TRIBUNAL DE JUSTIÇA SEGUNDA CÂMARA CÍVEL

Transcrição

1 TRIBUNAL DE JUSTIÇA SEGUNDA CÂMARA CÍVEL Apelação Cível nº Apelante: UNIMED SÃO GONÇALO NITERÓI SOCIEDADE COOPERATIVA DE SERVIÇOS MÉDICOS E HOSPITALARES LTDA Apelado: MARIA EMÍLIA PORTO FROES DOS SANTOS Relatora: Des. ELISABETE FILIZZOLA DECISÃO APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. PLANO DE SAÚDE. NEGATIVA NA AUTORIZAÇÃO DE MATERIAL CIRÚRGICO. FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS CARACTERIZADA. INFRINGÊNCIA DO CDC. DANO MORAL CONFIGURADO. A recusa injustificada na autorização de material cirúrgico configura falha na prestação de serviços, merecendo ser a autora indenizada pelos danos sofridos. Este é o entendimento firmado por este Tribunal de Justiça consubstanciado na Súmula 211: "Havendo divergência entre o seguro saúde contratado e o profissional responsável pelo procedimento cirúrgico, quanto à técnica e ao material a serem empregados, a escolha cabe ao médico incumbido de sua realização. O verbete sumular nº 112 deste E. TJ/RJ também dispõe: É nula, por abusiva, a cláusula que exclui de cobertura a órtese que integre, necessariamente, cirurgia ou procedimento coberto por plano ou seguro de saúde, tais como stent e marca-passo. Dano moral in re ipsa. Verba compensatória arbitrada no valor de R$ ,00, que se mostra razoável. RECURSO AO QUAL SE NEGA SEGUIMENTO, COM FULCRO NO ARTIGO 557, CAPUT, DO CPC. MARIA EMÍLIA PORTO FROES DOS SANTOS ajuizou ação indenizatória em face de UNIMED SÃO GONÇALO NITERÓI SOCIEDADE COOPERATIVA DE SERVIÇOS MÉDICOS E HOSPITALARES LTDA alegando, em síntese, ser associada da ré e apresentou discopatia degenerativa discal e hérnia de disco, sendo necessária a realização de intervenção cirúrgica, com procedimento

2 2 denominado artrodese de coluna lombar. Afirma que a operadora de plano de saúde negou a autorização de todos os materiais cirúrgicos solicitados pelo médico assistente, sob o fundamento de tratar-se de material importado, conduta esta que reputa abusiva. Requer a condenação da ré ao ressarcimento dos danos materiais suportados no valor de R$ ,20, bem como ao pagamento de indenização por dano moral, em quantia a ser arbitrada pelo Juízo. Sentença a fls. 190/193, julgando procedente o pedido autoral para condenar a ré a restituir à autora a quantia de R$ ,20 (quarenta e cinco mil, novecentos e vinte reais e vinte centavos), acrescida de correção monetária desde o efetivo pagamento (20/08/2010) e de juros moratórios de 1% a.m. a contar da citação. Condenou a ré, ainda, ao pagamento de indenização por dano moral no valor de R$ ,00 (dez mil reais), atualizado pelos índices do TJ/RJ, com juros legais de 1% a.m. a partir da publicação da presente. Condenou a ré ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios fixados em 10% do valor da condenação. Apelo tempestivo e regularmente preparado interposto pela ré a fls. 194/208, sustentando, em suma, ter sido avaliado o material cirúrgico solicitado pelo médico da autora, tendo sido solicitada a retificação de sua quantidade. Alega, para tanto, ser necessária a autorização prévia da Unimed para a realização de atendimentos clínicos e cirúrgicos e, no caso, não houve recusa na autorização, inexistindo dever de indenizar. Pugnou pelo provimento do recurso, com a improcedência do pedido ou, caso assim não entenda, seja minorado o quantum arbitrado a título de dano moral. Contrarrazões a fls. 212/222 pela autora. É o relatório. Decido na forma do artigo 557, caput do Código de Processo Civil. A relação existente entre as partes é regida pelo Código de Defesa do Consumidor, uma vez que se insere a autora na concepção de consumidora, o serviço prestado pela ré se enquadra no conceito legal de fornecedor de serviços.

3 3 A autora, idosa, apresentou quadro de discopatia com protusão discal em L3/L4 e L4/L5 e L5/S1, artrose e hipertrofia facetaria com listese de L4 e L5, sendo indicado tratamento cirúrgico para descompressão radicular e fixação da coluna para correção das listese, conforme laudo médicos acostados a fls. 35 e 42. Apesar da ré sustentar não ter havido negativa de autorização dos materiais, sustentou em suas razões que concluiu pela correção da quantidade de materiais, ao invés de 8 parafusos pediculares e 8 bloqueadores, foram recomendados 6 parafusos e 6 bloqueadores e a desnecessidade de hemostático em pó e a correção da quantidade do procedimento de artrodese, ao invés de 3x o recomendado seria 2x. (fls. 196/197) É inequívoca a obrigação da ré no custeio do procedimento e materiais necessários à cirurgia da paciente, descabendo indagações acerca da conduta do médico assistente. No caso, a ré não autorizou a quantidade de material cirúrgico solicitado pelo médico e negou o material denominado hemostático em pó, restando evidenciada a falha na prestação de serviços. Consoante entendimento firmado por este E. Tribunal de Justiça consubstanciada na Súmula 211: "Havendo divergência entre o seguro saúde contratado e o profissional responsável pelo procedimento cirúrgico, quanto à técnica e ao material a serem empregados, a escolha cabe ao médico incumbido de sua realização. A Constituição da República, em seu artigo 5º, considera o direito à vida e à saúde, como direitos fundamentais da pessoa humana. Diante do evidente relevante interesse público da atividade desenvolvida pela operadora de plano de saúde, compete ao Estado promover as necessárias intervenções e regulamentações, bem como tutelar as condições de atendimento à saúde em caso de necessidade da consumidora.

4 4 Há inequívoca violação ao princípio da boa-fé e segurança jurídica, não se podendo desconsiderar a legítima expectativa da autora em ver-se protegida pelo plano de saúde contratado, que restou frustrado. Deste modo, a falha na prestação de serviços da demandada enseja a reparação dos danos causados à autora, restituindo-se a quantia paga de R$ ,20 a título de danos materiais (fl. 44). Não há como considerar que a postura da ré como hipótese de mero descumprimento contratual, haja vista o manifesto dano moral causado à autora. A reparabilidade do dano moral não mais se questiona, eis que a Constituição Federal, no seu artigo 5º, V e X, reconhece a possibilidade de indenização desses danos que não atingem o patrimônio material da vítima. No caso, não há como se negar as consequências da atitude da ré em deixar de autorizar o material cirúrgico indicado à autora, causou-lhe sofrimento, angústia e humilhação que ultrapassam, em muito, o mero aborrecimento, principalmente levando-se em conta seu estado de saúde. Os efeitos do inadimplemento, em hipóteses como a presente, por sua própria natureza, exorbitam o aborrecimento que normalmente decorre de um mero descumprimento contratual, sendo evidente a frustração, a angústia e o desconforto da autora que, na hora em que mais precisou dos serviços médicos, viu negada a sua contraprestação. STJ: Vale ainda destacar o entendimento firmado pelo AGRAVO REGIMENTAL. PLANO DE SAÚDE. CIRURGIA CARDÍACA. IMPLANTE DE MARCAPASSO. RECUSA INDEVIDA DA COBERTURA. DANO MORAL CONFIGURADO. Em consonância com a jurisprudência pacificada deste Tribunal, a recusa indevida à cobertura médica enseja reparação a título de dano moral, uma vez que agrava a

5 5 situação de aflição psicológica e de angústia no espírito do segurado, já combalido pela própria doença. Precedentes. Agravo improvido. (AgRg no REsp /RN, Ministro SIDNEI BENETI, Terceira Turma, julgado em 21/10/2008) Diante do exposto, verifica-se que o valor arbitrado pela douta julgadora de primeira instância em R$ ,00 revela-se perfeitamente justo e suficiente para a reparação dos pleiteados danos morais, não estando, portanto, a indicar o inquinado quantum a necessidade de qualquer reparo, em atendimento aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade. Como ensina o ilustre Desembargador e Professor Sérgio Cavalieri Filho, em sua obra Programa de Responsabilidade Civil, 6ª edição, Editora Malheiros, pág. 116:... o juiz, ao valorar o dano moral, deve arbitrar uma quantia que, de acordo com o seu prudente arbítrio, seja compatível com a reprovabilidade da conduta ilícita, a intensidade e duração do sofrimento experimentado pela vítima, a capacidade econômica do causador do dano, as condições sociais do ofendido e outras circunstâncias mais que se fizerem presentes. Por tais fundamentos, sendo o recurso manifestamente improcedente, com fulcro no artigo 557, caput do CPC, NEGO-LHE SEGUIMENTO. Rio de Janeiro, 07 de novembro de Des. ELISABETE FILIZZOLA Relatora