SUSPENSÃO DE LIMINAR 890 BAHIA REGISTRADO REQTE.(S) ADV.(A/S) REQDO.(A/S) ADV.(A/S) INTDO.(A/S) PROC.(A/S)(ES) : MINISTRO PRESIDENTE :TELEFÔNICA BRASIL S/A : DIEGO BARBOSA CAMPOS E OUTRO(A/S) :JUIZ DE DIREITO DA VARA CÍVEL, FAZENDA PÚBLICA E RELAÇÕES DE CONSUMO DA COMARCA DE LUÍS EDUARDO MAGALHÃES :SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS :MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DA BAHIA :PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA Trata-se de pedido de suspensão de tutela antecipada concedida na Ação Civil Pública 0006643-94.2014.8.05.0154, em trâmite perante a Vara Cível da Comarca de Luís Eduardo Magalhães, no Estado da Bahia. Consta dos autos que o Ministério Público baiano ajuizou ação civil pública contra Vivo S.A., empresa cuja sucessora por incorporação é a Telefônica Brasil S.A., requerendo liminarmente: a) na defesa dos direitos e interesses difusos, seja concedida medida liminar determinando a adequação 90 serviço nos parâmetros estabelecidos nas resoluções da ANATEL, sob pena de multa diária de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) pelo descumprimento, a ser recolhida para o fundo a que se refere o artigo 13, da Lei n~7.347/85,no prazo de 60 (sessenta dias); b) seja garantida a estabilidade de sinal rias linhas móveis de telefone e internet, já no prazo de 60 (sessenta) dias, mediante a ampliação do número de torres de sinal qualificado, distribuída nos bairros Jardim das Acácias, Mimoso li, Santa Cruz, Jardim Paraíso, Jardim Imperial e Centro, pelo menos, sem prejuízo da instalação de novas bases de distribuição de sinal no distrito do Novo Paraná, pertencente á este município, ou outros bairros que não os acima citados; c) na defesa dos direitos e interesses difusos, seja concedida medida liminar determinando a proibição de habilitação de novos aparelhos celulares e de serviços de internet móvel 3G e 4G, no âmbito
do DDD 77, até a adequação do serviço nos parâmetros estabelecidos pela ANATEL, sob pena de multa de R$ l0.000,00 (dez mil reais) por unidade móvel habilitada, a ser recolhida para o fundo a que se refere o artigo 13, da Lei nº 7.347/85; d) De plano, seja decretada a inversão do ônus da prova, na forma do art. 6, VIII, do Código de Defesa do Consumidor, ante o flagrante interesse da coletividade de consumidores prejudicados; e) a apresentação de dados sobre ampliação do alcance da qualidade do sinal das bases de distribuição da zona rural do município de Luís Eduardo Magalhães-BA; f) a apresentação, in continenti, de planilha de dados que demonstre claramente o número de novas habilitações ocorridas no município de Luís Eduardo Magalhães, nos últimos 5 (cinco)' aos, o que incluiu os serviços de telefonia e internet móveis, que viabilize a clareza da evolução da demanda e contraposição à qualidade dos serviços sempre decrescente. (páginas 128-130 do documento eletrônico 6). A medida liminar foi concedida nos seguintes termos: 1 - Adeque os serviços de telefonia celular e internet móvel 3G e 4G aos parâmetros estabelecidos pela ANATEL, no prazo de 45 (quarenta e cinco) dias, considerando que haverá, ainda, o acréscimo de prazo do recesso forense, sob pena de multa diária de R$50.000,00 (cinquenta mil reais) a ser destinada ao Fundo a que se refere o art. 13 da Lei n. 7.347/85; 2 Garanta a estabilidade de sinais nas linhas móveis de telefone e internet, já no prazo de 45 (quarenta e cinco) dias, considerando que haverá, ainda, o acréscimo de prazo do recesso forense, mediante a ampliação do número de torres de sinal qualificado, distribuídas nos bairros Jardim das Acácias, Mimoso 11, Santa Cruz, Jardim Paraíso, Jardim Imperial e Centro, devendo, ainda, no prazo de 60 (sessenta) dias, instalar novas bases de distribuição de sinal no Distrito do Novo Paraná, pertencente a este município; 3 - Abstenha-se de habilitar novas linhas telefônicas e serviços 2
de internet móvel 3G e 4G, no âmbito do DDD 77, até a adequação dos serviços aos parâmetros estabelecidos pela ANATEL, sob pena de multa de R$10.000,00 (dez mil reais) por unidade móvel habilitada, a ser destinada ao Fundo a que se refere o art. 13 da Lei nº 7.347/85. 4 Apresente dados sobre ampliação do alcance da qualidade do sinal das bases de distribuição da zona rural do Município de Luis Eduardo Magalhães/BA; 5 - Apresente planilha de dados que demonstre o número de novas habilitações ocorridas no Município de Luis Eduardo Magalhães/BA, nos últimos 05 (cinco) anos, o que inclui os serviços de telefonia e internet móveis. (páginas 546-547 do documento eletrônico 7). Interposto agravo de instrumento contra a decisão liminar, o desembargador relator do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, em juízo de retratação, reconsiderou sua decisão e negou o pedido de efeito suspensivo e manteve os efeitos da decisão do juiz de primeiro grau (página 11 do documento eletrônico 11). Contra a referida decisão foi formulado pedido de suspensão de liminar perante a Presidência do Tribunal de origem, que o indeferiu (documento eletrônico 12). Sobreveio, então, o presente pedido de suspensão a esta Corte (documento eletrônico 2). Após afirmar ter legitimidade para pleitear a medida, por se tratar de autorizatária de serviços públicos atuando em nome da União, a empresa requerente assevera que a decisão impugnada impõe grave risco de violação à ordem e à economia públicas, sob os seguintes argumentos: a) A decisão autoriza o Poder Judiciário a punir, ainda mais na intensidade sumariamente impingida, o que não foi punido pela ANATEL, ente regulador dotado de competência constitucional para fiscalizar e exercer poder de polícia sobre as empresas prestadoras dos serviços de telecomunicações (arts. 21, XI, e 22, IV, da CF), em franca violação ao princípio da separação de Poderes (art. 2º da CF) e ao direito fundamental de 3
livre exercício da atividade econômica (art. 170 da CF); b) A determinação judicial, caso mantida, fomentará o chamado efeito multiplicador, abrindo espaço para o ajuizamento de diversas ações civis públicas objetivando a interrupção de serviços regulados pelo Poder Público, sob o fundamento de deficiência na sua prestação; c) O Poder Judiciário não é dotado de competência, estrutura e aparato técnico para adentrar a complexidade de temas regulatórios, nem para criar condicionantes ao exercício de atividade econômica regulamentada; e d) A competência constitucionalmente prevista para a regulação do setor de telecomunicações é da ANATEL e está definida, especificamente no que tange à exclusão de determinada operadora de telefonia do mercado, nos arts. 138 a 144 da Lei Geral de Telecomunicações. Por todas essas razões, pede a suspensão da medida liminar. É o relatório necessário. Decido o pedido liminar. Com efeito, o deferimento do pedido de suspensão exige a presença de dois requisitos: a matéria em debate ser constitucional e a ocorrência de lesão à ordem, à saúde, à segurança ou à economia públicas. Da análise dos autos, verifico que a controvérsia instaurada na presente contracautela evidencia a existência de matéria constitucional, especificamente quanto à incidência dos arts. 21, XI, 22, IV, e 170 da Constituição Federal. Dessa forma, cumpre ter presente que a Presidência do Supremo Tribunal Federal dispõe de competência para examinar questão cujo fundamento jurídico é de natureza constitucional (art. 297 do RISTF, combinado com o art. 25 da Lei 8.038/90), conforme firme jurisprudência desta Corte, destacando-se os seguintes julgados: Rcl 475, rel. Min. Octavio Gallotti; Rcl 497-AgR, rel. Min. Carlos Velloso; SS 2.187-4
AgR, rel. Min. Maurício Corrêa; e SS 2.465, rel. Min. Nelson Jobim. Feitas essas considerações preliminares, passo à análise do pedido liminar, o que faço apenas e tão somente com base nas diretrizes normativas que disciplinam as medidas de contracautela. Ressalte-se, não obstante, que, na análise do pedido de suspensão de decisão judicial, não é vedado ao Presidente do Supremo Tribunal Federal proferir um juízo mínimo de delibação a respeito das questões jurídicas presentes na ação principal, conforme tem entendido a jurisprudência desta Corte, da qual se destacam os seguintes julgados: SS 846-AgR/DF, rel. Sepúlveda Pertence, e SS 1.272-AgR/RJ, rel. Carlos Velloso. Passo a analisar se a requerente, pessoa jurídica de direito privado e autorizatária de serviços de telefonia móvel pessoal (SMP), possui ou não legitimidade ativa para postular a medida a que se referem os arts. 4º da Lei 8.437/92 e 297 do RISTF. Examinando o tema, esta Corte firmou entendimento de que não é sempre que entidades da Administração Indireta ou concessionárias de serviço público podem ser admitidas no polo ativo dos pedidos de contracautela. Nesse aspecto, colaciono as decisões proferidas na SS 1.308 (rel. Min. Celso de Mello), SL 34 (rel. Min. Maurício Corrêa) e SS 227/RJ (rel. Min. Rafael Mayer), entre outras. Ademais, o Supremo também decidiu que têm legitimidade ativa as pessoas jurídicas de direito privado "quando, no exercício de função delegada do Poder Público, como as concessionárias de serviço público, se encontrem investidas na defesa do interesse público, por sofrer as conseqüências da decisão concessiva da cautelar ou segurança, com reflexos diretos na ordem, na segurança, na saúde ou na economia pública" (SL 111, Rel. Min. Ellen Gracie). 5
No caso dos autos, percebe-se que a empresa requerente, autorizatária de serviço público essencial, titularizado pela União (art. 21, XI, da CF), pretende resguardar a manutenção do fornecimento do serviço de telefonia móvel, em toda a sua plenitude, no Estado da Bahia. Portanto, in casu, está configurado, sem sombra de dúvidas, o interesse público na manutenção do serviço essencial. O serviço de telefonia móvel possui significativo relevo para a economia e as relações entre indivíduos. A empresa requerente busca preservar não apenas a continuidade mas também a plena manutenção na execução do serviço, de interesse de toda a sociedade local; assim, os interesses em discussão transcendem o aspecto patrimonial, atendendo à sociedade como um todo. A interrupção de fornecimento do serviço prestado a milhões de pessoas provoca prejuízos a universo significativo da população. Há, portanto, comprovação de que a decisão concessiva da antecipação dos efeitos da tutela pode prejudicar a prestação dos serviços de telefonia móvel pessoal (SMP) à população do Estado do Espírito Santo. Confirma-se, assim, a afetação da atividade confiada à requerente, por autorização, pelo Poder Público, com a demonstração da violação da ordem pública e da segurança jurídica. No caso concreto, pelo visto, há o avanço da atuação judicial sobre áreas resguardadas à atividade da agência reguladora. Isso não quer dizer que o Poder Judiciário não possa sindicar os limites de atuação dessas entidades da Administração Indireta. Decerto que pode haver controle judicial sobre atos e omissões das agências no exercício das atividades típicas de regulação. Todavia, esse controle, excepcional, deve garantir a razoabilidade das decisões e das omissões típico controle de legalidade. 6
Verifico, em uma análise perfunctória dos fatos, típica das medidas de urgência, inexistir omissão da ANATEL a autorizar a atuação judicial. Pelo que consta nos autos, a agência reguladora de telefonia está fiscalizando o setor, tendo, inclusive, elaborado relatório a subsidiar a ação civil pública (páginas 338-364 do documento eletrônico 6). Desse modo, não houve até então omissão por parte da ANATEL a ensejar o controle judicial; consequentemente, inexiste o rompimento dos limites legais a serem garantidos pelo Poder Judiciário. Portanto, o Poder Judiciário não deveria ter adentrado a esfera destinada à regulação daquela agência. Ademais, não se verificou a ocorrência de medidas regulatórias viciadas, de modo a autorizar o manejo da ação civil pública pelo Ministério Público do Estado da Bahia. Atente-se que, ainda que se perceba a sindicabilidade das condutas praticadas pela empresa requerente no mercado de consumo, a decisão guerreada possui forte carga regulatória, suspendendo a atuação da delegatária do serviço público e condicionando o retorno à prestação dos serviços ao cumprimento de "melhorias", a serem fiscalizadas não por um corpo técnico especializado, mas pelo próprio juiz, logicamente após a certificação de quem tem a competência para tanto: a ANATEL. A ANATEL, por ser responsável pelo exercício da atividade regulatória setorial, não foca sua atuação na tutela particular do consumidor, mas em aspectos relacionados à continuidade e à universalização do serviço, ao equilíbrio econômico-financeiro do contrato de concessão e à modicidade tarifária, entre outros. Assim, a suspensão da prestação do serviço essencial seria sanção que caberia à ANATEL aplicar, não ao Poder Judiciário, que poderia analisar apenas a legalidade na aplicação de referida sanção. Não cabe, portanto, a interrupção inesperada dos serviços regulados 7
(concedida sem a oitiva da ANATEL e muito menos da empresa requerente), em caráter punitivo, por parte do Poder Judiciário. Reafirmo que a atuação judicial sobre a atividade de regulação é excepcional, faltando razoabilidade à medida judicial que substituiu indevidamente a vontade da agência, invadindo a conveniência e a oportunidade da prática de ato administrativo por parte da entidade federal de telecomunicações. No entanto, deve ser ressaltado que o Ministério Público, instituição à qual incumbe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis (CF, art. 127, caput), possui plena legitimidade para manejar a ação civil pública, nos termos do que dispõe o art. 1º, combinado com o art. 5º, I, da Lei 7.347/1985, sem a necessidade de verificação prévia da ocorrência de omissão ou atuação viciada de agência reguladora. Ademais, vislumbro o risco da ocorrência do efeito multiplicador da medida, de modo que sua manutenção permitiria o deferimento de outros pedidos de tutela de urgência em situações semelhantes, no âmbito do Estado da Bahia e de outros Estados, possibilitando a criação de desigualdades entre usuários e a indevida intervenção de terceiros na autorização conferida pela União ao delegatário do serviço de telefonia móvel. Em tempo, a empresa requerente juntou decisões proferidas em sede de ações civis públicas nas quais também foram suspensas as atividades de telefonia móvel pelas operadoras Oi, Vivo e TIM. No caso, entendo que está devidamente demonstrado o fundamento de aplicabilidade do instituto da suspensão, pois a decisão impugnada importa grave lesão à ordem pública e à segurança jurídica. Isso posto, defiro o pedido liminar, sem prejuízo de uma análise mais detida por ocasião do julgamento de mérito, para suspender a execução da antecipação dos efeitos da tutela concedida nos autos da 8
Ação Civil Pública 0006643-94.2014.8.05.0154, em trâmite perante a Vara Cível da Comarca de Luís Eduardo Magalhães, confirmada no Agravo de Instrumento 0000149-59.2015.8.05.0000, em curso no Tribunal de Justiça da Bahia, até o trânsito em julgado do processo. Comunique-se, com urgência, ao Presidente do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia e ao juiz de Direito da Vara Cível da Comarca de Luís Eduardo Magalhães. Publique-se. Brasília, 24 de junho de 2015. Ministro RICARDO LEWANDOWSKI Presidente 9