ACÓRDÃO. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores MAGALHÃES COELHO (Presidente), LUIZ SERGIO FERNANDES DE SOUZA E MOACIR PERES.

Transcrição

1 ACÓRDÃO Registro: Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº , da Comarca de São Paulo, em que é apelante FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO, é apelado FÁBIO COSTA FERNANDES. ACORDAM, em 7ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Deram parcial provimento aos recursos, vencido o Revisor, que declarará.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores MAGALHÃES COELHO (Presidente), LUIZ SERGIO FERNANDES DE SOUZA E MOACIR PERES. São Paulo, 1 de dezembro de Magalhães Coelho RELATOR Assinatura Eletrônica

2 Voto nº Apelação Cível nº Comarca de São Paulo Recorrente: Juízo ex officio Apelante: Fazenda do Estado de São Paulo Apelado/Recorrido: Fábio Costa Fernandes AÇÃO DE COBRANÇA Perícia Judicial Nomeação para atuar em prol da parte beneficiada pela gratuidade judiciária - Despesas que competem ao Estado, observada a tabela constante da Deliberação de n 92, de 29/08/08, do Conselho Superior da Defensoria Pública do Estado, que fixa os limites de seus honorários Sentença parcialmente reformada Recurso da Municipalidade improvido e recurso oficial parcialmente provido. Vistos, etc. I. Trata-se de ação de cobrança ajuizada por Fábio Costa Fernandes em face de Fazenda do Estado de São Paulo, sustentando, em síntese, que o valor que esse pretende receber R$2.500,00 refere-se a honorários periciais devidos pela parte que se encontrava amparada pelos benefícios da justiça gratuita. II. Sobreveio sentença, julgando procedente o pedido, condenando a Fazenda Estadual ao pagamento da quantia

3 de R$2.500,00 (dois mil e quinhentos reais), atualizada desde a data da distribuição e acrescida de juros moratórios a partir da citação nos termos da Lei nº 9.494/97. Condenou-a ainda a arcar com as despesas processuais e honorários advocatícios fixados em R$500,00 (quinhentos reais). III. Os autos foram remetidos ao Tribunal para análise do recurso de apelação da Fazenda Estadual e do recurso ex officio. IV. Foram apresentadas contrarrazões. É o relatório. Tratam-se, como se vê, de recurso oficial e de apelação interposto pela Fazenda Estadual que, reiterando na íntegra os argumentos declinados na contestação, almeja a reforma da decisão que julgou procedente o pedido inicial. O recurso da Municipalidade não merece prosperar, enquanto o recurso ex officio requer parcial provimento. Pondero que embora o ônus de arcar com honorários periciais, na hipótese dos autos, que recai sobre o

4 beneficiário da gratuidade judiciária, deva ser imputado ao Estado já que o perito não pode ser obrigado a trabalhar sem remuneração -, que tem o dever constitucional de prestar assistência judiciária gratuita aos hipossuficientes, há que se atentar, no entanto, que se trata da utilização do Fundo de Assistência Judiciária - FAJ, nos termos da Deliberação 92/08, do Conselho Superior da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, que assim prevê: Artigo 1 - o pagamento de perito indicado para atuar em processo judicial de natureza cível, de competência da Justiça Estadual, em que o ônus da prova pericial tenha sido atribuído à parte beneficiária da assistência judiciária gratuita, será feito com recursos do Fundo de Assistência Judiciária FAJ, quando houver recursos orçamentários e financeiros disponíveis, até os limites previstos na seguinte tabela: (...) Parágrafo primeiro - Os valores de que trata este artigo compreendem a totalidade dos honorários e das demais despesas do perito, englobando eventuais ou necessários reparos e emendas aos serviços técnicos apresentados no processo judicial. Parágrafo segundo - o pagamento de peritos, nos

5 termos desta Deliberação, deverá ser suportado exclusivamente com recursos disponíveis no Fundo de Assistência Judiciária - FAJ e não poderá ultrapassar o montante constante da tabela do caput do presente artigo, ainda que superior o valor arbitrado pelo juiz da causa a título de honorários periciais, sendo que o levantamento deste numerário implicará quitação e renúncia ao direito de reclamar saldos desta contraprestação. Assim, com o devido respeito à capacidade profissional do perito nomeado, por haver parâmetro a ser considerado quando da fixação de honorários periciais frente ao Estado, evidentemente esse montante lhe deve correspondência, sendo certo, de conseguinte, que os honorários, na hipótese, precisam atender aos termos da Deliberação nº 92 da Defensoria Pública do Estado de São Paulo - que fixa os limites segundo a tabela nela constante - já que será feito com recursos do Fundo de Assistência Judiciária FAJ, nos termos do Comunicado n 1010/2008 da Corregedoria Geral de Justiça de São Paulo. Isto posto, mantém-se a condenação da Fazenda Pública, porém, limitada ao valor correspondente à tabela constante da Deliberação nº 92 da Defensoria Pública do Estado de São Paulo.

6 Para eventual efeito, considera-se prequestionada toda a matéria infraconstitucional e constitucional deduzida no recurso, observando-se que é pacífica a desnecessidade de menção expressa de todos os dispositivos, bem como manifestação expressa acerca de todos os argumentos invocados pelas partes, e sim somente daqueles que julgar pertinentes para lastrear a decisão. Daí o porquê, dá-se parcial provimento ao recurso oficial e nega-se provimento ao recurso da Fazenda Pública, para manter a condenação da Fazenda do Estado de São Paulo, porém, limitada ao valor correspondente à tabela constante da Deliberação nº 92 da Defensoria Pública do Estado de São Paulo. MAGALHÃES COELHO Relator

7 Voto nº 7486 Apelação nº Comarca: São Paulo Apelante: Fazenda do Estado de São Paulo Apelado: Fábio Costa Fernandes DECLARAÇÃO DE VOTO Vistos, etc. passo a expor. Ouso divergir da Douta maioria, pelas razões que Primeiramente, diga-se que não se pode interpretar o trabalho do perito como um munus público; e isto porque o expert não está obrigado, por lei, a trabalhar graciosamente em benefício da coletividade ou da ordem social. Com efeito, a Constituição Federal dispõe que o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos (art. 5º, LXXIV, da Constituição Federal). E claro está que a Administração Pública não pode exigir do profissional liberal trabalho gracioso, quanto mais não seja porque ninguém está obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei (art. 5º, II, da Constituição Federal). Mais que isto, exigência de trabalho gratuito, por parte de profissional liberal, feriria frontalmente a regra do artigo 1º, incisos III e IV, da carta magna, pois uma das pilastras

8 da República brasileira é o respeito à dignidade humana e aos valores sociais do trabalho. Nem mesmo nos casos de pessoas encarceradas se pode admitir trabalho gratuito obrigatório (art. 28 e 126 da Lei Federal n.º7.210/84). Veja-se que a Lei nº 1060/50 fala, exclusivamente, da colaboração dos municípios e da Ordem dos Advogados do Brasil (artigo 1º). A regra do artigo 14, na perspectiva de uma exegese sistemática, tem de ser interpretada nesse contexto. Em outros termos, o profissional liberal, nomeado como perito do juízo, está obrigado ao cumprimento do seu mister, o que não quer dizer que tenha de trabalhar graciosamente, pois a colaboração só se coloca naquilo que concerne aos profissionais inscritos na Ordem dos Advogados do Brasil. Aliás, mesmo com relação aos advogados, é bem de observar que sobreveio disposição legal específica no sentido de que devem ser remunerados pelo exercício da assistência judiciária prestada aos necessitados, nos termos do convênio firmado entre a OAB/SP e o Estado, cabendo ressaltar que a indicação do profissional, pelo serviço de assistência judiciária do Estado, só se aplica nos casos de nomeação de advogado, e não nas hipóteses de nomeação de perito pelo juiz, que é profissional da confiança do magistrado, nos termos da lei processual civil. Tivesse cumprido o Poder Executivo a regra constitucional, vale dizer, prestando efetiva assistência jurídica que deve ser integral, compreensiva de todos os serviços necessários à defesa dos

9 direitos em juízo, teria o Poder Judiciário como se valer de profissionais previamente selecionados pelo Estado-Administração para funcionar nos processos em que é parte beneficiário da assistência judiciária. Em suma, muito embora o perito seja profissional da confiança do Juízo, isto não impediria a Administração Pública de colocar à disposição do Poder Judiciário um corpo de profissionais de reconhecida competência para servir nos processos em que o hipossuficiente é parte, como resulta do dever constitucional a ela imposto. E tanto o Estado reconhece a obrigação de prestar assistência jurídica integral e gratuita (para repetir a expressão utilizada na Constituição da República), e mais, a possibilidade jurídica de fornecer os meios necessários à consecução das finalidades assinaladas pelo legislador, que a Defensoria Pública do Estado de São Paulo, para dar aplicação à regra do artigo 236 da Lei Complementar nº 988/06, editou a Deliberação CSDP nº 56, de 11 de janeiro de 2008, na qual o órgão público institui tabela de remuneração de peritos. E nem se diga que, à vista disto, incabível seria o arbitramento judicial feito em outros termos, pois os valores contemplados na referida tabela, que variam entre R$ 292,36 e R$ 882,63, são manifestamente insuficientes, para dizer o menos. Destarte, à falta de providências da Administração Pública, que assim também se livra de gastos com a folha de pagamento, o magistrado tem de nomear perito dentre os que se apresentam, quando é certo que o profissional da sua confiança poderia ser escolhido entre aqueles previamente recrutados pelo

10 Estado-Administração, mediante remuneração compatível com a gravidade do trabalho que desempenha. Não procede tampouco a objeção da embargante naquilo que diz respeito ao fato de não ter participado da constituição do título que instrui a presente execução. Primeiramente, tem-se de consignar que se está tratando de título executivo extrajudicial, que, por presunção da lei, traz em si a certeza do direito do credor, a liquidez e a exigibilidade da obrigação do devedor, e contém a sanção para o caso do inadimplemento desse (Moacyr Amaral Santos, Primeiras Linhas de Direito Processual Civil, 3ª ed., 3º vol., SP, Saraiva, 1979, p. 205). Na regra do artigo 585, VI, do Código de Processo Civil, como observa a melhor doutrina, o Código abriu brecha em seu sistema de somente considerar como título executivo extrajudicial o que contém declaração ou manifestação do devedor (...). Realmente, o crédito do serventuário de Justiça, perito, intérprete ou tradutor, pode ser cobrado executivamente, sem qualquer reconhecimento do devedor (Alcides de Mendonça Lima, Comentários ao Código de Processo Civil, 6ª ed., vol. VI, RJ, Forense, 1990, p. 334). Como esclarece o renomado processualista, a propósito da regra do artigo 585, VI, do Código de Processo Civil, normalmente, a sentença condena a parte vencida ao pagamento das custas e demais encargos processuais, que deverá satisfazer o que o vencedor houver liquidado. Quanto à parte vencedora, a cobrança é por

11 execução, baseada em título judicial, na situação de credor. Quanto ao serventuário de justiça e demais interessados indicados neste inciso, a cobrança é por execução, mas fundada em título extrajudicial, em situação sui generis, porquanto há a participação do juiz, aprovando, por via de decisão, a conta lançada (...). A pretensão do serventuário de justiça (...) não decorre de nenhuma sentença condenatória, pois a proferida no processo apenas envolve as partes, e, sim, origina-se do privilégio que a lei mantém a seu favor. Há mero controle e não provimento do juiz, condenando a parte a pagar (Alcides de Mendonça Lima, ob. cit., p. 346). A interpretação da regra do artigo 568, I, como sugerida pela embargante, não colhe, pois o juiz, ao fixar honorários em favor de perito que atuou no processo no qual figura beneficiário da justiça gratuita, constitui o crédito em favor daquele a quem a Constituição Federal diz incumbir a prestação da assistência jurídica integral. Como já se disse, na base das lições de Alcides de Mendonça Lima, o Código abriu brecha em seu sistema de somente considerar como título executivo extrajudicial o que contém declaração ou manifestação do devedor, pelo que a Fazenda do Estado pode ser cobrada executivamente independentemente de ter ou não reconhecido a dívida em favor do perito. Neste sentido, colhem as considerações de Araken de Assis quando observa que há hipóteses em que não coincidem os legitimados e as pessoas indicadas no título executivo, que é apenas fonte mediata da legitimação (Manual da Execução, 11ª ed., SP, RT, 2007, p. 382).

12 E nada impede a execução contra a Fazenda Pública na base de título executivo extrajudicial. O artigo 730 do Código de Processo Civil, ao contrário do que preceituava o parágrafo único do artigo 218 do Código de 39, não exige tenha a quantia certa origem tão-só em sentença (Alexandre de Paula, CPC Anotado, 4ª ed., vol. III,SP, RT, 1988, p. 2667). Neste sentido, a posição de Celso Neves (Comentários ao Código de Processo Civil, 1ª ed., vol. VII, RJ, Forense, 1974, p. 166, e de Humberto Theodoro Jr., Processo de Execução, 8ª ed., SP, Leud, 1983, p. 335). de Justiça: Aliás, a propósito, já há Súmula do Superior Tribunal É cabível execução por título extrajudicial contra a Fazenda Pública (279/STJ). Sucede que, no caso presente, foi a autora da ação quem ganhou a demanda, conforme pesquisa feita no SAJ, busca na base do número dos autos , razão por que a Fazenda do Estado é parte ilegítima, considerada a regra do artigo 11, caput, da Lei Federal nº 1.060/50: Os honorários de advogado e peritos, as custas do processo, as taxas e selos judiciários, serão pagos pelo vencido quando o beneficiário de assistência for vencedor da causa Em outras palavras, a pretensão do perito haveria de

13 ser formulada contra aquele que perdeu a demanda, na conformidade da regra do artigo 20, caput, do Código de Processo Civil, precisamente porque foi ele condenado a pagar as despesas processuais, e não o vencedor, no caso, a autora, assistida pela gratuidade processual. Nestes termos, pelo meu voto, dava provimento ao recurso de apelação e ao reexame necessário. LUIZ SERGIO FERNANDES DE SOUZA Revisor

14 Este documento é cópia do original que recebeu as seguintes assinaturas digitais: Pg. inicial Pg. final Categoria Nome do assinante Confirmação 1 6 Acórdãos Eletrônicos 7 13 Declarações de Votos PAULO MAGALHAES DA COSTA COELHO LUIZ SERGIO FERNANDES DE SOUZA F87BAA F8FE08 Para conferir o original acesse o site: informando o processo e o código de confirmação da tabela acima.