RECURSO EXTRAORDINÁRIO Nº / RS

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1 Procuradoria Geral da República Nº 9175 RJMB / pc RECURSO EXTRAORDINÁRIO Nº / RS RELATOR : Ministro DIAS TOFFOLI RECORRENTE : Instituto Nacional de Seguro Social INSS RECORRIDO : João Elio Langhammer RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA NOS AUTOS. JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS. ÔNUS PROCESSUAL DE ELABORAÇÃO DOS CÁLCULOS DO VALOR DA CONDENAÇÃO IMPOSTO AO INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL INSS: POSSIBILIDADE. MEDIDA QUE SE PRESTIGIA OS PRINCÍPIOS QUE REGEM OS JUIZADOS ESPECIAIS, COROLÁRIOS DA GARANTIA DO JUSTO PROCESSO, DO QUAL SE EXTRAI O DIREITO FUNDAMENTAL À DURAÇÃO RAZOÁVEL DOS PROCESSOS (CF, ART. 5º, LXXVIII). 1. As questões constitucionais suscitadas no RE não foram objeto de debate e decisão no aresto recorrido, não se prestando os embargos de declaração para prequestionar matérias constitucionais que não foram arguidas nas razões do recurso inominado. Incidem as Súmulas nºs 282 e 356 do Supremo Tribunal Federal. Precedentes. 2. A violação aos princípios da legalidade, do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal, quando dependerem, para a sua constatação, da prévia interpretação de normas processuais ordinárias, caracteriza situação de violação indireta ou reflexa ao texto constitucional, não autorizando a admissão do extraordinário. Incidência, mutatis mutandis, da Súmula nº 636 do Supremo Tribunal Federal. 3. A fórmula jurisprudencial que, diante dos princípios norteadores dos juizados especiais, atribui ao Instituto Nacional do Seguro Social o ônus processual de elaborar os cálculos do valor da condenação, dado o fato de dispor dos documentos essenciais para o cálculo e ter entre suas atribuições institucionais a confecção de cálculos de benefícios previdenciários, não implica em atuação do Poder Judiciário na qualidade de legislador positivo e tampouco atenta contra os princípios da legalidade, do devido processo legal e da ampla defesa, posto que tal medida está embasada na inteligência do art. 11 da Lei /01 e no princípio constitucional do justo processo, do qual são corolários tanto a garantia de duração razoável do processo quanto os princípios da celeridade, simplicidade e economia processual, que informam o microssistema dos juizados especiais. 4. Parecer pelo não conhecimento do recurso extraordinário ou, caso conhecido, pelo seu desprovimento. Procuradoria Geral da República SAF Sul Quadra 4 Lote 3 CEP Brasília/DF

2 Trata-se de recurso extraordinário interposto pelo Instituto Nacional do Seguro Social INSS com fundamento no art. 102, III, a e b, da CF, contra o acórdão proferido pela 4ª Turma Recursal dos Juizados Especiais da Seção Judiciária do Estado do Rio Grande do Sul que condenou o INSS a converter o tempo de serviço especial em comum, com o fator de conversão de ¼, e impôs à autarquia previdenciária o ônus de elaborar os cálculos da execução. O acórdão, no que interessa, está assim fundamentado: É assente nesta 4ª Turma Recursal que não se acolhe a alegação de ausência de liquidez do julgado se a decisão contiver todos os parâmetros de liquidação necessários à apuração do valor exato mediante cálculo não complexo, como no caso. Quanto a elaboração dos cálculos de liquidação, entendo ser dever de todos os atores do processo concorrer para a celeridade, mormente no âmbito dos Juizados Especiais. Portanto, considerando as facilidades decorrentes da especialização do INSS em razão de sua missão institucional, àquele cabe a feitura dos cálculos, reservando-se a Contadoria Judicial para dirimir eventuais divergências. Os embargos de declaração opostos foram rejeitados. O recurso extraordinário, com preliminar formal e fundamentada de repercussão geral, aponta violação aos arts. 2º, 5º, caput e incisos II, LIV e LV; 22, inciso I e 37, caput, da CF, ao argumento de que o acórdão recorrido contrariou: (i) o princípio da legalidade ao criar dever processual para a parte ré/executada não previsto em lei; (ii) da separação de poderes ao inovar o rito de execução e usurpar a competência privativa da União para legislar sobre matéria processual e (iii) do contraditório e da ampla defesa ao impor à parte ré/executada a obrigação de liquidar as condenações judiciais constituídas em seu desfavor, impedindo o regular exercício das suas faculdades de defesa. Recurso tempestivo. Sem contrarrazões. O RE foi inadmitido na origem e subiu por força do provimento do agravo em que reconhecida a repercussão geral do tema constitucional em 2

3 razão de ausência de manifestações suficientes para a recursa (ARE RG, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe de tema nº 597). Em síntese, os fatos de interesse. É preciso ressaltar, inicialmente, que as questões constitucionais suscitadas no recurso extraordinário não foram objeto de debate e decisão no acórdão recorrido, não se prestando os embargos de declaração para prequestionar matéria constitucional não suscitada oportunamente nas razões do recurso inominado (RE , 1ª T., Rel. Min. Ayres Britto, DJe de ; AI AgR, 2ª T., Rel. Min. Gilmar Mendes, DJ de ). Incidem, na espécie, as Súmulas nºs 282 e 356 do Supremo Tribunal Federal. É o que se colhe do trecho da ementa do seguinte julgado: CONSTITUCIONAL. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. CONTRATO DE LOCAÇÃO DE IMÓVEL JÁ LOCADO. ARTS. 5º, LV, E 129, IX, CF/88. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. REEXAME DE FATOS E PROVAS. SÚMULA Nº 279. PRECEDENTES. 1. Os dispositivos constitucionais tidos como violados não foram prequestionados, porque não abordados pelo acórdão recorrido, e, embora suscitados nos embargos de declaração a ele opostos, não foram apontados oportunamente, na ocasião em que foram apresentadas as razões do recurso inominado. Súmulas STF 282 e 356. (AI AgR, Rel. Min. Ellen Gracie, DJe de 1º.7.10). Por outro lado, a apreciação da alegada violação aos princípios da legalidade, do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, em razão da vedação de prolação de sentenças ilíquidas e de inversão da execução perante os Juizados Especiais, não prescindiria da prévia análise de normas de caráter estritamente processual (Lei nº /01, art. 1º c/c arts. 38, parág. único e 52 da Lei nº 9.099/90 e CPC, art. 475-B). Assim, a violação ao texto constitucional somente se daria de maneira indireta ou reflexa, não autorizando a admissão do extraordinário (ARE e ARE , Rel. Min. Cármen Lúcia, DJe e , trânsito em julgado em e ). 3

4 A ausência do devido prequestionamento dos temas constitucionais e presente situação de violação indireta ou reflexa ao texto constitucional impõemse o não conhecimento do recurso extraordinário. Todavia, dado o reconhecimento da repercussão geral da questão (tema nº 597 imposição ao INSS, nos processos em que figure como parte ré, do ônus de apresentar cálculos de liquidação do seu próprio débito), passo ao exame das apontadas violações ao texto constitucional. O rito processual dos juizados especiais é orientado pelos princípios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade (Lei nº 9.099/95, art. 2º c/c art. 1º da Lei nº /2001). A própria criação dos juizados especiais teve por fim assegurar o amplo acesso ao Poder Judiciário, por meio de um microssistema que, embora mais simplificado, não retirasse do jurisdicionado a garantia constitucional do justo processo, do qual se extrai o direito fundamental à duração razoável do processo (CF, art. 5º, LXXVIII). Tendo em conta tais direitos fundamentais dos quais decorrem os princípios ordenadores do rito sumaríssimo dos juizados especiais, as turmas recursais têm editado enunciados de súmulas que admitem, excepcionalmente, a elaboração dos cálculos da condenação pela União ou pelo Instituto Nacional do Seguro Social quando estes figurem como parte ré/executada (Súmulas nºs 16 da 2ª Turma Recursal de Minas Gerais, 04 da Turma Recursal do Espírito Santo e 52 das Turmas Recursais do Rio de Janeiro). O inciso I do art. 52 c/c art. 38, parágrafo único, da Lei 9.099/95, aplicável aos juizados especiais federais por força do disposto no art. 1º da Lei nº /01, não admitem a execução de sentenças ilíquidas no âmbito dos juizados especiais. A liquidez da sentença não depende da fixação de valor certo e determinado pelo édito condenatório, bastando a indicação, de forma suficiente, dos parâmetros para eventual realização do cálculo final. Assim, a decisão que contenha os parâmetros de liquidação atende ao disposto no art. 38, parágrafo único, da Lei nº 9.099/95 (FONAJEF, Enunciado nº 32). 4

5 Contendo a sentença todos os elementos necessários para a futura quantificação, passa-se para uma fase de elaboração de cálculos, dispondo o art. 52, II, da Lei nº 9.099/95 que os cálculos de conversão de índices, de honorários, de juros e de outras parcelas serão efetuados por servidor judicial e que referidos cálculos poderão ser objeto de impugnação em caso de excesso de execução ou de erro de cálculo (art. 52, inciso IX, b e c ). É dizer, a sentença proferida no âmbito dos juizados especiais que imponha obrigação de pagar quantia certa deverá dispensar qualquer outro cálculo que não os de simples atualização a serem realizados pela contadoria judicial. Todavia, dependendo a valoração da condenação, unicamente, de meros cálculos aritméticos e, dispondo o INSS, em seu sistema informatizado, dos dados necessários para o cálculo dos valores devidos que são os mesmos utilizados para cálculo dos benefícios previdenciários concedidos administrativamente, nada impede que o juiz, em atenção aos princípios que norteiam os juizados especiais, determine que a própria autarquia previdenciária elabore os cálculos com o fim de garantir maior economia e celeridade aos processos. O art. 11 da Lei nº /01, por sua vez, autoriza ao juiz intimar a entidade pública devedora para que esta disponibilize documentação essencial para o deslinde da causa, a incluir a documentação relativa à forma de cálculo do benefício previdenciário concedido administrativamente. Logo, se pode o juiz intimar a autarquia previdenciária para apresentar os dados necessários para o correto cumprimento do julgado, com muito mais razão poderá determinar à autarquia previdenciária a confecção dos cálculos dos valores devidos à parte autora/exequente pertinentes à diferenças de benefícios previdenciários. Tal solução jurisprudencial não implica atuação, pelo Poder Judiciário, na qualidade de legislador positivo e tampouco representa ofensa aos princípios da legalidade, do contraditório e da ampla defesa, posto que embasada no rito sumaríssimo dos juizados especiais regido pelo princípios norteadores da celeridade, da simplicidade e da economia processual a que alude o art. 2º da 5

6 Lei nº 9.099/95 c/c art. 1º da Lei nº /2001 e em consonância, ainda, com a inteligência do art. 11 da Lei nº /2001. A realização dos cálculos apenas pela contadoria judicial, em face do plexo de ações judiciais intentadas perante os juizados especiais federais contra o INSS objetivando o pagamento de diferenças de benefícios previdenciários, conduz, inegavelmente, ao comprometimento da celeridade processual. Assim, a elaboração dos cálculos pelo próprio INSS atende, a um só tempo, o interesse dos juizados especiais federais, que alivia sua contadoria judicial de um pletora de cálculos, do próprio INSS, que não será compelido a pagar valores repetidos e da parte autora, que terá sua pretensão atendida de maneira mais célere. O parecer proferido na ADPF nº 219 destacou que a determinação judicial para que a União apresente os cálculos do valor devido após o trânsito em julgado dos processos em que figure como ré é medida que efetiva o princípio constitucional da duração razoável do processo, bem como os princípios da celeridade, da simplicidade e da economia processual. A manifestação ministerial está assim ementada: Arguição de descumprimento de preceito fundamental. Decisões judiciais proferidas pelos Juizados Especiais Federais da Seção Judiciária do Rio de Janeiro que determinam que a União apure, nos processos em que figure como ré, o valor devido à parte autora. O Microssistema dos Juizados Especiais é regido pelos princípios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade. Decisões em consonância com os princípios constitucionais da duração razoável do processo (art. 5º, LXXVIII, CR) e do acesso à ordem jurídica justa (art. 5º, XXXV, CR). Parecer pela improcedência da arguição. Ressalte-se que a ADPF, enquanto formula processual subsidiária do controle concentrado de constitucionalidade, precede o controle difuso, de modo que o julgamento do processo objetivo deve anteceder o julgamento do extraordinário que verse sobre idêntica controvérsia jurídico-constitucional (ADC 6

7 18-MC, Rel. Min. Menezes Direito, DJe de ), ainda que se trate de recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida nos autos. Diante de todo o exposto, opina o Ministério Público Federal pelo não conhecimento do recurso extraordinário ou, caso conhecido, pelo seu desprovimento. Brasília, 8 de agosto de Rodrigo Janot Monteiro de Barros Subprocurador-Geral da República 7