9 da Lei n. 9249, que dispõe sobre o tratamento tributário dos JCP, a decisão afirmou inexistir razão para que o tratamento lá conferido seja restringido ao acionista, excluindo-se o usufrutuário, eis que O legislador não adotou esse tipo de restrição, mesmo porque a instituição do usufruto não altera a natureza jurídica dos frutos percebidos pelo usufrutuário. No que tange aos dividendos, tratados no art. 10 da mesma Lei n. 9249, a decisão ressaltou que não há qualquer menção na Lei à figura do acionista, tampouco à do usufrutuário, de forma que não poderia haver tratamento distinto por parte do interprete. Assim, concluiu que cuida-se de uma verdadeira isenção tributaria de natureza objetiva, na medida em que o legislador ordinário escolheu como parâmetro um determinado fato jurídico, sem levar em consideração as condições das pessoas beneficiadas pela exceção. Válido ressaltar, ainda, que, conforme destacado pela decisão ora comentada, a mesma operação também gerou autuação da sociedade holding que recebeu a nu-propriedade das ações em aumento de capital. Naquele caso, processo n / , a fiscalização autuou a sociedade holding por omissão de receitas de JCP distribuídos pela pessoa jurídica operacional, exigindo o IRPJ, a CSL, o PIS e a COFINS. Essa autuação também foi julgada pelo CARF, por meio do acórdão n , de , que cancelou a autuação por também considerar perfeitamente válida a constituição do usufruto e a decorrente divisão dos atributos da propriedade. 3
4 A decisão proferida pelo CARF está correta, pois, no caso de usufruto sobre ações, os valores recebidos pelo usufrutuário continuam a receber o tratamento jurídico-tributário de dividendos ou de JCP, conforme a natureza jurídica do pagamento realizado. De fato, o instituto jurídico do usufruto pode ser definido como o direito real que outorga ao usufrutuário o direito de usar e perceber os frutos de coisa alheia, por tempo determinado ou por prazo vitalício. Assim, esse instituto garante ao usufrutuário o direito de usar e de gozar de bem alheio, com a obrigação de conservar a sua substância. Logo, com a instituição do usufruto, o proprietário mantém apenas a nua-propriedade do bem, que equivale ao domínio, despido dos direitos reservados ao usufrutuário, que passa a usar e desfrutar do bem alheio, sem alterar a sua substância. Assim, os frutos derivados da coisa alheia pertencem diretamente ao usufrutuário, mas sem que isso acarrete qualquer modificação em sua natureza jurídica ou no respectivo tratamento tributário. Diante disso, percebe-se claramente que o usufrutuário possui o direito de fruir das utilidades e dos frutos das ações, como os dividendos e o JCP. Como o usufruto estende-se, salvo disposição em contrário, aos acessórios da coisa, os demais proveitos econômicos provenientes das ações, como eventuais ações bonificadas, também devem ser atribuídos diretamente ao usufrutuário, em razão do direito real sobre coisa alheia. Ademais, na ausência de previsão legal específica, não há razões para se admitir o tratamento tributário diverso pelo IRPF entre acionista e usufrutuário dos rendimentos de JCP e dividendos. Sob a perspectiva da Lei n. 9249, não há nenhum elemento que permita se chegar à conclusão proposta pela fiscalização. Nesse contexto, parece que a solução do caso está de acordo com o brocardo jurídico ubi eadem ratio, ibi eadem dispositivo, definido por Carlos Maximiliano 2 como: Onde existe a mesma razão fundamental, prevalece a mesma regra de direito, os casos idênticos regem-se por disposições idênticas. 2 MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e Aplicação do Direito. 20ª Edição. Rio de Janeiro: Forense, 2011, p
5 Esse raciocínio fica evidente no caso dos dividendos, em que há disposição expressa na legislação societária (art. 205 da Lei n. 6404), admitindo o pagamento direto ao usufrutuário da participação societária 3. No caso dos JCP, em que não há disposição expressa, aplica-se a mesma lógica, eis que os JCP constituem forma de remuneração do acionista, assim como os dividendos. Por fim, cabe frisar que a reserva de usufruto, ainda que confira plena possibilidade de uso e de fruição do bem pelo usufrutuário, não tem o condão de reverter a transferência jurídica das ações, realizada por ocasião da integralização do aumento de capital na pessoa jurídica. Portanto, como os valores recebidos pelo usufrutuário a título de dividendo e o JCP mantêm as suas naturezas jurídicas intactas, cabe ao usufrutuário, na ausência de previsão legal específica, aplicar o mesmo tratamento tributário estabelecido para cada espécie de rendimento, como corretamente apontado pelo CARF no acórdão ora examinado. 3 Em relação aos dividendos, vale mencionar a decisão proferida pela Superintendência Regional da Receita Federal ( SRRF ) da 9ª Região Fiscal, na Solução de Consulta n. 11, de , segundo a qual os lucros distribuídos aos usufrutuários de quotas de sociedade limitada devem ser qualificados como dividendos isentos, caso tenham sido calculados com base em resultados apurados a partir do mês de janeiro de Confira-se: Ementa: USUFRUTO. QUOTAS DE CAPITAL. LUCROS DISTRIBUÍDOS. INCIDÊNCIA. Os lucros distribuídos aos usufrutuários das quotas do capital da empresa constituem rendimento não sujeito à tributação pelo imposto de renda, desde que tenham sido calculados com base em resultados apurados a partir do mês de janeiro de
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