Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Décima Sexta Câmara Cível

Transcrição

1 Agravo de Instrumento nº Agravante: UBIRATAN FRANCISCO PAIVA DE OLIVEIRA Agravado: ESTADO DO RIO DE JANEIRO Relator: DES. CARLOS JOSÉ MARTINS GOMES Ementa: Agravo de instrumento. Ação de obrigação de fazer c/c anulatória de ato administrativo. Concurso Público de Admissão ao Curso de Formação de Soldado da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro. Indeferimento da antecipação de tutela. Sustentação de que embora tenha acertado mais de 50% do total das questões, foi eliminado porque obteve zero na prova de história. Prova objetiva da primeira etapa composta de 40 questões, tendo constado do item 9.4 do Edital que seria aprovado o candidato que não zerasse nenhuma das disciplinas e que obtivesse o mínimo de acerto na soma da referida prova, tendo o agravante comprovado que obteve nota total 24,00. Nada obstante, foi reprovado porque zerou a prova de história. Contudo, o feito foi instruído com pareceres técnicos de professores no sentido da existência de questões da referida disciplina fora do conteúdo programático do edital, bem como com duplicidade de respostas, restando, portanto, presente a verossimilhança da alegação. Ademais, o periculum in mora na hipótese é evidente diante do risco de perda da vaga para a qual concorre o agravante. Por outro lado, não há risco de irreversibilidade do provimento judicial, pois, vencido o agravante ao final da demanda, o mesmo será excluído do certame, podendo o agravado convocar outros candidatos. Parcial provimento do recurso, na forma do disposto no artigo 557, 1º-A, do Código de Processo Civil. D E C I S Ã O Trata-se de agravo de instrumento contra decisão proferida pelo Juízo de Direito da 7ª Vara de Fazenda Pública da Comarca da Capital-RJ, nos autos de ação de obrigação de fazer c/c declaratória de nulidade de ato administrativo, ajuizada pelo agravante em face do agravado, que indeferiu o pedido de tutela antecipada para determinar que o agravado corrija a prova de redação do agravante do Concurso Público 1

2 para Curso de Formação de Soldado da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro, e, caso obtenha a pontuação mínima de 50%, que seja o mesmo seja autorizado a prosseguir nas demais etapas do referido concurso, pois, no entendimento do Juízo a quo analisando os autos não se vislumbra a existência de prova inequívoca capaz de convencer a verossimilhança das alegações do auto. A irresignação recursal sustenta, em suma, que o edital do concurso em tela, constituído de 07 etapas, estabeleceu para a primeira etapa, ou seja, o exame intelectual, prova objetiva de 40 questões e prova de redação, sendo certo que o candidato não poderia obter nota zero em qualquer das disciplinas e deveria somar, no mínimo, 50% de acerto do total de todas as questões. Que, apesar do agravante ter obtido nota total 24,00, foi eliminado do certame porque obteve nota zero na prova de história. Contudo, foram cobradas na referida disciplina questões fora do conteúdo programático previsto no edital, bem como algumas questões tinham mais de uma resposta correta, de modo que devem ser anuladas. Que o problema em tela foi verificado por renomados professores, ou seja, os professores Fernando Bezerra Muller Lopes, Luander do Valle Barros e o professor e deputado Chico Alencar, conforme pareceres técnicos que constam dos autos, os quais apontaram tais falhas, em relação à prova amarela da qual participou o agravante, nas questões 21, 23 e 25. Assim, presentes os requisitos legais para o deferimento da antecipação de tutela. É o relatório. Passo a decidir. De acordo com o disposto no artigo 273 do Código de Processo Civil o juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar total ou parcialmente os efeitos da tutela pretendida, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação. Adverte o Professor Luiz Guilherme Marinoni: A tutela antecipatória pode ser concedida no curso do processo de conhecimento, constituindo verdadeira arma contra os males que podem ser acarretados pelo tempo do processo, sendo viável não apenas para evitar um dano irreparável ou de difícil reparação (art. 273, I, do CPC), mas também para que o tempo do processo seja distribuído entre as partes litigantes na proporção da evidência do direito do autor e da fragilidade da defesa do réu (art. 273, II e 6º, do CPC) (Manual do Processo de Conhecimento, 5ª edição, Ed. Revista dos Tribunais, pág. 203). 2

3 Cabe ainda anotar que apesar dos atos administrativos gozarem dos atributos de presunção de legalidade, legitimidade e veracidade, é certo também que tal presunção não é absoluta e intocável, mas juris tantum, podendo, assim, ceder à prova em contrário, já que tais atos também devem respeitar os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Ademais, apesar de não ser da competência do Poder Judiciário analisar as questões inerentes ao mérito administrativo que se situa no âmbito da discricionariedade do Administrador Público, é certo que ao Poder Judiciário é permitida a verificação da legalidade e da legitimidade da conduta estatal. Não se olvide que, segundo entendimento consolidado no Enunciado nº 60 da Súmula da Jurisprudência desta Corte, é admissível a antecipação de tutela de mérito, mesmo contra a fazenda pública, desde que presentes os seus pressupostos. No caso em tela, a prova objetiva da primeira etapa foi de 40 questões, tendo constado do item 9.4 do Edital que seria aprovado o candidato que não zerasse nenhuma das disciplinas e que obtivesse o mínimo de acerto na soma da referida prova, tendo o agravante comprovado que obteve nota total 24,00. Nada obstante, foi reprovado porque zerou a prova de história. Contudo, o feito foi instruído com pareceres técnicos de professores no sentido da existência de questões da referida disciplina fora do conteúdo programático do edital, bem como com duplicidade de respostas. A questão não é nova nesta Câmara, já tendo sido asseverado, por ocasião do julgamento do agravo de instrumento de nº , da relatoria do eminente Desembargador Marco Aurélio Bezerra de Melo, que existe notória e grande controvérsia trazida ao Poder Judiciário a respeito de três questões elaboradas pela banca referentes à Batalha do Jenipapo e à Revolução de Avis como se pode inferir da matéria jornalística disponível em (acessado em 19/03/15), pelo que a anulação de ao menos uma delas já determinaria a revisão da eliminação do agravado no certame. 3

4 Ademais, o periculum in mora na hipótese é evidente diante do risco de perda da vaga para a qual concorre o agravante. Por outro lado, não há risco de irreversibilidade do provimento judicial, pois, vencido o agravante ao final da demanda, o mesmo será excluído do certame, podendo o agravado convocar outros candidatos. Neste sentido: AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONCURSO PÚBLICO. PRETENSÃO DE ANULAÇÃO DE QUESTÕES DE HISTÓRIA DO CONCURSO DE FORMAÇÃO DE SOLDADOS DA POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO CFSd DECISÃO DE INDEFERIMENTO DA ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. INCONFORMISMO MANIFESTADO PELO AUTOR. IMPOSSIBILIDADE DE CONHECIMENTO EX OFFICIO PELO ÓRGÃO JULGADOR DO DESCUMPRIMENTO DO ART. 526, DO CPC. RESP /PR, MIN LUIZ FUX, SOB O RITO DO ART. 543-C, DO CPC. DOCUMENTOS ACOSTADOS AOS AUTOS QUE ENSEJAM O RECONHECIMENTO DA PRESENÇA DE PROVA INEQUÍVOCA DA VEROSSIMILHANÇA DAS ALEGAÇÕES NOS AUTOS, PELO QUE O AUTOR TERIA SUA ELIMINAÇÃO REVISTA EM CASO DE ANULAÇÃO DE AO MENOS UMA DAS TRÊS QUESTÕES AMPLAMENTE DISCUTIDAS EM DIVERSAS AÇÕES EM CURSO, RESGUARDANDO-SE A POSSIBILIDADE DE O JUDICIÁRIO EXERCER O CONTROLE DE LEGALIDADE DO ATO ADMINISTRATIVO, ANULAR QUESTÕES DE CONCURSO PÚBLICO. PRECEDENTE. DESTA FEITA, INEQUÍVOCA A PRESENÇA DO FUMUS BONI JURIS NA QUESTÃO. RISCO DE DANO IRREPARÁVEL QUE ADVÉM DA POSSIBILIDADE DE CONCLUSÃO DO CERTAME, COM HOMOLOGAÇÃO DE RESULTADO, A ESVAZIAR O OBJETO DA AÇÃO E O PRÓPRIO DIREITO DO AUTOR. POR OUTRO LADO, A DETERMINAÇÃO DE CORREÇÃO DA PROVA DE REDAÇÃO E DE MANUTENÇÃO DO AUTOR NO CERTAME SALVO EM CASO DE REPROVAÇÃO EM ETAPA SUPERVENIENTE, VEDANDO-SE POR ÓBVIO A NOMEAÇÃO E POSSE ATÉ O ENCERRAMENTO DO PROCESSO ORIGINÁRIO, GERA ESFORÇO MÍNIMO PARA O ENTE ESTATAL E NENHUM RISCO DE DANO INVERSO, NA FORMA DO ART. 273, 2º, DO CPC. PRECEDENTE DESTE E. TRIBUNAL. DECISÃO REFORMADA. RECURSO PROVIDO, NA FORMA AUTORIZADA PELO ART. 557, 1º-A, DO CPC. (Agravo de instrumento nº , Rel. Des. MARCO 4

5 AURELIO BEZERRA DE MELO - Julgamento: 30/04/ DECIMA SEXTA CAMARA CIVEL). AGRAVO DE INSTRUMENTO. ORDINÁRIA. CONCURSO PÚBLICO PARA SOLDADO DA POLÍCIA MILITAR. ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA. INDEFERIMENTO. PRETENSÃO DE ANULAÇÃO DE QUESTÕES DAS PROVAS OBJETIVAS DE HISTÓRIA E PORTUGUÊS, SOB A ALEGAÇÃO DE ESTAREM EM DESCONFORMIDADE COM O CONTEÚDO DO EDITAL OU ADMITIREM DUPLICIDADE DE RESPOSTAS. CANDIDATO QUE NÃO OBTEVE O NÚMERO MÍNIMO DE ACERTOS. PRESENÇA, A PRIORI, DOS REQUISITOS AUTORIZADORES DA MEDIDA, HAVENDO VEROSSIMILHANÇA NAS ALEGAÇÕES E POSSIBILIDADE DE DANO IRREPARÁVEL AO RECORRENTE. PROSSEGUIMENTO NAS DEMAIS ETAPAS DO CERTAME QUE NÃO SE TRADUZ EM INVASÃO NO MÉRITO ADMINISTRATIVO. NECESSIDADE DA CONVENIENTE INSTRUÇÃO DO FEITO, COM VISTAS A ADEQUADA PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (Agravo de instrumento nº , Rel. Des. MAURO DICKSTEIN - Julgamento: 03/03/ DECIMA SEXTA CAMARA CIVEL). AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA. CONCURSO PÚBLICO PARA SOLDADO DA POLÍCIA MILITAR. DECISÃO QUE DEFERE A ANTECIPAÇÃO DE TUTELA REQUERIDA. IRRESIGNAÇÃO DO RÉU. A decisão atacada determinou que, caso o autor, com os pontos das questões 22 e 25 da prova amarela, fique classificado dentro do limite de cinco vezes o número de vagas oferecidas, nos termos do edital, que a sua prova de redação seja corrigida e, caso seja aprovado nela, lhe seja assegurada a participação nas demais etapas do concurso, ficando excluída a nomeação e posse. As tutelas de urgência se prestam a conceder efetividade ao processo, sendo certo que a tutela antecipada, fundada em um juízo de cognição sumária, depende da demonstração cumulativa de prova da probabilidade do direito alegado e do risco de dano de difícil reparação ou irreparável, e a ocorrência de requisito negativo, fundado no perigo de irreversibilidade absoluta do provimento. Verificam-se os pressupostos que autorizam a medida antecipatória pleiteada. As alegações de irregularidade das questões 22 e 25 gozam de verossimilhança, ao analisar-se o conteúdo programático da prova de história. Ainda que tal fato deva ser melhor apurado durante o processo, isso não impede a 5

6 concessão da tutela de urgência, já que a mesma não traz prejuízo aos réus e pode ser revogada a qualquer tempo. Ademais, o indeferimento do pleito provavelmente acarretaria dano irreparável ao autor no caso de eventual anulação das questões ao final do processo, pois ele estaria aprovado na etapa da prova objetiva, mas a sua redação não teria sido corrigida, o que tornaria inócuo o provimento jurisdicional. Decisão recorrida que não se afigura teratológica, contrária à lei ou à evidente prova dos autos e, nos termos do verbete sumular nº 59 deste Egrégio Tribunal de Justiça, não merecendo reparos. RECURSO QUE SE CONHECE E AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO, na forma do artigo 557, caput, do Código de Processo Civil. (Agravo de instrumento nº , Rel. Des. CEZAR AUGUSTO R. COSTA - Julgamento: 13/03/ OITAVA CAMARA CIVEL). Cabe ressaltar que, para a correção da prova de redação, o agravante deve ficar classificado dentre do limite de cinco vezes o número de vagas oferecidas, conforme previsto no item 9.3, letra a, do Edital do certame. Diante do acima expendido, com fulcro no artigo 557, 1º-A, do Código de Processo Civil, dou parcial provimento ao recurso para deferir a antecipação de tutela para determinar a permanência do agravante no certame em tela e, caso fique classificado dentro do limite de cinco vezes o número de vagas oferecidas, sua prova de redação seja corrigida e, evidentemente, sendo aprovado, que lhe seja assegurada a participação nas demais etapas. Oficie-se ao Juízo a quo para o cumprimento, remetendo-se cópia desta decisão. Rio de Janeiro, 28 de agosto de CARLOS JOSÉ MARTINS GOMES Desembargador Relator 6