DESAFIOS DOCENTES: UMA MARCA QUE PERPASSA DIFERENTES MOMENTOS DA CARREIRA DOCENTE

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1 DESAFIOS DOCENTES: UMA MARCA QUE PERPASSA DIFERENTES MOMENTOS DA CARREIRA DOCENTE Resumo SIMON, Fernanda Luiza 1 - UFSM WERLE, Natália 2 - UFSM SILVA, Marciele Taschetto da 3 - UFSM RODRIGUES, Michele de Oliveira 4 - UFSM STAHL, Luana Rosalie 5 - UFSM Grupo de Trabalho - Formação de Professores e Profissionalização Docente Agência Financiadora: CNPq, Fapergs O presente trabalho é um recorte da pesquisa Os movimentos da docência superior: construções possíveis nas diferentes áreas de conhecimento que busca investigar as relações existentes entre as áreas específicas de conhecimento dos professores de uma Instituição de Ensino Superior Pública e como elas podem influenciar nos movimentos construtivos da docência universitária. Essa investigação está sendo desenvolvida em uma instituição pública de ensino superior e envolve professores de cursos de licenciatura e bacharelado, com diferentes anos de atuação na instituição e abrange todas as áreas de conhecimento conforme classificação do CNPq. Os docentes com 0 a 5 anos de carreira pertencem ao grupo dos docentes em anos iniciais (PAI), aqueles com 6 a 15 anos de carreira, pertencem ao grupo dos docentes em anos intermediários (PAF) e com 16 anos de carreira em diante, são professores em anos finais (PAF). O foco desse trabalho é identificar e analisar, a partir das narrativas de quatro professores de diferentes áreas de atuação e com diferentes tempos de carreira na IES pública, os desafios docentes que estão presentes ao longo da carreira profissional desses sujeitos, buscando inferir como estes desafios são vivenciados pelos docentes. Objetivamos com este trabalho apresentar e discutir os desafios docentes 1 Acadêmica do curso de Pedagogia da Universidade Federal de Santa Maria. Bolsista de Iniciação Cientifica- PIBIC/ CNPq. fernandasimon.ufsm@gmail.com. 2 Acadêmica do curso de Educação Especial da Universidade Federal de Santa Maria. Bolsista de Iniciação Cientifica- PIBIC/ CNPq. werlenati@gmail.com. 3 Graduada em Pedagogia Licenciatura pela Universidade Federa de Santa Maria. marci.tasch@gmail.com. 4 Graduada em Pedagogia pela Universidade Federal de Santa Maria. michele06rodrigues@gmail.com. 5 Mestre em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação na Universidade de Santa Maria. Professora Temporária na Universidade Federal de Santa Maria. Tutora a distância na EAD/UAB. luanastahl@yahoo.com.br.

2 13231 presentes nos movimentos construtivos da docência universitária. Tais movimentos são entendidos como um processo que compreende os diferentes momentos da carreira docente, envolvendo trajetória vivencial dos professores e o modo como eles articulam o pessoal, o profissional e o institucional e, consequentemente, como vão se [trans] formando, no decorrer do tempo. Assim, para este trabalho, enfocamos na solidão pedagógica e na insegurança na docência como elementos delineadores dos desafios docentes na compreensão dos professores, destacando que estes estão presentes ao longo da carreira. Palavras-chave: Movimentos construtivos da docência superior. Áreas de conhecimentos. Carreira docente. Desafios docentes. Introdução Este trabalho é um recorte do projeto Os movimentos da docência superior: construções possíveis nas diferentes áreas de conhecimento, que tem por objetivo investigar de que modo as áreas específicas interferem no exercício docente de uma IES Federal. Essa investigação está sendo desenvolvida em uma instituição pública de ensino superior e envolve professores de cursos de licenciatura e bacharelado, com diferentes anos de atuação na instituição e abrange todas as áreas de conhecimento conforme classificação do CNPq. Os movimentos são entendidos nessa pesquisa como diferentes momentos da carreira docente nos possibilitam a compreensão das (trans) formações ocorridas na trajetória formativa de cada um dos docentes no decorrer do tempo. Estes movimentos carregam, portanto, as peculiaridades de cada docente e de como ele interpreta ou interpretou os acontecimentos vividos. Os movimentos não se apresentam de forma linear, mas correspondem a momentos de ruptura ou oscilação, responsáveis pelo aparecimento de novos percursos que podem ser trilhados pelos docentes. Dessa forma, apresentamos neste trabalho as narrativas de quatro docentes universitários de diferentes áreas de conhecimento e com diferentes tempos de experiência universitária, a fim de que a partir dessas falas possamos explicitar as marcas presentes nos movimentos da trajetória profissional de cada participante e o modo como cada professor percebe estes desafios.

3 13232 Metodologia A opção metodológica é qualitativa de cunho narrativo, envolvendo inicialmente a realização de entrevistas semiestruturadas, a transcrição do material, para posterior análise e discussão das compreensões. Entendemos que a narrativa, como procedimento investigativo, possibilita que os professores relatem suas vidas, considerando aspectos vivenciais de sua carreira profissional. Dessa forma, os docentes envolvidos puderam distanciar-se de suas vidas profissionais, convertendo-as em objeto de autorreflexão e, assim, [re] significá-las e transformá-las. (Huberman, 1998; McEvan, 1998). Com relação à análise dos materiais textuais resultantes das transcrições, nossa opção é pela análise textual discursiva (Moraes e Galiazzi, 2007). De acordo com estes autores, a análise textual discursiva pode ser comparada a uma tempestade de luz, pois descontruímos os textos criando as condições para que a tempestade ocorra na unitarização para, em seguida, estabelecer relações na categorização e, por último, construir uma nova compreensão. Os docentes participantes da pesquisa pertencem a diversos cursos, tanto de licenciatura quanto de bacharelado e foram identificados pelo tempo de carreira: Anos iniciais (0 a 5 anos), denominados PAI; anos intermediários (6 a 15 anos), denominados PAT; e anos finais (16 anos em diante), denominados PAF. Neste trabalho, apresentamos as compreensões alcançadas a partir da análise e discussão de quatro narrativas. O primeiro sujeito pertence à área da Ciência da Saúde e faz parte do grupo dos professores dos anos intermediários (PAT), o segundo sujeito pertence à área das Ciências Sociais Aplicadas e faz parte do grupo dos professores dos anos iniciais (PAI), o terceiro sujeito também pertence à área da Ciência da Saúde e faz parte do grupo dos professores dos anos intermediários (PAT) e o quarto sujeito é da área das Ciências e Tecnologias e faz parte do grupo dos professores dos anos finais (PAF) A delimitação do número de narrativas apresentadas e a diversidade do tempo de carreira profissional estão vinculadas à problematização deste trabalho: Como os quatro professores de diferentes áreas e com tempos de carreira diversos compreendem os desafios que se delineiam na prática universitária?

4 13233 Resultados e Discussão A partir de pesquisas que já foram realizadas e que estão sendo aprofundadas pelo Grupo Trajetória de Formação - GTFORMA, é possível afirmarmos que as concepções de docência que os professores apresentam, comportam dinâmicas em que articulam processos reflexivos e práticas efetivas, em permanente movimento construtivo ao longo da carreira docente. Assim, a docência constitui-se como um espaço de atividades alicerçadas não só em conhecimentos, saberes e fazeres, mas também em relações interpessoais e vivências de cunho afetivo, valorativo e ético, o que indica o fato da atividade docente não se esgotar na dimensão técnica, mas remeter ao que de mais pessoal existe em cada professor. (ISAIA e BOLZAN, 2007, p.05). A forma como os docentes percebem a si mesmos, seu fazer pedagógico, os alunos, os colegas, a cultura acadêmica em que estão inseridos e a instituição em que atuam é orientada pelas concepções de docência que veem construindo ao longo da carreira. A identidade profissional dos professores é formada por um processo contínuo que vai deste a fase de escolha da e pela profissão, passando pela formação inicial, até os diferentes espaços institucionais e geracionais onde a profissão se desenrola, compreendendo o espaço/tempo em que cada um continua produzindo sua maneira de ser professor. A partir das narrativas dos quatro docentes selecionados para este trabalho, que pertencem a diferentes áreas e possuem diferentes tempos de experiência na instituição federal, encontramos dois principais marcadores que remetem a percepções pertinentes as suas trajetórias que se configura em desafios na docência: a insegurança na docência e a solidão pedagógica. O sentimento de solidão pedagógica que afeta os professores ocorre em decorrência da falta de apoio institucional ao professor recém-formado ou então recém-chegado na instituição de ensino e/ou também pela falta de apoio de colegas com mais tempo de experiência na carreira docente. O termo solidão pedagógica foi cunhado por Isaia (2006, p.373), indicando o sentimento de desamparo dos professores frente à ausência de interlocução e de conhecimentos pedagógicos compartilhados para o enfrentamento do ato educativo. Esse sentimento está explicitado na narrativa que segue:

5 13234 Ai meu Deus, eu me sinto sozinha. [...] Nós somos muito departamentalizados, os professores lotados por departamento, sendo que o curso é maior que o departamento. Os departamentos ainda não se conversam, precisam exercitar mais isso. (Professor I, Ciências da Saúde - PAT) Na narrativa acima podemos perceber que a divisão por departamentos dificulta o compartilhamento de ideias, a troca de diálogo e experiências coletivas entre os docentes gerando o exercício solitário da docência. Essa individualidade frente ao exercício da docência superior ocasiona a fragmentação da prática docente que se reflete, em muitos casos, na centração na área específica de conhecimento. Assim, por não haver a integração entre o domínio específico e o pedagógico, deixam de possibilitar uma sólida construção didática do conhecimento científico-acadêmico para o profissional. Segundo Isaia (2006, p.67), a estrutura departamental é representativa deste clima de individualismo, uma vez que ela está voltada para o gerenciamento administrativo de disciplinas e professores, não oferecendo, a partir de suas reuniões, espaço propício para a construção compartilhada de estratégias educativas. Além da solidão pedagógica, é possível identificarmos nas falas seguintes o sentimento de insegurança na docência, que se trata de uma característica que é mais comum no início da carreira docente ocasionado pelo desamparo e despreparo dos professores para atuar na docência superior, mas pode também, perpassar a carreira profissional. Esse fato pode ser percebido nas narrativas a seguir: [...] quando eu iniciei e na verdade não existia uma formação docente. Eu tinha feito mestrado, tinha tido aula de metodologia, mas era uma metodologia que não era para preparar para ser professor no caso. Eu sentia dificuldade que eu não tinha prática [...] (Professor II, Ciências Sociais e Aplicadas - PAI). Os primeiros anos de docência me parecem assim que caracteriza muito por sentir aquela dúvida de que eu não fui preparado para ser docente. Eu estudei, me preparei para ser médico e não para ser docente. Então eu tinha muita dúvida de como preparar uma aula, como tu expor um assunto para os alunos. Como tu motivar os alunos, como tu conseguir te relacionar com eles [...] (Professor III, Ciências da Saúde, PAT).

6 13235 Eu tive dificuldades muito maiores no início da carreira. Eu iniciei sem ter prática [...] imagina, um professor começando, que não tem uma experiência naquele assunto, não tem um conhecimento mais a fundo, porque imagina, o conhecimento dele não é aquele, não tem experiência nessa área, ele vai ter o conhecimento do livro [...] (Professor IV, Ciências e Tecnologias, PAF). A partir dessas narrativas pode-se perceber que o sentimento de insegurança na docência pode ser sentido tanto no fato de como se relacionar com os alunos, quanto em relação de como conduzir a disciplina e os conteúdos a serem trabalhados. O desafio encontrado logo no início da carreira é o de construir, desenvolver estratégias de ensino e aprendizagem que articulem o domínio de conhecimentos específicos com a dimensão pedagógica, e, muitas vezes, o que falta é apoio institucional e compartilhamento de ideias e saberes com colegas mais experientes. A falta de preparação para a docência consequentemente ocasiona a não integração do domínio específico ao pedagógico, em muitos casos, deixando assim de possibilitar uma sólida transposição didática do conhecimento científico-acadêmico para o profissional. Segundo Isaia e Bolzan (2007, p.114) a professoralidade vai se construindo aos poucos. O saber-saber e o saber-fazer da profissão não são dados a priori, mas são conquistados arduamente ao longo da carreira docente. No decorrer da carreira o professor desenvolve consciência da prática educativa que exerce e se dão conta que a formação docente é um processo complexo o qual precisa ser construído ao longo da carreira, possibilitando assim a construção de sua professoralidade. Considerações Preliminares Dessa forma, a partir dos resultados encontrados nas análises das narrativas/vozes dos professores participantes foi possível apreender a compreensão que estes professores têm dos desafios enfrentados na docência universitária, possibilitando a compreensão do processo de constituição vivenciado ao longo de suas trajetórias. Independente do tempo de docência, há desafios presentes que indicam marcadores importantes dos movimentos construtivos da docência.

7 13236 A departamentalização é geradora, em muitos casos, do sentimento de solidão pedagógica, pois essa organização dificulta o compartilhamento coletivo de saberes e experiências entre os colegas de trabalho. As exigências institucionais conduzem à centralização de uma prática docente pautada na área de conhecimento específico e, assim, deixa lacunas no aprimoramento da carreira docente. O sentimento de insegurança na docência é um sentimento comum, principalmente, dos primeiros anos da carreira, que ocorre em razão das dificuldades que os professores encontram em saber lidar e agir frente aos alunos, com a falta de domínio do conteúdo da disciplina a ser conduzida, com as dúvidas em relação às estratégias a serem utilizadas no processo de ensino e aprendizagem. Isto se deve ao fato de que inexiste um preparo específico para a docência universitária, ou seja, falta domínio de uma pedagogia para esse nível de ensino. Ainda que tenhamos, no caso das atividades promovidas pelos programas de pósgraduação em educação, a possibilidade de realizar a atividade de docência orientada, estes espaços nem sempre se configuram no compartilhamento pedagógico. Nossa análise permitiu apreender que os professores têm a consciência de que a formação e o desenvolvimento profissional vão além da dimensão técnica. É sobressaliente a compreensão que tais processos envolvem também a formação pedagógica, sendo embasada não só por conhecimentos específicos, mas também por relações interpessoais, afeto, valores, diálogos, compartilhamento coletivo de ideias e experiências que influenciam não só no processo formativo de seus alunos, mas também na sua própria formação. Configuram-se como elementos norteadores da prática universitária a compreensão de que os desafios docentes precisam ser vencidos, e que, a falta de preparo pedagógico para atuar neste nível de ensino é percebida com maior intensidade nos primeiros anos de carreira, esteja ela relacionada ao sentimento de solidão pedagógica ou à insegurança docente. Tais compreensões apontam para a necessidade de continuar sua formação com o auxílio de uma condução pedagógica mais efetiva para que assim seja possível construir a sua docência embasada em conhecimento pedagógico compartilhado. REFERÊNCIAS

8 13237 HUBERMAN, M. Trabajando con narrativas biográficas. In: McEWAN y EGAN (comps.) La narrativa en la enseñanza, el aprendizaje y la investigación. Buenos Aires: Amorrortu, ISAIA, S. M. A. Glossário. In: Morosini, M. (org). Enciclopédia de Pedagogia Universitária. Brasília: INEP/RIES, v. 2, ISAIA, S. M. A. Desafios à docência superior: pressupostos a considerar. In: RISTOFF, Dilvo; SEVEGNANI, Palmira. (Org.). Docência na educação superior. Brasília: INEP, v. 5, 2006, p ISAIA, S. M. A. ; BOLZAN, D. P. V. Diálogo interdiscursivo sobre formação docente a partir da rede de pesquisadores - RIES. LASA International Congress, ISAIA, S. M. A.; BOLZAN, D. P. V. Trajetória profissional docente: desafios à professoralidade. In: Maria Estela Dal Pai Franco; Elizabethe Diefenthaeler Krae. (Org.). Pedagogia Universitária e Áreas do Conhecimento. 1ª ed. Porto Alegre: edi. PUCRS, 2007, v. 1, p McEWAN, H. Las narrativas en el estudio de la docência. In: McEWAN y EGAN (comps.) La narrativa en la enseñanza, el aprendizaje y la investigación. Buenos Aires: Amorrortu, MORAES, R.; GALIAZZI, M. do C. Análise Textual Discursiva. Ijuí: Ed. Unijuí, 2007,223p.