X Encontro Nacional de Educação Matemática Educação Matemática, Cultura e Diversidade Salvador BA, 7 a 9 de Julho de 2010
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- Martín de Barros
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1 UMA EXPERIÊNCIA DE ENSINO E APRENDIZAGEM DE GEOMETRIA ESFÉRICA COM A UTILIZAÇÃO DE MATERIAIS MANIPULÁVEIS Wilton Carneiro de Souza Universidade Federal de Mato Grosso - UFMT wilton.desouza@gmail.com Igor Ferreira Ribeiro Universidade Federal de Mato Grosso - UFMT igor1207@gmail.com Luzia Aparecida Palaro Universidade Federal de Mato Grosso - UFMT luziaapalaro@terra.com.br Resumo: O presente artigo relata uma experiência de estudo sobre geometria esférica desenvolvido com um grupo de alunos do ensino médio de uma escola pública de Cuiabá, Mato Grosso. Caracteriza uma das ações desenvolvidas, no segundo semestre de 2009, pelo Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID), ação, que teve como objetivo o estudo e a divulgação, por meio de uma oficina, de conceitos básicos de Geometria Esférica tema pouco conhecido e explorado no ensino médio. Ao término do trabalho foi possível perceber que, apesar da deficiência dos alunos, referente aos conceitos básicos da geometria euclidiana, os alunos envolvidos na ação, participaram do estudo, desenvolvendo e discutindo as atividades propostas, demonstrando interesse pelo que, para eles, era novo. Palavras-chave: Geometria esférica; Geometria plana; Experiência de ensino e aprendizagem. INTRODUÇÃO O Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID) da CAPES, iniciado em dezembro de 2008 e que se encontra em pleno desenvolvimento, tem como um de seus objetivos: [...] promover a articulação integrada da educação superior do sistema federal com a educação básica do sistema público, em proveito de uma sólida formação docente inicial; elevar a qualidade das ações acadêmicas voltadas à formação inicial de professores nos cursos de licenciaturas das instituições federais de educação superior. (CAPES, 2009) Foi por meio desse Programa que em 2009/2 pode-se realizar na Escola Estadual André Avelino Ribeiro, no município de Cuiabá/MT, uma oficina de estudo sobre Anais do 1
2 Geometria Esférica, oferecida a alguns alunos do ensino médio que se interessaram pelo tema. Um dos objetivos da oficina foi o de propiciar aos bolsistas PIBID-Matemática a oportunidade de aprimorar seus conhecimentos sobre geometrias não-euclidianas e de buscar, experimentar e avaliar estratégias para o ensino de noções básicas da geometria esférica, bem como divulgar os conceitos de geometria esférica a alunos do ensino médio, para que os mesmos tomassem conhecimento de outras geometrias, que não a euclidiana, e tivessem a oportunidade de construir alguns conceitos básicos da geometria esférica, comparando-os a conceitos da geometria euclidiana, discutindo algumas aplicações. A idéia de desenvolver este trabalho veio de um estudo preliminar sobre geometrias não-euclidianas realizado na disciplina de história e filosofia da matemática, do curso de Licenciatura em Matemática da UFMT/Cuiabá e do conhecimento que em 2006, a Secretaria do Estado da Educação do Estado do Paraná havia divulgado as Diretrizes Curriculares da Rede Pública de Educação Básica, e que nestas há a indicação da abordagem de noções básicas de geometrias não-euclidianas no Ensino Médio. Juntando a idéia já bem difundida de que o ensino da Matemática deveria possibilitar aos estudantes análises, discussões, conjecturas, apropriação de conceitos e formulações de idéias, o grupo de bolsistas PIBID/Matemática sentiu-se desafiado a estudar e desenvolver uma seqüência de atividades de ensino para divulgar noções básicas de geometria esférica a alunos do ensino médio. DESCRIÇÃO DO TRABALHO Fase de preparação Decididos a oferecer a oficina sobre geometria esférica a alunos do ensino médio, os bolsistas PIBID/Matemática se concentraram no estudo da história das geometrias euclidianas e não-euclidianas, tendo como base Boyer (1974), Eves (1992), Coutinho (2001) e Tomei (2003), além de alguns artigos disponíveis na internet; no estudo de trabalhos de pesquisa que abordam o ensino e a aprendizagem de geometria esférica de Marqueze (2006), Pataki (2003) e Prestes (2006) e no estudo de obras matemáticas que apresentam o conteúdo já sistematizado como, por exemplo, Garth e Lockwood (1995), e Greenberg (1999). Esses estudos caracterizaram um período extenso e de intensa discussão e eram apresentados em seminários periodicamente. Anais do 2
3 A fase de planejamento da oficina foi divida em três frentes: a preparação para a apresentação e discussão sobre a história das geometrias euclidiana e não-euclidianas; a elaboração da seqüência de atividades adequadas que propiciassem aos alunos do ensino médio a construção de conceitos básicos de geometria esférica bem como a elaboração, confecção e teste de materiais didáticos a serem utilizados ao longo da oficina; e o estudo de como sistematizar os conceitos construídos. O grande desafio para os bolsistas era o fato de que teriam que trabalhar ao longo da oficina concomitantemente a história, as atividades que levariam à construção dos conceitos pretendidos e a sistematização dos mesmos numa linguagem matemática apropriada aos estudantes do curso (cursistas). Desenvolvimento da oficina Levando em consideração que o grande desafio era propiciar aos alunos uma seqüência de atividades que com o uso de materiais manipuláveis permitissem a construção dos conceitos básicos da geometria esférica, julgamos por bem que os alunos se agrupassem por afinidade e trabalhassem em duplas, tendo a liberdade de trocar idéias com os demais, pois reconhecemos que com discussões e debates a aprendizagem torna-se mais significativa e através destes, poderíamos ter indícios do entendimento ou não do aluno sobre o assunto em estudo, o que nos permitiria a identificação das deficiências de conteúdo dos mesmos. A metodologia utilizada no desenvolvimento da oficina foi a de resolução de problemas, tendo por base uma seqüência de atividades, por se acreditar que possibilitaria a construção de conceitos básicos da geometria esférica, concomitantemente com apresentações e discussões sobre tópicos da história das geometrias, seguidos de uma sistematização matemática dos conceitos elaborados. A seqüência de atividades elaborada e trabalhada ao longo da oficina e que serviu de norte para as discussões dos conceitos básicos da geometria esférica é composta pelas seis atividades apresentadas abaixo: Atividade 1 Certo dia, um caçador de ursos saiu de sua casa e caminhou 100 km para o sul. Depois virou para oeste e caminhou mais 100 km. Então virou novamente e caminhou mais 100 km para o norte. Qual não foi sua surpresa ao perceber que voltara à sua casa. Anais do 3
4 a) Em uma folha de papel em branco, tente representar por meio de um desenho o caminho que o caçador percorreu. b) Pelo desenho que você fez, a partir dos dados do problema, o caçador voltou ao ponto de partida? Justifique sua resposta. c) Em uma bola de isopor, tente representar por meio de um desenho o caminho que o caçador percorreu. É possível que ele volte ao ponto de partida? Atividade 2 a) Represente um ponto no plano. b) Represente um ponto na superfície esférica. c) Quais suas observações sobre os itens a) e b)? d) Marque dois pontos distintos na superfície plana. Qual é a menor distância entre eles? e) Marque dois pontos distintos em uma superfície esférica. Qual é menor distância entre esse dois pontos? Atividade 3 a) Represente uma reta em uma superfície plana. Trace uma reta paralela a essa reta que você acabou de traçar. b) Represente uma reta (geodésica) na superfície esférica. Represente uma geodésica paralela a essa que você traçou. c) A respeito dos itens a) e b) o que podemos concluir? Atividade 4 a) Represente dois pontos distintos em um plano. Quantas retas podemos traçar de maneira que contenham os dois pontos ao mesmo tempo? b) Represente, agora, dois pontos distintos em uma superfície esférica. Quantas retas (geodésica) podemos traçar de maneira que passem, ao mesmo tempo, pelos dois pontos marcados? c) E se esse dois pontos marcados na superfície esfera fossem nos pólos da mesma, quantas retas passariam por eles? Anais do 4
5 Atividade 5 a) Na superfície esférica, marque três pontos distintos, tais que dois a dois pertençam a uma mesma circunferência máxima (geodésica). Ligue esses pontos. b) Descreva a figura encontrada no item anterior. Que nome você daria a essa figura? Ela se assemelha a alguma figura da Geometria plana? Atividade 6 a) Construa um triângulo qualquer em uma superfície plana. Qual é a soma dos ângulos internos desse triângulo? b) Construa um triângulo qualquer em uma superfície esférica. Qual a soma dos ângulos internos desse triângulo? c) Todos encontraram o mesmo valor como resposta ao item b)? d) Quais são suas observações levando em consideração os resultados obtidos nessa atividade? Considerações sobre o desenvolvimento das atividades A oficina iniciou com uma apresentação e discussão sobre a história das geometrias euclidiana e não-euclidianas, para que os alunos percebessem que o conteúdo matemática que iriam estudar não era criação de uma única mente, mas ao contrário era fruto de esforços de muitas mentes brilhantes, que existiram ao longo de muitos séculos, impulsionadas pelos mais variados problemas e necessidades. Pode-se falar de Euclides e sua obra os Elementos, o que gerou a necessidade de se explicar o significado dos termos axioma, postulado, teorema, prova matemática, dentre outros, exemplificando-os. Os alunos ficaram impressionados em saber, que as bases da geometria, que eles estudam nas escolas, ainda hoje, surgiu há cerca de vinte e três séculos atrás. Os alunos tentaram explicar o significado de cada um dos cinco postulados de Euclides, mas não deram conta do quinto. Isso foi interessante, pois deu gancho para que se discutissem as tentativas de vários matemáticos, ao longo de aproximadamente dois mil anos, de deduzi-lo dos demais postulados, como se fosse um teorema e, que estes esforços é que foram mola propulsora para o desenvolvimento de outras geometrias, como, por exemplo, a hiperbólica conhecida como geometria de Lobachevsky - e a elíptica ou de Riemann, sendo a esférica uma especificidade da última. Anais do 5
6 Algumas situações problemas, envolvendo navegação e aviação, levaram os alunos a discutirem a necessidade de outra geometria, que não fosse plana. Foi, então, que se iniciou o trabalho de aplicação das seis atividades da seqüência de atividades elaborada, objetivando desenvolver conceitos básicos de Geometria Esférica. Na atividade 1 proposta, a primeira dificuldade apresentada por alguns alunos era em relação às coordenadas geográficas (norte, sul, leste e oeste), o que levou à necessidade de uma explanação sobre. Ao tentarem representar o percurso do caçador no papel, diziam que não era possível e alguns alegavam que o enunciado do problema é que estava errado. Por fim chegaram ao consenso, mesmo sem uma justificativa, de que era impossível tal representação no papel. Quando receberam a esfera, fizeram várias tentativas, trocaram idéias e concluíram que na superfície esfera, diferentemente da superfície plana, é possível representar o percurso do caçador. Na atividade 2, os alunos perceberam com facilidade que a menor distância entre dois pontos, em uma superfície plana, é um segmento de reta. No entanto, só foi através de discussões e debates entre alunos, professores (bolsistas do PIBID/Matemática) que pode ser sustentada a afirmação que a menor distância entre dois pontos, em uma superfície esférica, é um arco. Para tal, houve necessidade por parte dos professores, de explicação anterior sobre a diferença entre reta e segmento de reta na geometria plana e também a diferença de segmento de reta e arco. A atividade 3, não foi fácil para os alunos, pois estes não sabiam, o que de fato representava uma reta (geodésica) na superfície esférica. Após um tempo destinado aos mesmos para que respondessem às perguntas formuladas na atividade, manipulando a bola de isopor e na discussão com os colegas, os professores interferiram, diferenciando o significado de reta na superfície plana e reta (geodésica) na superfície esférica. Mas, para tal, houve necessidade de uma explanação, com a utilização de um globo, dos conceitos de paralelos, meridianos e linha do equador. Após terem entendido, a noção de geodésica, os professores puderam formalizar tal conceito e os alunos voltaram à discussão das perguntas, inferindo que na geometria esférica não existe retas paralelas. Aproveitando a inferência, os professores apresentaram novamente o quinto postulado de Euclides, as impossibilidades de sua utilização na geometria esférica, retomando o surgimento da geometria esférica, na história da matemática. Anais do 6
7 Para responderem à atividade 4, foram necessárias muitas tentativas na bola de isopor, muita discussão entre eles e muitos questionamentos feitos pelos professores, o que levou um tempo razoável. Mas, acabaram compreendendo que dois pontos distintos do plano, determinam uma e uma única reta e que na superfície esférica, se os dois pontos distintos forem os pólos da esfera, eles vão determinar infinitas retas (geodésicas). Pode-se constatar a fundamental importância do material manipulável para a compreensão e percepção desses conceitos. A atividade 5, teve como objetivo levar os alunos a perceberem a existência de triângulos em uma superfície esférica e eles não demonstraram dificuldade na atividade e aceitaram o fato sem estranheza. Com a atividade 6, pretendia-se que os alunos percebessem a diferença entre triângulo esférico e triângulo plano. No entanto, percebeu-se que os alunos não sabiam utilizar transferidor para medir os ângulos internos dos triângulos desenhados, nem dominavam conceitos básicos da geometria plana necessários para o desenvolvimento da atividade e os professores tiveram que retomar conceitos tais como classificação de triângulos quanto aos lados e ângulos, Teorema de Pitágoras e soma dos ângulos internos de um triângulo. Depois de indagados e provocados a tentarem desenvolver a atividade, os alunos fizeram vários experimentos nas bolas de isopor, discutiram seus resultados com os colegas e chegaram à conclusão de que no triângulo esférico a soma dos ângulos internos é maior do que 180º. Depois do desenvolvimento das atividades, foi feita uma síntese no quadro, com a ajuda dos alunos, sobre as diferenças percebidas entre a geometria plana e a geometria esférica. CONSIDERAÇÕES FINAIS A fase de preparação da oficina foi de intenso trabalho, pois foi necessário estudar a história da geometria euclidiana e das geometrias não-euclidiana, o conteúdo sistematizado em livros de ensino superior e, estratégias para o ensino de conceitos básicos de geometria esférica, bem como a confecção de todo material manipulável que foi utilizado no desenvolvimento da oficina. O trabalho colaborativo no grupo de executores da atividade foi o que garantiu o êxito da atividade. Anais do 7
8 O desenvolvimento da oficina não foi algo muito tranqüilo, pois os alunos, mesmo sendo todos do ensino médio, demonstraram muita dificuldade e falta de conhecimento em relação a conceitos básicos da geometria plana e também muita dificuldade na utilização de instrumentos de medida, como régua e transferidor. Em virtude dessas deficiências, muitas vezes foram necessárias intervenções para resgatar conceitos básicos de geometria do ensino fundamental, impedindo o prosseguimento das atividades propostas. Mas, a impressão que fica é que a oficina possibilitou aos alunos tanto a apropriação de conceitos anteriores às atividades quanto a construção dos conceitos básicos da geometria esférica, bem como a comparação dos conceitos das duas geometrias em foco, identificando suas semelhanças e suas diferenças. A forma de trabalho por resolução de problemas e a resolução dos mesmos em grupos, para que os alunos pudessem argumentar sobre suas hipóteses de resolução e desenvolverem experimentos com materiais manipuláveis para validá-las ou refutá-las, são facilitadores no processo de aprendizagem, fornecendo ainda ao professor elementos para que o mesmo possa saber como dar continuidade e direcionamento às atividades e discussões. No final do curso, os alunos tiveram a oportunidade de expressarem suas considerações sobre o assunto estudado e a forma de trabalho. Dentre os comentários levantados, vale ressaltar que alguns acharam muito interessante essa mistura de aula de matemática com atividade prática e história da matemática; acharam profícuas as discussões; afirmaram que o uso de material manipulável ajudou muito na resolução dos problemas propostos; e, ter sido muito interessante saber da existência de geometrias diferentes da que eles estudaram ou estudam no ensino básico. Por fim, é preciso acrescentar que a atividade desenvolvida sugere que é possível trabalhar os conceitos básicos da geometria esférica com alunos do ensino médio, conforme indicado nas Diretrizes Curriculares da Rede Pública de Educação Básica (2006) da Secretaria do Estado da Educação do Estado do Paraná. BIBLIOGRAFIA BOYER, C. B. História da matemática. São Paulo: Edgard Blucher CAPES. Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência PIBID. Disponível em Acesso em 25 de setembro de Anais do 8
9 COUTINHO, L. Convite às Geometrias Não-Euclidianas. 2a. ed. Rio de Janeiro: Interciência EVES, H. História da geometria. São Paulo: Atual, (Tópicos de história da atemática para o uso em sala de aula; v. 3) GARTH, E. R. & Lockwood, J. R. Deductive Systems: finite and non-euclidean geometries. Reston: National Council of Theachers of Mathematics GREENBERG, M. J. Euclidean and non-euclidean geometries: development and history. New York : W.H.Freeman and Company, MARQUEZE, J. P. As Faces dos Sólidos na Superfície Esférica: uma proposta para o ensino-aprendizagem de Noções Básicas de Geometria Esférica. São Paulo, Dissertação (Mestrado em Educação Matemática) Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. PARANÁ. Secretaria de Estado da Educação. Diretrizes Curriculares para o Ensino Fundamental. Curitiba: SEED, Secretaria de Estado de Educação. Diretrizes Curriculares para o Ensino Médio. Curitiba: SEED, PATAKI, I. Geometria esférica para a formação de professores: uma proposta interdisciplinar. São Paulo, Dissertação (Mestrado em Educação Matemática) Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. PRESTES, I. da C. R. Geometria Esférica: uma conexão com a geografia. São Paulo, Dissertação (Mestrado em Educação Matemática) Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. TOMEI, C. Euclides: a conquista do espaço. São Paulo: Odysseus, Anais do 9
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