PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5.ª REGIãO Gabinete do Desembargador Federal Ivan Lira de Carvalho (convocado)

Transcrição

1 INQUÉRITO Nº 2885-CE ( ) AUTOR : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL INDIC/INVDO : SEM INDICIADO INVDO : ANTONIO MONTEIRO PEDROSA FILHO ADV/PROC : LURDIANA BEZERRA CUSTODIO MOTA ADV/PROC : PEDRO MONTEIRO CHAVES ORIGEM : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL NO CEARÁ - CE RELATOR : DES. FEDERAL IVAN LIRA DE CARVALHO (CONVOCADO) RELATÓRIO O Exmº Des. Federal IVAN LIRA DE CARVALHO (Relator Convocado): Cuida-se de denúncia oferecida com base no IPL nº 0075/2012/DPF/JNE/CE para apurar delito supostamente praticado por ANTÔNIO MONTEIRO PEDROSA FILHO, atual Prefeito Municipal de Arneiroz/CE, contra a pessoa de MÁRCIO LOPES CRUZ, Escrivão Eleitoral da Cidade de Aiuaba/CE. Noticia a peça acusatória (fls. 02-A/03-A), que no dia 8 de maio de 2012, véspera do último dia para o alistamento eleitoral no período, o servidor público Márcio Lopes Cruz, no exercício do cargo de Chefe do Cartório da 101ª Zona Eleitoral do Estado do Ceará, sediado na cidade de Aiuaba/CE, em razão de haver adotado providências para impedir a repetição de requerimentos de cidadãos que anteriormente haviam tido os respectivos pedidos de registro eleitoral indeferidos, dada a suposta falsificação de comprovantes de residência, ouviu através de telefone, a partir do denunciado, após se manter refratário a repetir o processamento do pleito dos candidatos à inscrição eleitoral, indicando a existência de impedimentos legais, os seguintes impropérios: SEU MERDA! SEU SERVIDOR DE BOSTA! VOCÊ É UM VAGABUNDO, SEU MOLEQUE! VOCÊ SABE COM QUEM ESTÁ FALANDO? VOCÊ ESTÁ FALANDO COM O PREFEITO ELEITO PELO POVO DE ARNEIROZ. EU CONHEÇO LEI. EU VOU LHE PROCESSAR. EU VOU ACABAR COM SUA VIDA, VOCÊ ESTÁ OUVINDO? EU VOU ACABAR COM SUA VIDA. SEU MOLEQUE, SEU MERDA! EU VOU AÍ. Acrescenta que a ligação telefônica se deu através de aparelho de um suposto advogado denominado Brunes. A tipificar a conduta, a peça acusatória indica restar caracterizado o crime de injúria contra funcionário público, dada a ofensa, na função e em razão dela, ao direito de ser respeitado pelo próximo e em especial ao sentimento de dignidade que tem de si próprio (honra subjetiva), do mesmo modo como, em concurso formal, igualmente o crime de ameaça, dada a promessa de mal injusto e grave de tirar-lhe a vida, fatos esses INQ2885-CE/12 1

2 descritos, respectivamente, no art. 140 c/c arts. 141, II, e 145, parágrafo único, e no art. 147, todos do Código Penal. Determinada a notificação do denunciado para os fins do art. 4º da Lei nº 8.038/1993 (fls. 77), vieram aos autos antecedentes criminais (fls. 89/106). Em sua resposta à acusação (fls. 124/131), o denunciado aduz a ausência do ânimo do dolo, ao entendimento de não se evidenciar o agir com o propósito de ofender a dignidade ou causar mal injusto e grave ao servidor, mas sim em decorrência do período eleitoral, no calor de acirrada discussão no âmbito do cartório eleitoral. Ainda, que as provas coligidas não possuem força suficiente, em si e por si, para referendar a suposta conduta a ele atribuída. Distribuído o caderno processual, originalmente, ao Des. Federal Fernando Braga, suscitou ele suspeição na forma do art. 254, I, do Código de Processo Penal (fls. 140), tocando-me, agora, em 16 de abril de 2015, por redistribuição automática. É o relatório. Peço a inclusão do feito em pauta para julgamento. INQ2885-CE/12 2

3 INQUÉRITO Nº 2885-CE ( ) AUTOR : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL INDIC/INVDO : SEM INDICIADO INVDO : ANTONIO MONTEIRO PEDROSA FILHO ADV/PROC : LURDIANA BEZERRA CUSTODIO MOTA ADV/PROC : PEDRO MONTEIRO CHAVES ORIGEM : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL NO CEARÁ - CE RELATOR : DES. FEDERAL IVAN LIRA DE CARVALHO (CONVOCADO) VOTO O Exmº Des. Federal IVAN LIRA DE CARVALHO (Relator Convocado): A denúncia constante das fls. 2A/3A não se mostra dissociada do exigido na lei processual penal (art. 41, CPP). Ao contrário, descreve minuciosamente as circunstâncias do fato criminoso em tese perpetrado pelo acusado, permitindo, como se pode verificar na peça por ele produzida, o exercício da ampla defesa e do contraditório. Em comunicação dirigida ao em. Desembargador Presidente do eg. Tribunal Regional Eleitoral do Ceará, cuja cópia repousa às fls. 4, narra Márcio Lopes Cruz, Técnico Judiciário lotado na 101ª Zona Eleitoral do Estado do Ceará, sediado na cidade de Aiuaba/CE, onde exerce a função de chefia daquele cartório eleitoral, verbis: (...) Aos 08 (oito) dias do mês de maio do corrente ano, véspera do final do alistamento eleitoral para o pleito vindouro, no exercício de minhas atribuições laborais fui, por telefone, ofendido e ameaçado pelo prefeito da cidade de Arneiroz, município amparado pela 101ª Zona Eleitoral, Sr. Antônio Monteiro Pedrosa Filho. A força policial já havia sido solicitada instantes antes em virtude de alteração dos ânimos das pessoas que estavam ali acompanhadas pelo preposto do prefeito citado. Na ocasião, retornei ao serviço no cartório eleitoral, que tem demanda naturalmente maior devido o período, em atenção aos eleitores que ali estavam, prioridade maior naquele momento. Cumpro informar que não abri mão de segurança policial dali em diante até o fechamento do expediente, pedido prontamente atendido pelo sargento responsável pelo policiamento de Aiuaba. No dia seguinte, o Ministério Público Eleitoral deparou-se com caso de fraude, cujo procedimento segue os trâmites legais e tem como suspeita a irmã do referido prefeito (...). Dos termos de depoimento tomados perante a autoridade policial federal, tem-se uníssono que após a devolução da documentação apresentada pelas pessoas que pretendiam, naquela data, a transferência do título eleitoral, por não atendidos os requisitos de conferir com a realidade, um suposto advogado de cidade de Arneiroz/CE, que as acompanhava, chamou o chefe do cartório, o qual, alguns minutos depois, retornando à sala, disse que, através do telefone daquele advogado, o prefeito de INQ2885-CE/12 3

4 Arneiroz/CE o teria desacatado e ameaçado, bem como, ainda estando ele ao telefone, havia pedido ao sargento responsável pelo policiamento no local para igualmente ouvir os impropérios e as ameaças a ele dirigidos, quando o aparelho foi tomado de forma repentina pelo proprietário do aparelho, advogado Brunes, com o encerramento da conversa (fls. 8/10 e 12/14). A injúria, como tipificado no art. 140 do Código Penal, atinge a honra subjetiva, devendo o sujeito passivo ter uma capacidade mínima de fazer um juízo de valores sobre si mesmo. A ameaça, como tipificado no art. 147 do Código Penal, atinge a paz de espírito, a segurança e a liberdade da pessoa humana. Para a tipicidade de ambos os delitos faz-se necessário o agir com dolo. Suscita a defesa, para o caso concreto, a ausência do elemento subjetivo específico, da vontade de ofender, aduzindo um ânimo decorrente do calor da discussão. Pelo observado nos autos, ao menos nesta análise preambular, não há como entender a atipicidade da conduta, eis que não se apresenta a situação posta de desferidos os apontados insultos e ameaças no calor de uma discussão, mas sim haver eles sido proferidos a partir de uma negativa de atendimento de pleito formulado pelo interlocutor, ora denunciado, após anterior narrativa da situação fática entre esse e o proprietário do aparelho telefônico, quanto a alistamento de eleitores cuja documentação não se mostrava hábil para tal ao entendimento não apenas do sujeito passivo, mas de outros servidores do cartório eleitoral. Acrescente-se, como noticiado às fls. 4, na comunicação dirigida ao em. Desembargador Presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Estado do Ceará, que no dia seguinte, o Ministério Público Eleitoral deparou-se com caso de fraude, cujo procedimento segue os trâmites legais e tem como suspeita a irmã do referido prefeito. Assim, o exame de questões como o dolo exige uma análise acurada dos autos, o que somente poderá ser feito no curso da instrução criminal, sendo necessário ouvir o réu e as testemunhas para, só então, se chegar a uma conclusão. Presentes, então, os elementos cognitivos mínimos que embasam a acusação, sem, contudo, qualquer antecipação de juízo, mas apenas reconhecendo a existência de justa causa, recebo a denúncia. É como voto. INQ2885-CE/12 4

5 INQUÉRITO Nº 2885-CE ( ) AUTOR : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL INDIC/INVDO : SEM INDICIADO INVDO : ANTONIO MONTEIRO PEDROSA FILHO ADV/PROC : LURDIANA BEZERRA CUSTODIO MOTA ADV/PROC : PEDRO MONTEIRO CHAVES ORIGEM : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL NO CEARÁ - CE RELATOR : DES. FEDERAL IVAN LIRA DE CARVALHO (CONVOCADO) EMENTA: PENAL E PROCESSUAL PENAL. INQUÉRITO. CRIMES DE INJÚRIA CONTRA FUNCIONÁRIO PÚBLICO, EM RAZÃO DE SUAS FUNÇÕES, E DE AMEAÇA. ART. 140 C/C ART. 141, II, E ART. 145, PARÁGRAFO ÚNICO, E ART. 147, TODOS DO CÓDIGO PENAL. ATENDIMENTO AO PRECEITUADO NO ART. 41 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. PRESENÇA DE ELEMENTOS PROBATÓRIOS APTOS A DEMONSTRAR AUTORIA E INDÍCIOS DE MATERIALIDADE DELITIVA. RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. I. II. III. IV. Pelo observado nos autos, ao menos nesta análise preambular, não há como entender a atipicidade da conduta, eis que não se apresenta a situação posta de desferidos os apontados insultos e ameaças no calor de uma discussão, mas sim haver eles sido proferidos a partir de uma negativa de atendimento de pleito formulado pelo interlocutor, ora denunciado, após anterior narrativa da situação fática entre esse e o proprietário do aparelho telefônico, quanto a alistamento de eleitores cuja documentação não se mostrava hábil para tal ao entendimento não apenas do sujeito passivo, mas de outros servidores do cartório eleitoral. O exame de questões como o dolo exige uma análise acurada dos autos, o que somente poderá ser feito no curso da instrução criminal, sendo necessário ouvir o réu e as testemunhas para, só então, se chegar a uma conclusão. Presença dos elementos cognitivos mínimos que embasam a acusação, sem, contudo, qualquer antecipação de juízo, mas apenas reconhecendo a existência de justa causa. Recebimento de denúncia. INQ2885-CE/12 5

6 ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos de INQUÉRITO, em que são partes as acima mencionadas. ACORDAM os Desembargadores Federais do Pleno do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, à unanimidade, em receber a denúncia, nos termos do voto do Relator e das notas taquigráficas que estão nos autos e que fazem parte deste julgado. Recife, 29 de abril de Des. Federal Ivan Lira de Carvalho Relator Convocado INQ2885-CE/12 6