TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo

Transcrição

1 TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo Registro: ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos do Habeas Corpus nº , da Comarca de Marília, em que é paciente LUCIANA TAVARES e Impetrante DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO. ACORDAM, em do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Denegaram a ordem. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores TOLOZA NETO (Presidente sem voto), AIRTON VIEIRA E ÁLVARO CASTELLO. São Paulo, 10 de outubro de RUY ALBERTO LEME CAVALHEIRO RELATOR Assinatura Eletrônica

2 VOTO Nº: HC. Nº: digital COMARCA: MARÍLIA IMPTE. : LUCAS PAMPANA BASOLIO IMPDO. : JUÍZO DE DIREITO DA 1ª VARA CRIMINAL DE MARÍLIA PACTE. : LUCIANA TAVARES MAGISTRADO DE 1º GRAU: DR. JOSÉ AUGUSTO FRANCA JUNIOR HABEAS CORPUS Crime de tráfico de drogas, associação para o tráfico e posse ou porte ilegal de arma de fogo Pedido de revogação da prisão preventiva - IMPOSSIBILIDADE Paciente primária Agente surpreendida na companhia de outro indiciado - Apreensão de 73 porções de maconha, 35 pinos de crack e 84 microtubos de cocaína dentro de uma sacola que a paciente segurava, além de R$ 96,00 em dinheiro em seu poder. No interior de sua residência, dentro de um guarda-roupa de um dos quartos, foram localizados três pacotes contendo maconha (totalizando mais de 1 kg da droga), 2 porções de crack, uma de cocaína, munições, 41 pinos plásticos vazios (normalmente utilizados para o embalo de drogas), uma anotação de contabilidade e uma fatura da SKY em nome do coautor, ex-companheiro de Luciana Confissão da paciente, em seu interrogatório na fase policial, de que estaria praticando o comércio ilegal de drogas - Dúvida que milita em favor da sociedade Preenchimento dos requisitos não são os únicos elementos a serem apreciados pelo Juízo, devendo-se levar em conta as circunstâncias do delito Insuficiência das medidas cautelares do art. 319 do CPP Decisão devidamente fundamentada. Ordem denegada. LUCAS PAMPANA BASOLIO impetram o presente pedido de HABEAS CORPUS em favor de LUCIANA TAVARES, pleiteando a revogação da prisão preventiva, com expedição de alvará de soltura. Informa o impetrante que a paciente foi presa em flagrante pela suposta prática do crime de tráfico de drogas, sendo o flagrante convertido em prisão preventiva. Ressalta a ausência dos pressupostos autorizadores da segregação cautelar, destacando que a

3 paciente é primária e possui residência fixa. Argumenta que a prisão cautelar se mostra mais gravosa do que eventual condenação, quando poderão ser aplicados benefícios legais incompatíveis com o cárcere. Sustenta que não há óbice para a concessão de liberdade provisória para o crime de tráfico de drogas, ante a inconstitucionalidade do artigo 44 da Lei 11343/06. Ressalta que a prisão processual é providência extraordinária e subsidiária a todas as demais medidas cautelares previstas no artigo 319 do CPP, que não pode ser confundida com a punição, somente justificada em situações de extrema necessidade, o que não restou demonstrado nos autos. 30/31). (fls. 34/60). O pedido de liminar foi indeferido (fls. Prestadas as informações do Juízo impetrado O Ministério Público, nesta instância, opinou pela denegação da ordem (fls. 62/64). É O RELATÓRIO. Com razão o representante do Ministério Público em seu parecer. A paciente foi denunciada como incursa nos artigos 33, caput, e 35, caput, ambos da Lei nº /2006 e artigos 14 e 16 da Lei 10826/03 (Estatuto do Desarmamento), todos em concurso material (artigo 69 do Código Penal), tendo sido presa em flagrante delito em 24/04/2017, porque estaria traficando drogas juntamente com Mauro de Souza, vulgarmente conhecido como Pequeno, no local dos fatos. Segundo consta, no dia dos fatos policiais civis receberam notícias anônimas de que o coautor estaria praticando tráfico de drogas na residência de Luciana, sua ex-companheira, com quem se achava associado para a referida conduta ilícita. De posse da informação, os policiais civis

4 dirigiram-se até o local indicado, onde presenciaram o usuário de drogas W.R.S. adquirindo uma porção de maconha por meio do vão do portão da residência. Abordado, W. confirmou a aquisição do entorpecente no local, dizendo informalmente aos policiais que se tratava da biqueira do Pequeno. Na sequência os policiais retornaram ao local dos fatos e avistaram que Mauro deixava o local em um veículo VW/Quantum, realizando a sua abordagem. Em revista pessoal, encontraram em seu poder a quantia de R$ 1.047,00 em dinheiro. Mauro negou-se a retornar ao endereço de onde acabara de sair, mas ao ser levado até defronte à residência, passou a gritar ordenando que Luciana não abrisse o portão. Assim, através do vão existente no portão, Luciana foi avistada pelos policiais civis no quintal da residência segurando, na mão esquerda, uma sacola contendo drogas. Diante da recusa em abrir o portão, os policiais ingressaram no imóvel pulando o muro lateral e detiveram Luciana na garagem na posse da sacola contendo 73 porções de maconha, 35 microtubos de crack e 84 de cocaína, bem como a quantia de R$ 96,00 em dinheiro. Estendidas as buscas no interior da residência, foram encontrados, escondidos dentro de um armário com roupas de Mauro, 03 pacotes contendo 1.107,5g de maconha, 02 porções de crack, 01 porção de cocaína, 05 munições de calibre.40 e 03 de calibre.32. Também foram apreendidos no interior da residência 09 cartuchos deflagrados de munição calibre.38, anotações de contabilidade relativas ao tráfico de drogas, 41 pinos vazios utilizados para embalagem da droga e uma conta da operadora SKY em nome de Mauro. Pois bem. Apesar de Luciana ser primária, o fato é que estão presentes os pressupostos da custódia cautelar, em razão das circunstâncias em que os fatos se deram, conforme

5 se verifica do auto de prisão em flagrante com os depoimentos colhidos, sem adentrar o mérito da ação penal, levando-se em conta a variedade e quantidade de droga apreendida, uma parte em poder da paciente e outra no interior da residência, além da localização de dinheiro, munições, pinos plásticos vazios (normalmente utilizados para o embalo de drogas), uma anotação de contabilidade e a confissão da paciente, em seu interrogatório na fase policial, de que estaria praticando o comércio ilícito de entorpecentes. O fato é que se deve ter cautela na concessão de qualquer benefício, notadamente, em se tratando da prática de tráfico de drogas, associação para o trafico e posse ou porte ilegal de arma de fogo. Os crimes imputados a paciente são extremamente graves pela latente periculosidade e que vêm afligindo a comunidade e, neste momento, não há qualquer elemento que exclua o tráfico. A dúvida milita em prol da sociedade, não vislumbrando falta de justa causa para a manutenção da prisão cautelar do paciente. Estão presentes, portanto, todos os requisitos da prisão preventiva, tanto os formais como os de conteúdo. Já se decidiu anteriormente que: (...) a primariedade, os bons antecedentes e a residência e o domicílio no distrito da culpa são circunstâncias que não obstam a custódia provisória, quando ocorrentes motivos que legitimam a constrição do acusado. (RSTJ 02/401) Como já dito, o tráfico de drogas, por si só, já se constitui em conduta perigosa, grave, capaz de originar outros delitos não menos graves e, da maneira como se apresenta nos autos, demonstra a necessidade de maior rigorismo. Ainda, hoje, com o advento da Lei nº /07, que alterou o disposto no art. 2º, inciso II, da Lei nº 8.072/90, foi possibilitada a concessão de liberdade

6 provisória aos acusados da prática de crimes considerados hediondos. Porém, o art. 44, da Lei nº /06 encontrase em lei especial e não foi derrogada pela Lei nº /07, a qual trata dos delitos hediondos e equiparados, de forma genérica. Assim, permanece a vedação legal. Quanto à inconstitucionalidade do art. 44 da Lei /2006, esta foi declarada pela Resolução 5/12 do Senado Federal e somente na parte em que vedava a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos e tal fato não retirou do magistrado a liberdade de apreciar os critérios para a concessão de benefícios, principalmente, nessa fase processual. Além disso, a própria Constituição Federal em seu art. 5º, inciso XLIII aduz que o tráfico ilícito de entorpecentes é crime inafiançável e insuscetível de graça ou anistia. O constituinte, portanto, ao dar este tratamento ao delito de tráfico de drogas, certamente, entendeu não ser cabível a concessão de benefícios aos praticantes desse delito, sem a análise minuciosa do caso concreto. Como acima dito, o tráfico de entorpecentes é uma conduta perigosa, extremamente grave e as circunstâncias dos presentes autos não recomendam a concessão de liberdade. Não se trata de afronta ao princípio da presunção de inocência, já que estão sendo proporcionados ao paciente todos os direitos que possui, como o devido processo legal, o exercício da ampla defesa e do contraditório. Deve-se analisar o espírito da lei que, no caso, agravou ainda mais as penalidades impostas e, em que pese, a possibilidade de liberdade concedida pela Lei nº /07, para os autores de crimes hediondos, não se pode ignorar todas as demais circunstâncias que envolvem o fato concreto. Vale dizer aqui que as medidas cautelares do art. 319 do Código de Processo Penal mostram-se insuficientes para coibir nova prática delitiva, diante das circunstâncias delitivas.

7 No que diz respeito a eventual aplicação do 4º, do art. 33, da Lei de Drogas, bem como substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, ou mesmo sursis, e fixação de regime mais brando, são circunstâncias que só poderão ser avaliadas quando da prolação da sentença, com a análise de toda a prova produzida nos autos. Com relação à fundamentação utilizada pelo Juízo impetrado, verifica-se que a decisão que converteu o flagrante em preventiva e a que indeferiu o pedido de revogação da prisão, levaram em consideração a quantidade e variedade de droga apreendida, a gravidade e hediondez do delito e a necessidade de manutenção da ordem pública, o que considero suficiente. mantida. A decisão atacada, portanto, é de ser Desse modo, não configurado o constrangimento ilegal, DENEGA-SE A ORDEM. RUY ALBERTO LEME CAVALHEIRO Relator