A LITERATURA INFANTIL COMO RECURSO NO ATENDIMENTO ESPECIALIZADO AOS ALUNOS COM DEFICIÊNCIA MENTAL Luana Martins Abreu Profª. da Secretaria Municipal de Educação de Nova Iguaçu/RJ As crianças com qualquer deficiência, independente de suas condições físicas, sensoriais, cognitivas ou emocionais são crianças que têm necessidade e possibilidade de conviver, interagir, trocar, aprender, brincar e serem felizes, algumas vezes, de forma diferente. Essa forma diferente de ser e agir é que as torna ser único, singular. Estudos acerca das possibilidades cognitivas de crianças com deficiência mental, como os de Inhelder (1963) mostram oscilações e ritmos diferentes no processo de construção da inteligência dessas crianças. Evidenciam esses estudos que os programas das escolas especiais, muitas vezes, centram-se nas limitações, nos déficits, nas impossibilidades e não aproveitam as potencialidades e os recursos que esses alunos dispõem, para que suas possibilidades intelectuais e de adaptação ao meio sejam aumentadas. Investigações recentes levantam a hipótese de que a deficiência mental não se origina apenas no déficit estrutural, mas também, na capacidade funcional da inteligência. Scarnhont e Buchel (1990) afirmam que essas pessoas apresentam pouca habilidade para problemas de generalização da aprendizagem e funcionamento da memória prejudicado. Entretanto, as estratégias de memória, imagem mental e categorização podem ser melhoradas nos alunos com deficiência mental, mas não treinadas mecanicamente. É necessário e primordial conhecer as formas de interação e comunicação que utilizam, a qualidade de experiências que possuem, as possibilidades de funcionamento, os níveis diferenciados, as estratégias de ação e pensamento para verificar as possibilidades de desafios, necessidades, conteúdos e atividades que modifiquem as possibilidades de funcionamento e produzam respostas qualitativamente melhores e mecanismos de adaptação ao meio. Estas ações serão nosso foco de atenção neste trabalho em que vem de encontro com as nossas práticas pedagógicas interativas que fogem a qualquer proposta de saber 1
acadêmico, transformando o saber trazido do cotidiano em diversas ações que propiciem ao aluno deficiente uma real construção de seu aprendizado. Numa perspectiva Vygotskyana percebemos o aprendizado do aluno deficiente mental como qualquer outra aprendizagem em que respeitamos suas peculiaridades em seu progresso intectual e assim, no desenvolvimento de sua aprendizagem. Ressaltando também a influencia do meio onde este facilita ou dificulta o seu desenvolvimento, ou seja, as vivências e possibilidades apresentadas para este aluno é que vão diferenciar seu aprendizado. Nessa concepção, as características individuais são determinadas por fatores externos ao indivíduo. Igualmente, desenvolvimento e aprendizagem se confundem e ocorrem simultaneamente estreitando as relações que ligam o pensamento humano à linguagem, uma vez que os significados das palavras, que são construídos socialmente, cumprem tanto a ação de representação quanto a de generalização, o que permite a reconstrução do real ao nível do simbólico. Essa reconstrução representa a condição de criação de um universo cultural e a construção de sistemas lógicos de pensamento, que possibilitam a elaboração de sistemas explicativos da realidade. Do mesmo modo, essa dupla função permite a comunicação da experiência individual e coletiva consolidando uma verdadeira inclusão sócio-cultural. A literatura infantil pode ser o cerne da construção de uma educação inclusiva, pois operando a partir de sugestões fornecidas pela fantasia e imaginação, socializa formas que permitem a compreensão dos problemas e demonstra-se como ponto de partida para o conhecimento real e a adoção de uma atitude que valorize as diferenças e as particularidades. Nesta proposta metodológica estaremos trazendo a literatura infantil com meio de aliar cognição, afetividade e imaginação que devem ter um olhar de criatividade e criticidade pelo professor para que haja sucesso nestas ações pedagógicas. Através do trabalho com a literatura infantil estaremos num caminho aliado ao processo de aquisição de leitura e escrita tendo em vista suas peculiaridades nas etapas de desenvolvimento deste aluno. Porém, o ato de alfabetizar não é o crucial neste processo, mas sim desenvolver potencialidades e habilidades necessários para inserção efetiva no mundo letrado. As etapas para a apresentação de uma história e o desenvolvimento do trabalho com esta irão partir de simples atos: O OUVIR, O FALAR, O LER E SENTIR. 2
O Ouvir será o marco da interação em que o aluno deverá compreender o que lhe é transmitido através da oralidade do professor ou de outro. Este é o momento da contação, que poderá ser desenvolvido através de simples narrativas, do uso de recursos áudio-visuais ou mesmo o uso de teatralização com fantoches. Através desta etapa o aluno estará, sem mesmo registro escrito, operando conhecimentos discursivos, semânticos e gramaticais e reconhecendo o uso de instrumentos lingüísticos ou nãolinguísticos. Utilizamos este momento também para que o aluno sinta através de seu corpo, pois sabemos que este aspecto é exacerbado em nosso aluno com deficiência mental. O Falar é o ato em si da expressão do aluno. Neste momento faz-se um debate sobre o tema da história apresentada, com o objetivo de fomentar os assuntos de interesse dos alunos buscando atendê-los. Através da comunicação oral o aluno deve expressar o que compreendeu da história, seus interesses, desejos, idéias e estabelecer a troca com o outro. O Ler é o momento em que nosso aluno interpreta o texto de acordo com sua visão de mundo atribuindo-lhe a sua própria significação. Neste momento também fazse o ato de leitura sensorial em que há as experimentações de sentimentos como: prazer, ódio, saudade, solidariedade, cooperação, etc. Estas experimentações nada mais são que momentos em que o aluno expõem sua sensibilidade em relação a ele e ao outro. As dinâmicas propiciadas são de diversas formas: jogos cooperativos, atividades psicomotoras, artísticas e até mesmo de produção textual. As formas de leituras também perpassam pela sensibilização corporal. Portanto, propiciamos momentos em que eles utilizam o próprio corpo explorando seus sentidos (olfato, paladar, tato, visão e audição) também para explicitar a construção do seu conhecimento. O alunos, através de todo este processo estará descobrindo suas habilidades e potencialidades, inclusive funções e uso da leitura e escrita, pois o ato de registrar, informar, comunicar, instruir, orientar estará fomentando todas as etapas. Após temos o momento de livre expressão em que o aluno registra de sua forma mais conveniente as idéias e conclusões sobre o tema e/ou temas das histórias apresentadas. O processo avaliativo de todo este trabalho será de forma de portifólio oportunizando a troca de experiência e conhecimentos entre os educandos, sua família e outros. Através deste material será facilmente visualizado o processo de construção de conhecimento deste aluno, bem como seus avanços, progressos ou insucessos. O 3
registro de relatórios feito pelo professor também é de suma importância para que o processo se consolide, pois as suas intervenções é que vão propiciar os benefícios aos alunos. Agora, vamos relatar as escolhas das obras a serem apresentadas para os alunos justificando o trabalho a ser desenvolvido com cada uma delas e o objetivo desta escolha: Nos Clássicos Infantis há uma variedade de títulos a serem desenvolvidos, porém destacamos apenas algumas obras para trabalhar com nossos alunos: Chapeuzinho Vermelho, O Três Porquinhos, Pinóquio, A galinha dos Ovos de Ouro, Soldadinho de Chumbo, Patinho Feio. Dentro destas obras os temas mais pertinentes á realidade de nossos alunos são: ética, solidariedade, atitudes contraditórias e a vertente entre Bem e Mal. O trabalho com hábitos e atitudes do cotidiano também serão contemplados nestas obras com a leitura sensorial em que estarão vivenciando comportamentos como hábitos de higiene e alimentação com autonomia visando o resgate da auto-estima do aluno. Destacamos em meio a uma variedade de autores da Literatura Infantil Brasileiras os que possuem um perfil ligado á nossa prática pedagógica interacionista. Foram eles: Ana Maria Machado, Ruth Rocha, Ziraldo, Vinícius de Morais, Monteiro Lobato e Maurício de Sousa. Ana Maria Machado e Ruth Rocha dispõem de um amplo acervo infantil que nos possibilita uma gama de interações. Portanto, ficará difícil apontar obras específicas para o trabalho, pois os alunos estarão em contato com vários livros podendo optar pelo que mais lhe interessa. Assim, os temas não serão delimitados. Serão propiciados após o momento de OUVIR. As autoras também disponibilizam dentre seu acervo livros adaptados aos deficientes. O autor Ziraldo nos acrescentará com sua obra O Menino Maluquinho. Nesta estaremos trabalhando a questão do limite e disciplina no nosso aluno. As brincadeiras infantis serão o tema das vivências que nossos alunos terão no trabalho com esta obra. Vinícius de Morais é o autor que busca uma musicalidade em seus textos com a obra A Arca de Noé. Então estaremos desenvolvendo a expressão corporal e gestual presente no trabalho musicista. O ritmo é um aspecto muito importante para que seu relacionamento com o corpo e com o meio seja harmonioso. Uma história constante a ser trabalhada será O Sítio do Pica-Pau Amarelo, pois Monteiro Lobato, nesta obra resgata muitos aspectos do Folclore Brasileiro que 4
apresenta a diversidade cultura com o cerne das questões direcionadas á nossa sociedade. Crenças, valores, costume e hábitos estão embutidos em seu trabalho e serão explorados por nós durante todas as etapas. Suas obras serão apresentadas em diversos momentos, de acordo com o tema social a ser explorado. Como também de acordo com a bagagem cultura trazida pelo nosso aluno. Maurício de Souza é um autor que também trabalha esta questão da Inclusão com seus livros adaptados e personagens específicos no assunto. Seu trabalho sob forma de quadrinhos nos dá uma grande alça no desenvolvimento da oralidade e da leitura e escrita, visando um aspecto criativo de comportamentos cotidianos. O aluno vivenciará os personagens e suas peculiaridades observando suas características e transpondo-se em meio a estes. Nosso objetivo durante todo este trabalho não é o desenvolvimento no aspecto acadêmico, mas sim do desenvolvimento das potencialidades e habilidades de nosso aluno em que suas particularidades em todo o processo de aprendizagem sejam contempladas. Portanto nossos resultados dependerão de cada aluno, de sua participação e freqüência nas atividades, bem como seu ritmo próprio de desenvolvimento biopsicossocial. Nossa intenção é que este tipo de trabalho, como proposta inclusiva, seja levado á todos os professores da nossa rede de ensino, pois nos dá condições de desenvolver a inclusão e não apenas no âmbito do atendimento especializado é que podemos desenvolver esta temática. Em nossos atendimentos esta temática será abordada, porém o aluno estará contemplando em suas vivências cotidianas que ultrapassam as paredes de nossas salas e contagiam a Unidade Escolar, as famílias e os amigos que cercam o dia-a-dia dos nossos alunos. Referências Bibliográficas Brasil. MEC. Política Nacional de Educação Especial. Brasília, 1994. COSTA, M.P. Alfabetização para deficientes mentais. São Paulo: EDICON, 1989. MANTOAN, M.T.E. Compreendendo a deficiência mental: novos caminhos educacionais. São Paulo: Scipione, 1989. OLIVEIRA, M.K. Vygotsky: aprendizado e desenvolvimento: um processo sócioholístico. São Paulo: Scipione, 1993. 5
Deficiência e não-deficiência: recortes do mesmo tecido. Revista Brasileira de Educação Especial, n.2, p.65-74, 1994. VERONEZI, R. Atendimento ocupacional. Revista Brasileira de Deficiência Mental, n.15, p.145-151, 1980. VYGOTSKY, L. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1991. BETTELHEIM, Brunno. A psicanálise dos contos de fadas. 18. ed. Tradução Arlene Caetano. São Paulo: Paz e Terra, 2004. VYGOTSKY, L. S. 1987. Pensamento e Linguagem. São Paulo: Martins Fontes. ABRAMOVICH, F. - Por uma arte de contar histórias In: Literatura Infantil. São Paulo: Scipione. 1989. BATISTA, Cristina Abranches Mota e MANTOAN, Maria Teresa Egler. Educação Inclusiva: atendimento educacional especializado para deficiência mental. Brasília: MEC/SEESP, 2005. 6