IV ENCONTRO ESTADUAL DE HISTÓRIA - ANPUH-BA HISTÓRIA: SUJEITOS, SABERES E PRÁTICAS. 29 de Julho a 1 de Agosto de Vitória da Conquista - BA.
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1 IV ENCONTRO ESTADUAL DE HISTÓRIA - ANPUH-BA HISTÓRIA: SUJEITOS, SABERES E PRÁTICAS. 29 de Julho a 1 de Agosto de Vitória da Conquista - BA. PASTAS ADMINISTRATIVAS E OS RETRATOS COMO FONTES NO ESTUDO DA HISTÓRIA Vanessa Magalhães da Silva Mestranda em História pela Universidade Federal da Bahia (UFBA) biaiju@yahoo.com.br Palavras-chave: Faculdade de Filosofia da Bahia. Corpo docente. Pastas administrativas. História intelectual. No horizonte de todo historiador está sempre um universo documental sobre o qual ele deverá se debruçar para a construção de uma narrativa referente a fatos do passado. Essa assertiva, bastante óbvia para to dos os que se dedicam à leitura de obras historiográficas, esteve no âmago da nossa pesquisa quando e sta principiou em janeiro de 2006, com um trabalho voluntário de organização de parte do acervo do Arquivo da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas (FFCH) da UFBA. Organizando e catalogando as pastas dos professores aposentados da Faculdade, percebemos a riqueza do acervo, surgindo daí a idéia de pesquisar a trajetória e a vida intelectual desses homens e mulheres. Imediatamente veio à nossa mente uma p assagem do clássico trabalho de Bloch (2001, p ) sobre o ofício do historiador. O pai da História Nova asseverou ser quase infinita a diversidade dos testemunhos históricos. E completou dizendo que tudo quanto o homem diz ou escreve, tudo quanto f abrica, tudo em que toca, pode e deve informar a seu respeito. Se a preocupação inicial do historiador, ao começar uma pesquisa, é com as fontes a serem trabalhadas e que se conformarão como a base do seu trabalho, não se pode perder de vista que, por mai s completo que seja o universo documental ele nos remeterá a um mundo diferente. Diferentemente do mundo que nos cerca, do qual somos coevos, o conhecimento do passado é necessariamente indireto (BLOCH, 2001, p. 69 ). Com estas idéias na cabeça começa a tarefa de refletir sobre o que a fonte pode revelar. Qual é o tipo de trabalho a ser feito, quais os referenciais a serem utilizados para que os documentos ajudem a esclarecer indagações sobre o passado que surgem à medida que começa a leitura dos primeir os fólios. Este artigo objetiva apresentar as pastas administrativas dos docentes fundadores da Faculdade de Filosofia da Bahia e seus retratos como fontes para o trabalho do historiador. Pretendemos evidenciar as contribuições e os problemas suscitados po r esta rica documentação, demonstrando como estas fontes influenciaram os métodos de trabalho aplicados no desenvolvimento do projeto de pesquisa intitulado Uma história da docência na
2 2 Bahia: os professores da Faculdade de Filosofia e suas trajetórias ( ) 1. Não só isto. Este acervo documental faz parte da essência da fundação da Faculdade de Filosofia da Bahia. Suas gerações precursoras deixaram traços que podem, ao serem reconstituídos, ajudar a elucidar facetas da história recente da Bahia, concernentes à sua história política, intelectual, cultural, institucional e quem sabe uma história que se marque por influências múltiplas, interdisciplinar. A primeira etapa da jornada foi a organização das pastas administrativas que se encontram no Arquivo da FFCH. Ordenamos as pastas em blocos, arquivamos por ordem alfabética e elaboramos uma ficha biográfica de cada professor. Começamos a nos deparar com os problemas, pois, algumas pastas não foram encontradas, provavelmente pelas várias mudanças de sede d a Faculdade. Dispomos no Arquivo da FFCH a Ata de Fundação da Faculdade de Filosofia e o Livro de posse do corpo docente que também nos servirão de fontes. A riqueza do acervo criou em nosso anseio a expectativa de ajudar a preencher algumas das muitas lacunas que ainda existem quanto à origem da Faculdade, sua fundação, seus primeiros docentes, locais de sociabilidade que frequentavam, traços das mentalidades dos personagens que foram seus contemporâneos, sua posição de arena de debates intelectuais e polí ticos e de plataforma de negociação e legitimação de interesses. Procedemos, em seguida, a um levantamento bibliográfico rico. Analisando a vida de alguns professores e amparados pela bibliografia a pesquisa teve novo s desdobramentos. Surgiu, então, a idéia de estabelecer uma ponte entre a Faculdade de Filosofia e outros locais de sociabilidade intelect ual presentes no cenário baiano da década de 40 do século passado. Interessante seria encontrar locais que possibilitassem a revelação de redes intelect uais. Verificamos que alguns dos professores, ao tempo em que se configuravam como docentes, desempenhavam, também, atividades intelectuais na Academia de Letras da Bahia e no Instituto Geográfico e Histórico da Bahia. Destarte, se concretizava a oportunidade de entrecruzar os papéis desempenhados em diferentes instituições e mapear a atuação dos docentes e a confecção de redes de sociabilidade intelectual. O período em estudo compreende os anos de 1941, ano da fundação da Faculdade, ao ano de 1968, quando acontece a Grande Reforma Universitária, durante a Ditadura Militar. A Faculdade de Filosofia desempenhou um papel muito importante no universo intelectual baiano na década de 40 do século XX, nomes do seu corpo docente, além de membros das 1 Projeto de Mestrado apresentado ao Programa de Pós -graduação em História Social da UFBA.
3 3 instituições citadas, eram personagens da política local e nacional. Alguns exerceram cargos políticos e públicos, como Antônio Balbino de Carvalho Filho, Luiz Viana Filho e Raul Baptista de Almeida. A Faculdade de Filosofia da Bahia foi criada a partir da idéia d o educador Isaías Alves e a primeira reunião data de sua fundação aconteceu no dia 13 de junho de 1941 na Associação Comercial da Bahia. Os professores tomaram posse no dia 15 de dezembro de 1942 e as aulas da Faculdade começaram em março de Em decorrência dos poucos cursos de nível superior existentes no início do século XX, a maioria dos professores era formada em Medicina, seguido dos bacharéis em Ciência s Jurídicas e Sociais e dos Engenheiros Civis. Os professores não eram especializados nas cadeiras que lecionavam. Era comum um Cirurgião Dentista formado pela Faculdade de Medicina exercer a cadeira de Catedrático de Língua e Literatura Espanhola; ou um médico ser Catedrático de Filologia e Língua Portuguesa, Catedrático de Filologia Românica, Catedrá tico de Literatura Hispano - Americana ou, ainda, Catedrático de Antropol ogia e Etnografia, dentre outras cátedras. Essas informações foram encontradas nas pastas. As pastas administrativas contêm informações sobre a vida docente dos professores, bem como produções intelectuais, correspondências, discursos, registros de viagens, além de informações administrativas e funcionais. Exemplo disso é um documento encontrado na pasta do professor Frederico Edelweiss, cuja biblioteca particular hoje está incorporada a o Centro de Estudos Baianos (CEB) e recebeu justamente o seu nome. Este documento, que se trata de um pedido de titulação de professor emérito ao professor Edelweiss, nos informa que ele foi um dos precursores do estudo da Língua tupi -guarani, quando esta cátedra foi instituída na FFB, ela era ministrada apenas na Universidade de São Paulo. Nossa pesquisa não objetiva fazer um trabalho sistemático sobre relações de gênero. Mas trataremos das mulheres, enquanto professoras, inseridas no corpo docente, analis ando algumas questões de gênero, pois estudamos um período de uma sociedade ainda com muitos valores conservadores. Há, no Arquivo da FFCH, pastas de duas professoras fundadoras: Gabriella Leal de Sá Pereira e Guiomar de Carvalho Florence. Catedrática de L íngua e Literatura Alemã e catedrática de História e Filosofia da Educação, respectivamente. A professora Leal, que exerceu a função de diretora da FFCH em 1960, foi Bacharela em Ciências Jurídicas e Sociais pela Faculdade de Direito da Bahia, formada em e a professora Guiomar Florence não tinha formação superior. Consta na Ata de Fundação a assinatura da Professora Maria Luigia Magnavita, assim como referências a ela em outras pastas e documentos, mas não foi encontrada a sua pasta administrativa. É possível fazer uma
4 4 pesquisa sobre gênero, a professora Gabriella Leal, por exemplo, se formou em Direito em 1933, período em que pouquíssimas mulheres tinham acesso a um curso superior. Outra fonte que utilizamos em nossa pesquisa são os retratos de profess ores que estão expostos na sala da direção da FFCH. Decidimos incluir em nossa pesquisa uma abordagem que contemplasse esses quadros, sem escapar ao tema inicial de nossa pesquisa, que é o estudo da primeira geração de professores da Faculdade de Filosofia da Bahia e seus meios e mecanismos de sociabilidade intelectual na Bahia das décadas de 40 a 60 do século XX. A perspectiva, deste modo, é fazer uma análise que promova o diálogo entre a história intelectual e a cultura material. As pinturas são símbolos que permeiam o imaginário e servem como elementos de legitimação. Estes quadros, que se configuram a um só tempo como parte da cultura material da Faculdade de Filosofia da Bahia e da sua história intelectual, podem, sem dúvida contemplar a agenda propost a por Meneses (2003, p ) de temas que enriqueçam as relações analíticas que colocam história e campo visual fre nte a frente. Os quadros devem ser vistos como documentos privilegiados que permitem entabular diálogos entre diferentes tendências da nar rativa histórica. Na condição de fontes a serem utilizadas para enriquecer o entendimento da sociedade baiana de meados do século XX, coadunam-se como elementos fundamentais para ajudar a elucidar traços das mentalidades e dos costumes que norteavam os ans eios e as convenções dos diversos segmentos sociais, especialmente daqueles que alimentavam os grupos docentes com seus representantes. A Faculdade enquanto instituição se expressa por meio desta documentação imagética, cria uma narrativa do passado que se conforma como campo privilegiado para o historiador. Estes quadros que fazem parte da cultura material da Faculdade de Filosofia da Bahia constroem um discurso sobre o passado da instituição e o rastro deixado por estas obras, certamente, está relacionado a disputas por poder e legitimidade. Traços da cultura material que, produzidos sob os auspícios de uma elite política num contexto antidemocrático e conservador por excelência, mostram os mecanismos utilizados por elementos destas elites que buscam pre stígio social através da atuação intelectual para sacramentar suas ações e preservar sua memória num período em que o culto da personalidade era a tônica da atuação na vida política. É preciso levar em consideração a proposta de abordar as atividades int electuais dos docentes fundadores da Faculdade de Filosofia da Bahia enquanto atitudes políticas, principalmente quando se pondera sobre os anseios destas gerações formadas nas primeiras
5 5 décadas do século XX, que estavam inclinadas a desempenhar uma ação c onjunta que mesclava a atividade intelectual e a prática política. Uma contribuição fundamental que esses quadros podem dar a nossa pesquisa é auxiliar na compreensão dos mecanismos utilizados por segmentos das elites intelectuais da Bahia, que tentam faze r prevalecer sua visão de mundo a partir dos discursos e narrativas calcados e camuflados em formas simbólicas imagéticas. São doze quadros de professores e não há retrato de mulheres. Fazendo o cruzamento das fontes, com um exemplo prático, é possível encontrar em algumas pastas informações sobre datas de inauguração dos retratos. Carlos Chiacchio faleceu em 1947 e em sua pasta consta um documento da Conferência realizada no Salão Nobre da Reitoria por ocasião da inauguração de seu retrato, no dia 28 d e outubro de A pasta de Manuel Peixoto contém um documento enviado à senhora Irene Baker, no qual a Faculdade a convidava para a inauguração do retrato do professor Peter Baker na Galeria de Mortos Ilustres, no dia 22 de abril de A pasta do pro fessor José Valladares contém um convite destinado ao Sr. Francisco do Prado Valladares, para a colocação dos quadros de Francisco Xavier Ferreira Marques, Herbert Parente Fortes, Antônio Luiz Cavalcanti de Albuquerque de Barros Barreto e José Antônio do P rado Valladares, que ocorreria às 16 horas do dia 1º de outubro de Nas pastas dos professores Magalhães Netto, Renato Mesquita e Barros Barreto também constam informações sobre os quadros. Não consta nos arquivos a pasta de um dos professores retrata dos, Xavier Marques. Assim como não consta a pasta do professor fundador Isaías Alves. A pesquisa com os retratos e as pastas administrativas dos professores nos remeteu a outras discussões, sobre a formação acadêmica dos professores e suas áreas de atuaçã o, além de questões de gênero e classe que poderão se tornar objeto de outras pesquisas. São caminhos possíveis. É possível fazer um trabalho de história da educação, história intelectual, história institucional e porque não, de cultura material e história visual, com as fontes com as quais pesquisamos. As pastas administrativas e os retratos, a priori, não têm muito a nos oferecer, mas com um olhar minucioso do historiador, é possível perceber muito sobre o período estudado, sobre a produção desses intelec tuais e sobre suas relações com o utros espaços de sociabilidades, seus meios de legitimação e as relações de poder.
6 6 Referências BLOCH, Marc. Apologia da história ou o ofício do historiad or. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, BURKE, Peter. A escrita da História. São Paulo: Editora Unesp, CARDOSO, Ciro Flamarion ; VAINFAS, Ronaldo ( Org.). Domínios da História: ensaios de teoria e metodologia. Rio de Janeiro: Campus, EL FAR, Alessandra. A encenação da imortalidade. Rio de Janeiro: Editora FGV, MENESES, Ulpiano T. Bezerra de. Fontes visuais, cultura visual, história visual. Balanço provisório, propostas cautelares. Revista Brasileira de História, São Paulo: ANPUH, v. 23, n. 45, p , jul UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA. Notícias Históricas da Universidade da Bahia. Salvador, 1966.
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