A GIRAFA E O MEDE-PALMO: CONSTRUINDO SABERES
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1 A GIRAFA E O MEDE-PALMO: CONSTRUINDO SABERES Ma Juliane Dias Guillen SME- São Carlos julianeguillen@gmail.com Ma Wuendy Fernanda Cardilli SME - São Carlos wuendy.nanda@gmail.com Resumo: A partir da leitura do livro A girafa e o mede-palmo foi desenvolvido um projeto de letramento, cujo objetivo era abordar de forma interdisciplinar o letramento matemático e as áreas do conhecimento a partir do uso de instrumentos de medidas não convencionais e comparação de medidas de comprimento, aliadas também às experiências de leitura e escrita. A leitura constituiu assim a atividade-elo deste projeto integrador. Compreender a interdisciplinaridade como a articulação entre as disciplinas sem a fragmentação excessiva do conhecimento é uma tarefa difícil no cotidiano escolar, portanto a realização desta proposta pedagógica apresentou-se relevante para as professoras e alunos. A construção do saber matemático sobre unidades de medidas e a importância de sua padronização revelou a compreensão da matemática enquanto prática social. Palavras-chave: interdisciplinaridade; matemática; letramento; prática social. 1. Introdução A interdisciplinaridade é um termo frequente nos documentos oficiais e já se tornou uma prática comum no cotidiano de muito professores. No entanto, para não comprometer seu propósito real, é importante observar os desdobramentos metodológicos que implicam sua prática. O presente trabalho pretende provocar reflexões a partir da prática docente, observando a construção de saberes em conjunto com os alunos em processo de alfabetização, evidenciando a necessidade de trabalhar teoria e prática de forma articulada. Na educação básica, a interdisciplinaridade apresenta-se como um dos caminhos eficazes para o ensino, o qual pressupõe a articulação das áreas do saber. 1
2 Desta forma, a leitura do livro A girafa e o mede-palmo apresentou um grande potencial para o trabalho interdisciplinar. Além de motivar diversos questionamentos por parte dos alunos, nos levou a ampliar as possibilidades do trabalho em sala de aula construindo os saberes de forma articulada. O livro A girafa e o mede-palmo de Luciana Pimentel Goes, (2010, ed Atica) conta a história da Girafa Benedita que fica presa em uma árvore e pede ajuda a uma lagarta, um pequeno mede-palmo, para soltá-la. Com essa história introduzimos o uso de instrumentos de medidas não convencionais e comparação de medidas de comprimento. Desde as civilizações mais antigas, o homem sentiu a necessidade de medir coisas e teve que descobrir meios para realizar as medições. Boyer (1996) define que as primeiras unidades de medidas utilizadas pelo homem foram baseadas em partes do seu próprio corpo como o comprimento do pé, da palma, do passo, da braça entre outras. Entretanto, essas maneiras de medir não eram precisas e se diferenciavam de indivíduo para indivíduo, causando confusões e dificuldades na comunicação. Em consonância a estas palavras, a proposta inicial deste projeto de letramento era reconstruir com os alunos a história dos instrumentos de medidas, partindo das possibilidades com o próprio corpo e problematizando as diferenças. Todavia, a prática possibilitou outros desdobramentos e articulação entre os saberes. Com a constante preocupação em inserir os alunos em práticas de letramento significativas, nós, professores, precisamos romper as barreiras das salas de aula e buscar parcerias para o ensino. Os desdobramentos dos conteúdos e a articulação dos saberes do trabalho interdisciplinar permite inserir os alunos em práticas sociais legítimas de leitura e escrita. Expandir o olhar para além da sala de aula pressupõe também romper com as barreiras dos conteúdos, com as delimitações das áreas de ensino, sendo assim necessário construir diálogos interdisciplinares. Este projeto de letramento foi realizado entre duas salas de alfabetização do 1º ano do Ensino Fundamental, de duas escolas distantes do mesmo Município, cujo objetivo principal era abordar de forma interdisciplinar o letramento matemático e as áreas do conhecimento, 2
3 considerando assim a matemática e a linguagens enquanto práticas sociais, pois fazem parte do cotidiano dos alunos. 2. Revisão Bibliográfica Falar sobre interdisciplinaridade parece ser mais simples do que incorporar o conceito nas práticas de sala de aula. Considerar o todo das áreas de conhecimento sem buscar a fragmentação excessiva e, por outro lado, aprofundar esse conhecimento em suas especificidades tem sido uma tarefa complexa para o professor. (BRASIL. Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa Caderno 3 Interdisciplinaridade no Ciclo de Alfabetização, 2015, p. 7 e 9). Uma das formas para abordar a interdisciplinaridade está relacionada com a leitura, de acordo com Kleiman e Moraes (2009), a leitura pode ser considerada a atividade-elo na interdisciplinaridade. A leitura é a atividade-elo que transforma os projetos de um professor em projetos interdisciplinares: parte-se da ótica do especialista historiador, geógrafo, biólogo para instaurar um espaço comum a todos, o da leitura (KLEIMAN; MORAES, 2009, p. 23). De acordo com Martins, Kleiman define os projetos de letramento como um conjunto de atividades genuínas e significativas cuja realização envolve a utilização da escrita, com objetivos que não se centram na sua aprendizagem de forma direta. Os projetos de letramento estão voltados para questões sociais mais amplas em que a escrita se insere e passa a ser aprendida ou apropriada com a participação efetiva da comunidade escolar. (MARTINS, 2012, p. 111) A própria narrativa A girafa e o mede-palmo traz diversos animais, em especial a lagarta mede-palmo que muitos alunos não conheciam e possibilitou a pesquisa e debate sobre estes animais. Nesta etapa do projeto, priorizamos o trabalho com os gêneros textuais em consonância à pesquisa científica e aos conceitos matemáticos. A articulação entre as áreas do conhecimento instaurada surgiu a partir da leitura, que configurou a atividade-elo deste projeto de letramento. A este propósito, a interdisciplinaridade É uma proposta que exige interação entre duas ou mais disciplinas, o que resultará em intercomunicação e enriquecimento recíproco e, 3
4 consequentemente, em uma transformação das metodologias de pesquisa, em uma modificação de conceitos, de terminologias fundamentais etc. entre as diferentes matérias ocorrem intercâmbios mútuos e recíprocas integrações; exige um equilíbrio de forças nas relações estabelecidas. (SANTOMÉ, 1998, p. 63). 3. Metodologia Para a realização desta proposta pedagógica, iniciamos a aula com a leitura do livro A girafa e o mede-palmo., após a leitura, foi realizada uma roda de conversa sobre a lagarta mede-palmo, suas características físicas, locomoção, habitat. Cada aluno confeccionou sua lagarta com a medida do palmo de sua mão (Figura 1) com o objetivo de comparar as unidades de medida como as civilizações antigas. Figura 1: Confecção da lagarta com a medida do palmo Terminada a confecção da medida do palmo, foi realizada a medição de diferentes objetos da sala de aula, cada aluno com a sua lagarta enquanto instrumento de medida. (Figura 2). 4
5 Figura 2: Medição de diferentes objetos Após esta primeira etapa, realizada de forma lúdica e concreta, conversamos sobre o tamanho dos objetos que mediram e levantamos hipóteses sobre todos terem chegado à mesma medida ou não. Os alunos concluíram que apesar de terem realizado medições em objetos de tamanho iguais, eles não haviam chegado ao mesmo resultado, pois cada palmo é de um tamanho e que precisavam de um instrumento que fosse padronizado para todos. Num segundo momento, retomamos oralmente as discussões sobre o que havíamos realizado e iniciamos a conversa perguntando aos alunos se eles conheciam algum instrumento de medida que poderiam usar. Os alunos sugeriram a régua e a fita métrica. Mais uma vez fizemos medições com a régua e a fita métrica e eles chegaram à conclusão de que para alguns objetos a régua não dava conta, mas ao utilizar a fita métrica seria mais fácil. Conversamos também a respeito de outros instrumentos de medidas como a trena, presentes em seu cotidiano a partir do relato sobre as profissões dos familiares. A valorização deste conhecimento prévio dos alunos revela a importância da matemática enquanto prática social. Após a conversa, medimos a altura dos alunos com a fita métrica e com isso pudemos classificar os alunos em ordem crescente e decrescente. (Figura 3) 5
6 Figura 3: Medição dos alunos com a fita métrica Considerando os desdobramentos da história e das diferentes áreas do conhecimento, relemos a história do livro a Girafa e Mede-palmo e escolhemos cinco animais do texto para escrever a ficha técnica. Para esta atividade, lemos alguns textos informativos e curiosidades dos animais escolhidos, selecionamos algumas informações para escrever a ficha técnica e refletimos sobre as características deste gênero textual. Outro enfoque foi dado também à relação entre texto oral e texto escrito, mesmo quando o professor assume o papel de escriba dos alunos, as características linguísticas e discursivas da modalidade textual devem ser respeitadas. Inserir os alunos em processo de alfabetização em momentos de escrita de texto é oferecer a oportunidade de refletirem sobre a língua, compreendendo as características próprias da enunciação, articulação esta possível a partir do projeto de letramento. Por fim, encerramos o nosso trabalho com a atividade extraclasse de visita ao Parque Ecológico de São Carlos para conhecer melhor alguns dos animais escolhidos e outros. 4. Resultados Os resultados deste projeto puderam ser observados através da avaliação contínua durante o desenvolvimento do trabalho pedagógico. Por tratar-se de uma prática de cunho qualitativo, o que pressupõe a qualidade dos dados observados e não a quantidade, consideramos a proposta relevante, pois incide de forma significativa no processo de ensinoaprendizagem, possibilitando a articulação dos saberes através da prática interdisciplinar aliada ao projeto de letramento. 6
7 Uma das considerações positivas em relação ao aprendizado dos alunos foi a compreensão do sistema de medidas, dos instrumentos utilizados e da conclusão coletiva da necessidade de instrumentos e medidas padronizadas. A leitura e escrita baseadas na circulação por diversos gêneros textuais também revela resultados positivos evidenciados através da escrita das fichas técnicas dos animais e a leitura de textos informativos, que estabelecem ainda a articulação entre as disciplinas e a compreensão enunciativa da linguagem. Por fim, uma atividade que partiu da leitura de um livro caracterizou-se como um projeto cuja leitura foi o elo integrador e permitiu a integração entre as diversas áreas do conhecimento, além de incentivar o prazer da leitura e ludicidade e significação dos sujeitos. 5. Considerações Finais A matemática, assim como a linguagem é uma prática social, uma forma de interação do sujeito com o mundo. O aluno utiliza a matemática em seu cotidiano, portanto, este conhecimento prévio deve ser resgatado e sua articulação com o conhecimento escolar é necessária para significar a matemática em sala de aula. De acordo com o material do PNAIC (BRASIL. Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa Caderno 6 Grandezas e Medidas, 2014), o sujeito para ser letrado matematicamente deve ser capaz de compreender a intenção dos textos que circulam socialmente, dessa forma a alfabetização Matemática é entendida como um instrumento para a leitura do mundo. Esta compreensão de mundo é aliada à interdisciplinaridade. O ensino da leitura, escrita, da oralidade e de outras linguagens pode desfazer os muros que separam as áreas do conhecimento e construir as pontes necessárias ao diálogo que favoreça a produção de sentidos para o conhecimento escolar, articulando os saberes às práticas sociais e culturais das crianças. Portanto, é por meio da linguagem que significamos o mundo e somos por ele significados. ((BRASIL. Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa Caderno 3 Interdisciplinaridade no Ciclo de Alfabetização, 2015). A interação e interdisciplinaridade analisadas neste trabalho constituem apenas uma das faces do projeto de letramento na alfabetização, pois a realidade é muito mais ampla e 7
8 complexa, as singularidades da sala de aula refletem nossas experiências e compreensões sobre o ensino. 6. Referências BOYER, C. B. História da matemática. Tradução: Elza F. Gomide. São Paulo: Ed. Edgard, 1996 BRASIL. Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa Caderno 6 Grandezas e Medidas. Brasília, MEC/SEB, 2014f. 80 p. Disponível em: Último. Último acesso em: 15 jan BRASIL. Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa Caderno 3 Interdisciplinaridade no Ciclo de Alfabetização. Brasília, MEC/SEB, 2015f. 116 p. Disponível em: Último acesso em: 21 jan KLEIMAN, Ângela; MORAES, Silvia. Leitura e interdisciplinaridade: tecendo redes nos projetos da escola. In: KLEIMAN, Ângela; MORAES, Silvia (Orgs.). Leitura e interdisciplinaridade: tecendo redes nos projetos da escola. São Paulo: Mercado das Letras, MARTINS, Maria Sílvia Cintra. Letramento, interdisciplinaridade e multiculturalismo no ensino fundamental de nove anos. Campinas, SP: Mercado das Letras, (Coleção Gêneros e Formação). SANTOMÉ, Jurjo Tores. Globalização e interdisciplinaridade: o currículo integrado. Porto Alegre: Artes Médicas,
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