Os níveis de endividamento das pequenas e médias empresas brasileiras são determinados por sua estrutura de capital?

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Transcrição:

Os níveis de endividamento das pequenas e médias empresas brasileiras são determinados por sua estrutura de capital? Liana Holanda Nepomuceno Nobre (UECE/FATENE) liana.nobre@terra.com.br Samuel Façanha Câmara (UECE) sfcamara@ig.com.br Francisco Roberto Farias Guimarães Júnior (UECE/UFC) roberttojr@gmail.com Resumo Este artigo tem como objetivo verificar os níveis de endividamento total das pequenas e médias empresas (PME s) e as suas conseqüentes estruturas de capital. Analisou-se como se estabelece a estrutura de capital das PME s, identificando os fatores que determinam os níveis de endividamento total. Os modelos empíricos são fundamentados na literatura sobre estrutura de capital e têm como variável dependente o nível de endividamento total (Y ET ). Analisaram-se os demonstrativos financeiros de 25 empresas, de 2000 a 2004, formando uma amostra de dados em painel. Realizou-se uma pesquisa quantitativa, do tipo descritiva e explicativa. A hipótese testada, a partir da análise de regressão, é a de que as variáveis explicativas determinam o nível de endividamento total das PME s. Os resultados estatísticos obtidos são coerentes com estudos empíricos anteriores, onde o modelo de endividamento total apresentou uma tendência à teoria da compensação. Ao final, sugere-se que novas pesquisas podem agregar mais variáveis ao modelo. Palavras-chave: Estrutura de capital; Endividamento; Pequenas empresas. 1. Introdução As decisões em finanças corporativas se concentram em três grandes áreas: investimentos, financiamentos e dividendos. Para financiar seus empreendimentos, as empresas dispõem de duas alternativas: fazê-lo com capitais próprios e/ou com capitais alheios. A decisão do administrador ao escolher a combinação das fontes de financiamento da empresa é conhecida como a decisão de estrutura de capital. O objetivo desta pesquisa é verificar os níveis de endividamento das pequenas e médias empresas (PME s) e as suas conseqüentes estruturas de capital, analisando como estas são compostas e identificando os fatores que determinam os níveis de endividamento total. A hipótese testada, a partir de modelos empíricos criados e fundamentados na literatura sobre estrutura de capital, é a de que as variáveis explicativas são determinantes do nível de endividamento total das PME s. Nobre (2005) expõe que, embora a importância das PME s para a economia seja notória, os pesquisadores só abriram os olhos para as diferenças estruturais entre as grandes empresas e as PME s a partir do início dos anos 80, quando estas empresas entraram no foco das discussões em nível acadêmico. A teoria financeira, no entanto, parece não ter acompanhado esta tendência, pois os conceitos e modelos desenvolvidos pelas finanças corporativas são, em sua maioria, voltados às grandes empresas, principalmente àquelas que possuem ações negociadas no mercado de capitais. As PME s têm estruturas físicas diferentes das grandes empresas e estruturas de capital bastante diversas. Um dos problemas que as PME s encontram, é que estas empresas têm uma lacuna financeira (HOLMES; KENT, 1991). Esta lacuna se divide em dois componentes: falta de oferta e de conhecimento, pois a disponibilidade de fundos para as PME s é limitada e, existe um desconhecimento, da oferta 1

de fundos e passivos financeiros disponíveis e das vantagens e desvantagens da dívida. 2. Referencial Teórico Nas decisões sobre estrutura de capital, a dúvida constante é: o que leva uma empresa a escolher determinada fonte de capital? A resposta usual é a que vincula o uso do capital ao seu custo. A literatura financeira aponta o custo do capital próprio como uma das variáveis mais importantes em finanças empresariais (ASSAF NETO, 2003), tendo papel central em grande parte das decisões financeiras, por ser um padrão de referência e ligação entre as decisões de investimento e financiamento. Se o financiamento gera custos, o retorno ajustado ao risco dos projetos, nos quais tal financiamento é empregado, deve ser tal que: 1) pague aos credores o principal e os juros devidos; 2) pague aos acionistas o custo do capital próprio e 3) gere um excedente responsável pelo incremento da riqueza desses acionistas. Dessa forma, nenhuma decisão de investimento pode ser tomada sem que sejam considerados os custos de financiamento, apurados a partir da combinação entre endividamento e capital próprio. O capital próprio dos acionistas constitui a primeira fonte de recursos de longo prazo disponível para os investimentos na empresa, e desempenha papel primordial na fase inicial da empresa. No Brasil, considera-se capital próprio o recurso proveniente da subscrição de cotas de capital, da emissão de ações ou de lucros retidos. Nos Estados Unidos e na maioria dos países desenvolvidos, por outro lado, a emissão de ações no mercado de capitais é considerada capital de terceiros (equity). Embora haja esta divergência conceitual sobre a emissão de ações, no contexto das PME s esta questão perde força, uma vez que são raras as pequenas e médias empresas brasileiras que negociam ações no mercado secundário (NOBRE, 2005). O capital de terceiros tem significativa importância econômica, pois é o uso deste que permite aumentar o nível de atividade das empresas e financiar projetos quando estas não possuem recursos internos suficientes. Este capital entra na empresa através de financiamentos, empréstimos e venda de debêntures (ASSAF NETO, 2003). Estas fontes de capital demandam o pagamento dos valores emprestados acrescidos dos juros, conforme os prazos acordados (HIRSCHIFIELD, 2000). As principais diferenças entre capital próprio e o capital de terceiros foram resumidas por Nobre (2005) e se encontram no Quadro 1. Recursos de Terceiros Pagamentos de principal e juros definidos em contrato. Dedutível da base de cálculo de impostos. Alta prioridade no caso de falência. Prazo fixo de maturidade. Não dá direito de ingerência na empresa. Fonte: Nobre (2005) Recursos Próprios Pagamento residual, após pagamento dos demais compromissos. Não dedutível da base de cálculo de impostos. Baixa prioridade no caso de falência. Sem prazo de maturidade. Dá direito de ingerência na empresa. Quadro 1 Principais diferenças entre os recursos de terceiros e os recursos próprios Para alcançar o objetivo maior da administração financeira, maximizar a riqueza do acionista, o administrador deverá considerar a captação de recursos de terceiros, de forma a minimizar o custo de capital e, assim, aprovar um maior número de projetos com rentabilidade positiva (ASSAF NETO, 2003; LEMES JR.; RIGO; CHEROBIM, 2002). Embora o uso da dívida seja favorável às empresas, o uso inadequado do crédito pode trazer diversas conseqüências para uma empresa, inclusive a insolvência financeira. Este fato ocorre porque à medida que o nível de endividamento aumenta, o custo de capital da empresa diminui, mas, por outro lado, o alto nível de endividamento torna maior a responsabilidade da 2

empresa para a cobertura da dívida, aumentando o risco do empreendimento (HIRSCHIFIELD, 2000). Portanto, para determinar o nível de endividamento adequado para a empresa, alguns tópicos devem ser considerados, tais como: as condições gerais da economia, o mercado onde a empresa atua, e as decisões operacionais e financeiras a serem tomadas, para verificar quais atividades serão financiadas pelos recursos obtidos, qual o Valor Presente Líquido (VPL) proporcionado por este investimento, entre outros fatores não financeiros. (LEMES JR.; RIGO; CHEROBIM, 2002). Em pesquisas voltadas para as PME s, os resultados, em sua maioria, convergem para a teoria da hierarquia das fontes (GAMA, 2000; HUTCHINSON, 2003; SERRASQUEIRO; DUARTE, 2002; SOGORB-MIRA, 2002). Usando a escala Likert, Serrasqueiro e Duarte (2002) enviaram questionários a 600 PME s portuguesas, investigando sobre a importância das fontes interna e externa de capital no financiamento das operações da empresa. Os resultados alcançados revelam a preferência dos empresários pelos lucros retidos e bancos, como fontes de financiamento. Tal comportamento reflete a hierarquia das fontes de capital. Um ponto comum das investigações empíricas sobre a estrutura de capital das PME s citadas é o resultado da regressão. Os modelos estudados são significativos em todas as pesquisas, no entanto, as variáveis não são suficientes para explicar o endividamento destas empresas. Esta conclusão decorre dos baixos níveis de R 2 dos estudos acima citados, que estão descritos na Tabela 1. Autores Modelo R 2 Significância Dívida Total 28,60% Gama (2000) Dívida Longo Prazo 18,20% Dívida Curto Prazo 36,00% Hutchinson (2003) Dívida Longo Prazo 32,2% Dívida Curto Prazo 36,3% Todos os modelos Dívida Total 11,45% testados foram Sogorb-Mira (2002) Dívida Longo Prazo 9,93% significantes, a um Dívida Curto Prazo 3,50% nível de significância Hall, Hutchinson e Dívida Longo Prazo 25,10% 10%. Michaelas (2000) Dívida Curto Prazo 29,90% Michaelas, Chittenden e Poutziouris (1999) Fonte: Elaborado pelos autores 3. Metodologia da pesquisa Dívida Total 22,5% Dívida Longo Prazo 25,2% Dívida Curto Prazo 12,9% Tabela 1 Resultados das regressões das pesquisas empíricas estudadas Tendo em vista os objetivos propostos, este estudo adotou uma pesquisa descritiva e explicativa, utilizando-se a survey como procedimento metodológico (BABBIE, 1999). Com relação ao método descritivo, Barbosa (2001) defende que este que possibilita a classificação, explicitação e interpretação dos fenômenos, a partir de dados colhidos da própria realidade. Vergara (2003, p. 47) ressalta que o objetivo da investigação explicativa é tornar algo inteligível, justificar-lhe os motivos. Assim, por buscar o esclarecimento dos fatores que contribuem para a escolha das estruturas de capital das PME`s, esta pesquisa se classifica como uma investigação explicativa. Neste estudo, adotou-se uma amostra não-probabilística, sem esquecer das ressalvas em 3

relação à natureza deste tipo de amostra (KERLINGER, 1980). A amostra foi constituída de relatórios contábeis de 25 PME`s, no período de 2000 a 2004, formando uma amostra de dados em painel. No Brasil, não há banco de dados sistematizados com informações financeiras sobre as PME`s, uma vez que estas empresas não são obrigadas, pela lei, a fazer escrita fiscal. Assim, a amostra de PME`s considerada neste trabalho foi extraída da carteira de clientes de uma empresa de contabilidade, que possui mais de 35 anos de existência, o que confere credibilidade a tais informações. As variáveis que são estudadas neste trabalho são aquelas que emergiram de estudos empíricos, fundamentados nos debates teóricos (GAMA, 2000; HUTCHINSON, 2003; SOGORB-MIRA, 2002). Assim, a variável dependente do estudo é o nível de endividamento total da empresa (Y ET ), descrita a seguir: Nível de Endividamento Total (Y ET ) = Dívida Total (1) Total de Ativos Por se tratar de uma pesquisa explicativa, as variáveis explanatórias devem emergir da teoria, ou de testes empíricos anteriores (BARBOSA, 2001). Assim, as variáveis explanatórias deste modelo foram importadas das teorias de estrutura de capital e dos trabalhos empíricos pesquisados citados. Então, para o Nível de Endividamento Total, foi testada a seguinte hipótese, segundo Hall, Hutchinson e Michaelas (2000): Ha: As variáveis: Taxa Efetiva de Impostos (TEI), Outros Benefícios Fiscais (OBF), Tamanho da Empresa (TE), Oportunidade de Crescimento (OC), Tangibilidade dos Ativos (TA), Lucratividade (L), Idade da Empresa (I), Tipo de Tributação (T), Setor Econômico (SE) e Tipo de Sociedade (SO) são determinantes do Nível de Endividamento Total das PME s. As relações das variáveis explicativas com a variável independente são detalhadas nos subitens desta hipótese, conforme explicação feita por Nobre (2005): a) A variável TEI é determinante do nível de endividamento total e seu sinal é positivo; b) A variável OBF é determinante do nível de endividamento total e seu sinal é negativo; c) A variável TE é determinante do nível de endividamento total e seu sinal é positivo; d) A variável OC é determinante do nível de endividamento total e seu sinal é positivo; e) A variável TA é determinante do nível de endividamento total e seu sinal é positivo; f) A variável L é determinante do nível de endividamento total e seu sinal é negativo; g) A variável I é determinante do nível de endividamento total, independente de seu sinal; h) A variável T é determinante do nível de endividamento total; i) A variável S é determinante do nível de endividamento total; j) A variável SO é determinante do nível de endividamento total. A técnica estatística utilizada neste trabalho foi a regressão múltipla com o auxílio do software SPSS for Windows 13.0. A hipótese foi testada através do coeficiente de determinação da regressão (R 2 ), dos coeficientes das variáveis explanatórias e pelo teste F. 4. Apresentação dos dados e análise dos resultados A análise dos dados sucedeu ao tratamento estatístico. Conforme exposto na seção de metodologia, foi considerada uma amostra por conveniência composta de relatórios contábeis de 25 empresas, durante 5 anos. A média de idade das empresas estudadas é de 22 anos. À exceção de uma, as demais empresas são constituídas como sociedades por quotas de responsabilidade limitada. A única empresa da amostra constituída como sociedade anônima funciona como sociedade anônima de capital fechado. Isso implica que nenhuma das 4

empresas da amostra tem ações negociadas em bolsa de valores. Quanto à forma de tributação, 64% das empresas estudadas se enquadram no Lucro Presumido, 32% das empresas se enquadram no Lucro Real e 4% são tributadas com base no SIMPLES. Assim, 68% das empresas estudadas pagam seus tributos com base no faturamento, enquanto 32% pagam os tributos federais com base no lucro apurado. Um outro aspecto relevante da amostra refere-se ao próprio nível de endividamento das empresas, apresentado na Tabela 2. Observa-se que grande parte das observações amostrais trazem um nível de endividamento zero; aproximadamente 40% das empresas não possuem nenhum tipo de dívida e 80% das empresas da amostra não possuem dívida de longo prazo. Este comportamento é semelhante ao resultado encontrado por Carvalho e Abramovay (2004), que aponta a baixa predisposição dos pequenos empresários em utilizar recursos de terceiros. Tipo de dívida % Dívida Total 40,8 Dívida de Longo Prazo 80,0 Dívida de Curto Prazo 56,0 Fonte: Elaborada pelos autores Tabela 2 Empresas sem endividamento, por tipo de dívida Vale ressaltar também a dívida média das empresas estudadas, que estão apresentadas na Tabela 3. Tal como a literatura sugere, pode-se observar que as empresas se utilizam, em grande parte, da dívida de curto prazo em detrimento da dívida de longo prazo. Tipo de dívida % Dívida Total 10,40 Dívida de Longo Prazo 2,22 Dívida de Curto Prazo 8,18 Fonte: Elaborada pelos autores Tabela 3 Dívida média das empresas estudadas, por tipo de dívida Depois de caracterizada a amostra em linhas gerais, foi realizada análise de regressão no modelo proposto: Modelo do Endividamento Total (Y ET ). Os coeficientes do modelo foram estimados através do método direto, uma vez que as variáveis explicativas são advindas das diversas teorias sobre estrutura de capital. Os resultados da análise multivariada estão apresentados a seguir. Modelo R R 2 R 2 Ajustado Desvio-Padrão 1* 0,404 0,164 0,114 15,776 2** 0,440 0,194 0,123 15,690 Fonte: Elaborado pelos autores * Modelo 1:Variáveis Preditoras: Constante, IDADE, TE, TEI, OBF, TA, OC, L. ** Modelo 2: Variáveis Preditoras: Constante, IDADE, TE, TEI, OBF, TA, OC, L, SO, T, SE. Tabela 4 Análise de Regressão (Y ET ) A Tabela 4 apresenta o teste do coeficiente de determinação do modelo de endividamento total. Na primeira função, foram utilizadas somente as variáveis já testadas (HUTCHINSON, 2003; GAMA, 2000; SOGORB-MIRA, 2002). No modelo 2, foram acrescentadas as variáveis: tributação, setor e sociedade. Ambos os modelos apresentaram baixos R 2, o que significa que as variáveis prognosticadoras têm baixo poder explicativo da variável 5

dependente (HAIR JR. et al, 2005). No entanto, tais resultados são condizentes com os estudos empíricos sobre estrutura de capital, pois estes têm apresentado um coeficiente de determinação abaixo dos níveis aceitos, tanto no estudo de pequenas empresas quanto no de grandes empresas (GAMA, 2000). Na Tabela 5 é apresentada a análise de variância do modelo, tanto da regressão quanto dos resíduos. Dois aspectos são relevantes nestes resultados: a proporção da soma dos quadrados dos resíduos em relação à soma dos quadrados da regressão demonstra que o modelo falha em explicar grande parte da variação da variável dependente e o valor da significância do teste F do modelo é pequeno, revelando que as variáveis independentes utilizadas são adequadas para os modelos, mesmo sem poder explicativo. A inclusão de outras variáveis explicativas talvez conferisse maior poder de explicação a esta função. Modelo Soma dos Quadrados df x 2 F Sig. 1 Regressão 5693,40 7 813,343 3,268 0,003 Resíduos 29117,99 117 248,872 Total 34811,39 124 2 Regressão 6745,66 10 674,566 2,740 0,005 Resíduos 28065,73 114 246,191 Total 34811,39 124 Fonte: Elaborado pelos autores Tabela 5 - ANOVA (Y ET ) Na Tabela 6 são apresentados os coeficientes do modelo de endividamento total, a partir da análise de regressão. Como não é objetivo desta pesquisa encontrar um modelo econométrico para futuras previsões em estrutura de capital, a equação da regressão gerada a partir destes resultados, não será apresentada. Coeficientes Coeficientes não padronizados Modelo padronizados t Sig. Desvio Padrão 1 (Constante) -8,152 15,273-0,534 0,595 TEI -0,005 0,038-0,013-0,143 0,887 OBF 0,060 0,025 0,233 2,430 0,017 TE 1,800 1,008 0,184 1,785 0,077 OC -0,039 0,052-0,076-0,751 0,454 TA 0,069 0,048 0,143 1,432 0,155 L -0,011 0,018-0,067-0,599 0,550 I -0,397 0,156-0,225-2,543 0,012 2 (Constante) -6,458 17,172-0,376 0,708 TEI -0,005 0,038-0,012-0,139 0,890 OBF 0,058 0,025 0,224 2,328 0,022 TE 2,791 1,159 0,285 2,409 0,018 OC -0,042 0,053-0,081-0,783 0,435 TA 0,068 0,051 0,141 1,341 0,182 L -0,001 0,019-0,007-0,062 0,951 I -0,356 0,173-0,201-2,058 0,042 T -3,044 3,089-0,103-0,985 0,326 SE 2,292 2,204 0,122 1,040 0,300 SO -13,317 7,645-0,156-1,742 0,084 Fonte: Elaborado pelos autores 6

Tabela 6 Coeficientes do modelo de regressão (Y ET ) A partir do teste t, pode-se determinar o grau de importância relativa de cada variável no modelo. As variáveis cujo teste t resultar em números superiores a +2 ou inferiores a -2 são relevantes (HAIR JR. et al, 2005). Assim, para o modelo de endividamento total 1, as variáveis relevantes são: outros benefícios fiscais e idade, enquanto no modelo 2, além destas variáveis, o tamanho da empresa também se mostrou relevante. Além das variáveis que apresentaram teste t relevante, as variáveis tamanho da empresa (modelo 1) e sociedade (modelo 2), também se mostraram apropriadas a um nível de significância 10%. Quanto às relações previstas entre as variáveis dependentes e independentes, as variáveis: tamanho da empresa (TE), tangibilidade dos ativos (TA), e lucratividade (L) apresentaram sinal coerente com a literatura. A conjunção destas três variáveis sugere que a teoria da compensação explica melhor o endividamento total das PME s. A variável idade (I) apresentou sinal negativo, o que está acordado com a teoria da hierarquia das fontes. As variáveis: taxa efetiva de impostos (TEI) e outros benefícios fiscais (OBF), referentes à teoria fiscal, apresentaram relação contrária às relações previstas pela literatura. 5. Considerações finais A presente pesquisa testou os níveis de endividamento das PME s a partir da ótica das teorias de estrutura de capital das empresas, no período de 2000 a 2004. Os modelos testados foram adaptados dos modelos de Hutchinson (2003), Gama (2000) e Sogorb-Mira (2002), utilizados para explicar as diferentes estruturas de capital das PME s. Relativamente ao tema em análise, os resultados obtidos nas diversas pesquisas, têm-se revelado controversos, não existindo uma opinião consensual. Nesta investigação, os resultados corroboram a linha de investigação de Nobre (2005), a qual diz que a teoria da estrutura de capital tal como é proposta para as grandes empresas não é validada quando aplicada ao universo das PME s. O modelo de endividamento total se apresentou significante a partir da análise de regressão. O resultado obtido aparenta ser inconclusivo e um tanto paradoxal da regressão do modelo de endividamento total, pois as variáveis que confirmaram as relações previstas nas hipóteses (TE, TA, L e I), são testes de duas teorias que se opõem: a teoria da compensação e a teoria da hierarquia das fontes. Os custos de falência trouxeram as variáveis tamanho da empresa e tangibilidade dos ativos para o modelo, e estas confirmam a teoria da compensação. Por outro lado, idade e lucratividade apresentaram relações condizentes com a teoria pecking order. Os baixos coeficientes de determinação alcançados pela análise de regressão não devem ser tomados como uma negação definitiva dos modelos testados. Os resultados das regressões são coerentes com as demais pesquisas realizadas em outros países, ou seja, os modelos apresentam baixo coeficientes de determinação, porém são significativos, estando de acordo com Carvalho e Abramovay (2004) que afirmam que o baixo nível de endividamento parece ser um resultado constante nas pesquisas brasileiras. De fato, o nível de endividamento das empresas estudadas na amostra sugere uma postura conservadora dos seus empresários frente ao endividamento: 40,8% das empresas estudadas não possuem nenhum tipo de dívida; 80% das empresas não possuem dívidas de longo prazo e 56% das empresas não possuem dívida de curto prazo. Além da postura conservadora das empresas perante o uso de capital de terceiros, estes números também revelam o baixo uso da dívida de longo prazo por tais empresas. Estes resultados confirmam a preferência das pequenas e médias pela dívida de curto prazo, retratada na literatura e nos resultados dos estudos empíricos sobre estas empresas (HOLMES; KENT, 1991; NOBRE, 2005). 7

A indefinição nos resultados das pesquisas financeiras sobre PME s e as rejeições dos modelos estudados não devem ser utilizados como critérios para afirmar que as teorias de estrutura de capital válidas para as grandes empresas não são válidas para as PME s. Fica clara a necessidade de aprofundamento sobre o tema, seja através da ampliação da amostra, ampliação do modelo ou através da elaboração de modelos alternativos. Na presente pesquisa, nota-se a melhora nos coeficientes de determinação de todos os modelos testados com a inclusão das variáveis: tributação, setor e sociedade. Estas variáveis trazem para os modelos características brasileiras, destacando-se a legislação das sociedades anônimas e as diferentes formas de tributação, e seus conseqüentes efeitos sobre as estruturas de capital das PME s. Sobre a ampliação do modelo, deve-se atentar para a questão macroeconômica brasileira: a economia brasileira possui idiossincrasias que muito a afastam das condições em que as teorias testadas no presente trabalho se desenvolveram. Sugere-se, portanto, que novas pesquisas sobre este tema podem agregar mais variáveis ao modelo, sejam elas referentes aos estilos de gestão, características pessoais dos pequenos e médios empresários, ou à situação macroeconômica brasileira, fazendo as devidas adaptações às características locais ou a partir de uma base nova, ainda não pensada pela academia e que pudesse explicar a realidade das PME s brasileiras. Referências ASSAF NETO, A. Finanças corporativas e valor. São Paulo: Atlas, 2003. BABBIE, E. Métodos de pesquisa em survey. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 1999. BARBOSA, A. P. L. Metodologia da Pesquisa Científica. Fortaleza: UECE, 2001. CARVALHO, C. E. & ABRAMOVAY, R. O difícil e custoso acesso ao sistema financeiro. In: SANTOS, C. A., org. Sistema financeiro e as micro e pequenas empresas: diagnósticos e perspectivas. Brasília: SEBRAE. p. 17-45, 2004. GAMA, A. P. B. M. Os Determinantes da Estrutura de Capital das PME s Industriais Portuguesas. Série Moderna Finança, nº 20, BVLP- IMC, 2000. HAIR JR., J. F.; ANDERSON, R. E.; TATHAM, R. L. & BLACK, W. C. Análise multivariada de dados. 5. ed. Porto Alegre: Bookman, 2005. HALL, G.; HUTCHINSON, P. & MICHAELAS, N. Industry Effects on the Determinants of Unquoted SMEs Capital Structure. International Journal of the Economics of Business. Vol. 7, n. 3, p. 297-312, 2000. HIRSCHFIELD, H. Engenharia econômica e análise de custos: aplicações práticas para economistas, analistas de investimentos e administradores. São Paulo: Atlas, 2000. HOLMES, S. & KENT, P. An Empirical Analyses of the Financial Structure of Small and Large Australian Manufacturing Enterprises. The Journal of Small Business Finance. Vol. 1, n. 2, p. 141-154, 1991. HUTCHINSON, P. How much does growth determine SMEs capital structure? In: 16º Annual Conference of Small Enterprise Association of Australia and New Zealand. Ballarat, 2003. KERLINGER, F. N. A metodologia da pesquisa em ciências sociais: um tratamento conceitual. São Paulo: EPU, 1980. LEMES JR., A. B.; RIGO, C. M. & CHEROBIM, A. P. Administração financeira: princípios, fundamentos e práticas brasileiras. Rio de Janeiro: Campus, 2002. MICHAELAS, N.; CHITTENDEN, F. & POUTZIOURIS, P. Financial policy and capital structure choice in U.K. SMEs: empirical evidence from company panel data. Small Business Economics. Vol. 2, n. 12, p. 23-37, 1999. NOBRE, L. H. N. Estrutura de capital e níveis de endividamento da PME s cearenses. 160 f. Dissertação (Mestrado em Administração) Curso de Mestrado Acadêmico em Administração da Universidade Estadual do Ceará. Fortaleza: UECE, 2005. 8

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