COMO ENSINAR E APREENDER NAS ESCOLAS DE HOJE? UMA PROPOSTA METODOLÓGICA A PARTIR DA PEDAGOGIA DA PROBLEMATIZAÇÃO 1
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- Rachel Cabral Salgado
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1 COMO ENSINAR E APREENDER NAS ESCOLAS DE HOJE? UMA PROPOSTA METODOLÓGICA A PARTIR DA PEDAGOGIA DA PROBLEMATIZAÇÃO 1 ÉDER DA SILVA SILVEIRA 2 É comum perceber o posicionamento de alunos em relação ao ensino de determinadas disciplinas como algo chato, cansativo, que tem muito texto ou tem que decorar muitas coisas. Também não é novidade questionamentos do tipo: Para que serve isso? Qual é o significado disso? Onde vou usar esse conteúdo em minha vida? Por que é necessário aprender isso? Certo é que um grande número de jovens vive a escola como uma passagem obrigatória, uma imposição do meio familiar e da sociedade, e não como uma experiência significativa da qual eles poderiam tirar um proveito pessoal (TARDIF e LESSARD, 2006, p ). Em parte, isso ocorre devido à deficiência das respostas dadas a essas perguntas ou, simplesmente, à ausência de respostas. Concordo com Castoriadis (apud HENGEMÜHLE, 2008, p.18) quando salienta que, na educação, dois princípios devem ser firmemente defendidos: todo processo de educação que não visa desenvolver ao máximo a atividade própria do aluno, é mau; todo sistema educativo incapaz de fornecer uma resposta racional à pergunta dos alunos por que deveriam aprender isso? é defeituoso. O que se constata é uma grande dificuldade em dar significado ou (re)significar aquilo que se ensina e se aprende. Esta dificuldade, juntamente com a desvinculação entre o componente curricular que se trabalha e a Educação, vem agravando o problema e contribuindo para que jovens profissionais iniciem suas carreiras incentivando a reprodução e não reconstrução do conhecimento. Por que as práticas pedagógicas na Educação Básica mudam tão lentamente (ou não mudam) frente a vastos referenciais teóricos disponíveis atualmente? A ausência de leituras, de conhecimentos teórico-pedagógicos, de uma concepção clara de Educação e do componente curricular, bem como do conhecimento da história do componente curricular e 1 Excertos retirados de Silveira (2009). 2 Doutorando em História pela Unisinos, Mestre em Educação pela PUC-RS, Docente do Curso de História da Ulbra São Jerônimo. dersilveira@yahoo.com.br
2 dos conteúdos ministrados que o compõe são importantes fatores-problemas quando se fala em uma metodologia de ensino capaz de responder à pergunta acima. Paradigmas epistemológicos e metodológicos na trajetória do ensino fazem-nos refletir sobre a prática docente e os elementos envolvidos nos processos cognitivos dos alunos. Dessa reflexão, percebe-se que independentemente do paradigma em questão 3, do ponto de vista didático pedagógico, a aprendizagem só se torna relevante e ocorre numa perspectiva mais perene quando é significativa para o aluno. Nesse sentido, proponho uma oficina sobre metodologia de ensino através de uma pedagogia da problematização. A Pedagogia da Problematização parte da base que, em um mundo de mudanças rápidas, o importante não são os conhecimentos ou idéias nem os comportamentos corretos e fáceis que se espera, mas sim o aumento da capacidade do aluno participante e agente da transformação social para detectar os problemas reais e buscar para eles soluções originais e criativas. Por esta razão, a capacidade que se deseja desenvolver é a de fazer perguntas relevantes em qualquer situação, para entendê-las e ser capaz de resolvê-las adequadamente. (BORDENAVE, s.d., p.265) Assim, a problematização dos conteúdos significa, em primeira instância, partir do pressuposto de que ensinar [...] é construir um diálogo entre presente e passado, e não reproduzir conhecimentos sobre fatos que ocorreram em outras sociedades e outras épocas (SCHMIDT & CAINELLI, 2004, p.52). Mas, como fazer a problematização 4 se concretizar nas abordagens dos conteúdos? A proposta de oficina que aqui apresento baseia-se na utilização do Arco de Charles Maguerez, adaptado por Adelar Hengemühle (2008), e visto como um importante instrumento para a prática de uma pedagogia da problematização. Em 1970, com base nas etapas de um método de solução de problemas, Charlez Maguerez 5 propôs um esquema pedagógico para ser utilizado na assistência técnica ao agricultor, o "Esquema do Arco", composto por cinco fases. Já citada por Bordenave e Pereira (2001), Berbel (1998) e Hengemühle (2004), a utilização do Arco não tem a pretensão de ser o único referencial ou instrumento para a 3 Entende-se por paradigma um conjunto de regras e padrões estabelecidos que proporcionam modelos para a produção de conhecimento (CRUZ in: NIKITIUK, 2004, p.77) 4 É importante salientar que trabalhamos aqui com a Problematização e não com a Aprendizagem Baseada em Problemas. Para o leitor que queira aprofundar-se nessa questão, indica-se a leitura de Berbel (Interface, 1998). 5 MAGUEREZ, C. Elementos para uma pedagogia de massa na assistência técnica agrícola: relatório Campinas: Coordenadoria de Assistência Técnica Integral da Secretaria da Agricultora do Estado de São Paulo, 1970.
3 prática de uma pedagogia da problematização. Também não se pretende com esta proposta passar a ideia de que apenas a pedagogia da problematização seja capaz de resolver todos os problemas ligados à complexa arte de ensinar e aprender. A esse respeito, Berbel exemplifica: Estamos conscientes de que nem sempre é a alternativa mais adequada para certos temas de um programa de ensino. Não pensamos ensinar o uso de crase através da Problematização, nem a tradução de palavras do português para outra língua, ou o cálculo de certas expressões matemáticas... O que de social, ético, econômico ou político estaria aí implicado? Há certamente temas que serão mais bem aprendidos com uma ou mais alternativas metodológicas da imensa lista à nossa disposição na literatura pedagógica (BERBEL, Interface, 1998, p.142). Entretanto, com o objetivo de contribuir com uma reflexão acerca do processo de significação de conteúdos a partir do Arco de Maguerez, a oficina pretende apresentá-lo já na adaptação realizada pelo professor Adelar Hengemühle (2008). Fig. 1: Esquema do Arco de Maguerez em Hengemühle (2008, p. 37) Na utilização desse instrumento, como podemos perceber, parte-se da realidade do aluno, busca-se iluminação em conhecimentos teóricos e retorna-se à realidade. Na primeira etapa, a partir de um tema ou unidade de estudo, observa-se a realidade concreta de modo a perceber o tema estudado na realidade ou em sua parcela. Nesta etapa, chamada por Hengemühle de momento da provocação de desejo, o professor inicia a sua aula trazendo situações e problemas significativos para os alunos ou, a partir de um tema
4 significativo, pode solicitar que os alunos apresentem situações e problemas significativos e que estão relacionados ao tema. O que é importante frisar nesse momento é que o professor, a partir de um tema, aborda as situações e problemas significativos para os alunos, sem ainda apelar ao conhecimento teórico (conteúdo) Hengemühle (2008, p.38). Na segunda etapa, o professor procura dinamizar a provocação de hipóteses dos alunos. Nesse momento, Hengemühle salienta que continua o momento de provocação do desejo. Como os alunos ainda não tiveram contato com o conteúdo (conhecimento, fundamentação teórica...), cada um, no seu senso comum, na sua individualidade, nas suas concepções prévias, na sua cultura, irá posicionar-se para apresentar seus argumentos (normalmente achismos), para a compreensão, ou solução da situação problema. O professor nesse momento, provoca, questiona, retira os alunos da sua cômoda posição de receber informações acabadas e repeti-las. Os alunos, por sua vez, são colocados em movimento e conflito mental. Hengemühle (2008, p.39) A segunda etapa permite que os alunos sejam levados a refletir sobre as possíveis causas da existência do problema em estudo e os porquês de sua existência. No terceiro passo ocorre o momento da iluminação e a compreensão fundamentada das situações e dos problemas (id., ibid.). É nessa etapa que o conteúdo tem importância e faz sentido, pois precisa responder ou iluminar o desejo provocado nos alunos (id., ibid.). Na quarta etapa o aluno precisa ser desafiado por novas situações-problemas, ou ser levado a confirmar/refutar/reconstruir suas hipóteses anteriores (id., p.40). De acordo com Hengemühle, a importância desse momento está em exercitar a capacidade argumentativa não mais por achismo, mas com fundamentação teórica, ou seja, fundamentação no conteúdo. Na quinta e última etapa do arco é o momento de ressignificar a teoria na realidade (id., ibid.). A prática que corresponde a esta etapa implica na possibilidade de produzir algo de forma reflexiva, sem perder de vista a análise de situações-problema. Implica em um compromisso dos alunos com o seu meio. Do meio observaram os problemas e para o meio levarão uma resposta de seus estudos, visando transformá-lo em algum grau (BERBEL, 1996, p.8-9). Por fim, apresento abaixo uma das tabelas com dois roteiros sugeridos por Adelar Hengemühle (2008, p.46) que servirá como fio condutor nas atividades práticas da oficina.
5 Para significar o conteúdo Passo 1: Selecione um conteúdo do seu componente curricular em uma determinada série. Passo 2: Investigue o contexto, as situações e os problemas que deram origem a esse conteúdo. Passo 3: Busque situações e problemas do contexto contemporâneo, onde esse conteúdo seja significativo para os seus alunos nessa série (respeitando o nível de desenvolvimento, contexto onde vivem...) Para desenvolver a prática pedagógica tendo como referência o Arco de Maguerez Passo 1: Pegue uma situação-problema e pense como seria mais significativo apresentála aos alunos. Passo 2: Imagine que hipóteses teriam os alunos antes da teorização e como esse momento poderia ser desenvolvido. Passo 3: Aponte o conteúdo que será abordado para iluminar a compreensão e/ou a solução do problema e pense como poderiam desenvolver esse momento. Passo 4: Imagine que hipóteses fundamentais teriam os alunos agora, após a teorização, e como esse momento poderia ser desenvolvido. Passo 5: Planeje como levar os alunos a produzir e a demonstrar sua capacidade de compreensão e/ou capacidade de argumentação e solução do problema abordado. Geralmente a cultura do professor é iniciar sua aula pelo conteúdo (passo 3 do Arco de Maguerez). Então, explica-se o conteúdo aos alunos, aplica-se exercícios sobre o mesmo conteúdo, enfim, muitas vezes se percebe que a prática metodológica do Ensino Básico gira em torno do conteúdo, sem qualquer problematização. Frequentemente isso ocorre devido aos conceitos e paradigmas que se tem e que se assume em relação ao componente curricular e à Educação. Na maioria das vezes, o que afasta o professor de uma pedagogia da problematização é, de acordo com Hengemühle (2008), o desconhecimento, por parte do educador, do contexto e/ou situações e problemas que originaram o conteúdo que ele tem que ensinar. Refletir sobre a pedagogia da problematização estimula o professor a desenvolver aulas onde o aluno esteja constantemente ativo, observando, formulando perguntas, expressando percepções e opiniões. Essa pedagogia permite que o aluno perceba problemas reais e que se esforce em entender ou encontrar os contextos ou soluções. A aprendizagem fica ligada aos aspectos significativos da realidade, desenvolvendo as habilidades intelectuais
6 de observação, análise, avaliação, compreensão, extrapolação, etc, e favorecendo a interação entre alunos, alunos-professor e professor-alunos. Os contextos da sociedade e da escola atual, dos quais nossos alunos fazem parte, exigem do professor um trabalho mais dinâmico que emane da observação de problemas e situações do cotidiano. O exercício da utilização do Arco de Maguerez pode ser uma possibilidade de alcançar uma pedagogia da problematização, privilegiando a formação de cidadãos conhecedores de sua própria realidade, críticos e autônomos na busca e solução de problemas. REFERÊNCIAS BERBEL, Neusi Aparecida Navas (org.). Metodologia da Problematização experiências com questões de ensino superior. Londrina, PR: Editora UEL, Metodologia da Problematização no Ensino Superior e sua contribuição para o plano da praxis. Semina: v.17, n. esp., p.7-17, BORDENAVE, Juan Díaz e PEREIRA, Adair Martins (2001). Estratégias de Ensino e Aprendizagem. 22 ed. Petrópolis, RJ: Vozes, BORDENAVE, Juan E. Dias. Alguns fatores pedagógicos (s.n., s.d.). Disponível em: < Último acesso em Fevereiro de CRUZ, Marília Beatriz Azevedo. O ensino de História no contexto das transições paradigmáticas da História e da Educação. In: NIKITIUK, Sônia (org.). Repensando o ensino de História. 5ª ed., São Paulo: Cortez, HENGEMÜHLE, Adelar (org.). Significar a Educação: da teoria à sala de aula. Porto Alegre: Edipucrs, Gestão de Ensino e Práticas Pedagógicas. Petrópolis, RJ: Vozes, SCHMIDT, Maria Auxiliadora e CAINELLI, Marlene. Ensinar História. SP: Scipione, SILVEIRA, Éder da Silva. História e Ensino de História: uma proposta a partir da teoria da problematização. In: VI Encontro Estadual de Ensino de História: O Ensino de História hoje: questões e possibilidades, 2009, São Gonçalo, Rio de Janeiro. Anais. Rio de Janeiro: Faculdade de Formação de Professores da UERJ, p TARDIF, C. e LESSARD, C. (orgs.) O Ofício de professor. RJ: Vozes, 2006.
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