TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo

Transcrição

1 ACÓRDÃO Registro: Vistos, relatados e discutidos estes autos do Apelação nº , da Comarca de, em que são apelantes TAM LINHAS AÉREAS S/A e MULTIPLUS S/A, é apelado JOÃO MIGUEL DE MEDEIROS CURY (JUSTIÇA GRATUITA). ACORDAM, em 15ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de, proferir a seguinte decisão: "Negaram provimento ao recurso. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores COELHO MENDES (Presidente sem voto), DENISE ANDRÉA MARTINS RETAMERO E VICENTINI BARROSO., 11 de agosto de JOSÉ WAGNER DE OLIVEIRA MELATTO PEIXOTO RELATOR Assinatura Eletrônica

2 Apelação (Com revisão) nº Apelante (s): Tam Linhas Aéreas S.A. e Multiplus S.A. Apelados (s): João Miguel Medeiros Cury Comarca:, 24ªVara Cível do Foro Central Juiz de 1º Grau: JOÃO OMAR MARÇURA Órgão 2º Grau: 15ª Câmara de Direito Privado, Subseção II Relator: JOSÉ WAGNER DE OLIVEIRA MELATTO PEIXOTO VOTO Nº 761 PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS REPARAÇÃO CIVIL PROGRAMA DE MILHAGENS Sentença que aplicou o Código de Defesa do Consumidor e inverteu o ônus da prova reconhecendo ausência de demonstração de culpa exclusiva do autor e falha das rés na prestação dos serviços quanto ao dever de vigilância e cuidados sobre a integridade das operações realizadas pela internet ou mesmo dentro das próprias agências das prestadoras de serviços, e as condenou a pagar R$ ,00 a título de danos materiais pela utilização fraudulenta de milhas do saldo acumulado pelo autor - Recurso das requeridas, TAM e MULTIPLUS objetivando a redução do valor dos danos materiais sob alegação de que houve restituição parcial da pontuação referente as milhas do programa de fidelidade do autor/apelado A alegada restituição das milhas, se ocorrida, foi realizada por mera liberalidade das apelantes e, ao que tudo indica, depois da sentença, pois a informação consta apenas nas razões do apelo O valor pedido e acolhido a título de danos materiais não foi impugnado especificadamente pelas apelantes Magistrado a quo que entendeu de forma correta pela aplicação do art. 302, do Código de Processo Civil Subsistência sem prejuízo de eventual estorno da pontuação ulteriormente creditada - Manutenção da sentença por seus próprios fundamentos, nos termos do RITJSP, artigo 252 Negado provimento ao apelo. Apelação nº Voto nº DASV 2

3 Trata-se de recurso de apelação interposto em face da sentença de fls. 85/87, com embargos de declaração rejeitados (fls. 108/109), cujo relatório é adotado, que julgou parcialmente procedente a ação indenizatória condenando as requeridas, solidariamente, ao pagamento de R$20.000,00 a título de dano material em razão da falha na prestação de serviços referente ao programa de milhagens das apelantes. Apelam as rés afirmando que não há comprovação dos efetivos prejuízos, pois a pontuação já foi parcialmente devolvida. Pugnam pela redução do valor da condenação porque excessivo e caracteriza enriquecimento ilícito. Requerem o conhecimento e provimento do recurso (fls. 99/102, reiterada às fls. 111/127). Contrarrazões do apelado às fls. 129/134. Recurso tempestivo e devidamente preparado. É o relatório. Versam os autos sobre ação indenizatória, na qual o autorapelado pretende o recebimento dos danos morais e materiais em razão da falha na prestação de serviços no sistema eletrônico das apelantes que culminou na privação da utilização de seus pontos acumulados (milhagens) diante da fraude perpetrada em seu cadastro. Primeiramente, repete-se os fundamentos da r. sentença de se estar diante de uma relação de consumo, sendo que ao caso aplicam-se as normas do Código de Defesa do Consumidor, notadamente a regra prevista no artigo 6º, inciso VIII, que possibilita a inversão do ônus da prova em favor do consumidorapelado, que é parte vulnerável e hipossuficiente em relação às apelantes. Apelação nº Voto nº DASV 3

4 E que a relação contratual entre as partes restou incontroversa, estando ainda comprovada pelos documentos de fls. 16/18 a existência dos pontos acumulados e a emissão dos bilhetes de passagens em nome de terceiros. Como também que as apelantes não produziram provas robustas para afastar a pretensão do autor. Pelo contrário, restringiram-se a imputar culpa exclusiva ao apelado pela utilização de cartão com senha de uso pessoal e intransferível, afirmando que o sistema é totalmente seguro. E o que restou comprovado realmente, é que houve saque indevido das milhagens do cartão de fidelidade do apelado, tanto que as apelantes alegam, agora, que houve a devolução parcial dos pontos, por mera liberalidade. Concluindo o d. julgador que não há qualquer comprovação de que houve culpa exclusiva do consumidor. Os argumentos das apelantes no tocante a culpa exclusiva do autor e de ausência de responsabilidade, mesmo no caso de culpa de terceiros, ficaram, destarte, respondidos pela afirmação de que competia às requeridas apelantes demonstrar de forma inequívoca que as operações realizadas e não reconhecidas pelo autor foram mesmo realizados por ele ou por pessoa com sua autorização e que seu sistema é imune a falhas ou fraudes. E que nestes casos, a responsabilidade da prestadora de serviços é objetiva. Faz parte do risco do negócio a ocorrência de fraudes, cabendo às apelantes cercar-se de meios para evitar que terceiros de má-fé ingressem em seu sistema, cumprindo, assim, o dever de vigilância e cuidados sobre a integridade das operações realizadas pela internet ou mesmo dentro das próprias agencias das prestadoras de serviços. Na temática recursal os danos materiais arbitrados na sentença, ficam mantidos, uma vez que as apelantes não impugnaram a quantia, nos Apelação nº Voto nº DASV 4

5 termos impostos pelo art. 302, do Código de Processo Civil, corretamente aplicado pelo magistrado, limitando-se, após a prolação da decisão a informar que por liberalidade procedeu-se devolução parcial da pontuação do autor/apelado. Nesse contexto, impõe-se manutenção da procedência da ação, exatamente como constou da r. sentença ao condenar as rés-apelantes ao pagamento de R$20.000,00 pelo dano material decorrente da perda da pontuação em razão da falha na prestação dos serviços, a qual, portanto, fica integralmente mantida por seus próprios e jurídicos fundamentos, consignado que eventual estorno da pontuação creditada é ato de avaliação das próprias apelantes. Enfim, o ato judicial monocrático terminativo que no essencial segue reproduzido conheceu dos fundamentos fático-jurídicos controversos com inteira aplicação do direito positivo vigente e correta interpretação na composição da lide, veja-se: (...) A hipótese é de inversão do ônus da prova porque não é possível ao autor fazer prova de fato negativo, ou seja, de que não transferiu os pontos a terceiros ou permitiu que terceiros se utilizassem de sua senha para resgatar os pontos. Cabia às rés o ônus de tal prova e dele elas não se desincumbiram. Procede o pedido do autor a título de indenização por danos materiais, visto que as rés como fornecedoras de serviços, detêm responsabilidade objetiva em manter e zelar pela segurança dos dados de seus clientes. Nos termos do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor: O fornecedor de serviços reponde independentemente de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos seus serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos (...). Não houve impugnação específica ao valor pleiteado a guisa de indenização por danos materiais, ou seja, as rés não observaram a regra do Apelação nº Voto nº DASV 5

6 art. 302 do CPC. (...) A sentença colacionada é, assim, mantida por seus próprios fundamentos, os quais ficam inteiramente adotados como razões de decidir pelo desprovimento do recurso, nos termos do art. 252 do Regimento Interno deste Egrégio Tribunal de Justiça ao dispor que Nos recursos em geral, o relator poderá limitar-se a ratificar os fundamentos da decisão recorrida, quando, suficientemente motivada, houver de mantê-la. O retro dispositivo regimental tem sido regularmente aplicado por suas Câmaras nesta Seção de Direito Privado para evitar inútil repetição de alegações e fundamentos, e como instrumento eficaz no cumprimento do princípio constitucional de que a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação (CF, artigo 5º, LXXVIII). Exemplifico com os seguintes julgados locais: Apelação , rel. Des. ELLIOT AKEL, em ; Agravo de Instrumento , rel. Des. LUIZ ANTONIO DE GODOY, em ; Apelação , rel. Des. PAULO EDUARDO RAZUK, em ; Apelação , rel. Des. NEVES AMORIM, em ; Apelação , rel. Des. JOSÉ ROBERTO BEDRAN, em ; Apelação , rel. Des. BERETTA DA SILVEIRA, em ; Apelação , rel. Des. JOSÉ JOAQUIM DOS SANTOS, em ; Apelação , rel. Des. PAULO ALCIDES, em ; Agravo de Instrumento , rel. Des. EDGARD JORGE LAUAND, em AI nº , Rel. Des. CAETANO LAGRASTA, em 17/09/2010; Apelação , Rel. Des. MOURA RIBEIRO, em 20/05/2010; Apelação n , Rel. Des. LUIZ ROBERTO SABBATO, em ; Agravo de Instrumento , Rel. Des. EDGARD JORGE LAUAND, em 13/04/2010; Apelação , Rel. Des. SIMÕES DE VERGUEIRO, em 09/06/2010; Apelação , Rel. Des. PAULO ROBERTO DE SANTANA, em 09/06/2010; Apelação nº , Rel. Des. RENATO SARTORELLI, em 01/09/2010; Apelação nº , SP, Rel. Des. CESAR LACERDA, em 27/07/2010; Apelação nº , Rel. Des. EDGARD ROSA, em 01/09/2010; Apelação nº , Rel. Des. PAULO AYROSA, em 14/09/2010; Apelação nº , Rel. Des. MENDES GOMES, em 06/05/2010; Apelação nº , Rel. Des. ROMEU RICUPERO, em 15/09/2010; Apelação nº SP, Rel. Des. JOSÉ LUIZ GAVIÃO DE ALMEIDA, j. 27/03/2012). Apelação nº Voto nº DASV 6

7 O Colendo Superior Tribunal de Justiça já proclamou a legalidade deste entendimento ao reconhecer "a viabilidade de o órgão julgador adotar ou ratificar o juízo de valor firmado na sentença, inclusive transcrevendo-a no acórdão, sem que tal medida encerre omissão ou ausência de fundamentação no decisum".(resp n RS, 2ª Turma, Rel. Min. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, j. de ; REsp n ES, 2ª Turma, Rel. Min. CASTRO MEIRA, j. de ; REsp n AL, 2ª Turma, Rel. Min. ELIANA CALMON, j e REsp n DF, 4ª Turma, Rel. Min. FERNANDO GONÇALVES, j de ). Do mesmo entender é a posição do Colendo Supremo Tribunal Federal que tem decidido ser juridicamente possível adotar os fundamentos de parecer do Ministério Público para o órgão colegiado decidir, conforme proclamado pelo Ministro DIAS TOFFOLI nos RE e , em , no qual afirma: Acompanho na íntegra o parecer da douta Procuradoria-Geral da República, adotando-o como fundamento desta decisão, ao estilo do que é praxe na Corte, quando a qualidade das razões permitem sejam subministradas pelo relator (Cf. ACO 804/RR, Relator Ministro CARLOS BRITTO, DJ 16/06/2006; AO 24/RS, Relator Ministro MAURÍCIO CORRÊA, DJ 23/03/2000; RE /SP, Relator Ministro NÉRI DA SILVEIRA, DJ 01/08/2000). PREQUESTIONAMENTO Anoto ainda entendimento pacífico de que o órgão julgador não está obrigado a citar todos os artigos de lei ordinária, infraconstitucional, ou da Constituição Federal para fins de prequestionamento, no que se consideram automaticamente prequestionadas todas as disposições legais discutidas nos autos. Na temática o Colendo Superior Tribunal de Justiça estabelece que: São numerosos os precedentes nesta Corte que tem por ocorrente o prequestionamento mesmo não constando do corpo do acórdão impugnado a referência ao número e à letra da norma legal, desde que a tese jurídica tenha sido debatida a apreciada (Rec. Esp , SP, Rel. Min. Fontes de Alencar, DJ Apelação nº Voto nº DASV 7

8 , pg.1088). Diante do exposto, pelo meu voto, nos termos do RITJSP, artigo 252, ratifico os fundamentos da sentença recorrida, para mantê-la por suficientemente motivada e nego provimento ao recurso. JOSÉ WAGNER DE OLIVEIRA MELATTO PEIXOTO Relator (assinatura digital) Apelação nº Voto nº DASV 8