13. Formação, suspensão e extinção do processo

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1 (Fonte: Neves, Daniel Assumpção Amorim, Manual de Direito Processual Civil. Salvador: Editora Juspodivm, 2016.) 13. Formação, suspensão e extinção do processo Sumário: Formação do processo Formação gradual da relação jurídica processual Momento da propositura da ação Litispendência Suspensão do procedimento Suspensão própria e imprópria Decisão de suspensão do processo Impugnabilidade da decisão de suspensão do processo Morte ou perda da capacidade processual da parte Dissolução de sociedade Morte ou perda de capacidade processual do representante legal Morte ou perda de capacidade processual do advogado Convenção das partes Arguição de impedimento ou de suspeição Admissão de incidente de resolução de demandas repetitivas Prejudicialidade Necessidade de verificação de determinado fato ou a produção de certa prova, requisitada para outro juízo Força maior Acidentes e fatos da navegação de competência do tribunal marítimo Demais casos regulados pelo novo código de processo civil Prazo de suspensão Vedação à prática de atos processuais durante a suspensão do processo Arguição de suspeição e impedimento do juiz Verificação da existência de fato delituoso pela justiça criminal Extinção do processo Extinção do processo Impropriedade do termo extinção parcial do processo Princípio da cooperação e extinção do processo por sentença terminativa Reconhecimento jurídico do pedido Formação do processo Formação gradual da relação jurídica processual O processo resulta da materialização do direito abstrato de ação, o que se dá pela propositura da ação por meio de protocolo da petição inicial perante o juízo para o qual a peça seja endereçada. Não tenho dúvida de que a partir desse momento já existe uma relação jurídica processual, ainda que apenas linear, formada entre o autor e o juiz. E com isso já existe processo, até porque quando há prolação de sentença liminar, seja para indeferir a petição inicial ou para julgar liminarmente improcedente o pedido do autor, o processo é extinto por essa sentença. Não é preciso muito esforço para compreender que só é possível se extinguir o que exista, de forma que a existência do processo necessariamente deve preceder à sua extinção. O processo, portanto, não precisa da citação para ser formado, não sendo correto o entendimento no sentido de que somente com a citação estar-se-á instaurado o processo. Na realidade o processo não se forma gradualmente, mas sim a relação jurídica processual, que com a citação do réu deixa de ser linear e passa a ser tríplice Momento da propositura da ação O art. 263 do CPC/1973 previa que a propositura da ação se dava com a distribuição em foros com mais de uma vara e com o primeiro despacho do juiz em foros de vara única. Essa previsão trazia um sério problema no tocante à interrupção da prescrição, porque se aplicado o dispositivo legal seria possível que o autor provocasse o Poder Judiciário antes do vencimento do prazo prescricional, mas que a distribuição ou o despacho do juiz ocorresse somente depois desse vencimento. Se realmente a propositura da ação dependesse de um ato do juízo distribuição ou despacho do juiz seria possível a extravagante hipótese de o autor exercer sua pretensão antes do vencimento do prazo prescricional e ainda assim ter seu processo extinto com fundamento na prescrição. Como tal situação é extremamente injusta, contrariando inclusive a própria razão de ser da prescrição, já que nesse caso a inércia não teria sido do titular do direito, o Superior Tribunal de Justiça ignorava a 1

2 previsão legal para entender que a propositura da ação se dava com o protocolo da petição inicial. O art. 312 do Novo CPC consagra esse entendimento, e em feliz redação prevê que a ação se considera proposta desde o protocolo da petição inicial. A propositura da ação é ato unilateral do autor, representado pela apresentação da petição inicial em juízo, não dependendo, portanto, de nenhum ato judicial que não o certificado de que a petição inicial foi protocolada. O registro e/ou a distribuição do processo, atos a serem praticados pelo Poder Judiciário, são estranhos ao ato da parte de propor a ação, sendo-lhe sempre posteriores Litispendência O termo litispendência é equívoco, podendo significar pendência da causa (que começa a existir quando de sua propositura e se encerra com a sua extinção) ou pressuposto processual negativo verificado na concomitância de processos idênticos (mesma ação). O art. 312 do Novo CPC adotou o primeiro sentido da expressão para prever que, ainda que a propositura da ação se dê com o protocolo da petição inicial, ela só produz quanto ao réu os efeitos mencionados no art. 240 do mesmo diploma processual depois que for validamente citado. Para o autor, há litispendência desde o protocolo de sua petição inicial, enquanto que para o réu a litispendência depende de sua citação válida. Ou ainda, como prefere parcela da doutrina, há litispendência desde a propositura da ação, mas seus efeitos são gerados para o autor a partir desse momento e para o réu somente depois de sua citação Suspensão do processo Suspensão do procedimento O processo é projetado para ter seu andamento sem interrupção, de forma que qualquer paralisação em seu trâmite é considerada pela melhor doutrina como crise do procedimento. Sendo a duração razoável do processo um dos princípios processuais consagrados tanto na Constituição Federal (art. 5º, LXXVIII) como no Novo Código de Processo Civil (art. 6º), é natural se compreender que qualquer suspensão do procedimento aumente o tempo de duração do processo, aparentemente conspirando contra tal princípio. Ocorre, entretanto, que em razão de determinadas circunstâncias é preferível a suspensão do que o andamento, sendo tal opção derivada de causas de ordem física, lógica e jurídica. Diferente do que está previsto no art. 313 do Novo CPC, o dispositivo na realidade não consagra causas de suspensão do processo, até porque o processo nunca é suspenso, mantendo-se íntegro mesmo durante o prazo de suspensão. O que se suspende é o procedimento e não o processo, ou seja, cessa o andamento regular do processo por um determinado período Suspensão própria e imprópria A suspensão do processo é tecnicamente a situação em que todo o procedimento cessa durante um determinado período. Ocorre, entretanto, que por vezes, apesar de parcela do procedimento continuar a ter andamento, outra parcela fica suspensa, como ocorre nos julgamentos de incidentes processuais, que suspendem o procedimento principal, mas por fazerem parte do processo, permitem que ele ao menos parcialmente continue a tramitar. Tome-se como exemplo o incidente de resolução de demandas repetitivas (IRDR). O processo em que foi instaurado será suspenso, mas na realidade o que fica suspenso é o procedimento principal desse processo, porque sendo o incidente parte dele, o processo parcialmente continuará seu trâmite, por meio do incidente processual. Diante dessas duas realidades distintas, a doutrina costuma falar em suspensão própria e imprópria do processo, ainda que nesse segundo caso não haja propriamente suspensão do processo. Na suspensão própria todo o procedimento cessa seu andamento por um determinado período, enquanto que na 2

3 suspensão imprópria a suspensão atinge apenas parcela do procedimento, enquanto outra parte tramita normalmente Decisão de suspensão do processo É tranquilo o entendimento de que a suspensão depende de uma decisão judicial nesse sentido, havendo, entretanto, divergência doutrinária a respeito do conteúdo de tal decisão. A doutrina majoritária entende tratar-se de decisão meramente declaratória, que se limita a dar a certeza jurídica da presença de uma das causas legais de suspensão do processo. Minoritariamente, há doutrinadores que defendem a natureza constitutiva, já que ela seria capaz de paralisar a atividade processual. Apesar da divergência doutrinária, há um ponto de aceitação generalizada: a decisão de suspensão do processo tem eficácia ex tunc, ou seja, retroage à data do evento que deu causa à suspensão, devendo-se considerar desde esse momento suspenso o procedimento. É no mesmo sentido o entendimento do Superior Tribunal de Justiça Impugnabilidade da decisão de suspensão do processo Por não estar previsto no rol do art do Novo CPC e nem haver qualquer previsão expressa nesse sentido, a decisão interlocutória de suspensão do processo não é recorrível por agravo de instrumento, salvo se proferida no inventário, cumprimento de sentença, processo de execução e liquidação de sentença (art , parágrafo único, Novo CPC). Teoricamente, a decisão seria impugnável em sede de apelação ou contrarrazões, nos termos do art , 1º, do Novo CPC, mas nesse caso fica evidente a inutilidade da impugnação da decisão somente nesse momento procedimental. Se o processo ficar suspenso indevidamente, e depois disso retomar seu andamento até a prolação da sentença, exatamente qual a utilidade prática de somente na apelação ou contrarrazões se insurgir contra a decisão que determinou a suspensão? Diante da manifesta inutilidade da forma impugnativa será cabível o mandado de segurança contra essa decisão. Registre-se que o Superior Tribunal de Justiça admite o mandado de segurança contra ato judicial justamente quando o recurso cabível é incapaz de inverter a sucumbência suportada pela parte Morte ou perda da capacidade processual da parte Falecendo a parte durante o processo e sendo o direito nele discutido intransmissível, o processo será extinto nos termos do art. 485, IX, do Novo CPC. Nos demais casos, a morte da parte será causa de suspensão do processo, nos termos do art. 313, I, do Novo CPC. Essa distinção de tratamento é reconhecida pelo art. 313, 2º, II, do Novo CPC, que prevê que a intimação do espólio, sucessor ou herdeiro do autor depende de o direito em litígio ser transferível. Tendo a decisão sobre a suspensão do processo eficácia ex tunc, o processo estará suspenso desde o momento em que a parte faleceu, sendo irrelevante para esse fim o momento em que a informação é levada ao juízo ou o da data da decisão de suspensão. A suspensão de processo, em virtude de falecimento da parte e cujo objeto seja direito transmissível, deve ser analisada com cuidado, porque depois de sua morte é possível que sejam praticados atos que não dependam de intervenção da parte, sendo, nesse caso, irrelevante se ela está viva ou morta. Nesses casos, não parece adequado afirmar-se que o processo está suspenso e que tais atos não podem ser praticados (art. 314 do Novo CPC). Se os autos estão com o contador judicial, porque ele teria que parar seu trabalho em razão do falecimento da parte? Se os autos estão conclusos para a sentença e ocorre o falecimento da parte, porque o juiz teria que esperar a regularização processual para sentenciar o processo? Nos arts. 687 a 692 do Novo CPC está prevista a ação de habilitação, que segundo o art. 687 do Novo 3

4 CPC é cabível quando ocorrer o falecimento de uma das partes e os interessados houverem de suceder-lhe no processo. Trata-se de ação incidental de procedimento especial para habilitar a sucessão processual na hipótese de morte da parte. Nos termos do 1º do art. 313 do Novo CPC, a propositura dessa ação suspende o processo, sendo exatamente essa a previsão do art. 689 do Novo CPC. Os dois dispositivos têm previsão inadequada porque não é a propositura da ação incidental de habilitação que suspende o processo, que na realidade estará suspenso desde o falecimento da parte. Caso não seja ajuizada a ação de habilitação, mas o juiz tome de ofício conhecimento da morte da parte, o 2º do art. 313 do Novo CPC prevê que o juiz determinará a suspensão do processo (na realidade o processo já estará suspenso, sendo a decisão meramente declaratória), e adotará posturas distintas a depender de o falecimento ter ocorrido com sujeito que figure no polo ativo ou passivo da relação jurídica processual. Falecido o réu, o juiz ordenará a intimação do autor para que promova a citação do respectivo espólio, de quem for o sucessor ou, se for o caso, dos herdeiros, no prazo que designar, de no mínimo 2 e no máximo 6 meses. Descumprida a diligência, estará configurado o abandono do processo, devendo o processo ser extinto sem resolução do mérito, nos termos do art. 485, II, do Novo CPC). Falecido o autor e sendo transmissível o direito em litígio, determinará a intimação de seu espólio, de quem for o sucessor ou, se for o caso, dos herdeiros, pelos meios de divulgação que reputar mais adequados, para que manifestem interesse na sucessão processual e promovam a respectiva habilitação no prazo designado, sob pena de extinção do processo sem resolução de mérito (art. 485, IV, do Novo CPC). Na hipótese de perda da capacidade processual da parte, a suspensão do processo serve para que ingresse no processo um representante processual, porque nesse caso a parte perde a capacidade de estar em juízo, só podendo atuar no processo por meio de um representante processual. Nesse caso deve se seguir o procedimento previsto no art. 76 do Novo CPC Dissolução de sociedade Há doutrina que equipara a morte da parte à extinção da pessoa jurídica, de forma que havendo a dissolução da sociedade caberia a suspensão do processo, sendo a essa hipótese aplicadas as regras previstas para a morte da parte e de sua sucessão no processo. Esse entendimento, entretanto, não é pacífico, havendo corrente doutrinária que entende ser inadequada essa equiparação, porque diante da dissolução da sociedade sempre haverá alguém encarregado de representá-la judicialmente, até final liquidação de seus direitos e obrigações. Por outro lado, na maioria dos casos, a extinção da pessoa jurídica decorre de ato voluntário de seus membros, não devendo se dar a eles o poder de suspender o processo pelo simples fato de terem extinguido a pessoa jurídica. Para essa parcela doutrinária, portanto, a extinção da pessoa jurídica não é causa de suspensão do processo, devendo o procedimento seguir normalmente Morte ou perda de capacidade processual do representante legal Se existe um representante legal no processo é porque falta à parte representada a capacidade de estar em juízo. No caso de morte ou de perda da capacidade processual desse representante processual, a parte volta a não ter capacidade de estar em juízo, cabendo a indicação de um novo representante processual para que se regularize sua situação no processo. O procedimento para a regularização é aquele previsto no art. 76 do Novo CPC, sendo entendimento tranquilo na doutrina que a hipótese não se aplica aos casos de morte ou perda de capacidade processual 4

5 do presentante de pessoa jurídica, porque nesse caso outra pessoa tomará o lugar do presentante morto ou que se torna incapaz, sem que haja obstáculos à continuidade do processo. Apenas para exemplificar, morto o prefeito, que presenta a Municipalidade em juízo, assume o cargo em seu lugar o vice-prefeito, não havendo razão para a suspensão do processo Morte ou perda de capacidade processual do advogado O art. 313, I, do Novo CPC, prevê como causa de suspensão do processo a morte ou a perda de capacidade processual do patrono da parte. Essa perda da capacidade processual deve ser entendida de forma ampliativa, porque o processo deve ser suspenso não só quando o advogado perde sua capacidade civil (por exemplo, é interditado), mas também quando perde sua capacidade postulatória (por exemplo, quando é suspenso pela Ordem dos Advogados do Brasil). A suspensão aqui tratada só se justifica se o advogado morto ou que perdeu sua capacidade for o único constituído nos autos, de forma que, havendo mais de um advogado constituído, o processo deve prosseguir normalmente com o outro procurador remanescente. Há, entretanto, situação excepcional quando o advogado foi contratado especificamente para praticar determinado ato processual. Imagine uma oitiva por carta precatória em que o advogado contratado, que tem domicílio profissional no local da audiência, venha a falecer e por essa razão obviamente não comparece à audiência. Ou ainda um advogado contratado para uma sustentação oral que vem a falecer antes da sessão de julgamento. Entendo que nesse caso, mesmo havendo mais de um advogado constituído, o processo deve ser suspenso. Nos termos do 3º do art. 313 do Novo CPC, no caso de morte do procurador de qualquer das partes, ainda que iniciada a audiência de instrução e julgamento, o juiz determinará que a parte constitua novo mandatário, no prazo de 15 dias. Nos termos do art. 139, VI, do Novo CPC, o juiz poderá dilatar esse prazo diante das particularidades do caso concreto. Caso não haja a regularização, as consequências variam a depender de a omissão ser conduta adotada pelo autor ou pelo réu. Sem advogado faltará capacidade postulatória ao autor, e sem esse pressuposto processual subjetivo o processo não poderá prosseguir, sendo caso de extinção do processo sem resolução do mérito nos termos do art. 485, IV, do Novo CPC. Sendo o réu omisso, não tem qualquer sentido a extinção do processo, que favoreceria o réu omisso e prejudicaria o autor que, nem que queira, poderá regularizar a capacidade postulatória do réu. A consequência, portanto, é outra, prevendo o art. 313, 3º, do Novo CPC que nesse caso o juiz ordenará o prosseguimento do processo à revelia do réu. A previsão deve ser bem compreendida, porque confunde a revelia com seus efeitos. Caso o falecimento do advogado do réu ocorra depois de já apresentada sua contestação, mesmo que não haja a regularização nos termos do art. 313, 3º, do Novo CPC, será impossível considerar-se esse réu revel, já que a revelia é um estado de fato gerado pela ausência jurídica da contestação. E apresentada validamente a contestação não será gerado o principal efeito da revelia que é a presunção de veracidade dos fatos alegados pelo autor. Nessa situação, a única consequência será a geração de outro efeito da revelia, a da dispensa da intimação do réu Convenção das partes A suspensão do processo por acordo das partes prevista no art. 313, II, do Novo CPC é apenas uma especificação da cláusula geral dos negócios jurídicos processuais prevista no art. 190 do Novo CPC. Tratando-se de acordo bilateral, está sujeito às exigências formais do art. 190 do Novo CPC, exigindo-se que seja celebrado por partes capazes, em processos em que se admita a autocomposição e que nenhuma das partes esteja em situação de vulnerabilidade. Não há exigência de motivação do acordo, não sendo dado ao juiz indeferir o pedido formulado pelas 5

6 partes. Esse acordo específico de suspensão do processo tem uma limitação temporal prevista no art. 313, 4º, do Novo CPC, não podendo ser superior a 6 meses. O legislador equacionou o interesse das partes com o interesse público na continuidade e encerramento do processo dentro de um prazo razoável. Registre-se que esse prazo não é aplicável à execução quando a motivação da suspensão for o cumprimento da obrigação pelo executado, sendo nesse caso o tempo de suspensão o necessário para tal cumprimento (art. 922 do Novo CPC). Apesar de entendimento arraigado na doutrina à luz do CPC/1973 de que não caberia suspensão convencional do processo durante o transcurso de prazo peremptório, já replicado em alguns entendimentos à luz do Novo Código de Processo Civil, entendo que esse impedimento não sobreviveu à nossa sistemática dos prazos criada pelo novo diploma legal. A partir do momento em que o art. 139, VI, do Novo CPC permite ao juiz a prorrogação de todo e qualquer prazo, entendo que não existem mais prazos peremptórios, sendo todos dilatórios. Dessa forma, a suspensão convencional será sempre admitida, ainda que pendente o prazo para a prática de ato processual. Reforçando a natureza meramente declaratória da decisão de suspensão do processo, a doutrina é tranquila em apontar que o processo estará suspenso desde a data em que o acordo for celebrado, sendo irrelevante o momento em que ele é levado ao conhecimento do juízo e por ele homologado. Registre-se corrente doutrinária que entende que, ainda que a suspensão não dependa de decisão, ela só tem início quando o ato processual é praticado pelas partes nos autos do processo. Há divergência doutrinária a respeito da possibilidade de as partes convencionarem a suspensão do processo quando o ato processual estiver em curso. Para parcela da doutrina, não se admite tal espécie de suspensão durante uma audiência ou de sessão de julgamento pelo tribunal, enquanto outra parcela não vê qualquer impedimento. Prefiro o entendimento contrário, porque pode justamente ser durante o ato processual que surja razão para as partes se motivarem a suspender o processo. Por outro lado, não parece adequado criar restrições ao exercício da vontade das partes quando a própria lei é omissa nesse sentido Arguição de impedimento ou de suspeição O art. 313, III, do Novo CPC prevê como causa de suspensão do processo a arguição de impedimento ou de suspeição, e, ainda que seja omisso o dispositivo nesse sentido, a única arguição de impedimento e suspeição capaz de suspender o processo é a do juiz, não havendo suspensão quando a arguição se dirigir ao membro do Ministério Público (art. 148, 2º, do Novo CPC) ou a auxiliares da Justiça. A mera arguição da suspeição ou impedimento do juiz suspende o procedimento principal (suspensão imprópria), mas a continuidade dessa suspensão até o julgamento da arguição depende de decisão a ser proferida pelo relator do incidente no tribunal. Nos termos do art. 146, 2º, do Novo CPC, o relator poderá receber o incidente sem efeito suspensivo, de forma que o processo retomará o seu andamento, ou com efeito suspensivo, quando a suspensão será prorrogada até o julgamento do incidente. No tocante aos pedidos de tutela de urgência, serão dirigidos ao substituto legal do juiz acusado de parcial enquanto não for declarado o efeito em que o incidente é recebido ou quando ele for recebido com efeito suspensivo. Se o relator receber o incidente sem efeito suspensivo, o pedido será dirigido ao próprio juiz acusado de suspeito ou impedido Admissão de incidente de resolução de demandas repetitivas O inciso IV do art. 313 do Novo CPC, além de repetitivo, diz menos do que deveria. A suspensão do processo em razão da admissão do incidente de resolução de demandas repetitivas já está prevista no art. 982, I, do Novo CPC, que prevê que sendo o incidente admitido pelo relator no tribunal de 6

7 segundo grau caberá a ele suspender os processos pendentes, individuais ou coletivos, que tramitam no Estado ou na região de competência do tribunal. Por outro lado, teria sido mais adequado o dispositivo prever a suspensão na admissão do julgamento de casos repetitivos, já que além da admissão do incidente de resolução de demandas repetitivas (art. 982, I, Novo CPC), também no julgamento de recursos especiais e extraordinários repetitivos haverá suspensão do processo, nos termos do art , II, Novo CPC. De qualquer forma, essa hipótese de suspensão está contemplada no inciso VIII do art. 313 do Novo CPC. No caso da suspensão em razão da admissão de incidente de resolução de demandas repetitivas, o art. 980, caput, do Novo CPC prevê o prazo máximo de um ano de suspensão, que poderá ser prorrogado por decisão fundamentada do relator (art. 980, parágrafo único, Novo CPC) Prejudicialidade Nos termos do art. 313, V, a, do Novo CPC o processo será suspenso quando a sentença depender do julgamento de outra causa ou da declaração de existência ou de inexistência de relação jurídica que constitua o objeto principal de outro processo pendente. Nesse caso, não se tratando de suspensão obrigatória, ela depende de decisão judicial expressa do juiz no sentido da suspensão do processo. Nas precisas lições da melhor doutrina, as questões prejudicais são aquelas que, além de constituírem premissas lógicas da sentença, reúnem condições suficientes para ser objeto de ação autônoma. Para se decidir um pedido de resolução contratual, o juiz deve necessariamente decidir se o contrato é válido ou nulo (questão prejudicial). Para se decidir um pedido de condenação a pagamento de alimentos, o juiz deve necessariamente decidir se o réu é ou não o pai do autor (questão prejudicial). As questões prejudiciais podem ser internas (endógenas) ou externas (exógenas). As primeiras são aquelas que surgem dentro do próprio processo e com a supressão do sistema da ação declaratória incidental não geram suspensão do processo. O próprio art. 313, V, a, do Novo CPC, prevê expressamente que a suspensão depende de outro processo pendente. As questões prejudiciais externas são aquelas que constituem objeto de outros processos, podendo ser homogêneas (objeto de outro processo da jurisdição civil) ou heterogêneas (objeto de outro processo da jurisdição criminal), sendo que o dispositivo ora comentado versa sobre a questão prejudicial externa homogênea. Na Jurisdição civil inclui-se a suspensão de processo em trâmite em diferentes Justiças, como Federal e Estadual. Por uma questão de lógica, havendo suspensão entre dois processos em razão da prejudicialidade externa, é natural que seja suspenso o processo prejudicado à espera do julgamento do processo prejudicial. Havendo tal espécie de prejudicialidade, suspende-se o processo no qual a relação jurídica controvertida é discutida incidentalmente enquanto o processo no qual a mesma relação jurídica é discutida de forma principal não é decidido. Para parcela doutrinária é irrelevante a ordem cronológica de propositura da ação prejudicada e da ação prejudicial. Nesse caso, desconsiderando-se a questão temporal, todo e qualquer processo, independentemente do momento de sua propositura, poderá ser suspenso à espera da solução da relação jurídica no processo que a decidirá de forma principal. A redação do art. 313, IV, a, do Novo CPC permite tal conclusão, ao prever que a suspensão depende de outro processo pendente, não exigindo que tal processo já esteja pendente quando da propositura da ação prejudicial. Basta, portanto, que o processo prejudicado esteja pendente para que possa ser suspenso pela aplicação do dispositivo legal mencionado. O Superior Tribunal de Justiça, embora não tenha tratado dessa matéria de forma principal, já permitiu 7

8 incidentalmente que mesmo tendo sido proposta a ação prejudicial quando já em trâmite a causa prejudicada, essa segunda fosse suspensa até o julgamento da primeira. Nesse sentido, determinou a suspensão de um processo de busca e apreensão em razão de processo revisional de contrato, ainda que esse segundo tenha sido proposto depois do primeiro. Há, entretanto, corrente doutrinária que entende que a suspensão depende de uma determinada ordem temporal de propositura dos processos. Para essa corrente doutrinária, só haverá suspensão se o processo prejudicial já estiver em trâmite quando da propositura do processo prejudicado. A reunião com fundamento na causa ora analisada tem como fundamento a harmonização dos julgados e a economia processual, mesmos objetivos perseguidos pela reunião de processos perante o mesmo juízo. Diante dessa realidade, a doutrina entende que a suspensão só se justifica se não for possível a reunião dos processos perante o mesmo juízo para julgamento conjunto dos processos Necessidade de verificação de determinado fato ou a produção de certa prova, requisitada para outro juízo O art. 313, V, b, do Novo CPC prevê a suspensão do processo quando a prolação de sentença de mérito depender da verificação de determinado fato ou de produção de certa prova requisitada para outro juízo. Até para se distinguir da hipótese prevista no art. 313, V, a, do Novo CPC, a suspensão ora analisada não trata de questão prejudicial, mas de questão preliminar ao julgamento de mérito, aqui compreendida como fato ou prova que deve ser verificada ou produzida anteriormente à prolação de decisão de mérito. A produção de prova requerida a outro juízo se dá por meio da expedição de carta precatória, rogatória ou de ordem. Sempre tive dificuldade de aceitar a literalidade do art. 377 do Novo CPC, que prevê que a suspensão do processo em razão da expedição de carta só ocorre se o pedido de produção de prova for elaborado antes da decisão de saneamento e quando a prova for imprescindível à formação do convencimento do juiz. Entendo que se a prova foi deferida, independentemente do momento procedimental, ela é imprescindível à formação do convencimento do juiz, porque, do contrário, será caso de indeferimento do pedido nos termos do art. 370, parágrafo único, do Novo CPC. Por tal razão, entendo que, sempre que haja prova pendente de produção por meio de carta de auxílio, o juízo da causa não poderá sentenciar o processo. Trata-se, naturalmente, de suspensão imprópria, porque todos os demais atos, salvo os debates orais (memoriais escritos) e sentença, podem ser normalmente praticados durante o cumprimento da carta Força maior Havendo motivo de força maior o processo será suspenso, nos termos do art. 313, VI, do Novo CPC, entendendo-se como força maior qualquer causa representada por evento insuperável, alheio à vontade dos sujeitos processuais e que os impeça de praticar atos processuais, tais como no caso de epidemia, calamidade pública, inundação, fechamento do fórum por determinação da Defesa Civil, incêndio etc. Há doutrina, inclusive, que inclui na força maior obstáculo oposto pela parte contrária e até mesmo a superveniência de férias coletivas. O processo deve ser considerado suspenso desde o momento em que ocorreu a força maior que motiva sua suspensão, sendo irrelevante para fins de fixação do termo inicial da suspensão o momento em que o juiz toma conhecimento da força maior ou em que profere a decisão de suspensão do processo. A suspensão fica condicionada à manutenção da força maior, de forma que encerrado o evento inevitável e irresistível que deu causa à suspensão o procedimento retoma seu andamento regular Acidentes e fatos da navegação de competência do tribunal marítimo Será suspenso o processo, nos termos do art. 313, VII, do Novo CPC, quando se discutir em juízo questão 8

9 decorrente de acidentes e fatos da navegação de competência do Tribunal Marítimo. Não parece adequada a interpretação literal da norma, porque se assim for o processo judicial deverá ser suspenso pelo simples fato de versar sobre acidentes e fatos da navegação, independentemente de já existir processo instaurado perante o Tribunal Marítimo. A única interpretação possível é a de que, já estando em trâmite processo perante esse tribunal administrativo, e sendo a questão lá discutida repetida no processo judicial, caberá a suspensão do processo judicial. O Tribunal Marítimo é vinculado ao Ministério da Marinha, não integrando, portanto, o Poder Judiciário. Segundo o art. 18 da Lei 2.180/1954, as decisões do Tribunal Marítimo quanto à matéria técnica referente aos acidentes e fatos da navegação têm valor probatório e se presumem certos, sendo, porém, suscetíveis de reexame pelo Poder Judiciário. O Superior Tribunal de Justiça, ao se manifestar sobre o tema, teve a oportunidade de decidir que as conclusões estabelecidas pelo Tribunal Marítimo são suscetíveis de reexame pelo Poder Judiciário, ainda que a decisão proferida pelo órgão administrativo, no que se refere à matéria técnica sobre acidentes e fatos da navegação, tenha valor probatório. Essa força probatória das decisões proferidas pelo Tribunal Marítimo quanto à matéria técnica referente aos acidentes e fatos da navegação, no processo judicial, recomendam a suspensão do processo enquanto não proferida tal decisão, ainda que a independência da instância judiciária da marítima tenha levado parcela da doutrina a criticar essa causa de suspensão Demais casos regulados pelo novo código de processo civil O inciso VIII do art. 313 do Novo CPC torna o rol de causas para a suspensão do processo previsto no dispositivo meramente exemplificativo ao prever que também será suspenso o processo em outros casos regulados pelo Novo Código de Processo Civil. Pode ser mencionada como exemplo a suspensão em razão da instauração do incidente de desconsideração da personalidade jurídica (art. 134, 3º, do Novo CPC); em razão da impugnação ao cumprimento de sentença ou embargos à execução (arts. 525, 5º, e 919, 1º, do Novo CPC); em razão da oposição (art. 685, parágrafo único, do Novo CPC); em razão da não localização de bens na execução de pagar quantia certa (art. 921, III, do Novo CPC); em razão de prazo concedido pelo exequente para que o executado cumpra sua obrigação (art. 922 do Novo CPC); em razão de julgamento de recurso especial e extraordinário repetitivos (art , II, do Novo CPC) Prazo de suspensão O 4º do art. 313 do Novo CPC prevê que no caso de suspensão convencionada pelas partes o prazo máximo de suspensão é de 6 meses, e nos casos previstos no inciso V, o prazo máximo é de um ano. O dispositivo faz claramente uma opção pela celeridade processual em detrimento da segurança jurídica, preferindo correr o risco da prolação de decisões contraditórias a postergar indefinidamente o andamento do processo. Dessa forma, a suspensão seria no máximo pelo prazo de um ano, devendo o processo prejudicado retomar seu andamento mesmo sem a solução do processo prejudicial. O Superior Tribunal de Justiça tem decisões recentes adotando a interpretação literal do art. 313, 4º, do Novo CPC, limitando o período de suspensão ao tempo previsto no dispositivo legal. O tema, entretanto, não está pacificado, mesmo no Superior Tribunal de Justiça, que também já se manifestou recentemente admitindo estender a suspensão do processo por período superior a um ano, por meio da renovação desse prazo por um novo período de um ano334 ou determinando que a suspensão dure até o trânsito em julgado do processo prejudicial. Parece razoável o entendimento, levando-se em conta que a reconhecida morosidade do processo não é compatível com o exíguo prazo de um ano de suspensão do processo. 9

10 Vedação à prática de atos processuais durante a suspensão do processo O art. 314 do Novo CPC é suficientemente claro ao prever a vedação à prática de qualquer ato processual durante o período de suspensão do processo, com exceção dos atos urgentes a fim de evitar dano irreparável. Dessa forma, não resta dúvida de que o ato não urgente praticado durante a suspensão do processo é viciado, já que praticado em desconformidade com a regra legal. Situar esse ato viciado no plano da existência, validade ou eficácia é matéria que sempre dividiu a doutrina. Para determinada corrente doutrinária, o ato praticado durante o período de suspensão do processo é juridicamente inexistente em razão da inexistência do pressuposto da pendência da causa. Para outra corrente doutrinária o ato existe, mas é inválido. Por fim, há os que entendem tratar-se de ato ineficaz. O Superior Tribunal de Justiça entende que os atos não urgentes praticados durante a suspensão do processo são nulos, aplicando o princípio da instrumentalidade das formas, de modo que a nulidade só será reconhecida se restar comprovado o prejuízo Arguição de suspeição e impedimento do juiz Sendo arguida a suspeição ou impedimento do juiz o procedimento principal será suspenso suspensão imprópria nos termos do art. 313, III, do Novo CPC. Essa suspensão poderá ser prorrogada pelo relator do incidente até o seu julgamento. Nesse caso, o art. 314 do Novo CPC veda ao juiz proferir qualquer decisão, inclusive os atos urgentes necessários para evitar dano irreparável. Trata-se de medida de salvaguarda das partes diante de um juiz que, potencialmente parcial, poderá por meio de decisão sobre tutela de urgência gerar indevidamente sério sacrifício a uma das partes. Havendo a necessidade de prática de ato urgente, a parte que dela necessita não ficará sem respaldo jurisdicional, cabendo ao substituto legal do juiz acusado de parcial a prática de tal espécie de ato, ainda que o procedimento principal esteja suspenso (art. 146, 3º, do Novo CPC). Registre-se que, não sendo o incidente recebido no efeito suspensivo pelo relator, o processo não estará suspenso, de forma que qualquer ato, urgente ou não, será praticado normalmente pelo juiz acusado de suspeição ou de impedimento Verificação da existência de fato delituoso pela justiça criminal O art. 315 do Novo CPC regulamenta a chamada prejudicialidade externa entre a ação civil e a ação criminal, facultando-se ao juiz da ação civil sua suspensão até que se resolva o processo penal. O que importa para o sobrestamento da ação civil é a existência de questões que serão resolvidas na motivação da sentença penal (por exemplo, materialidade e autoria do crime, presença de excludentes de ilicitude) e que poderão influenciar a formação do convencimento do juiz na esfera cível. A depender da classificação, a prejudicialidade ora analisada será heterogênea (jurisdicional ou perfeita), porque envolve ações de competência de diferentes seções especializadas do Poder Judiciário. Existe divergência doutrinária a respeito da obrigatoriedade ou facultatividade dessa suspensão. Enquanto doutrinadores entendem ser uma faculdade do juiz cível, outros defendem a obrigatoriedade sempre que presentes as hipóteses de vinculação do juízo civil à sentença penal. O Superior Tribunal de Justiça já teve a oportunidade de decidir que nos casos em que possa ser comprovado, na esfera criminal, a inexistência de materialidade ou da autoria do crime, tornando impossível a pretensão ressarcitória cível, será obrigatória a paralisação da ação civil. De qualquer forma, tendo sido suspenso o processo na esfera cível, as partes serão intimadas dessa decisão, contando-se a partir do primeiro dia útil subsequente um prazo de 3 meses para a propositura da ação penal, sem o que cessará a suspensão, cabendo ao juiz cível examinar incidentalmente a questão prévia. 10

11 Diante da omissão do art. 110 do CPC/1973, criou-se notável divergência doutrinária a respeito do tempo de duração do sobrestamento: para uns, o juiz cível, diante de demora irrazoável de definição na esfera penal, poderia cessar o sobrestamento, enquanto para outros, o sobrestamento deveria durar até o trânsito em julgado da ação penal. A divergência foi resolvida pelo 2º do art. 315 do Novo CPC ao prever que o prazo máximo de suspensão nesse caso é de um ano, a exemplo do que ocorre com a prejudicialidade externa com outro processo na esfera cível (art. 313, 4º, do Novo CPC) Extinção do processo Extinção do processo Nos termos do art. 316 do Novo CPC, a extinção do processo dar-se-á por meio de sentença. Na realidade, o dispositivo desconsiderou os processos de competência originária dos tribunais, que serão extintos por decisão monocrática do relator ou por acórdão. Sentença, afinal, é ato processual privativo do primeiro grau, e nem todo processo é competência do primeiro grau. Superado esse equívoco, é preciso dizer que o dispositivo está correto, não existindo outra forma de se extinguir o processo que não por meio de sentença, mas também é preciso dizer que nem toda sentença extingue o processo, já que naquelas que dependem de atos subsequentes para a satisfação do direito nelas reconhecidos (condenatória, executiva e mandamental), a sentença não extingue o processo, mas apenas a fase procedimental de conhecimento Impropriedade do termo extinção parcial do processo Apesar de rotineiramente utilizada na praxe forense, a expressão extinção parcial do processo é inadequada, tratando um conceito jurídico absoluto de forma equivocada. Falar em extinção parcial do processo é o mesmo que afirmar que uma mulher pode estar meio grávida ou que um funcionário público é meio honesto. A mulher está ou não grávida, o funcionário público é ou não honesto, o processo é ou não extinto. O que pode ocorrer é a diminuição objetiva ou subjetiva do processo, como ocorre, por exemplo, na exclusão de pedido para o qual o juízo é absolutamente incompetente e na exclusão de litisconsorte do processo por ilegitimidade de parte. Nesse caso, o processo é diminuído em termos objetivos ou subjetivos, e justamente por isso as decisões são interlocutórias e não sentenças. Se realmente houvesse extinção parcial do processo, teríamos que admitir sentenças também parciais, o que é refutado pelo Novo Código de Processo Civil. A distinção entre diminuição objetiva ou subjetiva de demanda e a incorreta expressão extinção parcial do processo é importante porque evita qualquer dúvida a respeito da natureza da decisão e, por consequência, quanto ao recurso cabível Princípio da cooperação e extinção do processo por sentença terminativa O processo (ou fase) de conhecimento foi projetado pelo legislador para resultar em um julgamento de mérito. Por essa razão, essa espécie de julgamento é considerada o fim normal dessa espécie de processo ou fase procedimental. Naturalmente nem sempre isso é possível no caso concreto, devendo o sistema conviver com o fim anômalo do processo ou fase de conhecimento, que se dá por meio da sentença terminativa (art. 485 do Novo CPC). Esse fim anômalo, portanto, deve ser evitado sempre que possível. Por outro lado, o princípio da cooperação consagrado no art. 6º do Novo CPC cria um dever de prevenção ao juiz, apontando às partes eventuais deficiências e permitindo suas devidas correções, evitando-se assim a declaração de nulidade, dando-se ênfase ao processo como genuíno mecanismo técnico de proteção de direito material. 11

12 Na conjugação do interesse no julgamento do mérito e no princípio da cooperação é criado o art. 317 do Novo CPC, ao prever que antes de proferir sentença terminativa cabe ao juiz conceder à parte oportunidade, sempre que possível, de corrigir o vício. Como se pode notar da própria leitura do dispositivo, sendo o vício insanável, de nada adiantará dar oportunidade ao autor para saneá-lo, sendo nesse caso necessária, embora não desejada, a prolação da sentença terminativa (art. 485 do Novo CPC) Reconhecimento jurídico do pedido Essa espécie de resposta do réu é bastante rara na praxe forense, consubstanciando-se na expressa declaração do réu de concordância com a pretensão do autor. É ato de total disposição de direito, pelo qual o réu concorda tanto com os aspectos fáticos como com os aspectos jurídicos narrados pelo autor em sua petição inicial. A consequência de um reconhecimento jurídico do pedido é a extinção do processo por meio de sentença homologatória de mérito (art. 487, III, a, do Novo CPC), desde que abranja toda a pretensão do autor ou, ainda, o julgamento antecipado parcial de mérito (art. 356 do Novo CPC). Não se confunda confissão com reconhecimento jurídico do pedido, porque a confissão atinge somente os fatos que em regra serão dados como verdadeiros pelo juiz; ainda que a confissão não seja prova plena, é comum que baste para a formação do convencimento do juiz. Mesmo convencido dos fatos, a aplicação do direito poderá ser contrária ao favorecido pela confissão, sendo incorreto imaginar que a confissão é apta, por si só, a produzir a vitória da parte beneficiada por ela. Por outro lado, o reconhecimento jurídico do pedido abrange tanto as questões de fato quanto as questões de direito, em integral submissão do réu à pretensão do autor. Nesse caso, independentemente de qualquer outra análise, o juiz homologa a manifestação de vontade do réu, sendo certa a vitória do autor. 12

13 (Fonte: Neves, Daniel Assumpção Amorim, Manual de Direito Processual Civil. Salvador: Editora Juspodivm, 2016.) 15. PETIÇÃO INICIAL Sumário: Introdução Requisitos estruturais da petição inicial Juízo singular ou colegiado a que é dirigida a petição inicial Indicação das partes e sua qualificação Os fatos e os fundamentos jurídicos do pedido Pedido Valor da causa Provas com que o autor pretende demonstrar a verdade dos fatos alegados Opção do autor quanto à realização da audiência de conciliação ou de mediação Documentos indispensáveis à propositura da demanda Introdução O princípio da inércia da jurisdição impede que o juiz inicie um processo de ofício, devendo aguardar a manifestação da parte interessada, sendo extremamente excepcional a exceção a essa regra, conforme analisado no Capítulo 1, item A forma de materializar o interesse em buscar a tutela jurisdicional é a petição inicial, conceituada pela melhor doutrina como peça escrita no vernáculo e assinada por patrono devidamente constituído em que o autor formula demanda que virá a ser apreciada pelo juiz, na busca de um provimento final que lhe conceda a tutela jurisdicional pretendida. A petição inicial tem duas funções: uma de provocar a instauração do processo e outra de identificar a demanda, decorrência natural da necessidade de menção às partes, causa de pedir e pedido. Essa segunda característica da petição inicial indicar os elementos da ação gera alguns interessantes efeitos processuais: a) permite a aplicação do princípio da congruência, indicando os limites objetivos e subjetivos da sentença; b) permite a verificação de eventual litispendência, coisa julgada ou conexão, quando comparada com outras ações; c) fornece elementos para a fixação da competência; d) indica desde logo ao juiz a eventual ausência de alguma das condições da ação; e) pode vir a influenciar na determinação do procedimento. Por tratar-se de peça que inicia o processo, permitindo o seguimento do procedimento mediante a citação do réu, e gerando todos os efeitos referidos, a lei processual exige que tal peça preencha alguns requisitos formais, o que torna a petição inicial um ato processual solene. A ausência de quaisquer deles pode gerar uma nulidade sanável ou insanável, sendo na primeira hipótese caso de emenda da petição inicial e, na segunda, de indeferimento liminar de tal peça Requisitos estruturais da petição inicial O artigo legal que primordialmente trata dos requisitos estruturais da petição inicial é o art. 319 do Novo CPC. Além desse dispositivo legal, também o art. 106, I, do Novo CPC indica outro requisito estrutural essencial para a regularidade da petição inicial: o endereço do patrono que a subscreve. Nesse tocante, cumpre esclarecer que a indicação do endereço em papel timbrado, nota de rodapé, ou na procuração, cumpre perfeitamente a exigência formal. Nas excepcionais hipóteses de dispensa do advogado esse requisito não será exigido. 13

14 Juízo singular ou colegiado a que é dirigida a petição inicial O primeiro requisito previsto pelo art. 319 do Novo CPC, e que constará no topo da primeira página da petição inicial, é o juízo a que esta é dirigida. Sendo a primeira peça do processo, necessária é a indicação do juízo que a receberá nesse primeiro momento procedimental. A indicação do destinatário da petição reconhecendo-se tanto a ação originária de primeiro grau como a de competência originária de Tribunal é necessária para a remessa da petição inicial e formação dos autos perante o órgão pretensamente competente para o conhecimento da demanda. Há melhora na redação do dispositivo quando comparado com o inciso I do art. 282 do CPC/1973, que previa o endereçamento para juiz ou tribunal. Como a indicação jamais será pessoal, mesmo quando a petição inicial for distribuída por dependência, ou ainda em comarcas de vara única com somente um juiz, exigindo-se a indicação do juízo, e não do juiz (consequência do caráter impessoal do Poder Judiciário), a nova redação deve ser elogiada. Ainda que seja possível identificar o juiz que receberá a demanda, não será ele indicado no endereçamento, e sim o juízo que representa. Mesmo sabendo-se que será exatamente aquele juiz específico que receberá a petição inicial distribuída por dependência, não é correta a indicação pessoal do juiz. Apesar de incorreto do ponto de vista técnico, a indicação pessoal do juiz nos casos em que isso for possível distribuição por dependência e comarcas com apenas um juiz desde que acompanhada pela indicação do juízo, gera mera irregularidade, não produzindo efeitos significativos no processo Indicação das partes e sua qualificação Deve constar da petição inicial a qualificação das partes, com indicação de nome completo, estado civil, profissão, domicílio e residência, o número do cadastro de pessoas físicas ou do cadastro nacional de pessoas jurídicas, o endereço eletrônico e a existência de união estável. Tais elementos identificadores se prestam a duas funções principais: permitir a citação do réu e a individuação dos sujeitos processuais parciais, o que se mostrará importante para distingui-los de outros sujeitos e fixar com precisão os limites subjetivos da demanda e da futura e eventual coisa julgada material. Diante das razões justificadoras para a indicação de tais dados, o que importa na análise do preenchimento do requisito é se a irregularidade ou mesmo a ausência de algum deles gera alguma espécie de prejuízo ao réu ou ao processo. Sem a comprovação de efetivo prejuízo, não haverá nulidade, aplicando-se ao caso o princípio da instrumentalidade das formas. A indevida troca de um nome por outro é mera irregularidade, podendo ser corrigida a qualquer tempo, se o verdadeiro réu recebe a citação e contesta regularmente a demanda. O mesmo ocorre com os dados pessoais do réu, que nem sempre serão de amplo conhecimento do autor. A indicação do estado civil das partes é importante em razão de normas processuais que exigem a presença de ambos os cônjuges em determinadas ações (art. 73, 1.º e 2.º, do Novo CPC ações reais imobiliárias), ou ainda o consentimento do cônjuge não litigante. Esse pressuposto processual poderá ser analisado à luz da petição inicial quando houver a exata indicação do estado civil das partes. A indicação do endereço eletrônico suscita algumas questões: (i) nem todos os litigantes têm endereço eletrônico; (ii) haverá real dificuldade do autor em saber o endereço eletrônico do réu; (iii) caso o autor omita essa informação, como o juiz saberá se ele tem ou não endereço eletrônico? Também a indicação de existência de união estável suscitará dúvidas, em especial quando a união estável não estiver reconhecida por contrato registrado ou sentença judicial. Nesse caso, é natural imaginar que o autor não tenha como indicar a existência de união estável do réu. Por outro lado, a mera indicação do autor de que mantém uma união estável já será o suficiente para assim ser considerado pelo juiz? Acredito que nesse caso o companheiro (a) deve concordar expressamente nos autos com tal estado civil, porque, havendo divergência, não parece ser legítimo criar um incidente processual para essa discussão apenas 14

15 para legitimar a indicação feita à luz do art. 319, II, do Novo CPC. Afinal, o dispositivo se limita a exigir a indicação, não impondo a efetiva existência da união estável indicada na petição inicial. Em algumas situações o autor não terá acesso às informações exigidas pela lei, mas pode contribuir com outras, ao menos para permitir a citação do réu. Pode-se imaginar a indicação de locais onde a pessoa possa ser encontrada, como o local em que comumente desfruta seus momentos de lazer (bar, restaurante, clube social, parques etc.) ou ainda em que exerça função ou profissão (escritório, consultório, empresa etc.). Outra circunstância possível é a indicação do apelido do réu, ou seja, a forma como ele é conhecido na sociedade à qual pertence (p. ex., camarão, alemão, bigode etc.), o que poderá auxiliar o oficial de justiça a localizá-lo. Conforme já indicado, o trabalho do patrono do autor nem sempre é fácil na indicação dos requisitos previstos pelo art. 319, II, do Novo CPC, considerando-se que nem sempre saberá com exatidão todos os dados do réu demandados pela lei. A indicação de informações não previstas em lei pode ser de extrema utilidade, ao menos para permitir que a citação seja realizada, restando ao próprio réu, em sua contestação ou qualquer outra espécie de resposta, regularizar sua qualificação, com a indicação de dados que faltaram à petição inicial por desconhecimento do autor. Nos parágrafos do art. 319 do Novo CPC, o legislador demonstrou sua preocupação com a dificuldade do autor em qualificar o réu. Nos termos do 1.º, o autor poderá requerer ao juiz diligências necessárias à obtenção das informações exigidas pela lei. No 2.º há previsão no sentido de não ser caso de indeferimento da petição inicial a ausência de dados do réu, desde que seja possível sua citação, ficando assim consagrado o entendimento doutrinário já exposto. Finalmente, o 3.º prevê que a petição inicial não será indeferida pelo não atendimento ao disposto no inciso II do art. 319, se a obtenção de tais informações tornar impossível ou excessivamente oneroso o acesso à justiça. O dispositivo é feito sob medida para hipótese de réus incertos, como nas ações possessórias movidas contra multidão de pessoas responsáveis pela agressão à posse. Mesmo sob a égide do CPC/1973 já se considerava como exceção à regra prevista pelo inciso ora em comento a existência de litisconsórcio passivo multitudinário, que exige do autor a colocação no polo passivo da demanda de número considerável de pessoas (uma verdadeira multidão). E o clássico exemplo sempre foi o das ações possessórias decorrentes de esbulho por grupos de pessoas. Nessas situações, sem conseguir responsabilizar o órgão ou entidade à qual pertencem os invasores já que esses maliciosamente evitam se constituir em pessoas jurídicas seria nítida ofensa ao princípio do acesso à justiça exigir do autor a perfeita identificação e qualificação de cada um dos réus, ou ainda a indicação de suas profissões e residências. A solução é permitir a indicação de algumas pessoas que o autor consiga identificar ou ainda do líder do movimento, se identificável, em nítida mitigação do dispositivo legal. O Novo Código de Processo Civil trata da ação possessória em que figure no polo passivo grande número de pessoas nos 1º e 2º do art. 554, mas curiosamente não regulamenta a flexibilização da qualificação dos réus nesse caso, preocupando-se apenas com a forma pela qual a citação deve ser realizada. Conforme analisado no Capítulo 28, item , será feita a citação pessoal dos ocupantes que forem encontrados no local e a citação por edital dos demais, sendo que, para fim da citação pessoal, o oficial de justiça procurará os ocupantes no local por uma vez e os que não forem identificados serão citados por edital. Por fim, ainda que se reconheça a existência de dificuldades na indicação de todos os dados exigidos pela lei quanto ao réu, o mesmo não ocorre relativamente ao autor, dado que este é o sujeito responsável pela contratação do patrono que elabora a petição inicial. Somente um desconhecimento considerável da lei ou a má-fé em omitir determinado dado podem explicar uma qualificação deficitária do autor, não se devendo admitir que a demanda prossiga com tal irregularidade. Será caso de emenda da petição inicial em 15 dias (art. 321 do Novo CPC), seguida de indeferimento (art. 330, IV, do Novo CPC) se o vício não for sanado. 15

16 Os fatos e os fundamentos jurídicos do pedido Apesar de o art. 319, III, do Novo CPC indicar como requisito da petição inicial o fato no singular, e os fundamentos jurídicos do pedido no plural, é pacífico o entendimento que a petição inicial pode perfeitamente ter um ou mais fatos e um ou mais fundamentos jurídicos. Trata-se da apresentação fática causa de pedir próxima e das consequências jurídicas que o autor pretende que tais fatos tenham no caso concreto causa de pedir remota. Considerando que dos fatos nasce o direito, cumpre ao autor narrá-los e demonstrar a razão jurídica para que, em decorrência desses fatos, seja merecedor da tutela jurisdicional pretendida. A causa de pedir é tema tratado no Capítulo 2, item Registre-se que a exigência da narrativa dos fatos constitutivos do direito do autor já em sua petição inicial se limita aos fatos jurídicos, também chamados de fatos principais. Ainda que seja recomendável a narrativa também dos fatos simples, também chamados de fatos secundários, estes não fazem parte da causa de pedir, de forma que podem ser levados ao processo depois do momento inicial de propositura da demanda Pedido O Poder Judiciário não pode servir como mero órgão consultivo, devendo sempre ser chamado à atuação para entregar ao autor o que este pretender receber. Dessa forma, é requisito essencial da petição inicial a indicação de sua pretensão jurisdicional. O pedido pode ser analisado sob a ótica processual, conhecido como pedido imediato, representando a providência jurisdicional pretendida condenação, constituição, mera declaração e sob a ótica material, conhecido como pedido mediato, representado pelo bem da vida perseguido, ou seja, o resultado prático (vantagem no mundo prático) que o autor pretende obter com a demanda judicial. Enquanto o autor pode pleitear diversas tutelas jurisdicionais diferentes e incalculáveis bens da vida, o réu, ao contestar a pretensão do autor, fará sempre o mesmo pedido: sentença de improcedência (sentença declaratória da inexistência do direito material alegado pelo autor). Em razão dessa circunstância se justifica que a sentença desde que de improcedência e em demanda que não seja declaratória possa ser de natureza diversa da natureza da demanda, fixada pelo pedido imediato do autor. As considerações sobre as características do pedido são realizadas no Capítulo 2, item Valor da causa O art. 291 do Novo CPC estabelece que a toda causa será atribuído um valor certo, ainda que não tenha conteúdo econômico imediatamente aferível. Desse modo, ainda que o bem material objeto da pretensão do autor não tenha um valor economicamente aferível, é necessária a indicação de valor à causa, ainda que seja calculado de forma meramente estimativa. A exigência de atribuição ao valor da causa decorre de diversos reflexos que esse requisito gera sobre o processo: a) determinação de competência do juízo segundo as leis de organização judiciária, como a fixação de competência dos Foros Regionais ; b) definição do rito procedimental (comum e sumaríssimo); c) recolhimento das taxas judiciárias; d) fixação do valor para fins de aplicação de multas, no caso de deslealdade ou má-fé processual, que sempre leva em conta o valor da causa, seja para fixá-las em percentual desse valor, seja para desprezá-las quando o valor da causa for irrisório ou inestimável; 16

17 e) fixação do depósito prévio na ação rescisória no valor correspondente a 5% do valor da causa (do processo originário art. 968, II, do Novo CPC); f) nos inventários e partilhas o valor da causa influi sobre a adoção do rito de arrolamento. É um erro, até certo ponto comum, afirmar-se que uma das razões para que toda causa tenha um valor é a condenação em honorários advocatícios. Tal afirmação é incorreta porque o sistema processual disponibiliza outros critérios além do valor da causa para tal fixação, de forma que, mesmo que a causa não tivesse valor não haveria impedimento ao juiz para a fixação dos honorários advocatícios valendo-se desses outros critérios, devidamente analisados no Capítulo 5, item 5.5. A lei pode expressamente prever uma regra específica a respeito do valor da causa de determinadas ações judiciais, sendo nesse caso afirmado que existe um critério legal ao valor da causa. O art. 292 do Novo CPC indica as regras específicas para o cálculo do valor da causa. No inciso I está previsto o valor da causa nas ações de cobrança de dívida: a soma monetariamente corrigida do principal, dos juros de mora vencidos e de outras penalidades, se houver, até a data da propositura da ação. Apesar de o dispositivo prever os juros de mora, havendo no caso concreto juros compensatórios são esses que devem ser considerados para o cálculo do valor da causa. Quando o litígio tiver por objeto a existência, validade, cumprimento, modificação, resolução, resilição ou rescisão de ato jurídico, o inciso II do dispositivo ora comentado prevê que o valor da causa será o valor do ato ou o de sua parte controvertida. A possibilidade de valor da causa em quantia inferior ao valor do ato, quando o objeto da demanda não corresponder à sua integralidade, é novidade do Novo Código de Processo Civil que vem ao encontro da jurisprudência formada sob a égide do CPC/1973, mesmo sem previsão expressa nesse sentido. O inciso III mantém a regra de ser o valor da causa na ação de alimentos a soma de doze prestações mensais pedidas pelo autor. Na ação de divisão, de demarcação e de reivindicação, o valor da causa será o valor de avaliação da área ou bem objeto do pedido, substituindo-se, assim, a estimativa oficial para lançamento do imposto como critério para a fixação do valor da causa, como previsto no inciso VII do art. 259 do CPC/1973. O novo diploma processual nesse caso buscou prestigiar um valor mais próximo do real, mas criou uma dificuldade ao autor porque sugere que caberá a ele a contratação de um perito para elaboração de avaliação sobre o valor do imóvel ou bem. Essa exigência, entretanto, contraria o princípio da economia processual porque o laudo, elaborado unilateralmente, violará o contraditório e se prestará tão somente para a fixação do valor da causa. Não tem sentido exigir que o autor dispenda dinheiro e tempo com uma avaliação tão somente para fixação do valor da causa, de forma que a iniciativa do legislador, apesar de nobre, cria uma nova espécie de pedido genérico e valor da causa a ser fixado a gosto do autor, devendo ser corrigida quando for realizada a avaliação judicial. Há um ponto importante nesse tocante. Em razão do disposto no 1º, II do art. 330 do Novo CPC, é inepta a petição inicial quando formulado pedido genérico quando a lei exigir o pedido determinado. Trata-se, à evidência, de um exagero formal que contraria o espírito no novel diploma legal, transformando inexplicavelmente um vício manifestamente sanável em insanável. De qualquer forma, será um grande risco a parte nas ações de divisão, demarcação e reivindicação elaborar o pedido genérico diante da exigência do inciso IV do art. 292 do Novo CPC. Em termos de novidades quanto ao tema ora analisado, parece não haver dúvida de que a principal está contida no inciso V do art. 292 do Novo CPC. Nas ações indenizatórias, inclusive as fundadas em dano moral, o valor da causa deve ser o valor pretendido. Ao tornar o pedido de dano moral em espécie de 17

18 pedido determinado, exigindo-se do autor a indicação do valor pretendido, o dispositivo contraria posição consolidada do Superior Tribunal de Justiça de admitir nesses casos o pedido genérico, ainda que exista corrente doutrinária que defenda que o pedido de dano moral pode continuar a ser genérico. Quanto à cumulação de pedidos, o inciso VI do art. 292 do Novo CPC prevê que cabe ao autor somar o valor de todos os pedidos para se chegar ao valor da causa. A regra, entretanto, só se aplica as duas espécies de cumulação própria de pedidos (simples e sucessiva), já que nessas cumulações o autor pode receber todos os pedidos que elabora, sendo lógico que o valor da causa represente todo o benefício econômico alcançável pelo autor. Por outro lado, na cumulação imprópria, em que o autor só pode receber um dos pedidos que formula, não teria sentido aplicar a regra geral. Assim, sendo alternativos os pedidos, prevê o inciso VII do artigo ora analisado que o valor da causa será o do pedido de maior valor e o inciso VIII prevê que na cumulação subsidiária o valor da causa será o valor do pedido principal. Não sendo hipótese de aplicação do critério legal caberá ao autor descobrir o valor referente à vantagem econômica que se busca com a demanda judicial. Basta verificar o valor econômico do bem da vida material perseguido e indicá-lo como valor da causa. Não tendo o bem da vida valor econômico ou sendo esse valor inestimável, caberá ao autor dar qualquer valor à causa, sendo nesse caso comum a utilização na praxe forense da expressão meramente para fins fiscais, seja lá o que isso realmente signifique. Registre-se que, havendo cumulação de pedidos, sempre que o valor da causa para um deles for regido pelo critério legal ou tiver valor economicamente aferível e para o outro for causa de valor da causa meramente estimativo, o valor da causa da ação será tão somente o do primeiro pedido. A indicação de qualquer valor à causa só se justifica quando não há alternativa para o autor, o que não será o caso na situação exposta. Edison ingressa com ação judicial pleiteando a condenação de Jussara ao pagamento de danos morais e matérias. Com relação aos danos morais, Edison faz pedido genérico, deixando ao juízo o arbitramento do valor, e com relação aos danos materiais Edison faz pedido determinado para reparação de seu prejuízo, que entende ter sido de R$ 5.000,00. O valor da causa será de R$ 5.000,00, não sendo preciso se somar a esse valor algum outro, meramente estimativo, somente para deixar claro que também se está pedindo condenação de Jussara ao pagamento de danos morais Provas com que o autor pretende demonstrar a verdade dos fatos alegados Caso os operadores do direito levassem mais a sério a regra prevista no art. 319, VI, do Novo CPC, que se limita a repetir o mesmo inciso do art. 282 do CPC/1973, as petições iniciais viriam, a exemplo do que ocorria no extinto procedimento sumário, com a devida especificação de provas (assim, por exemplo, o autor já indicaria quais as testemunhas que pretende ouvir ou ainda os quesitos de perícia requerida). Acontece, entretanto, que atualmente o dispositivo legal não encontra tal aplicação, bastando ao autor a indicação genérica de todos os meios de prova em direito admitidos, para que o requisito seja considerado preenchido. E nada indica que tal entendimento será modificado diante do Novo Código de Processo Civil. Tal prática, já arraigada em nossa praxe forense, enseja ao juiz, na fase de saneamento do processo, a prolação de despacho para que as partes especifiquem as provas que pretendem produzir, indicando e justificando os meios de prova requeridos. É medida tomada pelos juízes justamente em decorrência da generalidade do protesto realizado na petição inicial, sendo bastante improvável para não dizer impossível que a parte no momento em que é instada a especificar provas requeira todos os meios de prova admitidos. Há doutrina que entende ser completamente inútil a exigência legal, afirmando não se poder entender que a ausência de requerimento de provas na petição inicial gere preclusão para o autor. Nesse entendimento, 18

19 mesmo não tendo feito pedido de provas na petição inicial, a partir do momento em que o juiz intima as partes para a especificação de provas, poderá o autor livremente as requerer. O mesmo raciocínio seria aplicado ao réu quanto à exigência de requerer a produção de provas em contestação (art. 336 do Novo CPC). O Superior Tribunal de Justiça entende que, mesmo tendo sido realizado o pedido genérico na petição inicial (autor) ou contestação (réu), haverá preclusão da prova na hipótese de a parte não reiterar sua vontade de produzi-las no momento em que for intimada para especificá-las. Ainda que se entenda correto o entendimento que aponta a exigência do art. 319, VI, do Novo CPC uma ridícula inutilidade, entendo ser interessante o requerimento genérico na petição inicial (bem como na contestação), não para evitar a preclusão, mas para permitir a alegação de cerceamento de defesa na hipótese de julgamento antecipado da lide. Em minha visão, o autor que deixa de pedir provas em sua petição inicial permite ao juiz um julgamento antecipado da lide, sem que possa em grau recursal alegar cerceamento de defesa, visto que nada requerendo em termos de produção probatória permite ao juiz o julgamento imediato, sem a necessidade de produção de provas Opção do autor quanto à realização da audiência de conciliação ou de mediação Nos termos do art. 319, VII, do Novo CPC, cabe ao autor a indicação, em sua petição inicial, de requerimento para a realização ou não da audiência de conciliação ou de mediação. Conforme devidamente analisado no Capítulo 17, item 17.5., o momento mais adequado para o autor expressar sua vontade contrária à realização de tal audiência é a petição inicial. Como a audiência só não será realizada se a vontade de ambas as partes for nesse sentido, havendo na petição inicial o requerimento de sua realização, a postura do réu torna-se inútil, porque mesmo não querendo a realização da audiência dela não conseguirá se livrar. Entendo que não havendo qualquer manifestação de vontade do autor, em descumprimento ao previsto no inciso ora analisado, não é caso de irregularidade da petição inicial e tampouco de hipótese de emenda da petição inicial. A realização da audiência de conciliação e de mediação é o procedimento regular, cabendo às partes se manifestarem contra sua realização, de forma que sendo omissa a petição inicial, compreende-se que o autor não se recusa a participar da audiência, que assim sendo será regularmente realizada. Como o art. 334, 4º, II, do Novo CPC, exige a manifestação de ambas as partes para que a audiência de conciliação e mediação deixe de ocorrer, mesmo que o autor peça sua não realização em sua petição inicial, o réu será citado para comparecer a tal audiência, nos termos do caput do art. 334 do Novo CPC, salvo se o direito não admitir a autocomposição, quando a vontade das partes será irrelevante. Nesse caso, mesmo que o réu não queira a realização da audiência, provavelmente deixará de expressar essa vontade porque não tendo o autor em sua petição inicial se manifestado no mesmo sentido, de nada valerá sua discordância. De qualquer forma, é possível que o réu, mesmo diante da omissão do autor em sua petição inicial quanto à vontade de não participar da audiência de conciliação e mediação, se manifeste contrariamente à sua realização, pedindo seu cancelamento. Entendo que, nesse caso, não há que se falar em preclusão temporal para a concordância do autor com a não realização da audiência, de forma que, mesmo não tendo se manifestado nesse sentido em sua petição inicial, poderá fazê-lo posteriormente Documentos indispensáveis à propositura da demanda Determina o art. 320 do Novo CPC que a petição inicial será instruída com os documentos indispensáveis à propositura da demanda. A ausência de tais documentos enseja a possibilidade de emenda da petição inicial, considerando-se que o vício gerado pela não juntada de tais documentos é sanável. Caso o autor não tenha acesso a tais documentos, o juiz poderá requisitá-los, de ofício ou a pedido do autor, no exercício de seus poderes instrutórios. 19

20 Não ocorrendo a emenda com a juntada dos documentos indispensáveis à propositura da demanda, a petição inicial será indeferida (art. 330, IV, do Novo CPC). Caso o juiz só perceba a ausência de tais documentos após a citação do réu, não mais se admitirá o indeferimento da petição inicial, que deve ocorrer sempre liminarmente, mas diante da resistência do autor em não juntar aos autos tais documentos, o processo deve ser extinto sem resolução de mérito por falta de pressuposto processual (art. 485, IV, do Novo CPC). Documentos indispensáveis à propositura da demanda são aqueles cuja ausência impede o julgamento de mérito da demanda, não se confundindo com documentos indispensáveis à vitória do autor, ou seja, ao julgamento de procedência de seu pedido. Esses são considerados documentos úteis ao autor no objetivo do acolhimento de sua pretensão, mas, não sendo indispensáveis à propositura da demanda, não impedem a continuidade da demanda, tampouco a sua extinção com resolução do mérito. Numa demanda de divórcio, a certidão de casamento é um documento indispensável à propositura da demanda, porque sem esse documento é impossível o julgamento de mérito, o mesmo não se podendo dizer de um documento que comprove o adultério do cônjuge, que pode ser importante para a parte que o apresente em juízo, mas cuja ausência não impedirá o julgamento de mérito da demanda. Registre-se que o Superior Tribunal de Justiça já permitiu o ingresso de ação revisional de contrato mesmo que o autor não apresente com a petição inicial uma cópia do contrato que se busca rever. É interessante porque, na sociedade massificada em que vivemos, com ampla presença dos contratos de adesão, é possível a elaboração de uma petição inicial nesse tipo de ação sem a necessidade de sua instrução com cópia do contrato celebrado entre as partes. Diante dessa nova realidade, o Superior Tribunal de Justiça entende pela viabilidade do pedido de exibição do contrato, ao invés de ser elaborado por meio de ação cautelar precedente de exibição de documento, seja elaborado incidentalmente, ainda que continue a acreditar ser o contrato documento indispensável à propositura da ação. 20

21 FORMAÇÃO DO PROCESSO E PETIÇÃO INICIAL Ordem dos Advogados do Brasil e a sociedade de advogados da qual participa; se não for suprida a omissão no prazo de cinco dias, a petição será indeferida (art. 106, 1, CPC). O art. 321 é regra geral que autoriza o juiz a determinar a emenda da petição inicial, para a correção de vícios sanáveis, no prazo de quinze dias, também sob pena de indeferimento. 6. PEDIDO 6.1. Conceito e divisão O pedido é o núcleo da petição inicial; a providência que se pede ao Poder judiciário; a pretensão material deduzida em juízo (e que, portanto, vira a pretensão processual);4s a consequência jurídica (eficácia) que se pretende ver realizada pela atividade jurisdicional. É, como dito, o efeito jurídico do fato jurídico posto como causa de pedir. "O petitum é o que se pede, não o fundamento ou a razão de pedir, a causa petendi. É o objeto imediato e mediato da demanda. Aí está o motivo da discórdia, que o juiz vai desfazer, declarando quem está com a verdade".46 Como um dos elementos objetivos da demanda (junto com a causa de pedir), o pedido tem importância fundamental na atividade processual. Em primeiro lugar, o pedido bitola a prestação jurisdicional, que não poderá ser extra, ultra ou infra/citra petita, conforme prescreve a regra da congruência (arts. 141 e 492 do CPC). Serve o pedido também como elemento de identificação da demanda, para fim de verificação da ocorrência de conexão, litispendência ou coisa julgada. O pedido é, finalmente, o principal parâmetro para a fixação do valor da causa (art. 292 do CPC)Y É possível distinguir, no pedido, um objeto imediato e um objeto mediato.48 Pedido imediato é a providência jurisdicional que se pretende: a condenação, a expedição de ordem, a constituição de nova situação jurídica, a tomada de providências executivas, a declaração etc. O pedido mediato é o bem da vida, o resultado prático que o demandante espera conseguir com a tomada daquela providência. Essa distinção tem algum relevo. 45. ASSIS, Araken de. Cumulação de ações, p MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Comentários ao Códi30 de Processo Civil, t. 4, p MOREIRA, José Carlos Barbosa, O novo processo civil brasileiro, p MOREIRA, ]osé Carlos Barbosa. O novo processo civil brasileiro, p

22 FREDIE DIDIER JR. O pedido imediato será sempre determinado; já o mediato pode ser relativamente indeterminado (pedido genérico - art. 324 e incisos do CPC). Em relação ao pedido mediato, aplica-se a regra da congruência, que, de resto, decorre da garantia constitucional do contraditório; o magistrado não pode alterar o bem da vida pretendido pelo demandante. Essa é a regra. A questão, entretanto, não é tão simples. À luz do art. 461 do CPC- 1973, correspondente ao art. 536 do CPC atual, há quem defenda que "o juiz está autorizado, desde que respeitados os limites da obrigação originária, a impor o fazer ou o não fazer mais adequado à situação concreta que lhe é apresentada para julgamento".49 Sobre o tema, conferir o v. 5 deste Curso Requisitos O pedido há de ser certo (art. 322, CPC), determinado (art. 324, CPC), claro (art. 330, 1o, 11, CPC) e coerente (art. 330, 1o, IV, CPC). Pedido certo é pedido expresso. ' Como será examinado adiante, não se adm ite, como regra, o pedido implícito. "Não se adm ite, a teor da melhor técnica, pedido obscuro, dúbio e vago, substituído, parcial ou integralmente, através de expressões elípticas, por exemplo, condenar o réu 'no que couber' ou, ainda, 'no que reputar justo', e outras, infelizmente comuns"y Tanto o pedido mediato quanto o pedido imediato devem ser certos. Pedido determinado é aquele delimitado em relação à qualidade e à quantidade. Pedido determinado se contrapõe ao pedido genérico, logo abaixo examinado. O pedido tem também de ser claro, inteli3ível. Pedido que tenha sido formulado de maneira pouco clara implica inépcia da petição inicial, consoante já examinado. O pedido há, enfim, de ser coerente, ou seja, deve ser consequência jurídica prevista para a causa de pedir aduzida. 53 Pedido que não decorre da causa de pedir implica inépcia da petição inicial, também como já examinado MARINONI, Luiz Guilherme. Tu tela inibitória. São Paulo: RT, 1998, p MARINONI, Luiz Guilherme. Tu tela inibitória. São Paulo: RT, 1998, p ; DINAMARCO, Cândido Rangei. "Os gêneros do processo e o objeto da causa". Revista de Direito Processual Civil. Curitiba: Gênesis, 1996, v. 2, p. 327; WATANABE, Kazuo. "Tutela antecipatória e tutela específica das obrigações de fazer e não fazer (arts. 273 e 461 do CPC)". Reforma do Códiso de Processo Civil. São Paulo: Saraiva, 1996, p MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Comentários ao Códiso de Processo Civil, t. 4, p Araken de Assis, Cumulação de ações, p MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Comentários ao Códiso de Processo Civil, t. 4, p ASSIS, Araken de. Cumulação de ações, p. 236; SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil, v. 2, p

23 FORMAÇÃO DO PROCESSO E PETIÇÃO INICIAL Na falta de um desses requisitos, deve o magistrado, antes de indeferir a petição inicial, determinar a sua correção (art. 321)55 Note que os requisitos do pedido (certeza, determinação, clareza e coerência) são os mesmos requisitos da sentença (cf. v. 2 deste Curso). Se o pedido é um projeto de sentença, nada mais razoável do que exigir dessa os mesmos requisitos exigidos daquele Cumulação de pedidos Cumulação própria: simples ou sucessiva Há cumulação própria de pedidos quando se formulam vários pedidos, pretendendo-se o acolhimento simultâneo de todos eles. Em um mesmo processo, vários pedidos são veiculados, tornando composto o objeto desse processo - o que, por tabela, implicará que a decisão judicial venha a ser proferida em capítulos. O Código de Processo Civil expressamente autoriza o cúmulo de pedidos no art Duas são as espécies de cumulação própria de pedidos: a) simples; b) sucessiva. Ocorre a cumulação simples quando as pretensões não têm entre si relação de precedência lógica (pedido prejudicial ou preliminar), podendo ser analisadas uma independentemente da outra. Não há necessidade de exame prévio de um dos pedidos, que são autônomos: podem ser acolhidos, total ou parcialmente, ou rejeitados, sem que se perquira o resu ltado do julgamento do outro. Oportuna a transcrição dos enunciados 37 e 387 da súmula da jurisprudência do STJ: "São cumuláveis as indenizações por dano material e dano moral oriundos do mesmo fato"; "É lícita a cumulação das indenizações de dano estético e dano moral". Dá-se a cumulação sucessiva quando os exames dos pedidos guardam entre si um vínculo de precedência lógica: o acolhimento de um pedido pressupõe o acolhimento do anterior. Veja que aqui, diferentemente do que ocorre na cumulação subsidiária, o segundo pedido só será apreciado se o primeiro for acolhido. Essa dependência lógica pode ocorrer de duas formas: a) o primeiro pedido é prejudicial ao segundo: o não acolhimento do primeiro pedido implicará a rejeição (e, portanto, julgamento) do segundo; b) o primeiro pedido é preliminar ao 55- Também assim, enunciado n. 292 do Fórum Permanente de Processualistas Civis: "Antes de indeferir a petição inicial, o juiz deve aplicar o disposto no art. 321"

24 FREDIE DIDIER JR. segundo: o não-acolhimento do primeiro implicará a impossibilidade de exame do segundo (que não será julgado, pois). O acolhimento do primeiro pedido, em qualquer caso, não implica necessariamente o acolhimento do segundo pedido. Normalmente, diz-se que a cumulação sucessiva é uma cumulação por prej udicialidade,56 o que é um erro, pois se misturam os conceitos de questão prejudicial e preliminar (ver capítulo sobre a teoria da cognição). São exemplos de cumulação sucessiva por prejudicialidade: a) investigação de paternidade e alimentos; b) declaratória de inexistência de relação jurídica e repetição de indébito etc. É exemplo de cumulação sucessiva por pedido preliminar a formulada na ação rescisória: juízo de rescisão (iudicium rescindens) e o juízo de rejulgamento (iudicium rescissorium)y Cumulação imprópria: subsidiária ou alternativa Cogita-se também a chamada cumulação imprópria de pedidos. Cuida-se de formulação de vários pedidos ao mesmo tempo, de modo que apenas um deles seja atendido: chama-se, por isso, de cumulação imprópria o fenômeno, exatamente porq ue tem o autor ciência de que apenas um dos pedidos formulados poderá ser satisfeito: o acolhimento de um implica a impossibilidade do acolhimento do outro.58 A base normativa para este tipo de postulação é o art. 326 do CPC. o adjetivo "imprópria" justifica-se porq ue, de fato, não se trata rigorosamente de uma cumulação de pedidos. A doutri na divide a cumulação imprópria em eventual e alternativa, seguindo denominação de Chiovenda. A cumulação eventual está regulada no caput do art. 326 e a alternativa, no parágrafo único do mesmo artigo. Cuidemos primeiro da cumulação eventual (de um lado, a formulação de mais de um pedido; de outro, o prestígio da eventualidade), também chamada de pedidos subsidiários, pedidos sucessivos ou cumulação subsidiária, essa última denominação mais correta (por isso, será a adotada a partir de agora) DINAMARCO, Cândido Rangei. Instituições de direito processual civil, v. 2, p "Apenas quando a rescindibilidade da sentença decorre da sua injustiça (v. g., art. 485, no IX) é que o iudicium rescindens funciona como prejudicial do iudicium rescissorium" (MOREIRA, José Carlos Barbosa. Comentários ao Código de Processo Civil, p. 205). 58. TJÃDER, Ricardo. Cumulação eventual de pedidos. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1998, p Segundo lição de TUCCI, José Rogério Cruz e. "Reflexões sobre a cumulação subsidiária de pedidos". Causa de pedir e pedido no processo civil. São Paulo: RT, p

25 FO RMAÇÃO DO PROCESSO E PETIÇÃO INICIAL Trata-se de aplicação da regra da eventualidade,60 segundo a qual a formulação das pretensões e exceções deve ser feita no momento específico da postulação.6' O demandante estabelece uma hierarquia/preferência entre os pedidos formu lados: o segundo só será analisado se o primeiro for rejeitado ou não puder ser examinado (falta de um pressuposto de exame do mérito)6'; o terceiro só será atendido se o segundo e o primeiro não puderem sê-lo etc. O magistrado está condicionado à ordem de apresentação dos pedidos, não podendo passar ao exame do posterior se não examinar e rejeitar o anterior. Nem mesmo se houver reconhecimento pelo réu da procedência do pedido subsidiário.63 A cumulação de pedidos incompatíveis entre si é caso de inépcia da petição inicial (art.330, 1, V, CPC). Caso seja possível e interessante formulá-los, a técnica correta é a dos pedidos subsidiários. É possível que o autor esteja em dúvida sobre o acolhimento do pedido principal e, por isso, formule o outro, para o caso de não vingar o primeiro, sendo este aspecto frágil da inicial um ponto que fatalmente não passará sem a crítica do réu.64 Percebe-se, pois, que não se aplica à cumulação imprópria o requisito da compatibilidade dos pedidos formulados, os quais jamais poderão ser acolhidos simultaneamente (art. 327, 3o, CPC). Os demais requisitos gerais para a cumulação de pedidos (competência e identidade de procedimento) aplicam-se, no particular, sem qualquer especialidade.6s Importante observação de José Rogério Cruz e Tucci: "Seja como for, a incompatibilidade não significa que possam ser cumulados, na espécie aqui examinada, pedidos absolutamente autônomos quanto à sua gênese fático-jurídica. Na verdade, deverá haver um elo de prejudicialidade entre os pedidos, uma vez que o provimento jurisdicional de procedência do primário fulmina (implicitamente) o interesse processual e, consequentemente, exaure a pretensão do autor em 6o. Barbosa Moreira identifica a cumulação subsidiária como exemplo do direito positivo nacional em que se permite imprimir caráter condicional a atos das partes. Lembra o autor que não há norma genérica que regule a inserção de condição em ato processual, sendo o art. 326 exemplo que pode servir como fundamento para aqueles que entendam ser possível ato processual sob condição (MOREIRA, José Carlos Barbosa."Recurso especial. Exame de questão de inconstitucionalidade de lei pelo Superior Tribunal de Justiça. Recurso extraordinário interposto sob condição". Direito Aplicado 11. Rio de janeiro: Forense, 2000, p ). Sobre os atos processuais sob condição ou termo, DIDIER Jr., Fredie; NOGUEIRA, Pedro Henrique Pedrosa. Teoria dos fatos jurídicos processuais. 2 ed. Salvador: Editora Jus Podivm, 2012, p Sobre a relação entre a preclusão e a cumulação subsidiária, amplamente, TUCCI, José Rogério Cruz e. "Reflexões sobre a cumulação subsidiária de pedidos", cit., p Assim, também, enunciado n. 287 do Fórum Permanente de Processualistas Civis: "O pedido subsidiário somente pode ser apreciado se o juiz não puder examinar ou expressamente rejeitar o principal". 63. TUCCI, José Rogério Cruz e. "Reflexões sobre a cumulação subsidiária de pedidos", ob. cit., p Também assim, STJ. 3 T., REsp n SP, rei. Min. Dias Trindade, j. em ASSIS, Araken de. Cumulação de ações, p TUCCI, José Rogério Cruz e. "Reflexões sobre a cumulação subsidiária de pedidos", cit., p

26 FREDIE 01DIER JR. relação ao pedido subsidiário. Desse modo, não se viabiliza o cúmulo subsidiário na hipótese de o autor reclamar o pagamento do preço decorrente da alienação de um automóvel e, subsidiariamente, na circunstância de ser rechaçado esse primeiro pedido, reivindicar ele a propriedade de um determinado imóvel".66 É instituto útil nas hipóteses de concurso de pretensões (ver item relacionado ao concurso de ações no capítulo sobre a teoria da ação). Trata-se de figura simétrica e oposta à da cumulação sucessiva.67 O valor da causa será o do pedido principal (art. 292, VIII, CPC). Acolhido o pedido principal, está o magistrado dispensado de examinar o pedido subsidiário, que não ficará acobertado pela coisa julgada, exatamente por não ter sido examinado.68 Caso o magistrado examine o pedido sucessivo per saltum, sem ter examinado o pedido principal, haverá errar in procedendo, impugnável pelo autor, em razão da preferência expressada na formulação dos pedidos. Não acolhido ou não examinado (caso falte um pressuposto de admissibilidade de exame do mérito) o pedido principal, deve o magistrado examinar o pedido subsidiário, sob pena de sua sentença ser citra petita. 69 E se o pedido principal for acolhido apenas parcialmente? Ricardo Tjader70 e Cruz e TuccP' defendem que o magistrado poderá passar ao exame do pedido subsidiário se for o caso de acolhê-lo integralmente, pois se presume que o interesse do autor estaria mais bem atendido com a total procedência do pedido subsidiário do que com a parcial procedência do pedido principal. Poderá o autor, ainda, recorrer da parte da decisão que rejeitar o pedido principal, mesmo que logre êxito no pedido subsidiário, pois, ao estabelecer a hierarquia, definiu o demandante o que pare ele é mais interessante.71 Aqui, cabem as segui ntes observações: 66. TUCCI, )osé Rogério Cruz e. "Reflexões sobre a cumulação subsidiária de pedidos", cit., p MOREIRA, )osé Carlos Barbosa. O novo processo civil brasileiro, p STF, 2 T., AI SP AgRg, rei. Min. Marco Aurélio, D)U , p ST). 3' T., EDcl no REsp n /SP, Rei. Min. Waldemar Zveiter, j. em , publicado no D) de , p Em sentido semelhante, muito embora sem fazer referência a sentença citra petita (usa-se o termo constrangimento ilegal), mas apontando a necessidade de respeito à ordem de preferência, não podendo analisar primariamente o pedido subsidiário: ST). 3' T., AgRg no Ag n /SP, Rei. Min. Nancy Andrighi, j. em , publicado no D)e de T)ÃDER, Ricardo. Cumulação eventual de pedidos. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1998, p TUCCI, José Rogério Cruz e. "Reflexões sobre a cumulação subsidiária de pedidos", cit., p "Neste caso, se a sentença acolher o pedido subsidiário, e não o principal, o autor pode apelar, po rque não teve sua pretensão inteiramente acolhida". (NEGRÃO, Theotônio. Código de Processo Civil e legislação processual em vigor. 32 ed. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 378). Assim, também, Assim, também, enunciado n. 288 do Fórum Permanente de Processualistas Civis: "Quando acolhido o pedido subsidiário, o autor tem interesse de recorrer em relação ao principal"

27 FORMAÇÃO DO PROCESSO E PETIÇÃO INICIAL a) seu recurso envolverá apenas um capítulo da decisão;73 b) a análise do pedido subsidiário, que não foi impugnada por lhe ter sido favorável, não será devolvida ao órgão ad quem, salvo se houver recurso do réu, situação em que se repetirá, na segunda instância, o julgamento da causa, nos moldes em que apresentada na primeira; c) caso seja provido o recurso do autor, restará prejudicada a sentença na parte em que acolheu o pedido subsidiário; não o sendo, prevalece o que fora decidido na sentença, em razão da proibição da reformatio in peius.74 Cruz e Tucci entende que, se a sentença reconhecer a procedência do pedido princi pal, o tribunal não poderá, no julgamento da apelação do réu, dando a ela provimento, adentrar o exame do pedido subsidiário, porq uanto somente o capítulo da decisão relacionado com o pedido principal é que foi devolvido ao órgão ad quem.75 Este entendimento, defendido no início dos anos 2000, possivelmente está superado pelo inciso 111 do 3o do art do CPC, que permite ao tribunal julgar pedido não examinado em primeira instância (sobre o tema, v. 3 deste Curso). A sucumbência total do autor, quando formula pedido subsidiário, só existirá se todos os seus pedidos forem rejeitados. Acolhido apenas o pedido subsidiário, não há como negar, porém, que o autor sucumbe em parte - tanto que há interesse recursal. Assim, o valor da condenação em honorários advocatícios deverá ser fixado proporcionalmente, e não no teto de 20'7o previsto no art. 85 do CPC76 Agora, a cumulação imprópria alternativa. Consiste na formulação, pelo autor, de mais de uma pretensão, para que uma ou outra seja acolhida, sem expressar, com isso, qualquer preferência. É cumulação imprópria, pois somente um dos pedidos formu lados poderá ser atendido. Está prevista no parágrafo único do art. 326 do CPC. Diferencia-se da cumulação eventual, porq ue nesta o autor demonstra preferência por um dos pedidos, o que não acontece na cumulação alternativa. Não se deve confundi-la com o pedido alternativo previsto no art. 325, que é pedido único, fundado em obrigação alternativa (que se caracteriza por permitir o 73- Identificando o pedido subsidiário como capítulo autônomo da decisão, ver o excelente trabalho de DINAMAR CO, Cândido. Capítulos da sentença. São Paulo: Malheiros Ed., 2002, p Em sentido contrário, entendendo faltar ao autor interesse recursal quando o pedido subsidiário é atendido, TJÃDER, Ricardo. Cumulação eventual de pedidos, p TUCCI, )osé Rogério Cruz e. "Reflexões sobre a cumulação subsidiária de pedidos", cit., p Neste sentido, STJ, Corte Especial, EREsp n /MG, rei. Ministro Castro Meira, j. em o2.o8.2o1o, publicado no D)e de ; STJ. 2 T., REsp n /RS, Rei. Min. Mauro Campbell, j. em , publicado no D)e Em sentido diverso, entendendo que o autor, neste caso, em nada sucumbe: TJÃDER, Ricardo. Cumulação eventual, p. 91; STJ. REsp n , rei. Barros Monteiro)

28 FREDIE DIDIER JR. adimplemento por mais de uma forma).77 Na cumulação alternativa, há no mínimo dois pedidos autônomos, formu lados para que se acolha apenas um deles. Vislumbra-se situação específica de cúmulo alternativo na consignação em pagamento: na dúvida, pode o autor dirigir-se a duas pessoas, por não saber a qual das duas se acha juridicamente ligado (art. 547, CPC), requerendo o devedor o depósito e a citação dos que disputam o crédito. Ao julgar a controvérsia entre os dois réus, decidirá o juiz qual deles era o legitimado perante o autor78 O valor da causa será o do pedido que tiver o maior valor (art. 292, VIl, CPC). Acolhido um dos pedidos, não terá o autor interesse para interpor recurso com o objetivo de acolhimento do outro.79 Diferentemente do que ocorre na cumulação subsidiária, pois não houve determinação da preferência entre os pedidos, considera-se que abriu mão o demandante de questionar a escolha do magistrado por esse ou aquele pleito. O acolhimento de um e a rejeição do outro também não implicam sucumbência parcial do autor. Cumpre assinalar que, como o recurso é "simples aspecto, elemento, modalidade ou extensão do próprio direito de ação exercido no processo",80 aplicam-se, por analogia, à demanda recursal, as técnicas de postulação inicial, como a cumulação de pedidos e os pedidos subsidiários. É muito comum o recorrente pedir, por exemplo, a anulação da decisão recorrida ou, se assim não entender o tribunal, a sua reforma Cumulação inicial e cumulação ulterior A cumulação de pedidos pode ser inicial, quando veiculada na demanda inicial, ou ulterior, quando a parte agrega novo pedido ao processo após a postulação inicial. É cumulação ulterior o aditamento permitido da petição inicial (art. 329, I, do CPC). Outro exemplo de cumulação ulterior é o ajuizamento pelo autor de ação declaratória incidental que objetiva o reconhecimento da falsidade de documento (art. 430, CPC). Alguns autores consideram que qualquer ampliação objetiva do processo é uma cumulação ulterior de pedidos. Assim, seria a reconvenção, demanda proposta pelo réu contra o autor, p. ex., hipótese de cumulação de pedidos superveniente. Também seria cumulação ulterior a reunião de causas conexas pela causa de pedir (arts. 55, 1o, CPC). Fala-se, então, em cumulação homo3ênea, quando os pedidos forem formulados pela mesma parte, e cumulação hetero3ênea ou contrastante, quando os pedidos n. Tratando o pedido alternativo como se fosse cumulação alternativa, Ricardo Tjader, Cumulação eventual, p. 35; DUARTE, Ronnie Preuss. "Litisconsórcios alternativo e subsidiário no processo civil brasileiro". Revista de Processo. São Paulo: RT, 2007, n. 147, p DINAMARCO, Cândido Rangel. Litisconsórcio. 5' ed. São Paulo: Malheiros, 1998, p Também nesse sentido, Cândido Dinamarco, Instituições de Direito Processual Civil, cit., v. 2, p o. MOREIRA, José Carlos Barbosa. Comentários ao Código de Processo Civil. 10 ed. Rio de janeiro: Forense, 2002, v. V, p

29 FORMAÇÃO DO PROCESSO E PETIÇÃO INICIAL forem formulados por partes distintas, como é o caso da cumulação pela reconvenção ou denunciação da lide promovida pelo réu.8' Nesta linha, cumpre advertir, nem sempre se aplica à cumulação hetero3ênea o requisito da compatibilidade dos pedidos Requisitos para a cumulação. A cumulação de pedidos deve preencher alguns requisitos, sob pena de não ser admitida. Como já salientado, a cumulação indevida de pedidos não pode implicar indeferimento da petição inicial sem que se dê ao demandante oportunidade de corrigir o vício. Vejamos os requisitos que o legislador impôs para admitir a cumulação de pedidos, encontráveis no art. 328 do CPC Compatibilidade dos pedidos. Também é requisito para a cumulação de pedidos que eles sejam com patíveis entre si (art. 327, 1, I, CPC). Trata-se de pressuposto lógico da cumulação, que, se não preenchido, implica inépcia da petição inicial por força do art. 330, 1, IV, CPC. Se for possível a formu lação de pedidos incompatíveis, deve o demandante valer-se da técnica da cumulação imprópria (eventual ou alternativa), que, como visto, dispensa a compatibilidade dos pedidos, exatamente porque se espera o acolhimento de apenas um deles (327, 3o, CPC. A incompatibilidade dos pedidos decorre do direito material, razão pela qual alguns autores usam a expressão "incompatibilidade substancial"8'. Exemplos de cumulação de pedidos incompatíveis: i) revisão e nulidade do contrato; ii) resolução e abatimento do preço (ação redibitória e quanti minoris); iii) complementação da área e resolução do contrato; iv) nulidade e resolução do contrato por inadimplemento Competência Somente é possível a cumulação se o juízo tiver competência absoluta para conhecer de todos os pedidos formu lados (art. 327, 1, 11, CPC). "Caso tenha competência para um e não tenha para o outro, não poderá haver cumulação".83 É o que pode ocorrer quando se formulam pedidos, em cumulação simples, contra litisconsortes facultativos, sendo que um deles goza de juízo privativo, como a União e demais entes públicos NERY JÚ NIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Códiso de Processo Civil Comentado, p ASSIS, Araken de. Cumulação de ações, item NERY JÚ NIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Códiso de Processo Civil Comentado, p Nesse sentido, interessante suscitar o Enunciado n. 21 do FONAJEF - Fórum Nacional dos Juizados Especiais Federais de Enunciado n. 21: "As pessoas físicas, jurídicas, de direito privado ou de direito público estadual ou municipal, podem figurar no polo passivo, no caso de litisconsórcio necessário"

30 FREDIE DIDIER JR. Não deve o magistrado indeferi r totalmente a petição inicial, se ocorrer cumulação de pedido que fuja da sua competência; deve admitir o processamento do pedido que lhe é pertinente, rejeitando o prosseguimento daquele estranho à sua parcela de jurisdição. Esse é o sentido do correto enunciado 170 da súmula da jurisprudência predominante do Superior Tribunal de justiça: "Compete ao juízo onde primeiro for intentada a ação envolvendo acumulação de pedidos, trabalhista e estatutário, decidi-la nos limites de sua jurisdição, sem prejuízo do aj uizamento de nova causa, com o pedido remanescente, no juízo próprio". Vão nessa linha os 1o e 2 do art. 45 do CPC, que regulam a cumulação de pedidos perante o juízo federal, que é incompetente para um deles: " 1 Os autos não serão remetidos se houver pedido cuja apreciação seja de competência do juízo perante o qual foi proposta a ação. 2 Na hipótese do 1, o juiz, ao não admitir a cumulação de pedidos em razão da incom petência para apreciar qualquer deles, não examinará o mérito daquele em que exista interesse da União, de suas entidades autárq uicas ou de suas empresas públicas". Se a cumulação envolver pedido para cujo processamento o juízo não tenha competência relativa, o desmembramento da petição inicial dependerá da alegação de incompetência pelo réu.85 No entanto, se entre os pedidos houver conexão, é possível a cumulação, mesmo que o juízo seja relativamente incompetente para processar e julgar um deles, em razão do efeito modificativo da competência que decorre da conexão (arts. 55, 1, do CPC). Não poderá o réu opor-se a tal cumulação.86 É por isso que se adm ite a cumulação, no mesmo processo, de pedido de resolução do compromisso de compra e venda de imóvel (competência relativa) com o pleito reivindicatório do mesmo bem (competência absoluta) Identidade do procedimento ou conversibilidade para o procedimento comum. Cláusula geral de adaptabilidade do procedimento comum. Exige-se ainda, para a admissibilidade da cumulação, uma com patibilidade procedimental entre os pedidos formu lados. Todos devem poder tramitar pelo mesmo procedimento (art. 327, 1o, 111, CPC). Se os pedidos corresponderem a procedimentos diversos, ainda assim a cumulação será possível, se puderem ser processados pelo procedimento comum. Neste caso, o legislador, corretamente, determina que se adapte o procedimento comum, 85. ASSIS, Araken de. Cumulação de ações, p. 266; FUX, Luiz. Curso de Direito Processual Civil, p. 202; GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro, v. 2, p ASSIS, Araken de. Cumulação de ações, item 266; FUX, Luiz. Curso de Direito Processual Civil, p Assim, também, Assim, também, enunciado n. 289 do Fórum Permanente de Processualistas Civis: "Se houver cone xão entre pedidos cumulados, a incompetência relativa não impedirá a cumulação, em razão da modificação legal da competência"

31 FORMAÇÃO DO PROCESSO E PETIÇÃO INICIAL de modo a inserir técnica processual diferenciada que com ele não seja incompatível (art. 327, 2, CPC). Por exemplo: a técnica da cognição limitada no procedimento possessório (irrelevância da alegação de domínio) pode ser inserida no procedimento comum, caso de cumulem pedidos possessório e de resolução de contrato. Se isso ocorrer, o procedimento seria o comum, mas a cognição, em relação ao pedido possessório, seria limitada. Esse dispositivo, cujo alcance ainda precisa ser dimensionado, é muito rico. Dele pode-se extrair a conclusão de que o procedimento comum é adaptável, maleável, flexível; de que ele é receptivo à incorporação, ainda que episódica, de técnicas diferenciadas pensadas para procedimentos especiais. O procedimento comum passa a ser território propício para a imi3ração de ajustes procedimentais desenvolvidos para a tutela de determinados direitos. Essa cláusula 3eral pode ser a fonte normativa da reafirmação e do desenvolvimento do princípio da adequação do procedimento. De todo modo, ao menos há uma certeza: o procedimento comum, no processo civil brasileiro, não é xenófobo e, por isso, não é rí3ido. Duas são, contudo, as situações-problema: a) cumulação de um pedido de procedimento especial com um pedido de procedimento comum; b) cumulação de pedidos de procedimento especiais diferentes. Nesse caso, permite o legislador que a cumulação seja feita, desde que seguindo o procedimento comum. Esta é a regra. Sucede que a solução não é tão simples. Há procedimentos especiais que não podem ser convertidos ao procedimento comum. Esse é o ponto-chave para a verificação da admissibilidade de cumulação de pedidos nessas hipóteses: saber se o procedimento especial é ou não é redutível ao procedimento comum. Por vezes, o legislador oferece ao autor mais de um procedimento apto a servir de meio para a tutela jurisdicional pleiteada. Há procedimentos que são criados como uma alternativa de tutela diferenciada ao autor, que se valerá deles conforme a sua conveniência. Nesse caso, determinada pretensão, que poderia ter sido proposta via procedimento especial, poderá ser formulada via procedimento comum. São eles os procedimentos especiais não-obrigatórios, opcionais, porq uanto possam ser dispensados pelo autor. A eles se aplica irrestritamente a regra da conversibilidade do procedimento em comum, em caso de cumulação de pedidos, prevista no art. 327, 2o, CPC. São exemplos de procedimentos especiais opcionais: mandado de segurança, possessórias e ação monitória. Tem o autor, nestes casos, "a faculdade de optar pelas vias ordinárias (o processo comum regido pelo Código de Processo

32 FREDIE DIDIER JR. Civil) e com isso renunciar aos benefícios do processo especial",87 que não puderem ser inseridos no procedimento comum (art. 327, 2, fine, CPC). Outros procedimentos especiais, no entanto, são criados com objetivo precípuo de atender a determinado interesse público, normalmente envolvendo direitos indisponíveis. Esses procedimentos são obrigatórios, inderrogáveis pela vontade do demandante, que não pode deles abri r mão, optando pelo procedimento comum. A esses procedimentos não se aplica a regra da conversibilidade antes mencionada. Aquela pretensão material, tipicamente prevista para ser tutelada pela via de determinado procedimento especial, não pode ser veiculada por qualquer outro procedimento, nem mesmo em cumulação de pedidos. Assim, não pode o autor cumular um pedido, que seria processado por um procedimento especial obrigatório, com outro, qualquer que seja o procedimento a ele pertinente. São exemplos: inventário e partilha, interdição, procedimentos especiais de jurisdição voluntária, desapropriação, ações de controle concentrado da constitucionalidade das leis. É por isso que se não pode admitir a cumulação de pedidos em ação coletiva, envolvendo improbidade administrativa e outro direito difuso, em razão do procedimento especial do tipo obrigatório previsto para a tutela daquela prime i r a questão (Lei n /1 992). Há quem admita a cumulação de pedido de jurisdição contenciosa com pedido de jurisdição voluntária, salvo manifesta incompatibilidade Ampliação da demanda Salvo os casos em que se admite pedido implícito, incumbe ao autor formular na petição inicial todos os pedidos que puder contra o réu. Poderá o autor, contudo, aditar a petição inicial antes da citação, desde que arque com as despesas do aditamento (art. 329, I, do CPC). Após a citação do réu e até o saneamento do processo, o autor pode aditar a demanda, desde que o réu consinta - há, aqui, um negócio processual típico: ampliação negociada do objeto litigioso do processo. Obviamente, garante-se ao réu o direito de defender-se em relação ao novo pedido (art. 329, 11, CPC). Há, porém, algumas ponderações que precisam ser feitas. a) Se o novo pedido for conexo ao pedido originário, não há razão para impedir o aditamento, mesmo após o saneamento do processo. Isso porq ue, em razão da 87. DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil. São Paulo: Malheiros Ed., 2001, v. 11, p GRECO, Leonardo. jurisdição voluntária moderna. São Paulo: Dialética, 2003, p

33 FORMAÇÃO DO PROCESSO E PETIÇÃO INICIAL conexão, se o pedido for apresentado em demanda autônoma, os processos haveriam de ser reunidos por conexão, nos termos do art. 55, 1, CPC. b) Autor e réu podem acrescentar, em eventual autocomposição, lide que não componha o objeto litigioso originário (art. 515, 2, CPC). Isso é uma ampliação do objeto litigioso do processo, ainda que apenas para fazer o acordo. c) O legislador traz, no particular, incompreensível /imitação à negociação processual: se as partes são capazes e desejam, consensual mente, uma ampliação do objeto litigioso após o saneamento, por que não aceitar? Por que não aplicar o art. 190, que consagra a negociação processual atípica? É realmente difícil entender essa vedação; parece um fóssil legislativo, remanescente de um sistema anterior, incompatível com o sistema atual, que permite a negociação processual. É, enfim, inegavelmente, uma regra que restringe a negociação processual, pois, ao regular um negócio processual típico, impõe os seus limites. Dificilmente, porém, a invalidade decorrente dessa ampliação processual negociada será decretada, além de ser bastante questionável a legitimidade de qualquer das partes acordantes para questionar a validade dessa convenção, por supostamente violar a proibição do inciso 11 do art Seria possível cogitar, no caso, tu quoque, vedado pela incidência do princípio da boa-fé processual (art. 5o, CPC). d) A possibilidade de a parte pedir a desconsideração da personalidade jurídica na instância recursal (art. 134, CPC) é, também, uma mitigação à estabilização objetiva do processo. Há ampliação do objeto litigioso, com a formulação de pedido de aplicação da sanção da desconsideração da personalidade jurídica. e) Fato constitutivo superveniente - causa de pedir remota superveniente, portanto - pode ser conhecido, até mesmo de ofício, caso interfira no julgamento da causa (art. 493, CPC). Esse conhecimento pode dar-se em qualquer estágio do processo. Trata-se de regra que, claramente, enfraquece o rigor preclusivo do art. 329, CPC, pois permite acréscimo de nova causa de pedir, até mesmo de ofício, relembre-se. Todas essas ponderações servem para demonstrar que o art. 329 do CPC parece completamente fora do contexto do sistema que o próprio CPC instituiu Redução da demanda Barbosa Moreira sintetizou as hipóteses de redução da demanda: a) desistência parcial; b) renúncia parcial ao direito postulado; c) transação parcial na pendência do processo; d) convenção de arbitragem relativa a parte do objeto do litígio, na pendência do processo; e) interposição, pelo autor, de recurso parcial contra a sentença de mérito desfavorável MOREIRA, José Carlos Barbosa. O novo processo civil brasileiro, p

34 FREDIE DIDIER JR. Frise-se que, nesses casos, o processo continua em relação à parte restante do mérito e as decisões que homologuem tais atos, em juízo singular, serão interlocutórias e, não, sentenças. Cada um desses casos será estudado em momento oportuno Alteração objetiva da demanda O autor tem o direito processual de promover a alteração (substituição) dos elementos objetivos da demanda (pedido e causa de pedir) antes da citação do réu (art. 329, I, CPC). Após a citação, o autor somente poderá fazê-lo com o consentimento do demandado, ainda que revel (art. 329, 11, do CPC), que terá novo prazo de resposta, pois a demanda terá sido alterada. Trata-se de verdadeiro negócio jurídico processual. A negativa do réu deve ser expressa, pois o silêncio, após intimação da proposta de mudança, poderá ser interpretado como concordância tácita, operando-se a preclusão.90 Há entendimento segundo o qual a mudança objetiva ex officio pelo magistrado deve ser impugnada, sob pena de operar-se a preclusão.9' Após o saneamento, é vedada qualquer alteração objetiva promovida pelo autor, mesmo com o consentimento do réu. Em razão disso, não se pode alterar objetivamente o processo em fase recursal, até mesmo para que não haja supressão de instância. Observadas estas regras, é possível a alteração do objeto imediato ou mediato do pedido.92 Eventuais correções de erros materiais da demanda podem ser feitas a qualquer tempo.93 Cabem, aqui, as mesmas críticas ao legislador feitas acima, por ocasião da análise do aditamento da petição inicial. Não se nega importância à estabilidade do processo. Sucede que o rigor preclusivo do dispositivo não pode ser levado às últimas consequências: não há, em tese, qualquer prejuízo a uma alteração objetiva do processo com a concordância das 90. "Apresentada petição pelo autor, em que se altera a causa de pedir, e nenhuma objeção apresentando o réu, que, ao contrário, cuida de negar-lhe o fundamento, é de admitir-se que consentiu na alteração. Incidência da ressalva contida no art. 264 do CPC". (ST), 3' T., Resp MG, re i. Min. Eduardo Ribeiro, DJU , p , colhida por Theotônio Negrão, Códi80 de Processo Civil, nota. 1oa ao art. 264, CPC). Oart. 264 do CPC-1973 corresponde ao art. 329 do CPC atual. 91. "Constitui nulidade relativa a alteração do pedido ex officio pelo juiz. Caso não haja impugnação oportuna, ocorre preclusão". (]TA 90/341; colh ida e anotada por Nery ]r. e Nery, Código de Processo Civil Comentado e legislação processual civil em vigor, p. 706). 92. MOREIRA, José Carlos Barbosa. O novo processo civil brasileiro, p DINAMARCO, Cândido. Instituições de Direito Processual Civil, cit., v. 11, p. 69; Arruda Alvim, Manual de direito processual civil. 7' ed. São Paulo: RT, 2001, v. 2, p

35 FO RMAÇÃO 00 PROCESSO E PETIÇÃO INICIAL partes, até mesmo após o saneamento. Se existir, o prejuízo deverá ser verificado in concreto e não presumido pelo legislador. A rigidez deste artigo coaduna-se com o espírito das legislações do século XIX, denotando formalismo desnecessário. Carlos Alberto Alvaro de Oliveira94 lembra alguns dispositivos do direito estrangeiro, que podem servir como referência: a) legislação processual alemã, onde se permite a modificação da demanda, independentemente da anuência do adversário, se entendido estar presente o requisito da utilidade para a causa; b) legislação processual austríaca, que autoriza o magistrado a permitir a modificação da demanda se não conduz ao "agravamento" do desenvolvimento do processo; c) extenso regramento do Código de Processo Civil Português sobre o assunto (arts )95 Percebe-se que a análise da utilidade e da viabilidade da alteração do objeto litigioso do processo deve ser transferida ao magistrado, que as verificará em cada caso concreto que lhe for submetido. O legislador partiu de premissa exatamente contrária a essa: é interessante, a princípio, a alteração consensual, salvo se não o for concretamente Espécies de pedido Pedido genérico O pedido tem de ser determinado, conforme visto. Pedido indeterminado é pedido inepto (art. 330, 1, 111, CPC) 96 Permite a lei, em alguns casos, a formulação de pedido genérico (art. 324 do CPC). Determinado quanto ao gênero, o pedido pode ser genérico em relação à quantidade. No tocante ao an debeatur será determinado; em relação ao quantum debeatur, 94. OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro de. Efetividade e processo de conhecimento, p Art do CPC português: "Alteração do pedido e da causa de pedir por acordo Havendo acordo das partes, o pedido e a causa de pedir podem ser alterados ou ampliados em qualquer altura, em 1. ou v instância, salvo se a alteração ou ampliação perturbar inconvenientemente a instrução, discussão e julgamento do pleito". Art do CPC português: "Alteração do pedido e da causa de pedir na falta de acordo 1 Na falta de acordo, a causa de pedir só pode ser alterada ou ampliada na réplica, se o processo a admitir, a não ser que a alteração ou ampliação seja consequência de confissão feita pelo réu e aceita pelo autor. 2 - O pedido pode também ser alterado ou ampliado na ré plica; pode, além disso, o autor, em qualquer altura, reduzir o pedido e pode ampliá-lo até ao encerramento da discussão em 1. instância se a ampliação for o desenvolvimento ou a consequência do pedido primitivo. 3 - Se a modificação do pedido for feita na audiência de discussão e julgamento, ficará a constar da ata respetiva. 4-O pedido de aplicação de sanção pecuniária compulsória, ao abrigo do n.o 1 do artigo A do Código Civil, pode ser deduzido nos termos da segunda parte do n.o Nas ações de indemnização fundadas em responsabilidade civil, pode o autor requerer, até ao encerramento da audiência de discussão e julgamento em 1. instância, a condenação do réu nos termos previstos no artigo do Código Civil, mesmo que inicialmente tenha pedido a condenação daquele em quantia certa. 6 - É permitida a modificação simultânea do pedido e da causa de pedir, desde que tal não implique convolação para relação jurídica diversa da controvertida". 96. "É inepta a inicial se o autor se limita a pedir que o ré u seja condenado 'nas penas previstas na lei'." (NEGRÃO, Theotônio. Códi3o de Processo Civil e le3islação processual em vi3or. 32 ed. São Paulo: Saraiva, 2001, nota 2 ao art. 286 do CPC-1 973, que corresponde ao art. 324, p. 375)

36 FREDIE DIDIER JR. será indeterminado. Trata-se de hipótese de pedido relativamente indeterminado, pois.97 Não se pode, p. ex., pedir a condenação a qualquer prestação. A indeterminação ficará restrita à quantidade ou à qualidade das coisas ou importâncias pleiteadas.98 Três são as situações em que se admite o pedido genérico, todas previstas no art. 324, 1o, do CPC. Essas hipóteses são excepcionais, "devendo por isto mesmo ser interpretadas restritivamente".99 Admite-se pedido genérico nas ações universais, se não puder o autor individuar na petição os bens demandados (art. 324, 1, I, do CPC). Ações universais são aquelas em que a pretensão recai sobre uma universalidade, seja ela de fato ou de direito. A petição de herança é exemplo de ação universal. Art. 90 do Código Civil: "Constitui universalidade de fato a pluralidade de bens singulares que, pertinentes à mesma pessoa, tenham destinação unitária". Ex.: rebanho, coleção de livros de uma biblioteca etc. Art. 91 do Código Civil: "Constitui universalidade de direito o complexo de relações jurídicas, de uma pessoa, dotadas de valor econômico". Ex.: patrimônio, espólio, massa falida etc. Pode o autor formular pedido genérico nas ações indenizatórias (art. 324, 2o, 11, CPC). O dispositivo fala em "consequências de ato ou fato", sem especificar se lícito ou ilícito. A opção é correta, pois pedido indenizatório pode decorrer de fatos lícitos'00 ou ilícitos. Em qualquer hipótese, "o juiz poderá levar em consideração fatos novos ocorridos depois da propositura da ação, para que possa proferir a sentença",101 que deve refletir o montante dos danos existente à época da sua prolação. Trata-se da hipótese mais frequente de pedido genérico. Não há razão para associar o dever de indenizar somente aos atos ilícitos. Trata-se de um vício muito frequente, que acaba por confundir o fato jurídico com o seu efeito. É possível que atos lícitos tenham por eficácia, também, o dever de indenizar. São inúmeros os exemplos: a) atos lícitos da administração, como a construção de um viaduto, podem gerar o dever de indenizar os administrados que se prejudicaram e que não poderiam arcar sozinhos com o ônus do benefício de todos; 97. PASSOS, José Joaquim Calmon de. Comentários ao Código de Processo Civil, p A indeterminação do pedido não pode ser absoluta (Pontes de Miranda, Comentários ao Código de Processo Civil, t. 4, p. 35). 98. THEODORO jr., Humberto. Curso de Direito Processual Civil. 32 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2ooo, p CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil. 8 ed. Rio de janeiro: Lúmen Júris, v. I, p Exemplos de atos lícitos de eficácia indenizante podem ser lidos em Marcos Bernardes de Mello (chamados pelo autor de atos-fatos indenizantes), Teoria do Fato jurídico. 10 ed. São Paulo: Saraiva, 2000, p NERY JR., Nelson, NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil Comentado e Le!Jislação Processual Civil em vi!jor. 6 ed. São Paulo: RT, p

37 FORMAÇÃO DO PROCESSO E PETIÇÃO INICIAL b) a legítima defesa e o exercício regular do direito são atos lícitos (art. 188 do Código Civil), mas podem gerar o dever de indenizar (art. 929 do Código Civil); c) Danos causados pelas empresas ferroviárias a quem não seja passageiro ou remetente de carga: o tráfego de trem é ato lícito, mas se, p. ex., uma faísca que surja do contato das rodas com os trilhos vier a provocar um incêndio em plantações marginais, esse dano deverá ser ressarcido e não terá havido ato ilícito. Muito embora não precise quantificá-lo, o autor deverá especificar o prejuízo sofrido. Afirma Humberto Theodoro ]r.: "Expressões vagas como 'perdas e danos' e 'lucros cessantes' não servem para a necessária individuação do objeto da causa. Necessariamente deverá ser descrita a lesão suportada pela vítima do ato ilícito, v. g.: prejuízos (danos emergentes) correspondentes à perda da colheita de certa lavou ra, ou, ainda, os lucros cessantes representados pela perda do rendimento líquido do veículo durante sua inatividade... "'0' Problema que merece cuidadosa análise é a do pedido genérico nas ações de reparação de dano moral: o autor deve ou não quantificar o valor da indenização na petição inicial? A resposta é positiva: o pedido nestas demandas deve ser certo e determinado, delimitando o autor quanto pretende receber como ressarcimento pelos prejuízos morais que sofreu. Quem, além do próprio autor, poderia quantificar a "dor moral" que alega ter sofrido? Como um sujeito estranho e por isso mesmo alheio a esta "dor" poderia aferir a sua existência, mensurar a sua extensão e quantificá-la em pecúnia? A função do magistrado é julgar se o montante requerido pelo autor é ou não devido; não lhe cabe, sem uma provocação do demandante, dizer quanto deve ser o montante. Ademais, se o autor pedir que o magistrado determine o valor da indenização, não poderá recorrer da decisão que, por absurdo, a fixou em um real (R$1,oo), pois o pedido teria sido acolhido integralmente, não havendo como se cogitar interesse recursal. O art. 292, V, CPC, parece ir por este caminho, ao impor como o valor da causa o valor do pedido nas ações indenizatórias, "inclusive as fundadas em dano moral". Somente é possível a i/iquidez do pedido, nestas hipóteses, se o ato causador do dano puder repercutir, ainda, no futuro, gerando outros danos (p. ex.: uma situação em que a lesão à moral é contin uada, como a inscrição indevida em arquivos de consumo ou a contínua ofensa à imagem); aplicar-se-ia, então, o inciso 11 do 1o do art. 324, aqui comentado. Fora desta hipótese, incabível a formulação de pedido ilíquido. joel Dias Figueira jr. abordou com precisão o tema: "Muitas vezes, o pedido de condenação (objeto imediato) do réu (pedido certo) por danos morais, decorrentes da morte de um ente querido, não está na dependência de qualquer elemento probatório para a sua fixação 102. THEODORO ]r., Humberto. Curso de Direito Processual Civil. 32 ed. Rio de janeiro: Forense, 2000, p

38 FREDIE DIDIER JR. (determinação), em que tristeza e o sofrimento pela perda irreparável da pessoa amada aparecem de forma ínsita na própria relação de direito material violada, em face do ilícito civil praticado. Nesses casos, arbitrar o valor perseguido com a demanda é um ônus processual do postulante, não podendo ser relegado, em princípio, para fase processual posterior ou remetido para estipulação, de acordo com o prudente critério do julgador". 103 O STJ admitiu, contudo, embora sem grandes argumentos, a formu lação de pedido genérico em demandas de ressarcimento de dano moral: STL 1 T., REsp n /MG, Rei. Min. Luiz Fux, j. em , publicado no DJ de , p. 233; STL 3 T., AgRg nos EDcl no AREsp n /RL Rei. Min. Sidnei Beneti, j. em , publicado no Dje de Permite-se, ainda, pedido genérico quando a condenação depender de ato a ser praticado pelo réu (art. 324, 1o, 111, do CPC), como na hipótese da ação de prestação de contas cumulada com o pagamento do saldo devedor Pedido alternativo Pedido alternativo é aquele que reclama prestações disjuntivas. Trata-se de tipo de pedido classificado a partir de dada relação de direito substancial, que permite a satisfação do direito por prestações autônomas e excludentes. Seu estudo diz mais respeito ao direito material, cuidando a legislação processual, tão-somente, de regulamentar a postulação em juízo dessas obrigações. O pedido será alternativo quando veicular pretensão oriunda de obrigação alternativa, facultativa ou com faculdade de substituição. 104 Ele está regulado no art. 325 do CPC. Não se trata de cumulação de pedidos (nem da chamada cumulação alternativa, vista linhas atrás): somente um pedido é feito; a forma de satisfação desse pedido é que é disjuntiva FIGUEIRA ]r. ]oel Dias. Comentários ao Códiso de Processo Civil. São Paulo: RT, 2001, vol. 4, tomo 2, p No mesmo sentido, Nery ]r. e Nery: "2. Dano moral. Nas ações de indenização por dano moral ou à imagem (v.g., CF s.o v e X), o pedido deve ser certo e determinado, fixado pelo autor. Não se deve deixar para o perito judicial a fixação do quantum, na indenização dos danos extrapatrimoniais". (Códiso de Processo Civil Comentado e Lesislação processual civil em visar. 6 ed. São Paulo: RT, p. 642) MOREIRA, José Carlos Barbosa Moreira. O novo processo civil brasileiro. 22 ed. Rio de janeiro: Forense, 20o2, p. 12; PASSOS, ]osé Joaquim Calmon de. Comentários ao Códiso de Processo Civil, v. 3, p Orlando Gomes aponta para a correção da terminologia: "A expressão obrigação facultativa é manifestamente imprópria, por indicar a possibilidade de não ser cumprida ao arbítrio do devedor, o que seria absurdo. A doutrina alemã prefere designá-la obrigação com faculdade alternativa, ou com faculdade de solução, ou ainda com faculdade de substituição". (GOMES, Orlando. Obrisações. 3' ed. Rio de Janeiro: Forense, 1972, p. 92) Neste sentido, PASSOS, José Joaquim Calmon de. Comentários ao Códiso de Processo Civil. 8 ed. Rio de janeiro: Forense, 1998, v. 3, p. 189; ASSIS, Araken de Cumulação de ações. 4' ed. São Paulo: RT, 2002, p Tratando o

39 FORMAÇÃO DO PROCESSO E PETIÇÃO INICIAL Consideram-se as obrigações alternativas como compostas, pois há previsão de mais de uma prestação como forma de extinção da obrigação (arts do Código Civil): plures sunt in oblibatione, una autem in solutione.106 Opõem-se às obrigações cumulativas, em que se exigem do devedor várias prestações.'07 As chamadas obrigações facultativas são obrigações simples, que muito se assemelham às alternativas, mas apenas sob a ótica do devedor, que poderá eximir-se da obrigação efetivando qualquer das prestações possíveis; tem ele a faculdade de escolha da prestação a ser cumprida, embora somente uma delas seja a devida: existem uma prestação in obli3atione e uma in facultate solutione. O Código Civil de 2002, assim como o de 1916, não cuidou expressamente delas.108 A diferença entre as modalidades de obrigação reside no fato de que nas facultativas a segunda prestação é acessória, se a primeira perecer, perecerá a obrigação; nas alternativas, a obrigação só perece se ambas perecerem. Cumpre advertir que a prestação in facultate solutione não pode ser exigida pelo credor, que não tem sobre ela direito de crédito.'09 Nas obrigações alternativas, ao contrário, todas as prestações podem ser exigidas, cabendo a escolha ao credor ou devedor, conforme seja. Se a escolha da prestação couber ao autor, não haverá pedido alternativo: será fixo, pois o autor ao formulá-lo fez a sua escolha. Poderá o autor reservar-se para escolher na fase de execução (mesmo em se tratando de obrigação de fazer, não fazer ou dar, cujo cumprimento da respectiva sentença dispensa processo autônomo de execução), formulando pedido alternativ0110 Mesmo se o autor formular pedido fixo, nas hipóteses em que a escolha da prestação coubesse ao réu, deverá o juiz assegurar ao demandado o direito de escolha (parágrafo único do art. 325, CPC). "É que não seria lícito a uma parte, unilateralmente, arrogar-se o ius eli3endi pertencente à outra"_,, Mas cabe ao réu a iniciativa de salvaguardar o seu direito de substituição, fazendo-a na contestação, não podendo o magistrado agir de ofício.112 E se o réu for revel, tendo o autor formu lado pedido fixo, quando a escolha caberia ao demandado? Calmon de Passos responde tema como cumulação alternativa, DINAMARCO, Cândido Rangei. Instituições de Direito Processual Civil, cit., v. 2, p ; SANTOS, Silas Silva. Litisconsórcio eventual, alternativo e sucessivo. São Paulo: Atlas, 2013, p o6. Sobre o regramento das obrigações alternativas no Código Civil de 2002, ver com proveito GAGLIANO, Pablo Stolze e PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil. Obri3ações. São Paulo: Saraiva, 2002, v. 2, p ASSIS, Araken de. Cumulação de ações. 4 ed. São Paulo: RT, 2002, p GAGLIANO, Pablo Stolze e PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil. Obri3ações. São Paulo: Saraiva, 2002, V. 2, p GOMES, Orlando. Obri3ações. 3 ed. Rio de janeiro: Forense, 1972, p o. MOREIRA, ]os é Carlos Barbosa. O novo processo civil brasileiro. 22 ed. Rio de janeiro: Forense, 2002, p MOREIRA, José Carlos Barbosa. O novo processo civil brasileiro. 22 ed. Rio de janeiro: Forense, 2002, p CALMON DE PASSOS, Comentários ao Códi3o de Processo Civil, cit., p

40 FREDIE DIDIER JR. o questionamento: "Não nos parece que a revelia descaracterize a natureza da obrigação. Ela conduz à admissibilidade dos fatos, não à constituição de fatos jurídicos novos, nem à descaracterização do fato jurídico título da demanda. Consequentemente, ao revel deve o juiz condenar, deferindo-lhe o direito de escolha, se o autor formulou pedido fixo quando deveria tê-lo posto como alternativo"."3 Não se aplica às demandas de pedido alternativo o disposto no art. 292, Vil, CPC, que cuida da hipótese de cumulação alternativa, em que há mais de um pedido. Aqui, conforme visto, cuida-se de pedido único e, pois, de "um só valor a considerar, porquanto entre as alternativas de solução inexiste diferença quantitativa, podendo-se falar apenas em diferença qualitativa"." Pedido relativo a obrigação indivisível Cuida o art. 328 do CPC"5 da hipótese em que um dos credores de obrigação indivisível pleiteia em juízo a sua satisfação. Regula-se a demanda que envolve relação jurídica creditícia em que há pluralidade de credores em torno de um objeto indivisível, e somente um ou alguns deles vai a juízo pedir a efetivação desta obrigação. Esse artigo é o dispositivo processual que "regulamenta" as disposições do direito material relacionadas com a cobrança judicial de créditos de obrigação indivisível. A correta compreensão desse artigo impõe que se façam, pois, algumas considerações de direito material. Entende-se por obrigação indivisível aquela cuja prestação tem por objeto uma coisa ou um fato não suscetíveis de divisão, por sua natureza, por motivo de ordem econômica, ou dada a razão determinante do negócio jurídico (art. 258 do Código Civil). São obrigações, enfim, cuja prestação somente se pode cumprir por inteiro. Quando há pluralidade de credores de obrigação indivisível, poderá cada um destes exigir a dívida inteira (art. 260, primeira parte, do Código Civil). A pluralidade de credores de obrigação indivisível implica tratamento igual ao da solidariedade ativa (arts. 264/265 c/c art. 260, todos do Código Civil)."6 O direito material, assim, legitima um dos credores a pleitear a dívida por inteiro. A classificação das obrigações em divisíveis e indivisíveis diz respeito ao seu objeto. Na verdade, o estudo da obrigação indivisível somente tem 113. CALMON DE PASSOS, Comentários ao Código de Processo Civil, v. 3, cit., p CALMON DE PASSOS, Comentários ao Código de Processo Civil, v. 3, cit., p Art. 328 do CPC: "Na obrigação indivisível com pluralidade de credores, aquele que não participou do processo receberá a sua parte, deduzidas as despesas na proporção de seu crédito" "Não há dificuldade em resolver as situações oriundas de obrigações com prestação indivisível, desde que se reconheça a necessidade de discipliná-las pelas normas relativas às obrigações solidárias". (Orlando Gomes, Obrigações, p. 91)

41 FORMAÇÃO DO PROCESSO E PETIÇÃO INICIAL relevância prática nas hipóteses em que há pluralidade de credores ou devedores - o que acaba por tornar o seu exame muito próximo do estudo das obrigações solidárias, fazendo com que alguns autores as vejam como espécies de obrigações em razão dos sujeitos, e não do objeto."7 Nada obstante semelhantes, distinguem-se pela causa: "A indivisibilidade resulta de obstáculo ao fracionamento da obrigação, ainda quando criado em razão do que se quer obter, enquanto a solidariedade é garantia que nada tem a ver com o conteúdo da prestação"."8 Os arts. 263 e 271 do Código Civil revelam um tratamento diferenciado das obrigações indivisíveis e solidárias, quando se resolverem em perdas e danos. Se apenas um dos credores receber a prestação por inteiro, a cada um dos outros assistirá o direito de exigir dele em dinheiro a parte que lhe caiba no total (art. 261 do Código Civil). A regra do Código Civil foi reproduzida no art. 328 do CPC, que lhe acrescenta, entretanto, o seguinte: aquele credor que não participou do processo, para levantar o seu quinhão, deverá arcar, proporcionalmente, com as despesas processuais da cobrança do crédito (inclusive honorários advocatícios). Essa é a peculiaridade trazida pelo CPC, que complementa o regramento material - e que dá ao presente artigo alguma utilidade, pois, do contrário, seria mera repetição do quanto disposto no Código Civil."9 Já disse Araken de Assis que o art. 291 do CPC-1973, correspondente ao atual art. 328, se situa de maneira totalmente incorreta no capítulo destinado à petição inicial e na seção destinada ao pedido, pois nada de especial teria a ação condenatória de cobrança de prestação indivisível"0 Assim, resume Calmon de Passos: "Mas o autor apenas estará autorizado a levantar a parte que lhe for devida, legitimados os que não participaram do processo, tanto a executar a sentença pela parte que lhe couber, como a levantar do produto a quota que lhes for devida, abatida sua participação proporcional nas despesas do processo". 121 Finalmente, uma observação: conforme o art. 274 do Código Civil, pode ser que o outro credor não levante o seu quinhão, se o devedor, contra ele, tiver alguma exceção pessoal Sobre o tema, Orlando Gomes. Obrisações, p. 90; Robert Joseph Pothier. Tratado das Obrisações. Campinas: Servanda, 2002, p Orlando Gomes. Obrisações, p Neste sentido, Araken de Assis, Cumulação de ações, p ASSIS, Araken de. Cumulação de ações, p PASSOS, José Joaquim Calmon de. Comentários ao Códiso de Processo Civil, p

42 FREDIE DIDIER JR Interpretação do pedido e pedido implícito Interpretação da petição inicial. Regras gerais sobre a interpretação dos atos postulatórios De acordo com o 2o do art. 322 do CPC, o pedido há de ser interpretado de acordo com o conjunto da postulação e com o princípio da boa-fé. Trata-se de regra indispensável à delimitação do objeto litigioso do processo122 A compreensão desse dispositivo pressupõe uma série de considerações. a) A postulação inicial é uma declaração de vontade'23; como tal, precisa ser interpretada. Desta declaração surgirão diversas consequências jurídicas processuais: i) escolha do juízo a quem a petição é dirigida - dado necessário para o exame da competência; ii) escolha do procedimento a ser adotado; iii) fixação do objeto litigioso - e, portanto, a delimitação do exercício da função jurisdicional; iv) defin ição de quem está sendo demandado etc. Não é, portanto, tema lateral, de somenos importância. A doutrina, porém, com as exceções de praxe, não lhe dá a atenção devida.124 b) O caput do art. 322 impõe que o pedido tem de ser certo; ou seja, o pedido tem de constar da petição inicial, não se aceitando, a princípio, pedido implícito - há exceções, que serão examinadas no próximo item. Não se pode considerar como pedido aquele que, embora pudesse ter sido formulado, não o foi125 c) O art. 341, 111, CPC, traz regra de interpretação da contestação. O réu tem o ônus de impugnar especificadamente os fatos afirmados pelo autor. Se não o fizer, presume-se ocorrido o fato não impugnado. Sucede que o inciso 111 do art. 341 dispõe que essa presunção não ocorrerá, se os fatos não impugnados "estiverem em contradição com a defesa, considerada em seu conjunto". Ou seja, a regra impõe a interpretação sistemática da contestação - para além da interpretação literal, portanto Sobre a interpretação do pedido e a definição do objeto litigioso, SILVA, Paula Costa e. A c to e processo - o dogma da irrelevância da vontade na interpretação e nos vícios do acto postulativo. Coimbra: Coimbra Editora, 2003, p MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Comentários ao Código de Processo Civil. 3' ed. Rio de janeiro: Forense, 1999, t. 4, p Boa contribuição nacional sobre o tema em OLIVEIRA, Bruno Silveira de. O juízo de identificação de demandas e de recursos no processo civil. São Paulo: Saraiva, 201 1, p. 125 e segs.; MACHADO, Marcelo Pacheco. Correlação no processo civil. Salvador: Editora jus Podivm, "Interpretar restritivamente o pedido é tirar dele tudo quanto nele se contém e só o que nele se contém, sem que se possa ampliá-lo por força de interpretação extensiva ou por consideração outra qualquer de caráter hermenêutica. Compreendido no pedido só o que expressamente contiver, não o que possa, virtualmente, ser o seu conteúdo". (PASSOS, )osé Joaquim Calmon de Comentários ao Código de Processo Civil, v. 3, cit., p. 209)

43 FORMAÇÃO DO PROCESSO E PETIÇÃO INICIAL A interpretação sistemática é técnica que também se aplica à interpretação do pedido. O 2o do art. 322 consagra uma regra de interpretação: o pedido há de ser interpretado de acordo com o conjunto da postulação - regra simétrica à prevista para a interpretação da contestação. A causa de pedir, como fundamento do pedido, é, portanto, dado imprescindível para a correta interpretação da postulação126 Registre-se: corretamente pensadas as coisas, pedido e causa de pedir são perspectivas do direito material afirmado em juízo. A causa de pedir compõe-se da afirmação deste direito e o pedido se refere ao efeito jurídico material que deste direito decorre. Assim, o objeto do processo não pode ser delimitado sem que se levem em contas essas duas pers pectivas. "7 Mesmo antes do CPC atual, o STJ já entendeu que o pedido há de ser interpretado de acordo com o conjunto da postulação: o pedido deve ser inferido a partir de uma exegese lógico-sistêmica do comp leto teor da petição inicial, razão pela qual não pode ser considerado como ultra petita o julgado que o interpreta de forma ampla e concede à parte aquilo que foi efetivamente pretendido com o ajuizamento da ação (STJ, 3 T., REsp n s6o-MG, Rei. Min. Nancy Andrighi, j. em ).128 d) Aplicam-se à interpretação do pedido as normas de interpretação dos atos jurídicos; ou seja, as normas que disciplinam a interpretação das declarações de vontade. A postulação é, também, uma declaração de vontade (art. 200 do CPC). O art. 112 do Código Civil, por exemplo, enuncia que "nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem". Trata-se de dispositivo plenamente aplicável à interpretação do 126. Comentando o CPC-1973, que não possuía enunciado semelhante (ao contrário, possuía enunciado que determinava a interpretação restritiva do pedido), Pontes de Miranda já dizia: "... a regra jurídica não preexclui que se prefira a interpretação que mais de afeiçoe à causa de pedir ou à narração dos fatos". (MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Comentários ao Códiso de Processo Civil. 3' ed. Rio de janeiro: Forense, 1999, t. 4, p. 82.) 127. MANDRIOU, Crisanto. "Riflessioni in tema di 'petitum' e di 'causa petendi'". Rivista di Diritto Processuafe. Padova: CEDAM, 1984, v. XXXIX, p Nesse sentido, em determinado precedente, afirmou o STJ que, ainda que expressa de forma singela, a petição inicial que permite concluir pela pretensão de tutela antecipada não invalida a decisão que a concede. Consta do precedente que "A petição inicial, não obstante ter sido redigida de forma singela, narra que o autor busca a concessão de aposentadoria por invalidez rural porque é segurado da Previdência Social e se encontra inválido para o trabalho que lhe garanta o sustento" e que "Ao final, consta pedido para que o benefício seja implantado desde a citação, o que, alinhado às razões deduzidas, traduz pretensão de cunho antecipatório". ( notícia publicada em 29 de agosto de 2013)

44 FREDIE DIDIER JR. pedido129-'30. É preciso investigar a vontade do postulante, para que se possa proceder corretamente à interpretação do pedido. Registre-se: a vontade da parte não é irrelevante para a interpretação do pedido'3'. Embora a interpretação literal seja o ponto de partida - uma interpretação que contrarie frontalmente o texto ou que não se tenha um "mínimo de correspondência no texto respectivo"'32 dificilmente será considerada como legítima'33 -, ela não é a única técnica possível de interpretação. A interpretação teleológica também é importante - além da sistemática, já referida. E é disso que trata o art. 112 do Código Civil. O art. 113 do Código Civil enuncia, ainda, que "os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração". A aplicação do dispositivo à interpretação do pedido é clara, até mesmo como reforço à incidência do princípio da boa-fé processual. Os signos (palavras, números e outros símbolos) utilizados pelo demandante devem ser interpretados de acordo com a boa-fé e com os usos do lugar de sua celebração. Se, em determinada comunidade, uma expressão consagrou-se, pelo uso, em um sentido, não se pode, ao interpretá-la posteriormente, dar a ela um sentido incompatível com aquele que a ela sempre se atribuiu Assim, ST). 3'- T., REsp n RR, rei. Min. Nancy Andrighi, j. em : "PROCESSUAL CIVIL. INTERPRE TAÇÃO DE ATO PROCESSUAL. PEDIDO DE DESISTÊNCIA DA AÇÃO INTERPRETADO COMO RENÚ NCIA. SENTIDO LITERAL DA LINGUAGEM EMPREGADA INCORRETAMENTE PELA PARTE. INADEQUAÇÃO. BUSCA PELA REAL VONTADE CONTIDA NO ATO PROCESSUAL. RENÚ NCIA. NECESSIDADE DE INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA. - A interpretação literal e gramatical dos atos processuais é a mais pobre e perigosa das interpretações, acabando por desviá-lo de sua finalidade, com desastrosas consequências. - É imprescindível ao aplicador ou intérprete do ato processual perquirir pela valoração volitiva inserta em seu conteúdo, pois o conteúdo deve preponderar sobre a forma. -A renúncia ao direito que se funda a ação é classificada tanto pela doutrina como pela jurisprudência como instituto de natureza material e, por isso, deve ser interpretada restritivamente" "... o pedido é uma declaração de vontade que precisa ser descodificada, ela deve ser interpretada atendendo -se mais à intenção do autor do ato do que ao seu sentido literal (art. 112 do CC). Perquirição da vontade efetiva do autor do ato e interpretação restritiva dos pedidos não são, portanto, vetores incompatíveis". (PEREIRA, Luis Guilherme Gonçalves. A possibilidade jurídica de julsamentos implícitos no processo civil. Dissertação de mestrado. Universidade Federal da Bahia, 2012, p. 74) Sobre o assunto, longamente, é imprescindível a leitura de SILVA, Paula Costa e. Acto e processo - o dosma da irrelevância da vontade na interpretação e nos vícios do acto postulativo. Coimbra: Coimbra Editora, 2003, p Nesse sentido, também, o enunciado n. 285 do Fórum Permanente de Processualistas Civis: "A interpretação do pedido e dos atos postulatórios em geral deve levar em consideração a vontade da parte, aplicando-se o art. 112 do Código Civil" PEREIRA, Luis Guilherme Gonçalves. A possibilidade jurídica de julsamentos implícitos no processo civil. Dissertação de mestrado. Universidade Federal da Bahia, 201 2, p. 71. A propósito, como referência, o n. 1 do art. 238 do Código Civil português, que cuida dos negócios jurídicos formais: "1. Nos negócios formais não pode a declaração valer com um sentido que não tenha um mínimo de correspondência no texto do respectivo documento, ainda que imperfeitamente expresso" Ressalva-se a possibilidade de ambas as partes concordarem com isso e a causa permitir autocomposição. Neste caso, teríamos verdadeiro negócio jurídico processual. A propósito, SILVA, Paula Costa e. Acto e processo -o dosma da irrelevância da vontade na interpretação e nos vícios do acto postulativo, cit., p

45 FORMAÇÃO DO PROCESSO E PETIÇÃO INICIAL O CPC reproduziu a regra de interpretação, quando, na parte final do 2o do art. 322, determinou que o pedido seja interpretado de acordo com a boa-fé. e) A interpretação do pedido deve observar o direito de defesa. Não se pode dar à postulação um sentido que comprometa a defesa, que se baseia sempre naquilo que foi demandado. Não é lícito interpretar a postulação para extrair dela um pedido que o réu não contestou. A manifestação do réu, porém, é um dado relevante para a definição do quanto foi postulado. Por vezes, embora a petição não seja tão clara - o que poderia levar à inépcia da petição inicial -, a contestação, que também deverá ser interpretada, serve para revelar o sentido em que a postulação do autor foi formulada'34 - sentido esse que foi efetivamente contestado pelo réu'35 No ponto, muito oportuna a referência ao art. 186, 3, do CPC português: "3. Se o réu contestar, apesar de arguir a ineptidão com fundamento na alínea a) do número anterior, não se julgará procedente a arguição quando, ouvido o autor, se verificar que o réu interpretou convenientemente a petição inicial". Registre-se: a postulação em juízo é uma declaração de vontade com no mínimo dois destinatários, a contraparte e o órgão jurisdicional'36 Por isso, se ambas as partes estão concordes em relação à intepretação da postulação, o problema da interpretação do pedido praticamente deixa de existir, ressalvadas as situações de processo simulado. Não se pode esquecer que a parte demandada é o destinatário da declaração de vontade (pedido) que tem, em tese, conhecimentos sobre a relação jurídica material controvertida. o órgão jurisdicional não dispõe dessas informações. Como afirma Paula Costa e Silva, "dificilmente se poderá justificar que, existindo uma convergência das partes quanto ao sentido com que devem ser compreendidos os comportamentos processuais, este entendimento possa ser postergado por um entendimento divergente do tribunal" '37 Não por acaso, pedido obscuramente deduzido leva à inépcia da petição inicial, exatamente porque dificulta a fixação do objeto litigioso e a defesa do demandado SILVA, Paula Costa e. Acto e processo - o dogma da irrelevância da vontade na interpretação e nos vícios do acto postulativo, cit., p Assim como a manifestação do autor (réplica) sobre a contestação é um dado relevante para a correta interpretação da peça de defesa SILVA, Paula Costa e. Acto e processo - o dogma da irrelevância da vontade na interpretação e nos vícios do acto postulativo, cit., p SILVA, Paula Costa e. Acto e processo - o dogma da irrelevância da vontade na interpretação e nos vícios do acto postulativo, cit., p

46 FREDIE DI DIER JR. f) Do princípio da cooperação, como visto neste volume do Curso, decorre o dever de esclarecimento. Assim, caso tenha dúvidas sobre o sentido da postulação, deve o órgão jurisdicional intimar a parte para que o esclareça. g) Tudo o quanto aqui se disse aplica-se, mutatis mutandis, à interpretação de todos os atos postulatórios, como a contestação, a réplica e os recursos'38 Todos são declarações de vontade. Eis a síntese: i) o julgador deve ater-se aos pedidos formulados pelo demandante, ressalvados os pedidos implícitos, adiante examinados; ii) a identificação dos pedidos expressamente formu lados decorre da interpretação da demanda, considerada como declaração de vontade e que deve ser interpretada em seu conjunto; iii) a interpretação do pedido deve basear-se, ainda que minimamente, no texto da petição inicial; iv) a interpretação do pedido não pode prejudicar a defesa; a defesa, porém, pode servir como dado para a interpretação do pedido; v) a interpretação do pedido deve observar o princípio da boa-fé e os usos do lugar da postulação Pedido implícito O pedido implícito é aquele que, embora não explicitado no instrumento da postulação, com põe o objeto litigioso do processo (mérito) em razão de determinação legal. Mesmo que a parte não peça, deve o magistrado examiná-lo e decidi-lo. É temperamento da regra de que o pedido há de ser certo. Quando há pedido implícito, ocorre uma cumulação objetiva de pedidos por força de lei (ex vi legis)'39: é como se a lei acrescentasse à demanda um novo pedido. Embora se trate de pedido implícito, não se permite a condenação implícita'40: o magistrado deve examinar expressamente o pedido implícito'4'. A análise desse pedido também se constitui capítulo autônomo da decisão142 Assim, o caput do art. 491 do CPC: "Art Na ação relativa à obrigação de pagar quantia, ainda que formulado pedido genérico, a decisão definirá desde logo a extensão da obrigação, o índice de correção monetária, a taxa de juros, o termo inicial de ambos e a periodicidade da capitalização dos juros, se for o caso, salvo quando:" Nesse sentido, também, o enunciado n. 286 do Fórum Permanente de Processualistas Civis: "Aplica-se o 2 do art. 322 à interpretação de todos os atos postulatórios, inclusive da contestação e do recurso" Lúcida síntese de Cândido Dinamarco. Capítulos de sentença, cit., p ASSIS, Araken de. Cumulação de ações, cit., p. 247; PASSOS, José Joaquim Calmon de. Comentários ao Códiso de Processo Civil, v. 3, cit., p Não obstante isso, súmula do STF, n. 254: "Incluem-se os juros moratórios na liquidação, embora omisso o pedido inicial ou a condenação" DINAMARCO, Cândido Rangei. Capítulos de sentença, cit., p

47 FO RMAÇÃO DO PROCESSO E PETIÇÃO INICIAL São exemplos de pedido implícito: a) os juros legais (art. 322, 1o, CPC; arts. 405 e 406 do Código Civil);'43 b) ressarcimento das despesas processuais e dos honorários advocatícios (art. 322, 1o, CPC); c) correção monetária (art. 322, 1o, CPC; art. 404 do Código Civil); d) pedido relativo a obrigações com prestações periódicas, pois o autor está desobrigado a pedir as prestações vincendas: o magistrado deve incluir, na decisão, as prestações vincendas e não pagas (art. 323 do CPC). Importa frisar que os juros convencionais ou compensatórios não prescindem do pedido expresso do autor, não se constituindo pedido implícito'44 Cristiano Chaves de Farias também aponta o pedido de alimentos como implícito na demanda de investigação de paternidade, em razão do art. 7o da Lei n /1 992'45 Segue um rol de enunciados de súmulas dos tribunais superiores relativas aos juros. STJ 12: Em desapropriação, são cumuláveis juros compensatórios e moratórios. STJ 43. Incide correção monetária sobre dívida por ato ilícito a partir da data do efetivo prejuízo. STJ 54. Os juros moratórios fluem a partir do evento danoso, em caso de responsabilidade extracontratual. STJ 69. Na desapropriação direta, os juros compensatórios são devidos desde a antecipada imissão na posse e, na desapropriação indireta, a partir da efetiva ocupação do imóvel. STJ 70. Os juros moratórios, na desapropriação direta ou indireta, contam-se desde o trânsito em julgado da sentença. STJ 93. A legislação sobre cédulas de crédito rural, comercial e industrial admite pacto de capitalização de juros. STJ 102. A incidência dos juros moratórios sobre os compensatórios, nas ações expropriatórias, não constitui anatocismo vedado em lei. STJ 113. Os juros compensatórios, na desapropriação direta, incidem a partir da imissão na posse, calculados sobre o valor da indenização, corrigido monetariamente Art. 405 do Código Civil: "Contam-se os juros de mora desde a citação inicial". Art. 406 do Código Civil: "Quando os juros moratórios não forem convencionados, ou o forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, serão fixados segundo a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional" ASSIS, Araken de. Cumulação de ações, cit., p. 248, com amplas referências bibliográficas FARIAS, Cristiano Chaves de. "Investigação de paternidade". Procedimentos especiais Cíveis - le!jis/ação extrava!jante. Fredie Didier jr. e Cristiano Chaves de Farias (coord.). São Paulo: Saraiva, 2003, p

48 FREDIE DIDIER JR. STJ 114. Os juros compensatórios, na desapropriação indireta, incidem a partir da ocupação, calculados sobre o valor da indenização, corrigido monetariamente. STJ 176. É nula a cláusula contratual que sujeita o devedor à taxa de juros divulgada pela ANBID/CETIP. STJ 186. Nas indenizações por ato ilícito, os juros compostos somente são devidos por aquele que praticou o crime. STJ 188. Os juros moratórios, na repetição do indébito, são devidos a partir do trânsito em julgado da sentença. STJ 204. Os juros de mora nas ações relativas a benefícios previdenciários incidem a partir da citação válida. STJ 362. A correção monetária do valor da indenização do dano moral incide desde a data do arbitramento. STJ 408. Nas ações de desapropriação, os juros compensatórios incidentes após a Medida Provisória n , de 11/06/1997, devem ser fixados em 6"/o ao ano até 13/09/2001 e, a partir de então, em 12"lo ao ano, na forma da Súmula n. 618 do Supremo Tribunal Federal. STJ 426. Os juros de mora na indenização do seguro DPVAT fluem a partir da citação. STF 121. É vedada a capitalização de juros, ainda que expressamente convencionada. STF 254. Incluem-se os juros moratórios na liquidação, embora omisso o pedido inicial ou a condenação. STF 562. Na indenização de danos materiais decorrentes de ato ilícito cabe a atualização de seu valor, utilizando-se, para esse fim, dentre outros critérios, dos índices de correção monetária. STF 596. As disposições do Dec /33 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas que integram o sistema financeiro nacional

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50 18. RESPOSTAS DO RÉU Sumário: Introdução Contestação: Prazo; Matérias de defesa; Princípio da impugnação específica dos fatos; Princípio da eventualidade Reconvenção: Conceito; Condições da ação; Pressupostos processuais; Procedimento INTRODUÇÃO O réu, integrado à relação jurídica processual por meio da citação, passa a ter ciência da existência da demanda movida contra ele, sendo essa a sua primeira informação dentro do procedimento. E, mais do que isso, acompanhando o ato citatório, haverá também uma intimação ao réu para que, querendo, apresente sua resposta no prazo legal. Dessa forma, essa conjugação de citação e intimação representa de maneira bastante clara o fenômeno do contraditório no processo civil: informação da existência da demanda judicial e abertura de possibilidade de reação. É tradicional a afirmação de que a resposta do réu constitui um ônus processual, considerando-se que o réu somente se manifestará se essa for sua vontade, que determinará também a forma de reação. A inércia do réu, algo absolutamente admissível no processo civil, gerará em regra a sua revelia, fenômeno ligado à inexistência jurídica de contestação, com as limitações previstas pelo art. 345 do Novo CPC. A inércia, entretanto, ainda que possa ser considerada uma espécie de resposta do réu, já que a ausência de resposta é uma espécie de resposta omissiva, será analisada no capítulo referente à revelia, não sendo objeto de análise no presente capítulo. Interessam no momento apenas as respostas positivas que o réu poderá manejar após a sua citação, sendo essas das mais variadas ordens, ainda que o Novo Código de Processo Civil preveja apenas a contestação e a reconvenção em parte dirigida às respostas do réu. Apesar da inegável importância dessas duas espécies de resposta, existem outras formas que precisam ser destacadas, como o chamamento ao processo, a denunciação da lide, o reconhecimento jurídico do pedido, a impugnação ao valor da causa, a impugnação à concessão dos benefícios da assistência judiciária, desde que manejadas pelo réu e no prazo de defesa, considerando-se que alguns 50

51 desses institutos processuais também podem ser manejados pelo autor (por exemplo, denunciação da lide) ou em outro momento processual (por exemplo, impugnação aos benefícios da assistência judiciária). Também pode se considerar espécie de resposta do réu a alegação de litisconsórcio multitudinário. Apesar das inúmeras espécies de resposta do réu, no presente capítulo analisarse-á somente duas delas: a contestação (que passa a incluir a impugnação ao valor da causa e a impugnação à concessão dos benefícios da gratuidade) e a reconvenção. A denunciação da lide e o chamamento ao processo são tratados no Capítulo 8, itens 8.3. e 8.4. O mesmo ocorre com o reconhecimento jurídico do pedido, analisado no Capítulo 23, item , e o litisconsórcio multitudinário, enfrentado no Capítulo 7, item 7.4. Registre-se que, com a mudança na forma de alegação de incompetência relativa, que passa no Novo Código de Processo Civil a ser feita na própria contestação, e com o reconhecimento de que a suspeição e o impedimento são matérias alegáveis por ambas as partes, o novo diploma processual não prevê mais as exceções rituais como espécies de resposta do réu CONTESTAÇÃO PRAZO A contestação é a resposta defensiva do réu, representando a forma processual pela qual o réu se insurge contra a pretensão do autor. O prazo de contestação é de 15 dias, sendo o termo inicial de tal prazo tratado pelo art. 335 do Novo CPC. Nos termos do inciso I do art. 335 do Novo CPC, o prazo tem início a partir da audiência de conciliação ou de mediação, ou da última sessão de conciliação, quando qualquer parte não comparecer ou, comparecendo, não houver autocomposição. Como se pode notar, a ausência da parte e/ou advogado não impede que eles saiam intimados da audiência quanto ao início do prazo de resposta. No caso de ambas as partes se manifestarem expressamente contra a realização da audiência de conciliação ou de mediação, o inciso II do art. 335 do Novo CPC prevê a data do protocolo do pedido de cancelamento da audiência de conciliação ou de mediação apresentado pelo réu como termo inicial do prazo de resposta. O termo 51

52 inicial nesse caso independe de qualquer intimação específica para a prática do ato. Havendo litisconsórcio passivo, o prazo de cada um terá termo inicial autônomo, contado do protocolo do respectivo pedido ( 1.º). Já o inciso III do artigo ora analisado prevê a aplicação subsidiária do art. 231 do Novo CPC a depender da forma como foi feita a citação. O art. 335, 2.º, do Novo CPC, prevê termo inicial para a contagem do prazo para a resposta do réu especificamente quando a demanda não admitir autocomposição (nesse caso não haverá a audiência de conciliação ou de mediação), e, havendo litisconsórcio passivo, o autor desistir em relação a réu ainda não citado. Nesse caso, o prazo terá início na data de intimação da decisão que homologar a desistência. Diante do novo procedimento criado pelo Novo Código de Processo Civil, a contestação seria apresentada, quando necessário, depois da realização da audiência de conciliação e mediação. O art. 340 do Novo CPC, entretanto, cria uma hipótese na qual a contestação poderá ser protocolada antes da audiência de conciliação e mediação. Segundo o caput do dispositivo, havendo alegação de incompetência relativa ou absoluta, a contestação poderá ser protocolada no foro de domicílio do réu, fato que será imediatamente comunicado ao juiz da causa, preferencialmente por meio eletrônico. Como o 1º do art. 340 do Novo CPC prevê que a contestação nesse caso será submetida a livre distribuição ou, se o réu houver sido citado por meio de carta precatória, juntada aos autos dessa carta, seguindo-se a sua imediata remessa para o juízo da causa, fica claro que o protocolo se dá em foro distinto daquele no qual tramita o processo, o que inviabiliza materialmente que seja a contestação apresentada na audiência. Entendo, contudo, que o protocolo de contestação com preliminar de incompetência pode ocorrer até mesmo no juízo no qual tramita o processo, conforme amplamente exposto no Capítulo 18, item É evidente que será mais fácil para o réu fazer o protocolo no foro do local de seu domicílio, mas o objetivo principal da regra é evitar que o réu seja obrigado a comparecer à audiência de 52

53 conciliação e mediação em juízo incompetente, tendo importância secundária o foro em que a contestação é protocolada. O protocolo da contestação nos termos analisados é causa de suspensão da realização de audiência de conciliação e mediação já designada (art. 340, 3º, do Novo CPC). Sendo reconhecida a competência do foro indicado pelo réu, o 2º do art. 340 do Novo CPC prevê que o juízo para o qual fora distribuída a contestação ou a carta precatória será considerado prevento, sendo responsável, nos termos do 4º do mesmo dispositivo, a designar nova data para a audiência de conciliação ou de mediação MATÉRIAS DE DEFESA Sendo a contestação a única resposta do réu com natureza de defesa contra a pretensão do autor, é nela que o réu deverá elencar suas matérias de defesa. A doutrina costuma dividir as matérias de defesa passíveis de alegação em sede de contestação em dois grandes grupos, cada qual com suas subdivisões 505 : (a) defesas processuais, divididas em dilatórias, peremptórias e defesas dilatórias potencialmente peremptórias; (b) defesas de mérito, divididas em defesas de mérito diretas e indiretas Defesas processuais As defesas processuais, também chamadas por parcela da doutrina de defesas indiretas por não terem como objeto a essência do litígio 506, estão previstas no art. 337 do Novo CPC. Na praxe forense são tratadas como defesas preliminares em razão do local ideal dentro da contestação para serem alegadas (antes das defesas de mérito). Cabe ao juiz analisar as defesas processuais antes das defesas de mérito (defesas substanciais). O ponto em comum que reúne todas essas espécies de defesa é a sua característica de não dizerem respeito propriamente ao direito material alegado pelo autor, mas tão somente à regularidade formal do processo, ou seja, ao instrumento utilizado pelo autor para obter a proteção ao direito material. Essas defesas processuais são divididas conforme a consequência do seu acolhimento no caso concreto. Tradicionalmente, as defesas preliminares são 53

54 divididas em defesas dilatórias, cujo acolhimento não põe fim ao processo, tão somente aumentando o tempo de duração do procedimento, e defesas peremptórias, que, uma vez acolhidas, fazem com que o processo seja extinto sem a resolução do mérito. Além dessas duas espécies, acredito existir uma terceira, que não se amolda com perfeição a nenhuma das duas anteriores, e que prefiro chamar de defesas dilatórias potencialmente peremptórias. São as defesas que, acolhidas, permitem ao autor o saneamento do vício ou irregularidade, caso em que o processo continuará e a defesa terá sido meramente dilatória. No caso contrário, de omissão do autor, a defesa toma natureza peremptória, gerando a extinção do processo sem a resolução do mérito. Nesse caso, não é somente o acolhimento da defesa que leva o processo à sua extinção, mas sim tal acolhimento somado à inércia do autor Defesas dilatórias Inexistência ou nulidade de citação (art. 337, I, do Novo CPC) A inexistência ou nulidade de citação é matéria de ordem pública, alegável a qualquer momento do processo, o que leva a crer que tal alegação, descrita como espécie de preliminar a ser apresentada na contestação, somente se dará na hipótese de o réu, por alguma outra forma que não a citação válida, ficar sabendo da existência do processo ainda dentro do prazo de resposta, ingressando com a contestação tempestivamente e alegando todas as matérias de defesa que o possam beneficiar. Ocorrendo tal situação, o réu poderá se comportar de duas formas: tão somente alegar a inexistência ou nulidade de citação ou, além dessa matéria, passar às outras defesas processuais e/ou de mérito, em respeito ao princípio da eventualidade. Sendo acolhida a alegação do réu, o prazo de resposta lhe será devolvido, permitindo-lhe a apresentação de nova contestação, que substituirá a anteriormente apresentada. Em caso contrário, nenhum prazo lhe será devolvido, de forma que de duas uma; ou ele já apresentou as outras respostas, e nesse caso não será tido como revel, ou, com a rejeição de sua única defesa, estarão presentes as condições para a decretação de sua revelia 508. De qualquer forma, o acolhimento dessa defesa não extingue o processo, apenas dilatando seu tempo de duração em decorrência da devolução do prazo de resposta ao réu (art. 239, 1º, do Novo CPC) Incompetência do juízo (art. 337, II, do Novo CPC) 54

55 Apesar de a incompetência absoluta ser matéria de ordem pública, podendo ser alegada a qualquer momento do processo, quando o réu alegá-la em seu prazo de resposta o fará como tópico da contestação. Essa espécie de reação do réu, que não se volta contra a pretensão do autor, mas apenas ao juízo escolhido por ele, tem natureza meramente dilatória, porque uma vez acolhida gerará a remessa do processo ao juízo competente, sendo que as exceções dessa regra foram tratadas no Capítulo 4, item É natural que a remessa do processo a outro juízo demore algum tempo, dilatando o tempo de duração do processo. Em razão do previsto no art. 10 do Novo CPC, mesmo tratando-se de matéria de ordem pública cabe ao juiz, diante da alegação de incompetência absoluta formulada pelo réu em sua contestação, intimar o autor para se manifestar sobre a matéria antes de decidi-la. Acredito que nesse caso não se aplica a teoria do contraditório inútil, analisado no Capítulo 3, item de forma que pretendendo acolher ou rejeitar o pedido de reconhecimento de incompetência absoluta caberá ao juiz intimar antes o autor, concedendo-lhe prazo para se manifestar. Assim entendo porque a incompetência absoluta abstratamente não beneficia ou prejudica o autor, sendo indispensável abrir a ele oportunidade de se manifestar antes da prolação da decisão. Não tem qualquer sustentação jurídica o Enunciado 04 da ENFAM, que sumariamente decreta que para o reconhecimento da incompetência absoluta não se aplica a exigência de contraditório prévio, admitindo-se assim a decisão surpresa. Chega a ser curioso porque justamente essa matéria de ordem pública tenha sido excluída do alcance do art. 10 do Novo CPC. Porque para outras matérias tal artigo deve ser respeitado? A incompetência absoluta passou a ser mais de ordem pública que as demais matérias da mesma natureza? O absurdo do enunciado não merece maiores comentários, só lamentação. No Novo Código de Processo Civil a incompetência relativa passa a ser alegada em sede de preliminar de contestação, não existindo mais a exceção ritual para a alegação de referida matéria de defesa processual. Trata-se de consolidação legislativa de entendimento consagrado no Superior Tribunal de Justiça, que já vinha dispensando a peça autônoma para alegação da incompetência relativa na vigência do CPC/ A incompetência relativa gera uma nulidade relativa, e, não sendo 55

56 arguido o vício pelo réu em sua contestação, este se convalidará, não sendo mais possível ser levantando pelo réu e muito menos reconhecido de ofício. A revogação do art. 307 do CPC/1973, que versava sobre os requisitos quanto ao conteúdo da exceção ritual de incompetência relativa, deixa um interessante questionamento em aberto. No sistema revogado o réu tinha o ônus de não só alegar a incompetência relativa do juízo, mas também de indicar o juízo que entendia ser o competente, sendo que a ausência de tal indicação ocasionava a hipótese de emenda da petição e somente depois da oportunidade concedida ao réu, o indeferimento da exceção 510. Essa exigência formal se justificava porque a indicação do réu vinculava o juiz, não podendo ser acolhida a exceção se o juiz entendesse no caso concreto que o foro competente não era nem o atual, nem aquele indicado pelo réu. Seria realmente inexplicável a exigência de indicação do foro se o juiz pudesse remeter o processo para qualquer comarca ou seção judiciária 511. Na realidade, o pedido do réu na exceção ritual na vigência do CPC/1973 não se limitava à declaração de incompetência, mas também à remessa do processo ao foro indicado, de forma que, não sendo esse foro competente, caberia ao juiz indeferir o pedido. Apesar da lógica da regra do art. 307 do CPC/1973, sem uma expressa previsão no Novo Código de Processo Civil no sentido de exigir do réu essa alegação do juiz que entende ser o competente, aparentemente ele estará liberado desse ônus, o que, por via de consequência, liberará o juiz para encaminhar o processo para qualquer juízo que ele entenda ser o competente. Lamento a opção do legislador, mas não parece correto impor ao réu um ônus não previsto expressamente em lei 512. Diferente do previsto no art. 306 do CPC/1973, a alegação de incompetência relativa no novo diploma legal não gera a suspensão do procedimento principal, ainda que o ideal seja uma suspensão tácita enquanto o juiz não decidir a alegação do réu. Na realidade era o que já ocorria ou deveria ocorrer com a alegação de incompetência absoluta na vigência do diploma processual revogado, que também não tinha como continua a não ter previsão legal de suspensão do processo. Da decisão interlocutória que acolhe ou rejeita a alegação de incompetência do réu tanto a absoluta como a relativa não cabe agravo de instrumento, por não 56

57 estar tal decisão prevista no rol taxativo do art do Novo CPC e tampouco existir uma previsão específica de cabimento de tal espécie recursal. A recorribilidade deverá ser feita por alegação em apelação ou contrarrazões de apelação, nos termos do art , 1º, do Novo CPC, mas nesse caso não é preciso muito esforço para se notar a inutilidade da via recursal prevista em lei. Como os atos praticados pelo juízo incompetente, inclusive no caso de incompetência absoluta, não são nulos, mesmo que o tribunal de segundo grau reconheça a incompetência no julgamento da apelação poderá, nos termos do art. 64, 4º, do Novo CPC, deixar de anular os atos praticados em primeiro grau pelo juízo incompetente. Diante de tal situação, entendo ser cabível o mandado de segurança contra tal decisão Conexão/continência (art. 337, VIII, do Novo CPC) Quanto à conexão e continência, há uma importante observação a ser feita a respeito da indevida e frequente confusão entre a definição de seus conteúdos e de seu efeito principal. Os conteúdos dos fenômenos processuais estão previstos nos arts. 55, caput, e 56 do Novo CPC. Seu efeito principal é a reunião dos processos perante o juízo prevento, previsto pelo art. 55, 1º, do Novo CPC. O objeto e o efeito, como em qualquer instituto, não se confundem. Gerando-se o efeito programado pelo art. 55, 1º, do Novo CPC, a reunião dos processos proporcionará um aumento do tempo de duração do processo, sendo por essa razão entendidas a conexão e a continência como defesas processuais dilatórias. Como o art. 55, 3º, do Novo CPC prevê a reunião de processos com ações não conexas, desde que a reunião seja conveniente para evitar decisões conflitantes ou contraditórias, entendo que essa alegação também deve ser feita em preliminar de contestação, em aplicação por analogia ao art. 337, VIII, do Novo CPC. Registre-se, entretanto, que no caso de continência a defesa apresentada pelo réu poderá ter natureza peremptória, porque nem sempre o reconhecimento da continência levará à reunião dos processos. Segundo o art. 57 do Novo CPC, quando houver continência e a ação continente tiver sido proposta anteriormente, o processo relativo à ação contida será extinto por sentença sem resolução de mérito; caso contrário, as ações serão necessariamente reunidas Defesas peremptórias 57

58 Inépcia da petição inicial (art. 337, IV, do Novo CPC) A primeira espécie de defesa processual peremptória (art. 337, IV, do Novo CPC) é a inépcia da petição inicial, prevista no art. 330, 1º, do Novo CPC: falta de pedido ou causa de pedir; pedido for indeterminado, ressalvadas as hipóteses legais em que se permite o pedido genérico; da narração dos fatos não decorrer logicamente a conclusão; pedidos incompatíveis entre si. A inépcia da petição inicial é tratada no Capítulo 16, item Registre-se que essa matéria somente será alegável se o juiz não perceber estar no caso concreto diante de petição inicial inepta e indeferir a petição inicial, o que evidentemente eliminaria a fase de resposta do réu Perempção (art. 337, V, do Novo CPC) Como segunda espécie de defesa processual peremptória o art. 337, V, do Novo CPC indica o fenômeno da perempção, algo bastante raro na praxe forense. Segundo o art. 486, 3º, do Novo CPC, se o autor der causa, por três vezes, à extinção do processo pelo fundamento previsto no inciso III do artigo anterior, não poderá intentar nova ação contra o réu com o mesmo objeto, ficando-lhe ressalvada, entretanto, a possibilidade de alegar em defesa o seu direito. Para uma melhor compreensão do texto legal, o fundamento previsto no inciso III do artigo anterior, que trata da extinção do processo sem a resolução do mérito, é o abandono do processo. A única exigência para que se verifique a perempção é o abandono do processo por três vezes, não importando o motivo de tal abandono no caso concreto. Assim, a identidade exigida diz respeito apenas ao fundamento da extinção, mas não leva em conta as peculiaridades do caso concreto. Motivos diferentes levam à extinção pelo mesmo fundamento, gerando o fenômeno da perempção 513. Registre-se que a perempção não extingue o direito material da parte, nisso distinguindo-se da decadência, nem a pretensão de direito material, nisso distinguindo-se da prescrição. O ponto essencial dessas distinções é a possibilidade de a parte alegar o direito material objeto das três ações extintas por abandono em sua defesa 514. Fernanda ingressou por três vezes com ação indenizatória pedindo a condenação de Aline ao pagamento de R$ ,00 em razão de empréstimo inadimplido, sendo que nas três oportunidades o processo foi extinto sem a 58

59 resolução do mérito por abandono de Fernanda (art. 485, III, do Novo CPC). Em razão do fenômeno da perempção Fernanda não poderá mais ingressar com ação de cobrança contra Aline, mas, se porventura Aline a demandar por outra obrigação inadimplida, poderá alegar seu direito de crédito de R$ ,00 em sua contestação (compensação). Conforme visto, o direito material objeto das três demandas extintas por abandono do autor não é afetado pelo fenômeno da perempção, podendo, inclusive, ser utilizado em sede defensiva. Não será possível ao réu, entretanto, utilizar tal matéria em qualquer das respostas que o ordenamento lhe concede, mas tão somente na contestação, resposta defensiva por natureza contra a pretensão do autor. Inconcebível, portanto, que o réu, aproveitando-se de sua posição passiva no processo, ingresse com reconvenção alegando justamente o direito material objeto das três demandas extintas por abandono da causa. Tendo a reconvenção natureza jurídica de verdadeira ação do réu contra o autor, havendo a perempção, não se admitirá a propositura de tal espécie de resposta Litispendência (art. 337, VI, do Novo CPC) A litispendência é fenômeno conceituado pelo art. 337, 1.º, 2.º e 3.º, do Novo CPC. Haverá litispendência quando dois ou mais processos idênticos existirem concomitantemente, caracterizando-se a identidade pela verificação no caso concreto da tríplice identidade mesmas partes, mesma causa de pedir e mesmo pedido. É bastante claro ser a litispendência uma defesa processual peremptória, considerandose que a necessidade de manutenção de apenas um processo está baseada em dois importantes fatores: economia processual e harmonização de julgados. Não há qualquer sentido na manutenção de dois processos idênticos, com realização duplicada de atos e gasto desnecessário de energia. Além disso, a manutenção de processos idênticos poderia levar a decisões contraditórias, o que, além de desprestígio ao Poder Judiciário, poderá gerar no caso concreto problemas sérios de incompatibilidade lógica ou prática dos julgados contrários Coisa julgada (art. 337, VII, do Novo CPC) Há uma inegável semelhança entre a coisa julgada material e a litispendência no tocante às matérias defensivas. Ambas tratam de identidade plena entre processos, sendo que na litispendência esses processos se encontram em trâmite, o que não ocorre na coisa julgada material, em que um desses processos já chegou ao seu final, 59

60 com trânsito em julgado da decisão. Os motivos do fenômeno de a coisa julgada ser considerada matéria de defesa processual peremptória, além da harmonização de julgados, concernem ao respeito essencial à imutabilidade e indiscutibilidade da decisão de mérito transitada em julgado, essencial à segurança jurídica do sistema. O tema é tratado no Capítulo Convenção de arbitragem (art. 337, X, do Novo CPC) O instituto da arbitragem é tratado pela Lei 9.307/1996, que considera a convenção de arbitragem como um gênero do qual a cláusula compromissória e o compromisso arbitral são as duas espécies. Em ambos os casos, as partes terão preferido uma solução arbitral à intervenção do Poder Judiciário, podendo qualquer uma delas arguir em sua defesa tal convenção, de forma a impedir a continuação do processo, forçando a parte que buscou a proteção jurisdicional à solução arbitral. A cláusula compromissória é anterior ao conflito de interesses, fazendo parte de contrato quando ainda não existe qualquer litígio entre as partes contratantes (art. 4.º da Lei 9.307/1996). O compromisso arbitral é posterior ao surgimento do conflito, quando as partes entendem mais adequado solucionar o conflito pela via arbitral (art. 9.º da Lei 9.307/1996). Ressalte-se que a elaboração de cláusula compromissória aberta, sem qualquer especificação, poderá forçar as partes após o surgimento do conflito a reafirmarem sua vontade pela solução arbitral por meio da elaboração de um compromisso arbitral 515. O art. 337 do Novo CPC prevê as chamadas defesas preliminares, sendo que todas elas são objeções, ou seja, são defesas que podem ser conhecidas de ofício pelo juiz. As exceções ficam por conta da previsão contida no 5.º do dispositivo legal ora comentado, que apontam a incompetência relativa e a convenção de arbitragem como matérias que só podem ser conhecidas pelo juiz quando alegadas pelo réu. Segundo o 6º do artigo ora comentado, a ausência de alegação da existência de convenção de arbitragem, na forma prevista neste Capítulo, implica aceitação da jurisdição estatal e renúncia ao juízo arbitral Carência da ação por falta de interesse de agir e ilegitimidade (art. 337, XI, do Novo CPC) 60

61 Como devidamente exposto no Capítulo 2, item , entendo que as condições da ação continuam presentes em nosso sistema, tendo sido apenas excluída do sistema a possibilidade jurídica do pedido. Restam, portanto, a legitimidade de parte e o interesse de agir. A ausência de interesse de agir gera a extinção do processo sem a resolução do mérito, tratando-se sua alegação de defesa de mérito peremptória. A ilegitimidade de parte é defesa processual dilatória potencialmente peremptória, conforme analisado no item As condições da ação são tratadas no Capítulo 2, item Defesas dilatórias potencialmente peremptórias Incapacidade de parte, defeito de representação ou falta de autorização (art. 337, IX, do Novo CPC) O dispositivo legal ora comentado prevê três hipóteses bastante distintas entre elas. A identidade que justifica o seu tratamento no mesmo dispositivo se dá justamente em virtude da sua natureza de defesa que não põe fim ao processo, dando uma oportunidade ao autor para sanar a irregularidade ou o vício antes que isso ocorra. São vícios sanáveis, e bem por isso a extinção imediata da demanda seria um verdadeiro atentado ao princípio da economia processual, não se justificando à luz das conquistas mais recentes do direito processual. O vício da incapacidade de parte liga-se à capacidade de estar em juízo, assunto intimamente relacionado à capacidade para prática de atos jurídicos válidos, ou seja, trata-se de capacidade de exercício ou de fato, tema tratado no Capítulo 3, item O defeito de representação diz respeito ao vício na capacidade postulatória, consistente na exigência de que as partes estejam devidamente representadas por advogado regularmente inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil. Por fim, a falta de autorização ocorre em situações excepcionais em que a norma legal exige de algum sujeito a autorização de outro para que possa litigar. O caso clássico de tal autorização encontra-se no art. 73 do Novo CPC, que se refere às ações reais imobiliárias envolvendo cônjuges, nas quais se exige, para que um deles litigue sozinho no polo ativo, a autorização do outro. O dispositivo processual deve ser aplicado à luz do art , I e II, do CC, que determina a dispensa de tal autorização na hipótese de regime da separação absoluta de bens 516. Na hipótese de serem os cônjuges demandados, será hipótese de litisconsórcio passivo necessário. 61

62 Nas três situações descritas pelo art. 337, IX, do Novo CPC, o vício ou irregularidade poderá ser sanado pelo autor, sendo o caso de o juiz conceder prazo àquele para que assim o faça. Omisso nesse sentido, não haverá outra saída ao juiz que não a extinção do processo sem resolução de mérito. Não poderá nem mesmo voltar atrás em seu entendimento e, mesmo diante da omissão do autor, afirmar que o vício que entendia existir na verdade não se verificou no caso concreto. Nesse caso, há preclusão judicial, indevidamente chamada pela doutrina de preclusão pro iudicato Falta de caução ou de outra prestação que a lei exige como preliminar (art. 337, XII, do Novo CPC) O ordenamento processual excepcionalmente e em determinadas situações condiciona o exercício legítimo da demanda à prestação de uma caução ou outra prestação. Nesses casos, cabe ao autor comprovar que caucionou o juízo no momento de propositura da ação, instruindo a petição inicial com os documentos comprobatórios adequados. Na ausência de tal comprovação deverá o juiz de ofício determinar que o autor emende a petição inicial no prazo de quinze dias, sob pena de indeferimento da petição inicial. Caso haja omissão do juiz, alegada tal matéria em defesa, não será o caso de extinção imediata do processo, devendo ser concedido ao autor prazo para sanar a irregularidade. Como já afirmado, a exigência legal de caução prévia é excepcional em nosso sistema processual. Entre os raros casos destacam-se três: (a) art. 83 do Novo CPC, que exige do autor, nacional ou estrangeiro, que residir fora do Brasil ou dele se ausentar na pendência da demanda, que preste, nas ações que intentar, caução suficiente às custas e aos honorários de advogado da parte contrária, se não tiver no Brasil bens imóveis que lhes assegurem o pagamento; (b) art. 486, 2º, do Novo CPC, que exige do autor o pagamento das custas de processo idêntico extinto anteriormente sem a resolução do mérito; (c) art. 968, II, do Novo CPC, que exige do autor da ação rescisória a prestação de uma caução prévia de 5% do valor da causa, para ser revertido tal valor ao réu no caso de julgamento negativo (extinção sem a resolução do mérito e improcedência) unânime Incorreção do valor da causa (art. 337, III, do Novo CPC) Cumprindo a tendência já mencionada do Novo Código de Processo Civil de extinguir ao máximo as petições autônomas, o art. 293 prevê que a impugnação ao 62

63 valor da causa será elaborada em preliminar de contestação, sob pena de preclusão. Ainda segundo o dispositivo, caberá ao juiz decidir a respeito do valor da causa com a imposição, se for o caso, da complementação das custas judiciais. Trata-se indubitavelmente de defesa processual dilatória potencialmente peremptória, já que o art. 293 do Novo CPC é claro ao prever que sendo acolhida a alegação do réu o juiz dará prazo para o autor complementar as custas, sempre que necessário. Dessa forma, se o juiz intimar o autor para a correção do valor da causa e complementação das custas e ele se omitir, será caso de extinção do processo sem resolução do mérito. Registre-se que foi suprimido do dispositivo legal o termo na sentença constante do art. 256 do projeto originário do Novo CPC, que modificava substancialmente o momento de julgamento da impugnação ao valor da causa. Entendo correta a modificação porque postergar a decisão para o momento de prolação da sentença, embora resolva a questão recursal, evitando-se uma decisão interlocutória impugnável por agravo de instrumento, remete ao final do procedimento uma matéria que seria mais adequadamente decidida em seu começo. A alteração, entretanto, restou em meu entender incompleta. Mantido o texto originário, o recurso cabível seria a apelação, já que a decisão da impugnação ao valor da causa seria sempre um capítulo da sentença, mas, se o seu julgamento ocorrer imediatamente após o ingresso da impugnação, a decisão será interlocutória, e como o cabimento de agravo de instrumento passará a ser restritivo, seria adequada a expressa previsão de seu cabimento nesse caso. No projeto de lei do Novo CPC aprovado na Câmara havia previsão expressa de cabimento de agravo de instrumento contra a decisão do juiz que acolhesse a impugnação ao valor da causa, salvo se fosse um capítulo da sentença, quando então seria cabível a apelação. O dispositivo corroborava a previsão do art , XV, do projeto, no sentido de que seria cabível agravo de instrumento contra decisão que alterasse o valor da causa antes da sentença. Critiquei o texto legal porque me parecia inconstitucional, por ofensa ao princípio da isonomia, a previsão de cabimento recursal a depender do conteúdo da decisão. E da forma como estava previsto no texto não seria cabível o recurso de agravo de instrumento contra a decisão que rejeitasse a impugnação ao valor da causa. 63

64 No texto final do Novo Código de Processo Civil foi afastada a ofensa ao princípio da isonomia, mas da forma mais negativa possível. O Senado simplesmente revogou as regras legais que previam o cabimento de agravo de instrumento contra a decisão interlocutória da impugnação ao valor da causa, ainda que dependente do conteúdo. Significa dizer que independentemente do conteúdo da decisão, acolhendo ou rejeitando a alegação do réu, a decisão interlocutória não será recorrível imediatamente por agravo de instrumento, cabendo à parte sucumbente a alegação da matéria em sede de apelação ou contrarrazões. E nesse caso poderemos ter uma situação no mínimo peculiar, bastando para tanto imaginar a parte sucumbente, quanto à questão incidental do valor da causa, mas vitoriosa ao final da demanda. Terá interesse recursal na apelação somente para impugnar a decisão interlocutória que julgou o valor da causa? Penso que sim, mas não deixa de ser curioso esse recurso evitar o trânsito em julgado da sentença, ainda mais se a parte contrária deixar de recorrer contra a sentença. Afastando a dúvida a respeito da correção de ofício do valor da causa pelo juiz, o art. 292, 3.º, do Novo CPC prevê expressamente tal possibilidade sempre que verificar que não corresponde ao conteúdo patrimonial em discussão ou ao proveito econômico perseguido pelo autor, caso em que se procederá ao recolhimento das custas correspondentes. Apesar de o dispositivo ter previsto expressamente a correção do valor da causa de ofício, nenhuma menção fez ao prazo que o juiz teria para tal providência. A questão não é de fácil solução, considerando-se que, se a matéria for tratada como de ordem pública, não teria sentido o prazo imposto à alegação do réu no art. 293 do Novo CPC, levando em conta que matérias dessa natureza não precluem. Parece ser melhor entender que o valor da causa não é matéria de ordem pública, afinal, interessa apenas às partes e à Fazenda Pública quanto ao recebimento das custas processuais, e por essa razão preclui tanto para o réu quanto para o juiz, cabendo a alegação pelo primeiro e o reconhecimento pelo segundo até o vencimento do prazo de resposta do réu. Seria mais um exemplo da rara preclusão pro iudicato temporal. Reconheço, entretanto, que a redação do art. 293 do Novo CPC, ao associar a preclusão à ausência de alegação pelo réu em preliminar de contestação da 64

65 impugnação do valor da causa, permite a legítima conclusão de que tal preclusão atingirá somente o réu Carência de ação por ilegitimidade de parte (art. 337, XI do Novo CPC) Havia no CPC/1973 uma estranha espécie de intervenção de terceiro chamada de nomeação à autoria. Era estranha em tudo: natureza jurídica, cabimento e procedimento. Tradicionalmente, era considerada como forma excepcional de evitar a extinção do processo por ilegitimidade passiva, por meio da alteração do sujeito que compõe o polo passivo tido por sujeito ilegítimo para figurar no processo por um terceiro sujeito legitimado 518. Ocorria, na realidade, uma espécie de sucessão processual em razão da alteração subjetiva verificada no polo passivo, em fenômeno chamado pela doutrina de extromissão de parte. Note-se que a extromissão de parte não se confunde com a sucessão processual tradicional, porque na primeira o sujeito que participava do processo antes da alteração nunca deveria ter figurado na relação jurídica processual em razão da sua ilegitimidade, enquanto na segunda ocorre um fato superveniente que cria a legitimidade do terceiro que assumirá o lugar do sujeito que, antes desse fato, era o sujeito legitimado a participar do processo. Sempre houve fundada dúvida a respeito da natureza jurídica da nomeação à autoria porque por meio dela a relação jurídica processual não se tornava mais complexa do que já era antes da intervenção do terceiro. A demanda antes da nomeação à autoria é formada por um demandante e um demandado e assim continuará após a extromissão da parte, modificando-se somente o sujeito que compõe o polo passivo. Essa peculiar característica da nomeação à autoria levava, inclusive, parcela da doutrina à conclusão de que a nomeação à autoria é uma mera forma de correção do polo passivo, não tendo natureza jurídica de intervenção de terceiros 519. Não consta do rol de intervenção de terceiros do Novo Código de Processo Civil a nomeação à autoria, mas não seria correto afirmar que seu propósito tenha desaparecido em razão da previsão contida no art. 338 do novo diploma processual. Segundo o dispositivo legal, alegada pelo réu em preliminar a ilegitimidade passiva ou não tendo sido o responsável pelo prejuízo invocado, o autor poderá modificar, no prazo de 15 dias, o sujeito que compõe o polo passivo, por meio de emenda da 65

66 petição inicial. O que justificava a alteração subjetiva, com a consequente adequação do polo passivo, era a constatação do legislador de que em algumas situações poderia ser extremamente difícil ao autor identificar o sujeito que teria legitimidade para compor o polo passivo da demanda 520. Daí porque sua limitação a apenas duas hipóteses, previstas nos arts. 62 e 63 do CPC/1973, nas quais o legislador imaginava justificável o erro do autor. O Novo Código de Processo Civil não faz mais tal distinção, não se importando com a razão do erro do autor em colocar na demanda um réu que nunca deveria ter composto o polo passivo em razão de sua ilegitimidade de parte. Dessa forma, qualquer alegação de ilegitimidade passiva feita pelo réu será suficiente para uma possível correção do polo passivo. Se o autor errou porque realmente a situação lhe levou a equivocadas conclusões ou se errou bisonhamente, não importa. O vício de ilegitimidade passiva passa a ser sempre sanável, mas para isso dependerá da aceitação do autor da alegação do réu, até porque quem diz a última palavra sobre quem deva ser o réu é sempre o autor. Caso o autor não concorde com a alegação do réu e realmente haja ilegitimidade passiva, esse vício será o suficiente para a extinção do processo sem resolução do mérito por carência de ação. O vício é sanável, mas depende de postura a ser adotada pelo autor, de forma a ter o Novo Código de Processo Civil tornado a alegação de ilegitimidade passiva em defesa processual dilatória potencialmente peremptória. A característica mais peculiar da nomeação à autoria referia-se às possibilidades de conduta do nomeado à autoria diante de sua citação. Aceitando expressamente a nomeação, ocorria a extromissão de parte, devendo o terceiro que nesse momento já seria o réu ser intimado para a apresentação de sua resposta, o mesmo ocorrendo na hipótese de não se manifestar no prazo legal, quando haveria sua concordância tácita em participar do processo como réu. A postura mais criticável, e bem por isso consideravelmente polêmica, dizia respeito à possibilidade da sua recusa em participar como réu no processo, o que frustra a extromissão de parte, em nítida ofensa ao princípio da inevitabilidade da jurisdição. O incômodo era tamanho que parcela minoritária da doutrina entendia que, 66

67 mesmo se negando a participar como réu, o nomeado à autoria sofreria os efeitos da coisa julgada, como ocorre em ordenamentos alienígenas 521, entendendo-se que a recusa em participar seria considerada como revelia do nomeado à autoria 522. Era compreensível a indignação com o teor do art. 67 do CPC/1973, ao permitir a recusa do nomeado, único sujeito sob a égide do diploma processual revogado que podia se negar a participar de um processo mesmo tendo sido citado. Acontece, porém, que tal indignação não era suficiente para alterar os limites subjetivos da coisa julgada, de forma que o terceiro no caso, o nomeado que se recusou a participar não podia ser afetado pelo processo do qual não participou. Daí a afirmação corrente na doutrina de que o sucesso da nomeação à autoria dependia de uma dupla concordância/aceitação 523 : autor e nomeado deveriam em momentos sucessivos concordar com a nomeação à autoria feita pelo réu para que ocorresse no caso concreto a extromissão de parte. Sempre me pareceu curiosa a opção de alguém em concordar em se tornar réu num processo. Um convite desse certamente não é atrativo para uma pessoa normal. E nisso residia a raridade da extromissão de parte na praxe forense.nesse aspecto, o Novo Código de Processo Civil deve ser efusivamente elogiado, pois desaparece a exigência de dupla concordância, sendo a vontade do autor de mudar o réu o suficiente para a ação ser redirecionada a um novo sujeito. Segundo o parágrafo único do art. 338 do Novo CPC, concordando o autor com a sucessão processual (e não a substituição conforme consta do artigo de lei), deve reembolsar as despesas e pagar honorários ao procurador do réu excluído, que serão fixados entre três e cinco por cento do valor da causa ou, sendo este irrisório, nos termos do art. 85, 8º, do Novo CPC. O art. 339, caput, do Novo CPC mantém como dever do réu a indicação da parte legítima, exatamente como fazia o art. 62 do CPC/1973. Nesse sentido, prevê que incumbe ao réu indicar o sujeito passivo da relação jurídica discutida sempre que tiver conhecimento, sob pena de arcar com as despesas processuais e de indenizar o autor pelos prejuízos decorrentes da falta da indicação. O 1.º do dispositivo parece inútil, sendo mera repetição do artigo anterior. No 2º do mesmo dispositivo, a admissão de formação de litisconsórcio ulterior entre o réu e o sujeito por ele indicado se presta a albergar a indicação de terceiro quando existe responsabilidade solidária entre ele e o réu, sendo ambos legitimados passivos. 67

68 Há dois enunciados do II Fórum Permanente de Processualistas Civis (FPPC) a respeito do art. 339 do Novo CPC: Enunciado 42: O dispositivo aplica-se mesmo a procedimentos especiais que não admitem intervenção de terceiros, bem como aos juizados especiais cíveis, pois se trata de mecanismo saneador, que excepciona a estabilização do processo e Enunciado 44: A responsabilidade a que se refere o art. 339 é subjetiva. O prazo para que o autor concorde com a alegação de ilegitimidade passiva feita pelo réu não consta do dispositivo legal, sendo razoável a conclusão do Enunciado 152 do Fórum Permanente de Processualistas Civis (FPPC): Nas hipóteses dos 1.º e 2.º do art. 339, a aceitação do autor deve ser feita no prazo de quinze dias destinado à sua manifestação sobre a contestação ou sobre essa alegação de ilegitimidade do réu. Apesar de os dispositivos legais ora analisados indicarem a necessidade de o réu alegar em contestação sua ilegitimidade passiva, é correta a interpretação de que a matéria possa ser reconhecida de ofício pelo juiz, antes da citação do réu. Nesse caso, o autor será intimado para, querendo, alterar a sua petição inicial no tocante à formação do polo passivo, hipótese em que não haverá ônus sucumbenciais (Enunciado 296 do Fórum Permanente de Processualistas Civis FPPC) Indevida concessão do benefício da gratuidade de justiça (art. 337, XIII, do Novo CPC) O inciso XIII do art. 337 do Novo CPC prevê como defesa processual a indevida concessão do benefício da gratuidade da justiça. Nesse caso, sendo acolhida a defesa processual do réu, o autor será intimado para recolher as custas processuais em aberto. Caso o faça, o processo seguirá normalmente, e caso deixe de recolher as custas será caso de extinção terminativa do processo. Por essa razão, entendo tratarse de defesa processual dilatória potencialmente peremptória Defesas de mérito As defesas de mérito distinguem-se substancialmente das defesas processuais, sendo absolutamente inconfundíveis entre si. Enquanto estas têm como objeto a regularidade do processo, instrumento utilizado pelo autor para a obtenção de seu direito material, aquelas dizem respeito justamente ao direito material alegado pelo autor. Na defesa de mérito o objetivo do réu é convencer o juiz de que o direito 68

69 material que o autor alega possuir em sua petição inicial não existe. É, portanto, o conteúdo da pretensão do autor o objeto de impugnação por meio da defesa de mérito Defesa de mérito direta Na defesa de mérito direta o réu enfrenta frontalmente os fatos e os fundamentos jurídicos narrados pelo autor na petição inicial, buscando demonstrar que os fatos não ocorreram conforme narrado ou ainda que as consequências jurídicas pretendidas pelo autor não são as mais adequadas ao caso concreto. Sabendo o réu que sem fatos não há direito, caso demonstre a inveracidade das alegações de fato, o direito material alegado pelo autor ficará sem o seu essencial substrato fático, devendo o pedido ser rejeitado. Da mesma forma ocorrerá se, mantida a narração fática do autor, o réu demonstrar que não decorre dela o direito material alegado pelo autor 524. A defesa de mérito direta desenvolve-se dentro dos fatos e da fundamentação jurídica que compõe a causa de pedir exposta pelo autor em sua petição inicial, podendo, entretanto, trazer ao processo novos fatos e outras fundamentações jurídicas com o propósito exclusivo de demonstrar a inveracidade das alegações de fato e/ou a impropriedade das consequências jurídicas pretendidas pelo autor Defesa de mérito indireta Nessa espécie de defesa o réu, sem negar as afirmações lançadas pelo autor na petição inicial, alega um fato novo, que tenha natureza impeditiva, modificativa ou extintiva do direito do autor. Essa defesa amplia o objeto de cognição do juiz, que passará a analisar fatos que não compõem originariamente a causa de pedir narrada pelo autor, não sendo incorreto afirmar que, a partir do momento de arguição desta espécie de defesa, o juiz passará a uma análise fática mais ampla daquela que originariamente estaria obrigado em razão da pretensão do autor. Não ocorre, entretanto, uma ampliação do objeto do processo, pois o juiz sempre estará adstrito a conceder ou negar aquilo que o autor pediu 525. São considerados fatos impeditivos aqueles que, anteriores ou simultâneos ao fato constitutivo do direito, impedem que esse gere seus regulares efeitos. A característica principal dessa espécie de fato é gerar um efeito negativo sobre o fato constitutivo, que é justamente a impossibilidade de este gerar seus regulares efeitos. 69

70 O contrato vincula os contratantes, exigindo de ambos ou ao menos de um deles o cumprimento de certas obrigações (fato constitutivo). Tal efeito vinculativo, entretanto, não será gerado se o contrato foi celebrado por incapaz ou ainda quando tenha sido celebrado com vício do consentimento (fatos impeditivos). O fato de o contratante ser incapaz ou de ter celebrado o contrato em erro, dolo, coação etc., impede que o mesmo seja obrigado a cumprir qualquer estipulação contratual. Os fatos extintivos são aqueles que colocam fim a um direito, conforme o próprio nome sugere, sendo necessariamente posteriores ao surgimento da relação jurídica de direito material. Basta imaginar todas as formas de satisfação da obrigação previstas pela legislação material, tal como a prescrição, pagamento, remissão da dívida, confusão etc. Os fatos modificativos, necessariamente posteriores ao surgimento da relação de direito material, são aqueles que atuam sobre a relação jurídica de direito material, gerando sobre ela uma modificação subjetiva ou objetiva. No primeiro caso pode-se citar como exemplo a cessão de crédito sem ressalva, com a modificação do credor, e no segundo caso a novação objetiva é um exemplo perfeito, como também o parcelamento da dívida, alegação que levará à inexigibilidade do crédito in totum PRINCÍPIO DA IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA DOS FATOS Segundo o art. 341 do Novo CPC, serão presumidos verdadeiros os fatos que não sejam impugnados especificamente pelo réu em sua contestação. A impugnação específica é um ônus do réu de rebater pontualmente todos os fatos narrados pelo autor com os quais não concorda, tornando-os controvertidos e em consequência fazendo com que componham o objeto da prova. O momento de tal impugnação, ao menos em regra, é a contestação, operando-se preclusão consumativa se apresentada essa espécie de defesa o réu deixar de impugnar algum(s) do(s) fato(s) alegado(s) pelo autor. O ônus da impugnação específica não se aplica ao advogado dativo, curador especial e ao defensor público, que podem elaborar a contestação com fundamento em negativa geral, instituto que permite ao réu uma impugnação genérica de todos os fatos narrados pelo autor, sendo tal forma de reação o suficiente para tornar todos esses fatos controvertidos (art. 341, parágrafo único, do Novo CPC). Na realidade, 70

71 mesmo que não haja a expressa indicação de que o réu está se valendo da negativa geral, uma interpretação lógica desse benefício impede que o juiz presuma verdadeiros os fatos alegados pelo autor. Basta, portanto, a apresentação da contestação para que os fatos se considerem controvertidos, cabendo ao autor, ao menos em regra, o ônus da prova. O art. 341, parágrafo único, do Novo CPC tem duas diferenças quando comparado com o parágrafo único do art. 302 do CPC/1973. Exclui o Ministério Público e inclui o defensor público no rol dos sujeitos que têm a prerrogativa da negativa geral. A ausência de previsão expressa do Ministério Público não deve gerar consequências práticas porque sua presença como parte no polo passivo é excepcionalíssima e porque quando atuar, também excepcionalmente, como curador especial, continua a ter a prerrogativa. Mesmo que o réu não possa se valer da negativa geral, o art. 341 do Novo CPC, em seus três incisos, prevê exceções ao princípio da impugnação específica dos fatos, impedindo que um fato alegado pelo autor que não tenha sido impugnado especificamente seja presumido verdadeiro: (a) fatos a cujo respeito não se admite a confissão (direitos indisponíveis); (b) petição inicial desacompanhada de instrumento público que a lei considere da substância do ato (por exemplo, certidão de casamento, certidão de óbito); (c) fatos que estejam em contradição com a defesa, considerada em seu conjunto. Essa última exceção exige do juiz uma análise da defesa como um todo, reconhecendo-se que em algumas situações a impugnação de determinados fatos, por uma questão lógica, impede que os demais, ainda que não impugnados especificamente, sejam presumidos verdadeiros. João ingressa com ação reparatória contra Felipe alegando que num determinado pub londrino foi agredido por este com uma garrafada na cabeça. São dois fatos alegados por João: (a) Felipe estava no bar no momento da agressão; (b) Felipe foi o responsável pela garrafada que o vitimou. Em sua contestação Felipe alega tão somente que não estava no bar no momento da agressão, deixando de impugnar o fato de ser o responsável pela garrafada. Nesse caso, não poderá o juiz presumir que Felipe deu a garrafada, porque provado que ele não estava no bar, concluir-se por sua responsabilidade pela garrafada criaria incompatibilidade lógica insuperável. 71

72 PRINCÍPIO DA EVENTUALIDADE Os arts. 336 e 342 do Novo CPC consagram o princípio da eventualidade para o réu, ao exigir a exposição de todas as matérias de defesa de forma cumulada e alternativa na contestação. Também conhecido como princípio da concentração de defesa, a regra ora analisada fundamenta-se na preclusão consumativa, exigindo-se que de uma vez só, na contestação, o réu apresente todas as matérias que tem em sua defesa, sob pena de não poder alegá-las posteriormente. A cumulação é eventual porque o réu alegará as matérias de defesa indicando que a posterior seja enfrentada na eventualidade de a matéria defensiva anterior ser rejeitada pelo juiz. A exigência de cumulação de todas as matérias de defesa na contestação faz com que o réu se veja obrigado a cumular defesas logicamente incompatíveis, por exemplo, no caso de alegar que não houve o dano alegado pelo autor, mas que, na eventualidade de o juiz entender que houve o dano, não foi no valor apontado pelo autor, circunstância verificada com regularidade nos pedidos de condenação em dano moral. Certa incompatibilidade lógica é natural e admissível, mas o réu jamais poderá cumular matérias defensivas criando para cada uma delas diferentes situações fáticas, porque com isso em alguma das teses defensivas estará alterando a verdade dos fatos. Pode-se afirmar que o limite do princípio da concentração da defesa é o respeito ao princípio da boa-fé e lealdade processual 527. Marina ingressa com demanda de cobrança contra Aline, que em sua defesa alega que nunca celebrou contrato de empréstimo com a autora, mas na eventualidade do juiz entender diferente que já pagou a dívida, e ainda na eventualidade de nenhuma dessas defesas ser acolhida, que não pagou e nem deve pagar porque a dívida está prescrita. Note-se que, mesmo sem saber quando, é óbvio que Aline em algum momento de sua defesa mentiu, porque não é possível alegar que não há dívida, mas que já a pagou, ou ainda que já a pagou e que não pagou porque não deveria ter pago em razão da prescrição. Num caso como esse o princípio da eventualidade não pode acobertar a nítida litigância de má-fé do réu. O princípio da concentração das defesas na contestação é excepcionado em três hipóteses, previstas pelos incisos do art. 342 do Novo CPC, sendo que nesses casos o réu poderá alegar a matéria defensiva após a apresentação da contestação: (a) matérias defensivas relativas a direito ou a fato superveniente; (b) matérias que o juiz pode conhecer de ofício (por exemplo, matérias de ordem pública, prescrição, 72

73 decadência legal); (c) matérias que por expressa previsão legal podem ser alegadas a qualquer momento e grau de jurisdição (por exemplo, decadência convencional) RECONVENÇÃO CONCEITO A reconvenção não se confunde com nenhuma das outras espécies de resposta do réu, sendo compreendida como o exercício do direito de ação do réu dentro do processo em que primitivamente o autor originário tenha exercido o seu direito de ação. Afirma-se em doutrina que na reconvenção o réu se afasta da posição passiva, própria da contestação, para assumir uma posição ativa, pleiteando um bem da vida em pedido dirigido contra o autor da ação originária. Em razão dessa natureza de ação, é comum afirmar que a reconvenção é um contra-ataque do réu, pelo qual haverá uma inversão dos polos da demanda: o réu se tornará autor (autor-reconvinte) e o autor se tornará réu (réu-reconvindo). Com a reconvenção haverá uma ampliação objetiva ulterior do processo, que passará a contar com duas ações: a originária (indevidamente tratada pelo art. 343, caput, do Novo CPC como ação principal) e a reconvencional. Não se trata de pluralidade de processos, considerando-se que o processo continua sendo um só, mas, com o pedido feito pelo réu, passa o processo a contar com mais uma ação, de natureza reconvencional, o que leva à sua ampliação objetiva 528. A reconvenção é uma mera faculdade processual, podendo o réu que deixar de reconvir ingressar de forma autônoma com a mesma ação que teria ingressado sob a forma de reconvenção 529. Não é possível vislumbrar qualquer situação de desvantagem processual ao réu que deixa de reconvir, situação diametralmente oposta àquele que deixa de contestar, que será considerado revel. Nesse sentido, afirma-se corretamente que a contestação constitui um ônus do réu, enquanto a reconvenção constitui tão somente uma faculdade. A própria natureza de ação dessa espécie de resposta fundamenta sua natureza de mera faculdade processual, não se podendo admitir que o réu perca o seu direito de ação por uma simples omissão processual. O prazo para a reconvenção, portanto, é meramente preclusivo, significando que o réu não mais poderá reconvir após o seu transcurso, mas a via 73

74 autônoma continuará a existir para o exercício de seu direito de ação. O ingresso de ação autônoma que poderia ter sido manejada sob a forma de reconvenção, inclusive, pode gerar resultado prático similar ao da propositura dessa espécie de resposta. Havendo entre essas duas ações autônomas conexão, conforme previsão do art. 55 do Novo CPC, as mesmas serão reunidas perante o juízo prevento que ficará responsável pelo julgamento conjunto de ambos os processos (art. 58 do Novo CPC) 530. A única diferença é que com a reconvenção haverá somente um processo, objetivamente complexo (duas ações), enquanto na reunião de processos conexos, haverá dois processos, cada qual com uma ação, ainda que tenham um procedimento conjunto, sendo inclusive decididos por uma mesma sentença CONDIÇÕES DA AÇÃO Sendo indiscutível a natureza de ação da reconvenção, é preciso registrar que, como em qualquer outra ação, deverão estar presentes as condições da ação: legitimidade de parte, interesse de agir e possibilidade jurídica do pedido. A própria natureza da reconvenção traz consigo a exigência das três tradicionais condições da ação, mas, em razão de sua situação específica consistente em ser também uma resposta do réu, essas condições da ação têm interessantes peculiaridades que merecem uma análise particularizada Legitimidade de parte No tocante à legitimidade de parte entendida como a relação de pertinência entre o conflito levado a juízo e os sujeitos que demandarão, há interessantes questões a serem resolvidas. Diferente do art. 315 do CPC/1973, o art. 343 do Novo CPC não traz expressamente a previsão de que a legitimidade ativa da reconvenção é do réu e que a passiva é do autor da ação originária. De qualquer forma, essa continua a ser a realidade, havendo uma inversão dos polos entre autor e réu. A doutrina de forma uníssona admite a diminuição subjetiva na reconvenção 532. Assim, existindo litisconsórcio na ação originária, o mesmo litisconsórcio não será necessariamente formado na reconvenção, admitindo-se que somente um dos autores da ação originária figure como réu na reconvenção ou ainda que apenas um dos réus reconvenha, solitariamente, contra o autor ou autores da ação originária. Vale a 74

75 lembrança de que tal liberdade está condicionada à espécie de litisconsórcio verificado na ação originária e de seus reflexos sobre a ação reconvencional; havendo um litisconsórcio necessário na ação originária que deva se repetir também na reconvenção, será impossível a reconvenção não envolver todos os litisconsortes 533. Essa circunstância, entretanto, não diz respeito à reconvenção, sendo decorrência natural da espécie de litisconsórcio a ser formado. Se a diminuição subjetiva na reconvenção parece não encontrar maiores obstáculos, o mesmo não ocorria com a ampliação, tema consideravelmente controvertido, sob a égide do CPC/1973. Havia muita controvérsia a respeito da admissibilidade da formação de um litisconsórcio na reconvenção ativo ou passivo com sujeito que não participava do processo até então, ou seja, sujeito que não figurava como parte na ação originária. É evidente que se manteria a estrutura básica mínima réu x autor, mas ao lado de um deles ou mesmo de ambos seria formado litisconsórcio com terceiro estranho à demanda até então 534. A polêmica é resolvida pelos 3º e 4º do art. 343 do Novo CPC, que passam a prever expressamente que a reconvenção pode ser proposta contra o autor e um terceiro, e que a reconvenção pode ser proposta pelo réu em litisconsórcio com terceiro. Admitida a formação do litisconsórcio na reconvenção, com o ingresso de terceiro na demanda, aplica-se a regra que permite a limitação do número de litisconsortes sempre que o número elevado de sujeitos puder comprometer a rápida solução do litígio ou dificultar a defesa. Trata-se do litisconsórcio multitudinário, previsto pelo art. 113, 1º e 2º, do Novo CPC, que fundamentará no caso concreto o indeferimento da formação do litisconsórcio desde que observados os requisitos legais tratados no Capítulo 7, item 7.4. Havia na vigência do CPC/1973 uma interessante questão referente à legitimidade de parte na reconvenção derivava da inadequada redação do art. 315, parágrafo único, do revogado diploma processual, pela qual não poderia o réu, em seu próprio nome, reconvir ao autor, quando este demandasse em nome de outrem. A leitura apressada do dispositivo legal poderia levar o leitor mais desavisado a concluir se tratar de norma referente à representação processual, pois quem atua em nome de outrem é representante processual. Essa interpretação, entretanto, tornaria o 75

76 dispositivo legal absolutamente inútil, considerando-se que o representante não é parte, o que significa dizer que já não tem legitimidade de agir para a reconvenção. A doutrina de forma uníssona emprestava utilidade ao artigo legal ao entender tratar-se de hipótese de substituição processual na ação originária, que deveria obrigatoriamente se repetir na ação reconvencional. A regra acabava tornando-se simples: exigia-se que os sujeitos tivessem na reconvenção a mesma qualidade jurídica com que figuravam na ação originária. Se naquela estavam como substitutos processuais (seja no polo ativo ou passivo), da mesma forma deveriam figurar na reconvenção. Nas palavras de autorizada doutrina, trata-se do princípio da identidade bilateral, que não é identidade da pessoa física, mas identidade subjetiva de direito 535. Esse entendimento restou consagrado no 5º do art. 343 do Novo CPC, que prevê que se o autor for substituto processual, o reconvinte deverá afirmar ser titular de direito em face do substituído e a reconvenção deverá ser proposta em face do autor, também na qualidade de substituto processual. Interessante questão é levantada a respeito da legitimidade do curador do réu para ingressar com reconvenção. Imprescindível para se concluir de forma positiva ou negativa a exata noção da qualidade jurídica do curador especial, previsto pelo art. 72 do Novo CPC. A doutrina parece uníssona no sentido de entender que o curador assume no processo uma posição de representante dos sujeitos descritos pelo artigo legal supramencionado 536. Essa simples constatação já demonstra de forma inequívoca a ilegitimidade do curador em ingressar com ação reconvencional, posto que não é considerado parte no processo e sua eventual legitimidade para reconvir conflitaria com a regra geral de legitimidade para essa espécie de resposta do réu 537. Sua tarefa será, portanto, tão somente reagir à pretensão do autor, jamais ingressar com ação contra ele Interesse de agir Costuma-se afirmar que o interesse de agir é o somatório de dois fatores: a necessidade e a adequação (ou utilidade). No tocante à reconvenção, os elementos são mantidos, mas aqui também existem interessantes particularidades a serem debatidas. A doutrina parece concordar que a reconvenção só terá alguma serventia prática 76

77 se o autor puder obter com ela tutela que não conseguiria com o simples acolhimento de suas alegações defensivas lançadas em contestação. Nesse sentido também é a jurisprudência a respeito do tema 538. A primeira e mais evidente inutilidade da reconvenção ocorre na hipótese em que ela é utilizada para a arguição de matérias que são na realidade defensivas, próprias da contestação (reação) e não da reconvenção (ação). Nessa hipótese, ao menos como regra, a reconvenção deve ser extinta prematuramente por carência de ação do réu-reconvinte. São exemplos a alegação do réu em reconvenção do pagamento da dívida cobrada ou, ainda, a alegação de contrato locativo para justificar sua posse do imóvel que lhe é reivindicado 539. Na excepcional hipótese de o réu não contestar, somente apresentando reconvenção, haverá interesse em seu julgamento, não sendo caso de extinção por carência de ação. Outra hipótese de manifesta inutilidade na utilização da reconvenção se verifica nos casos em que a própria improcedência já será apta a entregar ao réu o bem da vida em disputa, que seria exatamente aquilo que estaria perseguindo em sede reconvencional. Se já tem condições de obter o bem da vida pelo simples acolhimento de sua defesa, que serventia terá a reconvenção? Essa situação se verifica com clareza nas ações dúplices, nas quais a relação de direito material gera essa peculiar situação em que a contestação já basta para entregar ao réu o bem da vida debatido. Exemplo clássico é da ação meramente declaratória. Imagine-se um autor que pretenda em juízo obter a certeza jurídica a respeito da existência de uma relação jurídica de doação. Contestando o réu a demanda, alegará que nunca houve a doação alegada, e o acolhimento de tal defesa gerará a certeza jurídica de que nunca houve a relação de direito material alegada pelo autor, o que significa dizer que a certeza jurídica bem da vida em disputa nas ações meramente declaratórias será concedida favoravelmente ao réu. De fato, nenhuma utilidade tem a reconvenção pleiteando a declaração de que a relação jurídica de doação não existiu. A afirmação de inutilidade da reconvenção nas ações dúplices e de que as ações meramente declaratórias são dúplices não confronta com o entendimento jurisprudencial consolidado na Súmula 258 do Supremo Tribunal Federal de que é admissível reconvenção na ação declaratória. Numa ação meramente declaratória é admissível a reconvenção para que o réu faça outros pedidos, distintos do objeto original do processo, tal como a condenação do réu ao cumprimento de uma 77

78 determinada obrigação. Mariana ingressa com ação de investigação de paternidade contra Felipe, que em contestação alega não ser o pai da criança. Nesse caso não é cabível a reconvenção para a declaração negativa da paternidade, porque isso já será obtido por meio da improcedência do pedido de Mariana. Ocorre, entretanto, que Felipe pode entender que a alegação de paternidade realizada por Mariana em público, diante de seus empregadores, lhe causou um abalo moral, podendo nesse caso pleitear em sede de reconvenção a condenação de Mariana ao pagamento de indenização pelos danos morais suportados PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS Tendo a reconvenção natureza jurídica de ação, além do preenchimento das condições da ação, também pressupostos processuais específicos devem ser preenchidos: (a) litispendência: para que exista reconvenção é indispensável que exista a demanda originária; (b) identidade procedimental: considerando-se que a ação originária e a ação reconvencional seguirão juntas, sendo inclusive decididas por uma mesma sentença, o procedimento de ambas deve ser o mesmo; (c) competência: o juízo da ação originária é absolutamente competente para a ação reconvencional, de forma que, sendo a competência absoluta dessa ação diferente da ação originária, será proibido o ingresso de ação reconvencional, devendo a parte ingressar com a ação autônoma perante o juízo absolutamente competente 540 ; (d) conexão com a ação originária ou com os fundamentos de defesa. Segundo o caput do art. 343 do Novo CPC, é indispensável à reconvenção a existência de conexão com a ação principal originária ou com os fundamentos de defesa. A conexão com a ação originária é a prevista no art. 55, caput, do Novo CPC, com os devidos temperamentos já apontados no Capítulo 4, item No tocante à conexão com os fundamentos de defesa, obriga-se o réu a apresentar contestação com defesa de mérito indireta, alegando um fato novo impeditivo, extintivo ou modificativo do direito do autor, servindo esse fato novo como fundamento da defesa e ao mesmo tempo como fundamento do contra-ataque contido na reconvenção. Naturalmente o cabimento da reconvenção nesse caso é realizado in status assertionis, de forma a ser irrelevante se a alegação de fato do réu é verdadeira ou não, o que interessará somente no julgamento de mérito da ação principal e da reconvencional

79 Acredito que, mesmo quando não haja qualquer das duas espécies de conexão presentes no caso concreto, seja admissível a reconvenção para se evitar decisões conflitantes ou contraditórias na hipótese em que a pretensão reconvencional for deduzida em processo autônomo e julgada por outro juiz. Deve-se, portanto, aplicar por analogia o art. 55, 3º, do Novo CPC ao cabimento da reconvenção. Carlos ingressa com demanda de cobrança contra Edison, requerendo sua condenação ao pagamento de R$ 5.000,00 em razão de uma dívida inadimplida. Edison alega em sua contestação que a dívida foi compensada com outra, no valor de R$ 8.000,00, e que por tal razão não é devedor de Carlos, devendo seu pedido ser julgado improcedente. Com fundamento nesse fato novo (compensação), fundamenta a reconvenção na qual cobrará de Carlos R$ 3.000,00, existindo nesse caso a conexão com os fundamentos da defesa PROCEDIMENTO Tendo natureza jurídica de ação, sob a égide do CPC/1973 a reconvenção devia ser apresentada por meio de petição inicial autônoma, nos termos dos arts. 282 e 283 do diploma processual revogado, sendo autuada nos próprios autos principais. Em aplicação do princípio da instrumentalidade das formas admitia-se que a reconvenção fosse elaborada na mesma peça em que se contestava a demanda, desde que fosse possível a identificação exata da defesa e do contra-ataque do réu 542. A reconvenção deixa de ser alegada de forma autônoma no Novo Código de Processo Civil, passando, nos termos do art. 343, caput, a ser apresentada na própria contestação. A novidade deve ser saudada porque, ainda que a melhor doutrina já defendesse a possibilidade de utilização de uma única peça para a contestação e reconvenção, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça recentemente havia rejeitado a tese, retrocedendo com relação a posicionamento anteriormente adotado 543. A formalização da reconvenção dentro da contestação deve seguir as diretrizes fixadas pelo Enunciado n.º 45 do Fórum Permanente dos Processualistas Civis (FPPC): Para que se considere proposta a reconvenção, não há necessidade de uso desse nomen iuris, ou dedução de um capítulo próprio. Contudo, o réu deve manifestar inequivocamente o pedido de tutela jurisdicional qualitativa ou quantitativamente maior que a simples improcedência da demanda inicial. 79

80 Apesar de não ter mais uma forma autônoma de alegação, entendo que a reconvenção não perdeu sua natureza de ação do réu contra o autor, pois o próprio art. 343, caput, do Novo CPC prevê que a reconvenção se presta para o réu manifestar pretensão própria. Além disso, o 2.º do dispositivo comentado mantém a sua autonomia, prevendo que a desistência da ação ou a ocorrência de causa extintiva que impeça o exame de seu mérito não obsta o prosseguimento do processo quanto à reconvenção. Como a forma de alegação passou a ser tópico da contestação, o legislador teve o cuidado de manter, expressamente na lei, o entendimento atualmente consagrado de que a apresentação de reconvenção independe de contestação. Na vigência do CPC/1973, de apresentação de duas peças, era entendimento tranquilo, mas, a partir do momento em que a própria lei passa a dizer que a reconvenção deve ser alegada na contestação, é importante o art. 343, 6.º, do Novo CPC. No Novo Código de Processo Civil, portanto, existem duas formas de ingresso de reconvenção: como tópico da contestação ou de forma autônoma quando o autor não contestar. Dessa forma, ainda que não exista regra similar àquela prevista no art. 299 do CPC/1973, que exigia a apresentação concomitante de contestação ou reconvenção, parece que o ingresso da reconvenção, mesmo que antes do vencimento do prazo de resposta do réu, retira do réu o direito de contestar posteriormente, ainda que dentro do prazo. Acredito que nesse caso continua a se operar preclusão mista (consumativa-temporal). Apresentada a reconvenção, a mesma passa a ser autônoma relativamente à ação originária, de forma que, se por qualquer razão, a ação originária for extinta sem resolução do mérito, inclusive a desistência do autor, tal extinção não afetará a reconvenção, que prosseguirá normalmente (art. 343, 2º, do Novo CPC). O mesmo ocorre se a reconvenção for prematuramente extinta, prosseguindo normalmente a ação originária. Mesmo sem dispositivo legal nesse sentido no CPC/1973, segundo doutrina majoritária, cabendo julgamento de mérito, o juiz deveria julgar ambas as demandas no mesmo momento processual, por meio de uma só sentença, objetivamente complexa. A extinção prematura de qualquer uma das duas demandas, portanto, seria sempre terminativa. Esse entendimento parece ter sido consagrado no 2º do art

81 do Novo CPC, que prevê a extinção prematura da reconvenção somente em razão da desistência da ação originária ou de causa extintiva que impeça o exame de seu mérito. Ainda que não exista previsão nesse sentido, como também não havia no CPC/1973, o mesmo fenômeno aplica-se à extinção prematura da reconvenção, não tendo sentido postergar-se uma extinção terminativa quando manifesto o insuperável vício formal. Dessa forma, se o juiz entender pela intempestividade da reconvenção deverá indeferi-la de plano, dando seguimento ao processo somente com a ação originária (principal). Essas decisões que extinguem de forma terminativa e prematuramente a ação principal e a reconvenção são decisões interlocutórias, restando em aberto a questão de sua recorribilidade por meio do agravo de instrumento. A hipótese não está prevista expressamente no art do Novo CPC, o que poderia sugerir sua recorribilidade somente na apelação e contrarrazões desse recurso. E essa interpretação demonstraria mais um exemplo da péssima opção legislativa de tornar o cabimento do agravo de instrumento restrito a um rol exauriente. Entendo, contudo, que seja aplicável à hipótese ora analisada o art. 354, parágrafo único, do Novo CPC. Ainda que o dispositivo esteja previsto no capítulo referente ao julgamento conforme o estado do processo, não se pode negar sua incidência a qualquer espécie de diminuição objetiva ou subjetiva da demanda em razão de decisão de natureza terminativa. Não teria qualquer sentido sistêmico limitar a aplicação do dispositivo legal a apenas um momento procedimental, conforme pode sugerir sua colocação no capítulo referente ao julgamento conforme o estado do processo. Na realidade, a recorribilidade por meio do agravo de instrumento deve ser analisada pelo conteúdo e efeito da decisão e não pelo momento de sua prolação: sendo terminativa e diminuindo a demanda, será agravável. Não sendo caso de indeferimento liminar da reconvenção, o autor reconvindo será intimado, na pessoa de seu advogado, para responder no prazo de 15 dias. A resposta mais comum certamente será a contestação e sua ausência gera o efeito da revelia 544, mas o art. 343, 1º, do Novo CPC não repetiu o equívoco do art. 316 do 81

82 CPC/1973, que previa ser o prazo de 15 dias para contestar. Ao prever que o prazo é de resposta facilita a conclusão de que outras espécies, além da contestação, são possíveis. A reconvenção da reconvenção, apesar de rara, também é admitida, embora parcela da doutrina entenda que o seu cabimento esteja condicionado às hipóteses de reconvenção com fundamento na conexão com os fundamentos de defesa 545. Reconvenções sucessivas poderão ser inadmitidas no caso concreto com fundamento na economia processual sempre que o juiz entender que mais uma reconvenção prejudicará significativamente o andamento procedimental. Poderá, inclusive, utilizar a regra de vedação ao princípio do litisconsórcio multitudinário (art. 113, 1º e 2º, do Novo CPC) para impedir a improvável sucessão de reconvenções. A exceção fica por conta da ação monitória em razão da injustificável previsão do art. 702, 6º, do Novo CPC. Como o 4º do art. 343 do Novo CPC admite expressamente a formação de litisconsórcio passivo na reconvenção entre o réu e terceiro, não há dúvida de serem cabíveis como espécie de resposta do réu a denunciação da lide e o chamamento ao processo. Após o momento de resposta do autor reconvindo, o procedimento da ação reconvencional será o mesmo da ação originária, sendo inclusive ambas as ações julgadas por uma mesma sentença, apesar de não mais existir regra expressa a esse respeito como existia no CPC/1973 (art. 318). Trata-se de medida de economia processual e tradicional do julgamento do pedido contraposto, contra-ataque do réu deduzido na própria contestação. 82

83 19. REVELIA Sumário: Conceito Efeitos: Fatos alegados pelo autor serão reputados verdadeiros; Desnecessidade de intimação do réu revel; Julgamento antecipado do mérito Modificação objetiva da demanda Ingresso do réu revel no processo Participação do réu revel no procedimento probatório CONCEITO A revelia é um estado de fato gerado pela ausência jurídica de contestação. Esse conceito pode ser extraído do art. 344 do Novo CPC, que, apesar de confundir conteúdo com os efeitos da revelia, expõe claramente que a existência desse fenômeno processual depende da ausência de contestação 546. A ausência deve ser necessariamente jurídica porque ocorre revelia mesmo nos casos em que o réu apresenta contestação, que faticamente existirá. Essa existência fática, entretanto, não é o suficiente para afastar a revelia, sendo indispensável que juridicamente ela exista. Contestação intempestiva, por exemplo, não impede a revelia do réu 547, já tendo o Superior Tribunal de Justiça resolvido que contestação endereçada e protocolizada em juízo diverso e distante daquele no qual tramita o feito não evita a revelia 548. O conceito de revelia está previsto no art. 344 do Novo CPC e mais uma vez, como fazia o art. 319 do CPC/1973, incorre no erro de confundir a revelia com o seu principal efeito: a presunção de veracidade dos fatos alegados pelo autor. De qualquer modo, o dispositivo é melhor que o art. 319 do CPC/1973 porque é expresso ao prever que a revelia decorre da ausência de contestação, ainda que pudesse ter sido mais claro quanto à qualificação de ausência jurídica da defesa do réu. Acredito que a redação dada ao art. 344 do Novo CPC tornará ainda mais difícil se concordar com doutrina minoritária que, sob a égide do diploma processual revogado, defendia que a revelia, na realidade, era ausência jurídica de resposta do réu, de forma que, apresentada qualquer espécie de resposta, o réu não seria revel 549. Ao que parece, essa parcela da doutrina confunde revelia com seus efeitos, não 83

84 compreendendo que é plenamente possível um réu revel apresentar outras espécies de resposta que não a contestação, evitando assim a geração dos efeitos da revelia, mas não o seu estado de revel 550. O Superior Tribunal de Justiça já teve oportunidade de decidir na vigência do CPC/1973 que o réu que deixa de contestar é revel, ainda que tenha apresentado reconvenção, hipótese, entretanto, em que não haverá a presunção de veracidade dos fatos 551. Uma bela lição de distinção entre a revelia e os seus efeitos. Entendo que o conteúdo da revelia não pode ser confundido com os seus efeitos, até porque, conforme autorizada doutrina, conceito é o que está dentro e efeito é aquilo que se projeta para fora, de maneira que é impossível confundir um com o outro. Sendo a revelia uma questão de fato gerada pela ausência jurídica de contestação, não guarda maior interesse o seu conceito, sendo muito mais relevante o estudo de seus efeitos. Como já afirmado, é plenamente possível existência de revelia que não gere nenhum dos efeitos programados pela lei, o que, entretanto, não será o suficiente para afastá-la do caso concreto EFEITOS A melhor doutrina costuma apontar três efeitos para a revelia: (a) os fatos alegados pelo autor são reputados verdadeiros; (b) desnecessidade de intimação do réu revel; (c) julgamento antecipado do mérito (art. 355, II, do Novo CPC) FATOS ALEGADOS PELO AUTOR SERÃO REPUTADOS VERDADEIROS A ausência jurídica de resistência do réu diante da pretensão do autor faz com que o juiz repute verdadeiros os fatos alegados pelo autor, sendo comum entender que nesse caso a lei permite ao juiz presumir a veracidade dos fatos diante da inércia do réu. O entendimento de que existe uma confissão ficta na revelia é duramente criticado pela melhor doutrina, que afirma corretamente que a omissão do réu não pode ser entendida como a concordância tácita a respeito dos fatos alegados pelo autor. No direito não é aplicado o brocardo popular quem cala consente ; no direito quem cala, cala. Os fatos são dados como verdadeiros porque existe uma expressa 84

85 previsão legal nesse sentido, sendo irrelevantes as razões da omissão do réu revel 553. Reputam-se verdadeiros somente os fatos alegados pelo autor, de forma que a matéria jurídica naturalmente estará fora do alcance desse efeito da revelia. Aplicando-se o princípio do iura novit curia o juiz sabe o direito, é inadmissível a vinculação do magistrado à fundamentação jurídica do autor somente porque o réu não contesta a demanda, tornando-se revel 554. Daí por que incompreensível a determinação de desentranhamento da contestação dos autos quando ocorre a revelia, sendo certo que o juiz poderá se aproveitar dos fundamentos jurídicos de defesa apresentados pelo réu em sua contestação viciada 555. A exclusão da matéria de direito da presunção gerada pela revelia é o que explica o julgamento de improcedência do pedido do autor mesmo sendo revel o réu e ocorrendo a presunção de veracidade dos fatos alegados na petição inicial no caso concreto. A presunção de veracidade dos fatos alegados pelo autor, certamente o efeito mais importante da revelia, é meramente relativa 556, podendo ser afastada no caso concreto em especial, mas não exclusivamente nas hipóteses previstas expressamente pelo art. 345 do Novo CPC. Ao afirmar que a presunção de veracidade é relativa, é importante notar que o seu afastamento no caso concreto não permite ao juiz a conclusão de que a alegação de fato não é verdadeira. Não sendo reputados verdadeiros os fatos discutidos no caso concreto, o autor continua com o ônus de provar os fatos constitutivos de seu direito, sendo concedido a ele o prazo de 15 dias para especificação de provas (art. 348 do Novo CPC). Há quatro hipóteses previstas nos incisos do art. 345 do Novo CPC em que a revelia não gerará a presunção de veracidade dos fatos alegados pelo autor. No inciso I do dispositivo ora analisado há previsão de que não se reputarão verdadeiros os fatos alegados pelo autor sempre que, havendo litisconsórcio passivo, um dos réus contestar a demanda. É claro que o litisconsorte que contestou a demanda não é revel, sendo, entretanto, aquele que não contestou. O dispositivo legal deve ser interpretado levando-se em conta o art. 117 do Novo CPC, que versa genericamente acerca do tratamento procedimental dos litisconsortes. A aplicação do benefício previsto no inciso I do art. 345 do Novo CPC depende, num primeiro momento, da espécie de litisconsórcio passivo formado na demanda e, depois, 85

86 dependendo da espécie de litisconsórcio, da análise do conteúdo da contestação. Tratando-se de litisconsórcio unitário, no qual a decisão obrigatoriamente será de mesmo teor para todos os litisconsortes, não resta nenhuma dúvida de que a contestação apresentada por um dos réus aproveitará aos demais. No caso de litisconsórcio simples, no qual a decisão poderá ter diferente teor para os litisconsortes, o afastamento do efeito mencionado no art. 344 do Novo CPC dependerá do caso concreto, só se verificando quando houver entre os litisconsortes uma identidade de matéria defensiva, ou seja, que a contestação apresentada por um dos réus tenha como teor as matérias de defesa que comporiam a contestação não oferecida do litisconsorte revel. Sendo apresentada contestação com matéria de defesa de exclusivo interesse do réu que a apresentou, os fatos que prejudiquem somente o réu revel poderão ser presumidos verdadeiros 557. Marilena ingressa com demanda de reparação de danos contra a Garzia & Munte e seu funcionário Nelson, alegando que Nelson dirigia caminhão da empresa e que, durante o exercício de suas funções, passou no farol vermelho e a atropelou. São dois fatos, portanto, alegados por Marilena: Nelson dirigir um caminhão da Garzia & Munte durante seu expediente e ter passado no farol vermelho, o que causou o acidente. Nelson é revel, tendo sido apresentada contestação somente pela Garzia & Munte, sendo que a aplicação do art. 345, I, do Novo CPC dependerá do teor dessa defesa. A Garzia & Munte contestou o fato de que Nelson estivesse em seu horário de expediente, acusando-o de furtar o veículo do pátio no dia de sua folga, e, além disso, alegou que o farol estava verde no momento do acidente, acusando Marilena de ter se jogado na frente do veículo. É óbvio que nesse caso a defesa da Garzia & Munte favorece Nelson e o art. 345, I, do Novo CPC deve ser aplicado. Por outro lado, se na contestação da Garzia & Munte tiver sido alegado tão somente que o veículo foi furtado de seu pátio, essa defesa em nada favorece Nelson, o réu revel. Será, nessa hipótese, legítimo reputar como verdadeiro o fato de o farol estar vermelho no momento do acidente. Diz o art. 345, II, do Novo CPC que não se reputam os fatos verdadeiros na revelia se o litígio versar sobre direitos indisponíveis. Em razão da natureza não patrimonial de alguns direitos, não se permite ao juiz dispensar o autor do ônus probatório ainda que o réu seja revel. A indisponibilidade do direito é a justificativa para impedir o juiz que repute como verdadeiros os fatos diante da revelia da Fazenda Pública, aplicando-se ao caso concreto o princípio da prevalência do interesse coletivo perante o direito individual e a indisponibilidade do interesse 86

87 público 558. O art. 345 III, do Novo CPC afasta a presunção de veracidade sempre que a petição inicial não estiver acompanhada do instrumento que a lei considere indispensável à prova do ato. Trata-se de documentos cuja ausência proíbe que o juiz os considere verdadeiros, daí a ser imprescindível a sua juntada aos autos. Muitos desses documentos podem representar documentos indispensáveis à propositura da demanda (art. 320 do Novo CPC), mas nesse caso serão exigidos do autor já no momento da propositura da demanda. O dispositivo ora analisado trata de documentos indispensáveis à prova do ato alegado, mas não à propositura da demanda, porque mesmo sem eles o juiz tem condições de julgar o mérito da demanda. Guilherme ingressa com ação de inventário em razão do falecimento de Jonas, sendo indispensável à propositura dessa demanda a juntada da certidão de óbito, sem o que o inventário não poderá prosseguir. Circunstância diferente verifica-se quando Guilherme ingressa com demanda indenizatória contra Jussara e em argumentação fática alega que Jonas faleceu. Nesse caso, o julgamento de mérito poderá ser feito sem a prova do fato, mas, para que o juiz considere em suas razões do decidir que Jonas realmente faleceu, é indispensável a juntada ao processo da sua certidão de óbito. Nunca teve fundamento a exigência de o juiz presumir como verdadeiros fatos inverossímeis (fatos que não aparentam ser verdadeiros), exclusivamente em razão da revelia do réu. Tendo o juiz a impressão de que os fatos não são verdadeiros, aplicando no caso concreto as máximas de experiência, sempre pareceu mais adequado exigir do autor a produção da prova, afastando no caso concreto o efeito da revelia previsto no art. 319 do CPC/ Tratava-se da melhor solução, bastando para fundamentá-la imaginar o autor alegando que transportou objetos com a força da mente, ou ainda que praticou atos que as próprias leis da natureza desmentem (que saltou um rio de 50 metros de largura, que ficou submerso por 30 minutos, que percorreu a pé uma distância de 20 km em 10 minutos etc.). Gerando-se no espírito do julgador o sentimento de improbabilidade do fato narrado ter efetivamente ocorrido, não havia como reputá-lo verdadeiro, mesmo não havendo nesse sentido qualquer previsão legal no diploma processual revogado. Em razão do exposto deve ser elogiado o art. 345, IV, do Novo CPC, que traz 87

88 uma quarta hipótese de revelia sem que os fatos alegados pelo autor sejam presumidos verdadeiros: as alegações de fato formuladas pelo autor forem inverossímeis ou estiverem em contradição com prova constante dos autos. Como se pode notar pelo dispositivo legal, além da inverossimilhança da alegação, também não haverá a presunção de veracidade quando as alegações, apesar de verossímeis, contrariarem a prova constante dos autos. Nessa nova hipótese de afastamento do principal efeito da revelia, a prova constante dos autos só pode ser aquela produzida pelo autor com a petição inicial (prova pré-constituída), porque, se o juiz entender que o efeito se opera, julgará antecipadamente o mérito da ação. Por outro lado, caso determine ao autor a especificação de provas, já terá afastado a presunção de veracidade dos fatos, impondo ao autor o ônus de provar suas alegações de fato. Diante de tal cenário, é de presumir que terá pouca incidência na praxe forense, porque dependerá de prova produzida pelo autor contrária às suas alegações de fato constantes da petição inicial. Por outro lado, defende acertadamente autorizada doutrina que não se reputam verdadeiros os fatos sempre que tenham sido legalmente impugnados, sendo irrelevante o sujeito responsável pela impugnação ou a forma pela qual ela ocorreu. É claro que o réu é o legitimado tradicional para impugnar as alegações do autor, e o momento mais adequado para isso é a contestação. Na revelia, não haverá contestação ao menos do ponto de vista jurídico, mas é possível que um terceiro interveniente dentro do prazo legal de manifestação realize a impugnação do fato alegado pelo autor, como no caso do denunciado à lide ou do chamado ao processo. É o que basta para não se aplicar a regra da presunção de veracidade. Por outro lado, o réu poderá não apresentar contestação revelia mas outras formas de resposta, sendo admissível que a impugnação dos fatos alegados pelo autor seja realizada em alguma dessas outras formas de resposta. Numa reconvenção 560, impugnação ao valor da causa ou exceção de incompetência, por exemplo, poderá o réu impugnar o fato alegado pelo autor, e, mesmo sendo um réu revel por não ter contestado, os fatos devidamente impugnados não serão presumidos verdadeiros DESNECESSIDADE DE INTIMAÇÃO DO RÉU REVEL Diz o art. 346, caput, do Novo CPC que contra o revel que não tenha patrono nos autos os prazos fluirão da data de publicação de cada ato decisório no órgão 88

89 oficial. Importante notar que para a geração desse efeito dispensa de intimação não basta que o réu seja revel, sendo também indispensável que não esteja representado por patrono nos autos. Decorrendo a revelia da inexistência jurídica da contestação, é possível imaginar um réu revel que não suporte em nenhum momento da demanda o efeito ora tratado. Basta imaginar um réu que junta procuração nos autos no prazo de resposta e protocola a contestação fora do prazo. Em razão da intempestividade da defesa, o réu será considerado revel, mas, como já tem patrono constituído dos autos desde o momento da apresentação da defesa, será rigorosamente intimado de todos os atos processuais 562. Por outro lado, admitindose a intervenção no processo do réu revel a qualquer momento, a partir do ingresso terá patrono constituído, devendo ser, também a partir de seu ingresso, intimado de todos os atos processuais. Uma divergência clássica se referia à intimação/publicação da sentença quando o réu era revel, existindo três correntes doutrinárias a respeito do tema: (a) dispensa de publicação na imprensa oficial, com início do prazo recursal a partir do momento em que a sentença se torna pública 563 ; (b) necessidade de intimação pessoal do réu revel 564 ; (c) necessidade de publicação da sentença na imprensa oficial 565. Ocorre, entretanto, que nem toda intimação de ato processual se dá por meio de publicação no Diário Oficial, sendo questionável o acerto da previsão contida no art. 346 do Novo CPC para tais hipóteses. O autor sai intimado de atos praticados em audiência, mas, se o réu é revel, deve haver publicação no Diário Oficial? Se o autor for intimado pessoalmente do ato processual, em razão de sua especial qualidade ou de particularidade do caso concreto, será necessária a publicação em Diário Oficial? Entendo que nesses casos será inaplicável o artigo ora analisado e o prazo para o réu terá sua contagem iniciada com a intimação do autor. Por outro lado, a intimação do réu nem sempre decorre de uma decisão, podendo se limitar a chamá-lo a fazer ou deixar de fazer algo porque assim prevê o procedimento, e não porque há uma decisão judicial nesse sentido. No máximo haverá um despacho, e essa circunstância não está coberta pelo art. 346 do Novo CPC. Contudo, se o ato a ser praticado não é postulatório, ainda que independa de intimação para o autor, não vejo como dispensar a intimação para o réu revel sem patrono constituído, até porque, se o ato é postulatório, a intimação deve ser feita na 89

90 pessoa do advogado, que, nesse caso, não existe, mas para atos pessoais a intimação deve ser pessoal. Para evitar tais questionamentos, bastaria ao dispositivo manter expressa a regra pela dispensa da intimação do réu revel sem advogado constituído, mas a omissão legal não será suficiente para afastar tal efeito da revelia nessas situações. A melhor doutrina lembra que determinadas hipóteses de intimação pessoal do réu exigirão a intimação pessoal do réu revel, como a intimação para prestar depoimento pessoal e exibir documentos 566, em entendimento totalmente aplicável à luz do Novo Código de Processo Civil JULGAMENTO ANTECIPADO DO MÉRITO Em criticada regra, o art. 330, II, do CPC/1973 previa que uma das hipóteses de julgamento antecipado da lide era a revelia. Mais uma vez o legislador indevidamente confundia a revelia com os seus efeitos, o que ficava claro com a previsão do art. 324 do CPC/1973, que determinava a especificação de provas quando o juiz, apesar da revelia do réu, não presumisse os fatos como verdadeiros. Mesmo diante do texto legal já se notava que não bastava a revelia para que fosse aplicado o art. 330, II, do CPC/1973, sendo indispensável que o juiz presumisse os fatos alegados pelo autor como verdadeiros, o que tornaria a fase probatória desnecessária, condição indispensável ao julgamento antecipado da lide. O problema foi superado pela redação do art. 355, II, do Novo CPC, que prevê tal forma de julgamento somente na hipótese de revelia com presunção de veracidade dos fatos alegados pelo autor. O dispositivo vai ainda mais longe, prevendo que o julgamento antecipado também não será admitido se o réu, fazendo-se representar nos autos a tempo, requerer a produção de provas. Nesse caso, houve exagero do legislador porque o réu revel só terá tempo hábil se o juiz não tiver presumido verdadeiros os fatos e intimado o autor para especificar as provas MODIFICAÇÃO OBJETIVA DA DEMANDA Previa o art. 264 do CPC/1973 que o autor podia livremente modificar sua causa de pedir e pedido até a citação do réu; após a citação e até o momento de saneamento do processo essa mudança dependia de concordância do réu; após o saneamento a modificação era vedada, mesmo que existisse concordância do réu. 90

91 No processo em que se verificasse a revelia, previa o art. 321 do CPC/1973 que o autor, desde que realizada nova citação do réu, poderia alterar o pedido, causa de pedir e demandar declaração incidente, sendo nesse caso assegurado um novo prazo de resposta ao réu. Não parecia feliz a redação do dispositivo legal porque, se o réu era revel, significava que já fora citado, ou seja, já estava integrado à relação jurídica processual, não sendo necessário realizar uma nova citação em razão da alteração objetiva da demanda. Bastaria uma intimação pessoal informando-o da alteração e abrindo um novo prazo de resposta 567. Concedida uma nova oportunidade de resposta ao réu revel em razão de sua segunda citação no processo, e efetivamente contestada a demanda, naturalmente o réu deixaria de ser revel. É certo que não poderia nessa oportunidade impugnar matérias que deveria ter impugnado após a sua primeira citação, não sendo essa segunda oportunidade de defesa uma nova chance de impugnar matérias já atingidas pela preclusão em razão de sua revelia diante da primeira citação. A defesa estaria, portanto, limitada ao objeto da alteração objetiva realizada pelo autor. De qualquer forma, ainda que o réu não pudesse realizar uma impugnação completa da pretensão do autor, a mera presença de uma contestação no processo fazia com que o réu não pudesse mais ser considerado revel. A doutrina era pacífica no tocante à limitação do objeto de defesa do réu revel após sua segunda citação ao objeto da alteração objetiva da demanda. É preciso perceber, entretanto, que ao depender da espécie de modificação, o réu, mesmo se limitando em sua defesa ao objeto da alteração objetiva, poderia impugnar fatos que fundamentavam a pretensão originariamente postulada pelo autor, o que afastaria o único efeito da revelia que ainda poderia ser gerado, a presunção de veracidade dos fatos. Basta imaginar uma ampliação do pedido, quantitativa ou qualitativa, mantendo-se a mesma causa de pedir. O réu, citado pela segunda vez, em tese se limitaria ao objeto da alteração, mas, como não houve alteração da causa de pedir, para impugnar a nova pretensão poderia impugnar os mesmos fatos que fundamentam tanto a nova como a originária pretensão do autor. Nesses casos, ainda que a defesa do réu se limitasse ao objeto de alteração, seriam afastados todos os efeitos da revelia no caso concreto. Cibele ingressa com demanda de reparação de danos materiais contra Alarico, pleiteando R$ 5.000,00 de danos emergentes. Sendo Alarico revel, Cibele adita 91

92 sua petição inicial, passando a pleitear R$ ,00 de danos emergentes e R$ 4.000,00 de lucros cessantes. Citado novamente, Alarico ingressa na demanda e apresenta contestação nos limites da alteração objetiva realizada por Cibele, sendo natural que, além de impugnar os R$ 5.000,00 a mais a título de danos emergentes e o pedido de lucros cessantes, possa impugnar os fatos constitutivos do direito de Cibele, narrados originariamente na petição inicial. Com isso, será afastada a presunção de veracidade dos fatos. Situação diferente ocorreria se Cibele ampliasse as causas de pedir, mantendo o mesmo pedido; na petição inicial alega a embriaguez de Alarico como fator do acidente automobilístico e pleiteia a condenação em danos materiais. Diante da revelia, Cibele adita a inicial e alega também que Alarico estava na contramão no momento do acidente. Nesse caso, mesmo que Alarico compareça no processo depois de sua segunda citação, só poderá impugnar o fato de estar na contramão, sendo legítimo ao juiz presumir como verdadeira a alegação de embriaguez. O Novo Código de Processo Civil não tem dispositivo que preveja a matéria tratada pelo art. 321 do CPC/1973. Quanto à propositura da ação declaratória incidental, compreende-se a omissão porque essa espécie de ação desaparece no Novo Código de Processo Civil, ainda que o art º, II, tenha condicionado a coisa julgada material da solução da questão prejudicial ao contraditório prévio e efetivo, não se aplicando no caso de revelia. Entretanto, com relação à mudança objetiva da demanda, o silêncio do legislador não se justifica, ainda mais se for considerado que as regras da estabilização objetiva da demanda foram mantidas pelo art. 329 do Novo CPC. Apesar da omissão legislativa, é no mínimo complicado admitir que, depois da revelia, o autor modifique o objeto da demanda sem que o réu tenha conhecimento e possa se defender. O problema é que, sem uma regra específica a esse respeito e com a dispensa da citação do réu revel diante de tal alteração, poderá o réu ser derrotado por causa de pedir que não lhe chegou ao conhecimento ou mesmo ser condenado por pedido por ele desconhecido. A violação ao princípio do contraditório nesse caso exige dos juízes no caso concreto uma atuação fora da mera interpretação das normas que regulamentam a revelia no Novo Código de Processo Civil, de forma que ao menos uma intimação pessoal do réu a respeito da mudança objetiva da demanda realizada pelo autor após sua revelia deve ocorrer, sob pena de grave violação ao princípio do contraditório INGRESSO DO RÉU REVEL NO PROCESSO 92

93 Correta lição doutrinária afirma que faz parte do passado o entendimento de que a revelia constitui um ato de ofensa do réu com o Poder Judiciário, por demonstrar seu pouco caso com a atuação jurisdicional. Durante certo tempo da história, a repulsa a esse comportamento gerava inclusive a ida à força do réu ao processo, pois entendia-se inconcebível o réu não responder ao chamado jurisdicional. Isso tudo faz parte do passado, porque atualmente não se encara a revelia como um ato de afronta ou pouca consideração com o Poder Judiciário, sendo diversas as razões que levam um réu a ser revel, e todas elas irrelevantes. Como elegante expressão doutrinária afirma, o réu revel não é um delinquente, mas um mero ausente, não devendo ser punido de nenhuma forma em razão de seu estado de revelia. Diante dessa constatação, o réu revel é bem-vindo ao processo, podendo dele passar a participar a qualquer momento. Segundo o art. 346, parágrafo único, do Novo CPC, o revel poderá intervir no processo em qualquer fase, recebendo o processo no estado em que se encontrar. Significa dizer que, apesar de o réu revel ser bem-vindo, permitindo-se o seu ingresso a qualquer momento do processo, essa intervenção tardia deve respeitar as regras de preclusão, de forma que não se admitirá o retrocesso procedimental. O réu revel terá participação garantida a partir do momento de sua intervenção, mas atos processuais passados, já protegidos pela preclusão, não poderão ser repetidos ou praticados originariamente. A regra formulada à luz das preclusões judiciais parece ser de fácil compreensão; do passado nada se altera, suportando o réu revel as consequências de sua ausência; do futuro participará ativamente o réu revel PARTICIPAÇÃO DO RÉU REVEL NO PROCEDIMENTO PROBATÓRIO No campo probatório, entretanto, a aparente simplicidade da regra prevista no art. 346, parágrafo único, do Novo CPC pode esconder algumas complicações. Naturalmente a regra continua a ser aplicada, mas é imprescindível para fixar o seu exato alcance a percepção de que a prova surge no processo mediante um procedimento probatório, sendo a participação do réu revel condicionada ao momento desse procedimento probatório quando ingressa no processo 568. A Súmula 231 do Supremo Tribunal Federal permite a produção de prova pelo réu revel, mas há limitações que dependem do momento de ingresso no processo. 93

94 Na tentativa de solucionar os dilemas surgidos quanto à participação do réu revel na instrução probatória, o Novo CPC prevê em seu art. 349 que ao réu revel será lícita a produção de provas, contrapostas às alegações do autor, desde que se faça representar nos autos a tempo de praticar os atos processuais indispensáveis a essa produção. A regra está posta, mas cabe à doutrina esmiuçá-la Provas causais Provas causais são as produzidas dentro do processo, durante seu procedimento, como ocorre com a prova testemunhal e a prova pericial. Para essas provas, o procedimento probatório é dividido em quatro fases: (a) propositura, (b) admissibilidade; (c) produção, fase dividida em preparação e realização; e (d) valoração. A propositura das provas deve ser feita no primeiro momento em que as partes falam nos autos; o autor na petição inicial (art. 319, VI, do Novo CPC) e o réu na contestação (art. 336 do Novo CPC). Como se pode notar, o réu revel é aquele que não contesta, e sendo esse o momento procedimental para o réu requerer a produção de provas, é natural que, qualquer que seja o momento de ingresso do réu revel no processo, ele não poderá propor a produção de prova. Registre-se posição doutrinária que entende possível ao réu revel requerer provas, desde que compareça ao processo no prazo de especificação de provas. Embora a especificação de provas, nos termos do art. 348 do Novo CPC, seja dirigida ao autor, essa parcela doutrinária entende que também o réu poderá especificar as provas, ainda que não as tenha pedido na contestação. Após a propositura da prova, o juiz analisará a sua admissibilidade, tarefa em regra realizada no saneamento do processo, seja por meio de decisão escrita, seja por meio de audiência preliminar. Caso o réu revel ingresse no processo antes do juízo de admissibilidade, será facultado a ele impugnar as provas requeridas pelo autor e influenciar o convencimento do juiz na análise de sua admissibilidade. Na fase de produção da prova existe uma divisão procedimental entre a preparação e a realização. Numa prova testemunhal, os atos de arrolar uma 94

95 testemunha e de intimação são atos de preparação, enquanto a oitiva em audiência é ato de realização. Numa prova pericial, a indicação de quesitos e de assistente técnico faz parte do momento preparatório, ao passo que a resposta desses quesitos pelo perito faz parte da realização. O importante é entender que no momento de preparação a prova já está sendo produzida. Caso o réu revel ingresse na demanda antes do momento de preparação da prova, poderá livremente dela participar, sendo essa a razão pela qual se admite ao réu revel arrolar testemunhas e indicar quesitos e assistentes técnicos. Note-se que em tese o réu revel não pode pedir a produção de prova testemunhal ou pericial, mas, tendo sido deferidos tais meios de prova pelo juiz em razão de pedido do autor ou de ofício, o réu revel poderá participar de sua preparação, desde que ingresse no processo em momento adequado para tanto. Caso o réu revel ingresse no processo depois do momento de preparação, mas antes da realização, poderá desse segundo momento ativamente participar, como comparecer à audiência, contraditar e fazer perguntas às testemunhas, como também impugnar o laudo pericial e requerer a presença do perito em audiência para o esclarecimento de dúvidas 569. Por fim, a fase da valoração, realizada pelo juiz em sua sentença. Tendo o réu revel ingressado na demanda após a produção da prova, restará a ele a impugnação da prova já produzida, na tentativa de influenciar o juiz na formação de seu convencimento. O mesmo poderá fazer se ingressar no processo dentro do prazo de apelação Provas pré-constituídas Provas pré-constituídas são aquelas formadas fora do processo, sendo o exemplo clássico a prova documental. O procedimento probatório dessa espécie de prova é dividido em três fases: (a) propositura e produção; (b) admissibilidade; (c) valoração. Já existindo a prova fora do processo, como ocorre com a prova documental, caberá ao autor na petição inicial e ao réu na contestação não só requererem a sua produção, mas produzirem-na nesse momento procedimental. Diante dessa regra, 95

96 seria correta a conclusão de que o réu revel nunca poderá produzir prova préconstituída, considerando-se que o seu ingresso na demanda sempre se dará após o momento de ausência jurídica de contestação? A resposta é afirmativa, mas deve ser dada com extrema cautela. O art. 435 do Novo CPC prevê uma série de hipóteses em que se admitirá a juntada de documentos após a petição inicial e a contestação, exigindo que a juntada extemporânea seja analisada à luz do princípio da boa-fé consagrada no art. 5º do Novo CPC. Ao menos no tocante à preservação da boa-fé, para o réu revel será mais fácil o seu preenchimento do que para um réu que contesta. Não tendo apresentado a contestação, momento adequado para a produção da prova documental, será difícil acreditar que a juntada posterior de documento tenha sido fruto de uma manobra de má-fé por parte do réu revel. Quanto às fases de admissibilidade e de valoração da prova pré-constituída, aplicam-se integralmente os comentários feitos no tópico anterior quanto às provas causais. 96

97 20. PROVIDÊNCIAS PRELIMINARES E JULGAMENTO CONFORME O ESTADO DO PROCESSO Sumário: Providências preliminares Julgamento conforme o estado do processo Introdução: Extinção do processo sem a resolução do mérito; Extinção do processo com a resolução do mérito, fundada no art. 487, II e III, do Novo CPC; Julgamento antecipado do mérito Julgamento antecipado parcial do mérito; Saneamento e organização do processo PROVIDÊNCIAS PRELIMINARES Segundo o art. 347 do Novo CPC, findo o prazo para a contestação, o juiz tomará, conforme o caso, as providências preliminares previstas em lei. O dispositivo é substancialmente igual ao art. 323 do CPC/1973 que, entretanto, era superior ao prever que as providências preliminares seriam tomadas após o prazo de resposta do réu. A confusão entre gênero e espécie foi devidamente afastada em várias passagens do Novo CPC, mas, infelizmente, no art. 344 modificou-se errando aquilo que no diploma processual revogado estava corretamente previsto. Como já ocorria no CPC/1973, no Novo Código de Processo Civil as providências preliminares não constituem uma fase obrigatória do procedimento, dependendo sua existência das circunstâncias do caso concreto. Na hipótese de o réu ser revel, a postura a ser adotada pelo juiz dependerá da geração ou não do principal efeito da revelia. Sendo presumidos verdadeiros os fatos alegados pelo autor, será caso de julgamento antecipado do mérito, nos termos do art. 355, II, do Novo CPC. Não sendo presumidos os fatos como verdadeiros, aplica-se o art. 348 do Novo CPC, com a determinação ao autor para que especifique as provas que pretende produzir, se ainda não as tiver indicado. Mantendo a tradição omissiva do art. 324 do CPC/1973, o art. 348 do Novo CPC deixa de prever expressamente o prazo para a especificação de provas. Como para as outras espécies de providência preliminar há previsão expressa de quinze dias, 97

98 entendo que para preservar a homogeneidade dessas reações do autor reunidas no capítulo ora analisado também assim o seja na especificação de provas. Interessante notar que o art. 348 do Novo CPC, em sua interpretação literal, tem aplicação tão somente na hipótese de revelia do réu, da mesma forma como ocorria com o art. 324 do CPC/1973. Ocorre, entretanto, que com a aceitação doutrinária e jurisprudencial dos pedidos genéricos de produção de prova na petição inicial e na contestação do procedimento ordinário, que não deve se alterar com o novo diploma processual, o art. 348 do Novo CPC continuará a ser aplicado de forma ampliativa como era seu antecessor, permitindo que o juiz determine às partes a especificação de provas mesmo diante de réu não revel. Como o juiz não sabe exatamente o que as partes pretendem produzir em termos probatórios, determina a especificação de provas em qualquer situação, ampliando-se consideravelmente na praxe forense o âmbito de aplicação do art. 324 do CPC/1973 em realidade que deve se repetir na aplicação do art. 348 do Novo CPC. O art. 349 do Novo CPC versa sobre a participação do réu revel no procedimento probatório na hipótese de o juiz determinar a intimação do autor a especificar as provas que pretende produzir. O tema é devidamente enfrentado no Capítulo 19, item A segunda providência preliminar prevista pelo Código de Processo Civil consiste na réplica, oportunidade de manifestação aberta ao autor sempre que o réu alegar em sua contestação defesa de mérito indireta e/ou defesa processual. Nessas duas espécies de matéria defensiva, o réu traz uma novidade ao processo, tanto quando alega um fato novo impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, como quando alega uma defesa preliminar, naturalmente não narrada pelo autor em sua petição inicial. No tocante à alegação pelo réu de preliminares em sua contestação, o art. 352 do Novo CPC prevê que caso o juiz verifique a existência de irregularidades ou vícios sanáveis, determinará sua correção em prazo nunca superior a trinta dias. A regra já constava do art. 327 do CPC/1973 e se refere às defesas processuais dilatórias potencialmente peremptórias, devidamente analisadas no Capítulo 18, item Como se pode notar, a réplica é manifestação do princípio do contraditório, 98

99 exigindo-se a oitiva do autor a respeito de matérias novas do processo que podem ser determinantes para a decisão judicial. Na praxe forense, entretanto, percebe-se uma indevida generalização da réplica, abrindo-se prazo para manifestação do autor a respeito da contestação mesmo quando essa resposta do réu seja fundada tão somente em defesa de mérito direta. Tal postura, além de contrariar o texto legal, não encontra nenhuma justificativa plausível, devendo ser criticada. Isso quando o juiz não abre prazo para a tréplica, e assim por diante JULGAMENTO CONFORME O ESTADO DO PROCESSO INTRODUÇÃO Ultrapassada a fase das providências preliminares, ainda que nenhuma delas tenha sido necessária, o processo chega a uma nova fase, em que o juiz proferirá uma decisão, que pode ser interlocutória ou sentencial. Nesse momento, abrem-se quatro caminhos possíveis ao juiz, sendo que em três deles o processo será extinto por sentença e em outro a decisão terá natureza saneadora, com o prosseguimento da demanda e o ingresso na fase probatória. Trata-se da fase do julgamento conforme o estado do processo. Entre os cinco caminhos previstos pelo Código de Processo Civil está a extinção do processo sem a resolução do mérito (art. 354, caput do Novo CPC); extinção do processo com a resolução do mérito, desde que a sentença se fundamente no art. 487, II e III, do Novo CPC (art. 354, caput do Novo CPC); julgamento antecipado do mérito (art. 355 do Novo CPC); julgamento antecipado parcial do mérito (art. 356 do Novo CPC) e prolação de decisão saneadora (art. 357 do Novo CPC) EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM A RESOLUÇÃO DO MÉRITO Trata-se de norma legal ligada ao princípio da economia processual, determinando que, se o juiz perceber a inutilidade da continuação do processo, em razão de vício formal insanável, deve determinar a extinção do processo sem a resolução do mérito. É preciso afirmar que a maioria dos casos previstos pelo art. 485 do Novo CPC, e repetidos pelo art. 337 do mesmo diploma processual, e que fundamentam essa espécie de extinção do processo, poderia ter sido objeto de 99

100 apreciação de ofício anterior ao momento procedimental ora analisado. É inegável, por exemplo, que uma ilegitimidade de parte, percebida pelo juiz na leitura da peça inicial, gerará seu indeferimento, com a consequente extinção do processo sem a resolução do mérito. Nesse caso, evidentemente, não haverá oportunidade para a fase de julgamento conforme o estado do processo, visto que o mesmo terá atingido seu fim num momento processual bem anterior a tal fase. Por outro lado, se a ilegitimidade de parte for percebida somente após a manifestação do réu em sua defesa, deverá o juiz, aí sim, nesse momento, extinguir o processo sem a resolução do mérito. Como a matéria é de ordem pública e por isso não é atingida pela preclusão, mesmo após esse momento procedimental o processo poderá ser extinto sem a resolução de mérito. O Novo Código de Processo Civil traz novidade em seu art. 354, parágrafo único, importante regra quanto ao cabimento do agravo de instrumento diante de decisão terminativa (art. 485) ou de mérito (art. 487, II e III) que resolver apenas parcela do processo. A redação do dispositivo não merece elogios porque sugere a existência de uma extinção parcial do processo, o que é algo rejeitado historicamente pela melhor doutrina. Seria como falar em mulher meio grávida ou funcionário público meio honesto... Por outro lado, contraria o próprio conceito de sentença previsto no art. 203, 1º, do Novo CPC, para o qual será sentença o pronunciamento do juiz que, com fundamento nos arts. 485 e 487 do Novo CPC, põe fim à fase cognitiva do procedimento comum, bem como extingue a execução. Um julgamento terminativo de parcela do processo não tem capacidade de extinguir o processo ou uma de suas fases, o que necessariamente o transforma em decisão interlocutória, que, nos termos do art. 203, 2.º, do Novo CPC, é todo pronunciamento judicial de natureza decisória que não se enquadra no conceito de sentença. Da forma como ficou redigido o dispositivo ora comentado, passaríamos a ter, por expressa previsão legal, uma sentença recorrível por agravo de instrumento. Teria sido mais cuidadoso o legislador se tivesse expressamente previsto que a decisão terminativa que diga respeito a apenas parcela do processo é interlocutória, recorrível por agravo de instrumento, aliás, exatamente como ocorre no CPC/

101 Outra crítica deve ser dirigida à desnecessidade de previsão específica de cabimento de agravo de instrumento da decisão que resolve parcela do mérito no momento do julgamento conforme o estado do processo, em razão de prescrição ou decadência (art. 487, II, do Novo CPC) ou homologatória de autocomposição (art. 487, III, b do Novo CPC). Nos termos do art , II, do Novo CPC é cabível agravo de instrumento contra decisão interlocutória que verse sobre o mérito da causa, sendo tal previsão suficiente para tutelar as hipóteses de julgamento parcial de mérito previstas no art. 354, parágrafo único, do Novo CPC. Trata-se da consagração da sentença parcial de mérito, ainda que recorrível por agravo de instrumento por expressa indicação legal. Ocorre, entretanto, que as mesmas críticas já feitas quanto à decisão terminativa parcial também se aplicam à decisão parcial de mérito. Quanto à natureza jurídica da decisão, que o art. 354, parágrafo único do Novo CPC sugere ser uma sentença recorrível por agravo de instrumento, já foi afirmado que o legislador poderia ter tomado mais cuidado de forma a apontar para a natureza interlocutória da decisão. Mesmo diante da redação legal, o Enunciado 103 do Fórum Permanente de Processualistas Civis (FPPC) conclui que: A decisão parcial proferida no curso do processo com fundamento no art. 487, I, sujeita-se a recurso de agravo de instrumento. A previsão que trata do cabimento de agravo contra decisão interlocutória terminativa capaz de diminuir objetiva ou subjetivamente a demanda tem aplicação em outros momentos procedimentais, além do julgamento conforme o estado do processo. Um exemplo emblemático do afirmado é a extinção da reconvenção por decisão interlocutória terminativa EXTINÇÃO DO PROCESSO COM A RESOLUÇÃO DO MÉRITO, FUNDADA NO ART. 487, II E III, DO NOVO CPC É interessante a opção do legislador em não tratar das hipóteses previstas pelo art. 487, II e III, do Novo CPC, sob o instituto do julgamento antecipado do mérito. Reconhece-se nas previsões dos arts. 354, caput, do Novo CPC (extinção pelo art. 487, II e III, do Novo CPC) e 355 do Novo CPC (extinção pelo art. 487, I, do Novo CPC) que somente essa segunda sentença é genuinamente de mérito, daí somente ela poder ser tratada por julgamento antecipado do mérito (aqui entendido como 101

102 pedido). Seja como for, as hipóteses previstas nos incisos II e III do art. 487 do Novo CPC, são tratadas também como decisões de mérito, o que gera importantes consequências no tocante à existência de coisa julgada material nessas espécies de sentença. Extingue-se a demanda com resolução de mérito, nos termos do art. 354, caput, do Novo CPC, na fase de julgamento conforme o estado do processo, quando houver: (a) prescrição ou decadência; (b) homologação de reconhecimento jurídico do pedido, de transação e de renúncia. É natural que a previsão dessas espécies de sentença de mérito como providências a serem adotadas pelo juiz no momento procedimental do julgamento conforme o estado do processo não cria uma limitação temporal para a prolação de tais sentenças. Assim, uma transação ou renúncia, por exemplo, podem gerar a extinção do processo tanto antes quanto depois do julgamento conforme o estado do processo JULGAMENTO ANTECIPADO DO MÉRITO Conforme visto, o art. 354 do Novo CPC prevê dois caminhos ao juiz, ambos levando a extinção do processo, no primeiro caso sem a resolução do mérito e no segundo com resolução do mérito. No art. 355 do Novo CPC, prevê-se mais um caminho que levará à extinção do processo com a resolução do mérito, aplicando-se ao caso concreto sempre que o juiz acolher ou rejeitar o pedido do autor. O art. 330 do CPC/1973 chamava tal fenômeno processual de julgamento antecipado da lide, em opção unanimemente criticada pela doutrina, já que o julgamento não era da lide e sim do pedido do autor. O art. 355 do Novo CPC corretamente passa a chamar o julgamento antecipado da lide de julgamento antecipado do mérito, expressamente prevendo que a sentença que julga antecipadamente o mérito é sentença com resolução de mérito. Na realidade, ao mudar o nome da forma de julgamento, ficou exagerada essa repetição, porque, se o julgamento antecipado é do mérito, é óbvio que a sentença será de mérito. Sendo possível dividir o processo de conhecimento em quatro fases apesar de 102

103 não ser essa uma divisão estanque, o julgamento antecipado do mérito se justifica em razão da desnecessidade da realização da fase probatória. Após a fase postulatória, tem-se a fase de saneamento, seguida da fase instrutória e finalmente a decisória. Não sendo necessária a produção da prova, não haverá a fase probatória, restando um vácuo entre a fase de saneamento e a decisória. Como tal vácuo é obviamente inadmissível, a fase decisória é antecipada para o momento do saneamento, resultando no julgamento antecipado da lide. O art. 355 do Novo CPC prevê duas situações que não se confundem, mas que geram o fenômeno acima descrito, ou seja, a desnecessidade da produção probatória: (a) quando não houver necessidade de produção de outras provas; (b) quando o réu for revel, ocorrer o efeito previsto no art. 344 do Novo CPC e não houver requerimento de prova, na forma do art. 349 do mesmo diploma legal. O inciso I do art. 355 do Novo CPC não foi feliz ao prever a primeira hipótese de julgamento antecipado do mérito. Segundo o dispositivo, haverá essa forma de julgamento, se não houver necessidade de produção de outras provas, em previsão que não consegue alcançar todas as circunstâncias que deveria. Na hipótese, rara é verdade, mas não impossível, de a demanda conter apenas questões de direito, não caberá julgamento antecipado do mérito? Quando a matéria for exclusivamente de direito, não há objeto a ser tratado na instrução probatória, dado que essa fase se destina à prova dos fatos. A inexistência da narração fática, em situação que basta ao juiz interpretar as normas jurídicas objeto da ação, faz com que seja absolutamente desnecessária a instrução probatória, visto que não haverá o que provar. E se, apesar de haver alegações de fato, estas não chegarem a se transformar em questões (art. 334 do CPC/1973 e art. 374 do Novo CPC), não haverá julgamento antecipado do mérito? Acredito que sim. Na hipótese de fatos que não exijam provas (notórios, incontroversos, presumidos), não há necessidade de instrução probatória e por consequência natural o julgamento antecipado do mérito é legítimo. 103

104 O que o dispositivo deveria ter previsto, mas não o fez, é que o julgamento antecipado do mérito será cabível sempre que se mostrar desnecessária a instrução probatória após a apresentação de contestação pelo réu. Seja porque só há questões de direito, seja porque as questões de fato independem de prova, quer porque as provas pré-constituídas (geralmente documentos) que instruíram a petição inicial e a contestação são suficientes para a formação do convencimento do juiz. Apesar de não prever exatamente isso, acredito que deva ser essa a situação a ser considerada para o julgamento antecipado do mérito com fundamento no dispositivo ora analisado. A melhor doutrina lembra que o juízo de primeiro grau não é o único órgão julgador, visto que o processo poderá ser julgado em sede de apelação. Em razão disso, o juiz de primeiro grau deve evitar dois erros; indeferir provas pertinentes porque já se convenceu em sentido contrário ou ainda indeferir provas porque, em seu entender, a interpretação do direito não favorece o autor. Nesses casos, a interrupção abrupta do processo, sem a realização de provas, constitui cerceamento de defesa, gerando a anulação da sentença e dispêndio desnecessário de tempo e de dinheiro. A segunda hipótese de julgamento antecipado do mérito, prevista no inciso II do art. 355 do Novo CPC, prevê a condição de revelia do réu e outros dois requisitos aparentemente cumulativos: o juiz presumir a veracidade dos fatos e não haver pedido do réu de produção de prova. Acredito que os dois requisitos são na realidade faces de uma mesma moeda, porque se o juiz presumir a veracidade dos fatos julgará antecipadamente o mérito e o réu não terá oportunidade de requerer validamente a produção de provas. Por outro lado, se não for cabível ao caso concreto a presunção de veracidade, aplicarse-á o previsto no art. 348 do Novo CPC. Mas reconheço que é possível, apesar de excepcionalíssimo, que haja pedido do réu revel pela produção de prova antes mesmo de o juiz decidir sobre o cabimento do julgamento antecipado do mérito ou da especificação de provas. É natural que após a revelia do réu os autos sejam conclusos para o juiz, que decidirá entre julgar antecipadamente o mérito e determinar ao autor a especificação de provas. E é 104

105 possível, ainda que extremamente raro, que nesse meio tempo o réu compareça ao processo requerendo a produção de prova. Mais comum será a hipótese de réu que contesta intempestivamente pedindo a produção de prova. E nessa situação, ainda que extremamente rara, é que surge o problema. Porque se levando ao pé da letra não será cabível o julgamento antecipado do mérito porque, ainda que o juiz presuma verdadeiros os fatos alegados pelo autor, haverá pedido de produção de prova elaborado pelo réu. Acredito ser evidente a possibilidade de julgamento antecipado do mérito nesse caso, porque a presunção ou não da veracidade dos fatos independe de o réu ter ou não pedido a produção de provas. Essa é a única interpretação possível ao criticável dispositivo legal JULGAMENTO ANTECIPADO PARCIAL DO MÉRITO A grande novidade do Novo Código de Processo Civil quanto ao julgamento antecipado do mérito é a previsão expressa de que ele pode ser parcial. Nos termos do art. 356 do novo diploma processual, o juiz decidirá parcialmente o mérito, quando um ou mais dos pedidos formulados ou parte deles mostrar-se incontroverso ou estiver em condições de imediato julgamento, nos termos do art. 355 do Novo CPC. O dispositivo encerra uma considerável polêmica doutrinária quanto à melhor interpretação do art. 273, 6.º, do CPC/1973. Apesar de prevista como espécie de tutela antecipada no revogado diploma processual, o julgamento parcial do mérito suscitava interessante debate doutrinário: seria realmente uma espécie diferenciada de tutela antecipada ou um julgamento antecipado parcial da lide? Havia parte da doutrina que entendia não se tratar de genuína tutela antecipada, mas sim de julgamento antecipado parcial da lide, e, em vez de um parágrafo no art. 273 do CPC/1973, o legislador deveria ter incluído um parágrafo no art. 330 do CPC/1973. Para essa corrente doutrinária, a cognição do juiz, ao decidir parcela da pretensão do autor, era exauriente, fundando-se a decisão em um juízo de certeza. Tratando-se de resolução do mérito fundada em juízo de certeza, a decisão seria apta a gerar coisa julgada material, não podendo ser revogada nem modificada pela decisão final da demanda, sendo inaplicável à espécie o art. 273, 4.º, do CPC/

106 Existia outra corrente doutrinária que defendia a natureza de tutela antecipada, afirmando-se que o art. 273, 4.º, do CPC/1973 era totalmente aplicável à tutela antecipada de parcela incontroversa da pretensão do autor. Para essa corrente doutrinária, apesar de o juízo de verossimilhança ser ainda mais robusto que nas outras espécies de tutela antecipada, o juiz não decidia com fundamento em cognição exauriente, sendo admissível que ao final da demanda reformulasse seu entendimento e revogasse ou modificasse a decisão concessiva de tutela antecipada 571. Diante da realidade legislativa imposta pelo revogado Código de Processo Civil, entendia-se que a opção do legislador em qualificar o julgamento de parcela da pretensão quando incontroversa era determinante para a solução do impasse doutrinário. Defendia-se ser possível a criação do fracionamento do julgamento de mérito por meio da admissibilidade de julgamento antecipado parcial da lide, com decisão fundada em cognição exauriente e apta a gerar a coisa julgada material. Por uma opção legislativa, o processo continuaria somente para decidir a parcela controversa da pretensão, e sua decisão não afetaria o que já teria sido resolvido definitivamente. Não foi isso, entretanto, o que a Lei /2002 criou ao incluir o 6.º ao art. 273 do CPC/ Se o legislador no CPC/1973 tratou do fenômeno como espécie de tutela antecipada, não restava dúvida da aplicação dos 4.º e 5.º do art. 273 do CPC/1973 a essa espécie de tutela antecipada, significando que a tutela antecipada poderia ser revogada ou modificada a qualquer momento, ainda que somente na hipótese de haver novas circunstâncias. Diante dessa realidade, defendia que, mesmo considerando-se a cognição exauriente nessa espécie de tutela antecipada, o conhecimento superveniente de matérias de ordem pública, que poderiam inclusive ser levadas a processo ex officio pelo juiz, seria apto a extinguir o processo sem resolução do mérito, acarretando a imediata revogação da tutela antecipada anteriormente concedida. Essa possibilidade de revogação demonstrava que a decisão concessiva de tutela antecipada não era definitiva, não sendo apta a gerar coisa julgada material 573. Há, inclusive, interessante julgamento do Superior Tribunal de Justiça a respeito do art. 273, 6.º, do CPC/1973, no qual o tribunal, além de reconhecer que essa tutela antecipada não é espécie de tutela de urgência, afirma que a cognição é exauriente, 106

107 mas que em razão de política legislativa a tutela do incontroverso não é suscetível de imunidade pela coisa julgada, sendo concedida por meio de decisão interlocutória de mérito 574. A opção do legislador no Novo Código de Processo Civil foi modificar a natureza jurídica dessa espécie de julgamento, tornando o que anteriormente era uma espécie diferenciada de tutela antecipada em julgamento antecipado parcial do mérito. Afastou-se do princípio da unicidade do julgamento do mérito preconizado por Chiovenda, passando a prever a hipótese de julgamento fracionado de mérito. Há duas hipóteses de cabimento do julgamento antecipado parcial do mérito previstas pelos incisos do art. 356 do Novo CPC. A incontrovérsia de um dos pedidos ou de parcela de um pedido prevista pelo inciso I do art. 356 do Novo CPC deve ser compreendida como o parcial reconhecimento jurídico do pedido. O dispositivo não trata da incontrovérsia dos fatos, mas do pedido, e a única forma de o pedido do autor se tornar incontroverso é por meio de ato de autocomposição unilateral do réu. Nesse caso, caberá ao juiz julgar a parcela incontroversa por meio da sentença homologatória de mérito prevista no art. 487, III, a, do Novo CPC. Também será cabível o julgamento antecipado parcial do mérito quando um ou mais pedidos, ou parcela deles, estiver em condições de imediato julgamento, nos termos do art. 355 do Novo CPC. O inciso II do art. 356 do Novo CPC é de simples compreensão: é possível se julgar antecipadamente parcela do mérito sempre que com relação a essa parcela não houver necessidade de produção de provas, quer porque já produzidas, quer porque dispensável a produção de qualquer prova. Com a alteração, o capítulo que decide parcela do mérito produzirá coisa julgada material ao transitar em julgado, não sendo possível o juiz posteriormente modificar a decisão ao resolver a parcela do mérito que demandou a continuidade, ainda que parcial, do processo. Nos termos do art. 356, 1.º, do Novo CPC, a decisão que julgar parcialmente o mérito poderá reconhecer a existência de obrigação líquida ou ilíquida. A norma 107

108 parece ser fruto de excesso de zelo do legislador porque, se a forma de julgamento é antecipada do mérito, ainda que parcial, seria natural entender que a obrigação reconhecida pudesse ser líquida ou ilíquida. Sob a ótica do ditado popular o que abunda não prejudica, o dispositivo não deve gerar consequências práticas relevantes. O 2.º do dispositivo ora comentado é interessante porque libera a liquidação ou execução imediata na obrigação reconhecida na decisão que julgar parcialmente o mérito, independentemente de caução, ainda que haja recurso pendente de julgamento. O dispositivo é compatível com o 5.º, que prevê a decisão ser recorrível por agravo de instrumento, recurso sem efeito suspensivo. Há, entretanto, uma gritante contradição entre qualquer decisão que resolva o mérito e seja recorrível por apelação e a decisão que julga antecipadamente parcela do mérito. Enquanto no primeiro caso será inviável, ao menos em regra, a execução em razão do efeito suspensivo do recurso; no segundo, será cabível a execução provisória. A distinção de tratamento não tem qualquer justificativa lógica ou jurídica plausível, porque trata julgamentos de mérito de maneira distinta quanto à sua eficácia imediata sem nada que justifique o tratamento desigual, em nítida ofensa ao princípio da isonomia. Sou um crítico do efeito suspensivo como regra na apelação, mas, uma vez sendo essa a opção legislativa, realmente fica complicado compreender por que a decisão que julga antecipadamente parcela do mérito pode ser executada provisoriamente. Essa manifesta contradição, entretanto, não permite a conclusão paradoxal de que para os atos previstos no art. 520, IV, do Novo CPC será exigida a prestação da caução 575. Esse entendimento torna letra morta o art. 356, 2º, do Novo CPC 576. Por outro lado, a previsão expressa do 5.º do art. 356 do Novo CPC de que a decisão que julga antecipadamente parcela do mérito é recorrível por agravo de instrumento gera problemas porque teremos no sistema processual dois recursos distintos ao segundo grau para reexame de decisão de mérito. Insisto que não é solução adequada prever agravo de instrumento contra decisão que resolve o mérito enquanto a apelação mantiver muito mais garantias ao recorrente do que o agravo de instrumento. Resolve-se um problema (não haver múltiplas apelações em momentos distintos) e se criam inúmeros outros. Abre-se espaço, até mesmo, para a exótica 108

109 apelação de instrumento, um recurso de agravo de instrumento com as garantias processuais da apelação... Reconheço, por outro lado, que o Novo Código de Processo Civil aproximou consideravelmente o procedimento dos recursos de apelação e de agravo de instrumento interposto contra decisão de mérito, que passam a ter o mesmo prazo de interposição (15 dias), nenhum deles conta com revisor e é aplicável a ambos a técnica de julgamento substitutiva dos embargos infringentes. Mas ainda há diferenças, como a sustentação oral, admitida na apelação e não no agravo de instrumento interposto contra decisão interlocutória de mérito. E a questão dos diferentes efeitos de tais recursos é o principal problema, conforme já analisado. Por fim, o art. 356, 4.º, do Novo CPC, prevê regra mais cartorial do que processual ao disciplinar a forma de autuação da liquidação ou cumprimento de sentença da decisão que julga parcialmente o mérito. Nos termos do dispositivo, poderão nesse caso ser criados autos complementares, a requerimento da parte ou a critério do juiz, o que deve ocorrer para não embaralhar o procedimento principal da parcela do processo que ainda não foi julgada e a liquidação ou execução da decisão que decidiu o mérito de forma antecipada e parcial SANEAMENTO E ORGANIZAÇÃO DO PROCESSO Como verificado nos itens anteriores, todos os caminhos possíveis existentes ao juiz já analisados levam o processo à sua extinção, ora com a resolução do mérito (sentença definitiva), ora sem essa resolução (sentença terminativa). A única possibilidade de o processo prosseguir é o seu saneamento, hipótese verificável sempre que não for possível sua extinção pelos motivos já analisados. O saneamento e a organização do processo estão previstos no art. 357 do Novo CPC. Além de tornar o saneamento escrito a regra, o dispositivo tem profunda inovação com relação ao art. 331 do CPC/1973. Não consta mais entre os atos a serem praticados nesse momento procedimental a tentativa de autocomposição. Acredito que a mudança tenha se dado pelo fato de tal tentativa, além de ter uma audiência específica para ocorrer, não é mais realizada pelo juiz da causa, e sim por um conciliador ou mediador pertencente ao Centro Judiciário de Solução de Conflitos vinculado ao juízo. 109

110 A novidade é interessante por desvincular o saneamento da tentativa de solução consensual, e sob esse aspecto correta e bastante elogiável. A história mostra que essa confusão não levava a bons resultados, inclusive com a dispensa da audiência preliminar em hipóteses em que a autocomposição era concreta ou supostamente inviável. Ainda assim parece não haver qualquer impedimento ao juiz em tentar nesse momento a autocomposição ou a mediação entre as partes. O saneamento e agora também organização do processo continua a ser um ato processual complexo, como atestam os incisos do art. 357 do Novo CPC, cabendo ao juiz, nesse momento procedimental: resolver, se houver, as questões processuais pendentes; delimitar as questões de fato sobre as quais recairá a atividade probatória, especificando os meios de prova admitidos; definir a distribuição do ônus da prova, observado o art. 373 do Novo CPC; delimitar as questões de direito relevantes para a decisão do mérito; e, se necessário, designar audiência de instrução e julgamento. Nos termos do inciso I do art. 357 do Novo CPC, o primeiro ato a ser praticado pelo juiz no saneamento e organização do processo é a resolução das questões processuais pendentes, sanando alguma irregularidade que porventura ainda exista. Com isso, estará deixando o processo, do ponto de vista formal, absolutamente pronto e regular para a posterior fase instrutória e derradeiramente à fase decisória. Caso não haja nenhuma irregularidade o que geralmente ocorre, visto que o juiz desde o início do processo busca sanar eventuais vícios sanáveis (p. ex., emenda da inicial), haverá tão somente a declaração de que o processo se encontra sem vícios, preparado, portanto, para seu regular desenvolvimento. Ultrapassada essa fase, o juiz deverá passar à fixação dos pontos controvertidos. Segundo o inciso II do dispositivo ora comentado, essa fixação se dá por meio da delimitação das questões de fato sobre as quais recairá a atividade probatória. Essa fixação busca otimizar a instrução probatória, dado que o juiz, sendo o destinatário das provas, determina antes do início de sua produção quais fatos controvertidos realmente interessam ser provados para a formação de seu convencimento. É forma de afastar o trabalho inútil das partes em provar fatos que 110

111 não são controvertidos e outros, que apesar da controvérsia, não interessam ao convencimento do juiz. Com tal fixação todos ganham: as partes, que voltarão suas energias para o que realmente interessa na fase probatória e o próprio juiz, que economizará tempo que seria despendido na produção de provas inúteis. Após a fixação dos pontos controvertidos, momento em que se determinará o objeto da fase probatória (o que se deve provar), o juiz determina os meios de prova para que tais questões possam ser provadas. Ou seja, depois de fixado o objeto da prova, o juiz determina de que forma tal prova será produzida, deferindo ou indeferindo meios de prova requeridos pelas partes, como também indicando a produção de provas por meios não pedidos, ou seja, de ofício (art. 370 do Novo CPC). Fixa-se, portanto, o que se deve provar e como isso ocorrerá. Em novidade do Novo Código de Processo Civil, o saneamento passa a ser o momento adequado para o juiz definir a distribuição do ônus da prova. Conforme devidamente analisado no Capítulo 22, item , o art. 373, 2º, do Novo CPC exige o respeito ao contraditório na distribuição do ônus probatório, para que a parte não seja surpreendida ao final da instrução com a informação de que o ônus da prova era dela. O momento mais racional para essa distribuição é o saneamento e organização do processo, ou seja, antes do início da fase instrutória. Por isso deve ser elogiada a previsão do art. 357, III, do Novo CPC. A previsão, entretanto, não cria qualquer espécie de preclusão ao juiz, que mesmo depois do saneamento do processo poderá distribuir os ônus da prova, conforme lhe faculta o art. 373, 1º, do Novo CPC. Mas nesse caso terá que reabrir a instrução, o que não é o ideal, tendo-se em conta os princípios da duração razoável do processo e da economia processual. Também é inovadora a previsão do inciso IV do art. 357 do Novo CPC, que prevê a delimitação das questões de direito relevantes para a decisão do mérito. Fazendo-se um paralelo com a tradicional fixação da matéria fática controvertida, passa a ser incumbência do juiz também definir quais questões de direito são relevantes para a formação de seu convencimento. Apesar de um paralelo possível, há uma diferença fundamental: as questões de fato precisam ser provadas pelas partes, o que não ocorre com as questões de direito em razão da aplicação do brocardo iura noti curia ou dahim factum dabo tibu ius. 111

112 Entendo que a exigência ora analisada se preste tão somente para sinalizar às partes quais as questões de direito que serão essenciais para a prolação da decisão de mérito, evitando-se assim que as partes percam seu tempo e energia com discussões jurídicas inúteis. Finalmente, e sempre que necessário, designa-se a audiência de instrução e julgamento. O art. 357, V, do Novo CPC foi cuidadoso em indicar que essa atividade processual somente será exercida se for necessário, visto que é perfeitamente possível o processo chegar ao seu fim sem a necessidade de realização de tal audiência (basta pensar numa demanda em que a única prova a ser produzida seja a pericial e que não haja necessidade da presença dos peritos em audiência). Dessa forma, apenas será designada a audiência de instrução e julgamento quando for necessária a produção de prova oral (depoimento pessoal, testemunhas e, raramente, a presença do perito para esclarecer em audiência pontos obscuros ou duvidosos de seu laudo). Caso o juiz defira a prova testemunhal, já deve fixar prazo comum não superior a 15 dias para que as partes apresentem rol de testemunhas (art. 357, 4.º, do Novo CPC), e, se houver a designação de audiência, as partes deverão nesse ato apresentar o rol de testemunhas (art. 357, 5.º, do Novo CPC), o que leva à conclusão de que caberá às partes o ônus de formular tal rol, mesmo sem saber se haverá prova testemunhal, considerando que na hipótese do 3.º do art. 357 do Novo CPC o saneamento será realizado de modo compartilhado em audiência. Ainda quanto à designação de produção de prova testemunhal, o 6.º repete a regra do art. 407, parágrafo único, do CPC/1973, ao prever que o número de testemunhas arroladas não pode ser superior a dez, sendo três, no máximo, para a prova de cada fato. Há, entretanto, novidade no 7.º do art. 357 do Novo CPC ao permitir que o juiz limite o número de testemunhas levando em conta a complexidade da causa e dos fatos individualmente considerados. O dispositivo claramente abre a possibilidade de o juiz deferir um número de testemunhas abaixo do máximo previsto pelo parágrafo anterior, em poder que deve ser utilizado com extrema ponderação, considerando que o convencimento na maioria das vezes, não se limita apenas ao juiz que produz a 112

113 prova em primeiro grau, mas também aos desembargadores que julgarão a futura e provável apelação. Segundo o art. 357, 8º, do Novo CPC, sendo determinada a produção da prova pericial, o juiz deve nomear o perito e fixar de imediato o prazo para a entrega do laudo (art. 465 do Novo CPC) e, se possível, estabelecer, desde logo, um calendário para a sua realização. No sistema consagrado no art. 331 do CPC/1973, o saneamento do processo era realizado, em regra, por meio de uma audiência chamada de audiência preliminar. O saneamento escrito ficava reservado para demandas que tinham como objeto direitos que não admitiam transação ou quando as circunstâncias da causa evidenciassem ser improvável sua obtenção. O sistema do novo diploma processual parece ter prestigiado o saneamento escrito do processo, já que, nos termos do art. 357, 3º, do Novo CPC, está reservada a realização de audiência apenas para as causas de maior complexidade em matéria de fato ou de direito, ainda que pareça ser possível ao juiz sua designação em causas de pequena ou nenhuma complexidade 577. Trata-se, naturalmente, de situação excepcional, considerando-se que a maioria das demandas é de pequena complexidade e dessa forma não exigirá a designação de uma audiência para seu saneamento e organização. É ainda mais interessante notar que além da dualidade de formas de saneamento e organização do processo, também haverá diferentes técnicas procedimentais a serem empregadas a depender do caso concreto. Afinal, o 3º do art. 357 do Novo CPC prevê que, havendo audiência, o saneamento será feito em cooperação com as partes 578, podendo o juiz, inclusive, nesse ato convidar às partes a integrar ou esclarecer suas alegações. Trata-se do chamado saneamento compartilhado. Significa dizer que sendo o saneamento feito por escrito, não haverá cooperação das partes, sendo, portanto, um ato praticado unilateralmente pelo juiz. Já no saneamento oral, ainda que sob o comando do juiz, o ato será colegiado, em cooperação entre ele e as partes. Para a realização das audiências de saneamento e de organização do processo 113

114 deve haver um intervalo mínimo de uma hora entre elas. A exigência do 9º do art. 357 do Novo CPC pretende evitar que a audiência não receba a atenção que merece. Afinal, seu cabimento está condicionado, ao menos em regra, a situações de maior complexidade fática e/ou jurídica. A norma busca evitar que audiências de saneamento e organização sejam designadas em intervalo de tempo muito curto, o que naturalmente levará o juiz a conduzi-las de forma a cumprir sua pauta do dia, o que pode conspirar contra o princípio da cooperação que deve nortear a atuação de todos, do juiz em especial, no saneamento compartilhado do processo. Segundo o Enunciado 298 do Fórum Permanente de Processualistas Civis (FPPC), a audiência de saneamento e organização do processo em cooperação com as partes poderá ocorrer independentemente de a causa ser complexa. Trata-se de conclusão correta, porque cabe ao juiz a tarefa de definir qual a melhor forma de sanear o processo no caso concreto. Mas não há razões para acreditar que na prática isso ocorra, bem ao contrário. Certamente será mais frequente ver juízes saneando processos complexos por escrito do que vê-los saneando de forma compartilhada processos simples. Seja como for, não vejo espaço para alegação de nulidade do processo nesse caso. Não há razão para o Superior Tribunal de Justiça modificar seu entendimento a respeito do poder do juiz em definir a forma escrita ou oral do saneamento do processo. A realização ou não de audiência, portanto, não deve gerar qualquer nulidade no processo. Não há no art. 357 do Novo CPC previsão a respeito da intimação das partes para comparecerem à audiência, até porque os atos que serão nela praticados são postulatórios, de forma que a intimação ocorrerá normalmente por publicação na Imprensa Oficial em nome dos advogados. Há duas novidades no Novo Código de Processo Civil que independem de terem sido saneado e organizado o processo de forma oral ou escrita. Nos termos do 1º do art. 357 do Novo CPC, realizado o saneamento, as partes têm o direito de pedir esclarecimentos ou solicitar ajustes, no prazo comum de cinco dias, findo o qual a decisão se torna estável. Trata-se de preclusão que vincula tanto 114

115 as partes como o juízo, de forma que aquilo que foi esclarecido e decidido não possa ser mais modificado 579. A previsão é importante porque a decisão de saneamento e organização do processo não está prevista no art do Novo CPC como recorrível por agravo de instrumento, de forma que esse pedido de esclarecimento e ajustes será a única forma de as partes se insurgirem contra a decisão, indiscutivelmente de natureza interlocutória. A exceção fica por conta do capítulo referente à distribuição do ônus da prova, recorrível por agravo de instrumento nos termos do inciso XI do art do Novo CPC. Acredito que mesmo no saneamento compartilhado realizado em audiência, na qual a responsabilização pelos atos praticados deve ser repartida entre o juiz e as partes, é possível a aplicação do art. 357, 1º, do Novo CPC. É verdade que nesses casos os pedidos de esclarecimentos e ajustes devam ser mais raros, mas mesmo tendo contribuído na construção do saneamento e organização do processo a palavra final é sempre do juiz, não tendo sentido retirar das partes a única forma que tem de impugnação contra a decisão judicial. Deve-se tomar cuidado com a parte final do dispositivo ora comentado, quando prevê que não havendo a manifestação das partes no prazo de cinco dias a decisão se torna estável. Ainda que não compreenda exatamente por que o legislador não se valeu do termo preclusão parece ser esse o seu objetivo. A preclusão, entretanto, parece não ser o mais saudável ao processo e, por essa razão, é criticável a previsão legal a respeito da estabilidade da decisão. Na realidade, a prevista estabilidade deve ser interpretada à luz da natureza das matérias decididas no saneamento e na organização do processo e nos poderes do juiz. As delimitações de fato e de direito não podem realmente ser modificadas após o saneamento do processo? Ainda que seja indispensável alguma estabilidade e segurança ao processo, caso surja um fato novo que seja imprescindível para a formação do convencimento do juiz, a decisão que fixa os fatos controversos realmente não poderá ser alterada? E na hipótese de uma lei superveniente, ou mesmo um novo entendimento jurisprudencial a respeito da matéria jurídica discutida, a decisão sobre as questões de direito relevantes para a solução do mérito continuará inalterável? 115

116 É bem verdade que nesse caso poder-se-á alegar que circunstâncias supervenientes exigem nova decisão e não mudança de decisão anteriormente proferida. Mas o que dizer do deferimento dos meios de prova? O juiz não poderá determinar um meio de prova que não foi deferido anteriormente se passar a entender que sua produção é importante para a formação de seu convencimento? Com os poderes instrutórios reconhecidos no art. 370 do Novo CPC ao juiz é difícil responder positivamente a essa questão. Apesar de não concordar com a estabilidade plena da decisão de saneamento e organização do processo, entendo que quanto à distribuição do ônus da prova será importante o juiz não poder mudar seu posicionamento após esse momento procedimental. E também por essa razão se torna ainda mais inacreditável que a decisão de saneamento e organização do processo não possa ser impugnada por agravo de instrumento. Segundo o 2.º do art. 357 do Novo CPC, as partes podem apresentar ao juiz, para homologação, delimitação consensual das questões de fato e de direito a que se referem os incisos II e IV do dispositivo. A norma deve ser interpretada com o devido cuidado porque não parece viável uma limitação quanto aos fatos ou direitos, ainda que desejada pelas partes, se isso inviabilizar a prestação de tutela jurisdicional de qualidade 580. Imagino que o juiz, se entender que sem aquela questão de fato ou de direito não tem como decidir com qualidade a demanda judicial, não deve homologar o acordo entre as partes. O próprio dispositivo faz menção à necessidade de homologação, e só depois dela a delimitação passa a vincular as partes e o juiz, não sendo, portanto, um negócio processual bilateral como o previsto no art. 190 do Novo CPC, mas sim um acordo plurilateral, do qual devem participar as partes e o juiz

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118 4 FASE INSTRUTÓRIA.1. INTRODUÇÃO Na petição inicial, o autor precisa expor os fundamentos de fato e de direito que embasam o seu pedido (causa de pedir). Com a apresentação da contestação, o réu poderá tornar controvertidos os fatos ou apenas as cons.equências jurídicas que o autor pretende deles extrair. Em suma, a controvérsia pode ser exclusivamente de direito, ou também de fato. No primeiro caso, não há necessidade de provas (exceto os casos excepcionais do art. 376, em que o juiz pode exigir a comprovação da vigência e do teor do direito municipal, estadual, estrangeiro ou consuetudinário). Mas se houver fatos controvertidos, ele dará às partes a oportunidade de comprová-los , Provas são os meios utilizados para formar o convencimento do juiz a respeito de fatos I controvertidos que tenham relevância para o processo. 2. NATUREZA JURiDICA DAS PROVAS É tradicional e antiga a controvérsia a respeito da namreza jurídica das normas sobre provas. A lei substancial trata, em alguns dispositivos, da forma dos negócios jurídicos, que podem servir tanto como solenidade indispensável à sua constituição (forma ad solemnitatem) quando para provar-lhes a celebração (forma ad probationem). Parece-nos que a lei substancial não trata propriamente da questão das provas, mas das formas dos negócios jurídicos. Nos casos em que a lei diz que o contrato, para ter-se por celebrado precisa respeitar determinada forma, somente a comprovação de que esta foi obedecida servirá para demonstrar-lhe a existência. É isso o que diz o art. 406 do CPC, ao estabelecer que quando a lei exigir o instrumento público como da essência do negócio, não se admitirá nenhuma outra prova para suprir-lhe a falta. Mas o problema da prova é aqui reflexo, ou indireto: não se admite outra prova porque sem a obediência àquela forma o negócio não se terá celebrado. Nesse sentido, a lição de Hermenegildo de Souza Rego, para quem as formas ad solemnitatem refogem ao tema da prova e estão associadas ao da própria formação do negócio jurídico 3 3 Hermenegildo de Souza Rego, Natureza das normas sobre provas, p

119 Vil B Do Processo e do Procedimento 467 A disciplina das provas hoje é, acertadamente, feita pelo Código de Processo Civil, que as considera como formas de convencimento do juiz, a respeito de fatos controvertidos. Daí resulta a conclusão de que deva prevalecer o caráter processual das normas jurídicas que tratam das provas. 3. CLASSIFICAÇÃO DAS PROVAS a) Quanto ao objeto podem ser diretas ou indiretas: 11 diretas: aquelas que se ligam diretamente ao fato que se pretende demonstrar, como o recibo ao pagamento ou o instrumento ao contrato; ~ indiretas: aquelas que não se prestam a demonstrar diretamente o fato a ser provado, mas algum outro fato a ele ligado e que, por meio de induções ou raciocínios, poderá levar à conclusão desejada. Exemplo: testemunhas que declaram estar o litigante viajando, em determinada data, e em razão disso não podendo ser ele o autor da conduta lesiva. b) Quanto ao sujeito a prova pode ser pessoal ou real: 1!1 prova pessoal é aquela prestada por uma pessoa a respeito de um fato, como a ouvida de testemunhas ou o depoimento pessoal das partes; 1!1 prova real é a obtida pelo exame de determinada coisa, como a inspeção judicial ou perícia feita sobre ela. c) Quanto à forma, pode ser oral ou escrita: llil oral é a colhida verbalmente, como os depoimentos das partes e das testemunhas; líl escrita é a que vem redigida, como os documentos e perícias. 4. OBJETO DA PROVA..., O objeto da prova são os fatos controvertidos relevantes para o julgamento do processo. Para que o juiz profira o julgamento, é preciso que forme sua convicção a respeito dos fatos e do direito controvertidos. Para que se convença do direito, não é preciso que as partes apresentem provas, porque ele o conhece Uura novit curia), salvo as hipóteses do art em que pode exigi-las quanto à vigência de direito estadual, municipal, estrangeiro ou consuetudinário, o que será feito por meio de certidões ou pareceres de juristas estrangeiros ou locais. 5. FATOS QUE NÃO PRECISAM SER COMPROVADOS No item anterior, foi visto que somente os fatos relevantes para a causa precisam ser comprovados. Assim, dispensam prova aqueles que não terão nenhuma repercussão no desfecho do processo e os irrelevantes. 119

120 468 Direito Processual Civil Esquematizado Marcus Vinicius Rios Gonçalves Mas mesmo entre os fatos relevantes, há alguns que não precisam ser comprovados. O art. 374 do CPC os enumera:, FATOS NOTÓRIOS f-~~~---~ ~ OS AFIRMADOS POR UMA DAS PARTES E CONFESSADOS PELA OUTRA r-~~ i OS ADMITIDOS NO PROCESSO COMO INCONTROVERSOS EM CUJO FATOR MILITA PRESUNÇÃO LEGAL DE EXIST~NCIA OU DE VERACIDADE IJ São aqueles do conhecimento geral da comunidade em que o processo tramita. Não é preciso que sejam de conhecimento global, bastando que sejam sabidos pelas pessoas da região. Por exemplo: que no Rio de Janeiro há grande afluxo de turistas estrangeiros, ou que, em determinadas épocas, a crise econômica assolou o país ou determinada região. 13 O que foi confessado pela parte contrária, seja expressamente, seja por falta de impugnação específica, não se tornou controvertido e apenas sobre o que há controvérsia exige-se prova. Pressupõe-se que o fato admita confissão. 1!1 Essa hipótese assemelha-se à anterior, porque pressupõe também a incontrovérsia, que dispensa a instrução. Aqui há um consenso entre os litigantes a respeito de determinado fato. m Há dois tipos de presunção que podem ser estabelecidas lpor lei: a absoluta (juris et de jure) e a relativa (juris tantum). Se houver a primeira, nenhuma prova se admitirá que seja contrária ao fato alegado; se for a segunda, aquele que alegou o fato não precisará comprová-lo, mas o seu adversário poderá fazer prova contrária. A revelia é um exemplo em que há presunção relativa dos fatos alegados na petição inicial PRESUNÇÕES E IN DI CIOS No item anterior, foi visto que não há necessidade de provar os fatos, ainda que relevantes, a respeito dos quais milite presunção legal de existência ou veracidade. As presunções podem ser divididas em duas categorias: 11 as legais, que podem ser relativas ou absolutas, conforme admitam ou não prova em contrário, como visto no item anterior; 111 as que decorrem da observação do que normalmente acontece, chamadas presunções simples ou hominis, como a de culpa daquele que, dirigindo um veículo, colide contra a traseira do carro que segue à frente. As presunções, que pertencem ao tema da dispensa de provas, não se confundem com os indícios, que são começos de prova. São sinais indicativos da existência ou veracidade de um fato, mas que, por si sós, seriam insuficientes para prová-lo. No entanto, somados a outras circunstâncias ou a outros indícios, podem fazê-lo. PRESUNÇÕES I INDÍCIOS 11 São pressuposições da existência ou veracidade de 11 São sinais indicativos da existência ou veracidade um fato, estabelecidas por lei, ou como decorrência de determinado fato qüe, por si sós, não são suficienda observação do que ocorre normalmente. Haven- tes para demonstrá-lo. No entanto, somados a outras do presunção, dispensa-se a produção da prova. As circunstâncias ou indicias, podem fazê-lo. decorrentes de lei podem ser relativas ou absolutas, conforme admitam ou não prova em contrário. 120

121 VIl lll Do Processo e do Procedimento Presunções simples ou hominis Vêm mencionadas no art. 375 do CPC, que autoriza o juiz a decidir com base nas regras de experiência comum, que resultam da observação do que normalmente acontece e das regras de experiência. Têm aplicação subsidiária na falta de normas jurídicas particulares que tratem do assunto. Constituem o corpo de conhecimento que resulta da experiência e do senso comum. Incluem, além disso, conhecimentos específicos que são acessíveis às pessoas em geral, como os relativos a fatos históricos, ou, por exemplo, a cálculos aritméticos, que dispensem conhecimento especializado. O Código Civil, no art. 230, exclui a aplicação das presunções simples aos casos em que a lei exclui a prova testemunhal. 7. PROVA DE FATO NEGATIVO É tradicional no direito a afirmação de que os fatos negativos não podem ser provados, mas apenas os afirmativos. Só seria possível demonstrar a existência de um fato, e não o contrário, razão pela qual os fatos negativos não precisam ser provados (negatio non sunt probanda). Por exemplo: é condição da usucapião especial que o possuidor não tenha nenhum outro imóvel, urbano ou rural, no País. Não lhe seria possível fazer tal prova, o que exigiria certidões negativas de todos os cartórios de registro de imóveis no Brasil. Mas o adversário do possuidor pode provar que ele tem algum imóvel, juntando a certidão do cartório correspondente. Mas há fatos negativos que podem ser provados: é possível que eu prove não ter imóveis em determin~da circunscrição imobiliária, ou que não fui a determinada festa, porque estava em outro local, ou que não viajei em determinado período, pois estive trabalhando. Não se pode exigir prova dos fatos negativos quando eles forem imprecisos: não é possível provar que uma pessoa não tenha nenhum outro imóvel, ou que nunca tenha ido a uma festa, ou que nunca tenha vi:úado; mas é possível a prova de que não tenha imóvel em determinada circunscrição, ou não tenha ido a uma festa específica, ou feito certa viagem. 8. O JUIZ E A PRODUÇÃO DA PROVA A prova é destinada a convencer o juiz, a respeito dos fatos controvertidos. Ele é o destinatário da prova. Por isso, sua participação na fase instrutória não deve ficar relegada a um segundo plano, de mei-o espectador das provas requeridas e produzidas pelas partes: cumpre-lhe decidir quais as necessárias ou úteis para esclarecer os fatos obscuros. Mas ele nem sempre terá condições de saber que provas são viáveis. Por exemplo: se há testemunhas do fato, se existe algum documento que possa comprová-lo. Por isso, a produção de provas deverá resultar de atuação conjunta das partes e do juiz. Cumpre àquelas, na petição inicial, contestação, fase 121

122 ~~-"' ~J". (:~ ':. 470 Direito Processual Civil Esquematizado Marcus Vinicius Rios Gonçalves ordinatória e fase instrutória requerer as provas por meio das quais pretendam convencer o juiz. E a este decidir quais são efetivamente necessárias e quais podem ser dispensadas, podendo determinar prova que não tenha sido requerida, ou indeferir prova postulada, cuja realização não lhe pareça necessária. O art. 370 do Código de Processo Civil atribui ao juiz poderes para, de ofício, determinar as provas necessárias. Ele deve valer-se desse poder para esclarecer os fatos relevantes para o julgamento da causa. É dever do juiz proferir a melhor sentença possível, e, para isso, é indispensável que os fatos sejam aclarados. Se as partes não requereram ou produziram provas suficientes, e o juiz verifica que há outras que, realizadas, poderão esclarecer os fatos, permitindo-lhe julgar com mais confiança, deve determiná-las, ainda que o processo verse sobre interesse disponível. A disponibilidade do direito não afasta a exigência, válida para todos os processos e de interesse público, de que o juiz realize sempre o melhor julgamento possível. Há casos em que, ainda que todas as provas tenham-se esgotado, os fatos não se aclararam. A lei apresenta regras de julgamento, que devem ser aplicadas para que o juiz, apesar disso, possa sentenciar, obrigação da qual ele não se exime: são as regras do ônus da prova, aplicáveis apenas se os fatos não foram elucidados, e não há outras provas. Se houver outra que possa trazer luz sobre o ocorrido, o juiz deve determiná-la, ainda que não tenha sido requerida por nenhum dos litigantes. Ao fazê-lo, o juiz não perderá a imparcialidade. Antes, mostrar-se-á devotado ao seu ofício, e diligente na busca da verdade real. O princípio dispositivo é mitigado no que concerne à produção de provas: sendo possível, o juiz deve buscar a verdade real, determinando de ofício as provas necessárias à formação do seu convencimento. 9. ÔNUS DA PROVA O juiz não se exime de sentenciar, alegando que os fatos não foram esclarecidos. Não há possibilidade do non liquet, em que ele se recusa a julgar, aduzindo que não conseguiu formar a sua convicção. Há casos em que, esgotadas as provas possíveis, os fatos não ficaram suficientemente esclarecidos. A situação não é incomum: há fatos controvertidos, a respeito dos quais cada litigante tem uma versão e dos quais não há provas, pois ninguém os presenciou ou documentou. Porém, o juiz precisa decidir. A lei processual formula uma série de regras aplicáveis somente na hipótese de, no momento do julgamento, os fatos não terem ficado suficientemente esclarecidos. São as regras do ônus da prova, cuja função é indicar qual dos litigantes sofrerá as consequências negativas advindas da falta de comprovação. Se o juiz, concluída a instrução, formou o seu convencimento sobre os fatos, não terá necessidade de socorrer-se delas. Bastará extrair as consequências jurídicas pertinentes ao caso. Não aclarados os fatos, o juiz, para poder sentenciar, verificará a quem cabia o ônus de prová-los: será esse o litigante que sofrerá as consequências negativas da falta ou insuficiência de provas. 122

123 VIl 111 Do Processo e do Procedimento 471 A aplicação das regras do ônus da prova deve ficar reservada à hipótese de terem sido esgotadas as possibilidades de aclaramento dos fatos. Se ainda houver prova que o auxilie, deverá o juiz mandar produzi-la, de ofício, na forma do art. 370 do CPC. As regras do ônus da prova vêm formuladas no art. 373 do CPC A prova como ônus As partes não são obrigadas a produzir provas a respeito do que alegarem. Elas terão o ônus de fazê-lo. O ônus distingue-se da obrigação, porque esta é a atividade que uma pessoa faz em benefício da outra. O devedor, por exemplo, tem a obrigação de pagar ao credor. O ônus é a atividade que a pessoa desempenha em favor de si mesma, e não da parte contrária. O litigante tem o ônus de contestar, o que lhe trará o benefício de tornar controvertidos os fatos; sem isso, sofrerá a consequência desfavorável decorrente da sua omissão. Quem tem o ônus da prova é aquele que sofrerá as consequências negativas que advirão da ausência daquela prova no processo. A prova é uma espécie de ônus reflexo, decorrente de um ônus primário, que é o de alegar. Cada uma das partes tem o ônus de apresentar a sua versão dos fatos: o autor o fará na petição inicial, e o réu, na contestação. Aqueles que se tornaram controvertidos precisarão ser comprovados, em regra, por quem os alegou: ao menos em geral. ao autor cumprirá provar os fatos constitutivos de seu direito; e ao réu os fatos extintivos, impeditivos ou modificativos do direito do autor (CPC, art. 373) Ônus da prova- aspecto subjetivo e objetivo As regras do ônus da prova podem ser examinadas em dois aspectos: subjetivo e objetivo. Do ponto de vista objetivo, elas são regras de julgamento, dirigidas ao juiz da causa, que devem orientá-lo ao proferir sentença, na hipótese de os fatos não terem ficado suficientemente esclarecidos. Não devem ser utilizadas em qualquer circunstância, mas apenas na de terem sido esgotadas as possibilidades de elucidação dos fatos controvertidos. Ao aplicá-las, o juiz imporá àquele que tinha o ônus de provar as consequências negativas da insuficiência ou falta de provas. Como decorrência do aspecto objetivo, deflui o subjetivo. A lei, ao estabelecer quem sofrerá as consequências negativas decorrentes da falta de provas, norteará os litigantes a respeito daquilo que compete a cada um deles demonstrar. Quando o art. 373 estabelece que cumpre ao autor a prova dos fatos constitutivos de seu direito, diz, ao mesmo tempo, ao juiz e ao autor, quem sofrerá as consequências negativas da falta de prova desses fatos. O juiz as aplicará ao proferir o julgamento; e o autor se orientará, no curso do processo, sobretudo na fase instrutória, com a consciência de que cabe a ele essa prova. Os aspectos objetivo e subjetivo do ônus da prova são indissociáveis: ao indicar como o juiz deverá se orientar no julgamento, em caso de falta de provas, a lei 123

124 472 Direito Processual Civil Esquematizado Marcus Vinicius Rios Gonçalves também indica como cada uma das partes deve comportar-se a respeito da instrução. Os ônus da prova, conquanto regras de julgamento, interessam diretamente às partes, que sofrerão as consequências negativas ou positivas da sua distribuição Distribuição do ônus da prova O art. 373 do CPC dispõe que: liil cumpre ao autor a prova dos fatos constitutivos do seu direito; 1!1 cumpre ao réu a prova da existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor. Essas duas regras podem ser condensadas em uma única, assim resumida: O ônus da prova, em regra, cabe a quem alega determinado fato. Isso vale não apenas para as partes, mas para todos aqueles que intervenham no processo. a 9.4. A distribuição diversa do ônus da prova No item anterior, foram indicadas as regras do ônus da prova. Mas, pode haver a inversão, que consiste na modificação da regra natural de distribuição dos ônus da prova. Convencional Legal Judicial Essa classificação leva em conta a causa da inversão, se a vontade dos litigantes, determinação legal ou judicial. Ela terá relevância tanto para as partes quanto para o juiz e repercutirá no aspecto subjetivo e objetivo do ônus da prova. Do ponto de vista objetivo, se o juiz verificar, na sentença, que determinado fato não ficou comprovado, carreará as consequências negativas não para o litigante a quem elas seriam normalmente atribuídas, mas ao seu adversário. Do ponto de vista subjetivo, o autor não terá mais de provar os fatos constitutivos de seu direito, 124

125 VIl 1!1 Do Processo e do Procedimento cumprindo ao réu fazer prova contrária; e o réu não terá mais o ônus de provar os fatos extintivos, modificativos ou impeditivos do direito do autor, cabendo ao autor a prova contrária. Cada uma das hipóteses de inversão será examinada em itens separados Inversão convencional Podem as partes, por convenção, alterar as regras naturais de distribuição do ônus da prova? O parágrafo único do art. 373, 3, do CPC, o autoriza, ao estabelecer que a distribuição diversa do ônus da prova também pode ocorrer, salvo quando: "I - recair sobre direito indisponível da parte; II - tornar excessivamente difícil a uma parte o exercício do direito". Se o dispositivo impede a inversão nos casos a que alude, por exclusão a autoriza nos demais casos. Se o processo versa sobre interesse disponível, no qual as partes podem renunciar aos seus direitos, reconhecer juridicamente o pedido do adversário ou transigir, não há óbice a que convencionem a modificação do ônus. A primeira condição é que o processo verse sobre interesse disponível, porque inverter o ônus da prova consiste em uma forma de disposição. Além disso, é indispensável que não torne a uma das partes excessivamente difícil o exercício do direito. Do contrário, a fase instrutória tornar-se-ia praticamente inútil, dada a dificuldade de o interessado provar os fatos a respeito dos quais recai o ônus que lhe foi atribuído. A parte pode até mesmo renunciar ou reconhecer o pedido; mas não pode promover a inversão de forma a dificultar em demasia a prova de um fato, o que obrigaria o juiz a abrir a fase instrutória, embora já saiba de antemão que o fato não pode ser provado, ou só o pode com muita dificuldade. Isso impiicária transtornos que não se coadunam com a natureza pública do processo. O Código de Defesa do Consumidor veda expressamente a inversão do ônus da prova em detrimento do consumidor (art. 51, VI). Nos casos em que for permitida, a convenção sobre o ônus da prova pode ser celebrada antes ou durante o processo Inversão legal A lei brasileira estabelece numerosos casos de presunção. Ao fazê-lo, torna dispensável a prova do fato alegado, que se presume verdadeiro, podendo ou não admitir prova contrária, conforme o grau de intensidade da presunção. Há aquelas que admitem prova contrária-são as presunções relativas; e as que não a admitem -presunções absolutas. No item 6 deste capítulo, foi visto que as presunções podem decorrer de lei ou da observação do que normalmente acontece. No primeiro caso, serão legais; no segundo, simples ou hominis. Havendo presunção legal ou simples, a parte fica dispensada de provar o fato cuja existência ou veracidade é presumida. 125

126 474 Direito Processual Civil Esquematizado Marcus Vinicius Rios Gonçalves Também a presunção simples encontra amparo legal, uma vez que o art. 375 do CPC estabelece: "O juiz aplicará as regras de experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece e ainda as regras de experiência técnica, ressalvado, quanto a estas, o exame pericial". Alguns exemplos ajudarão a esclarecer de que forma as presunções invertem o ônus da prova. O art. 37, 6, da Constituição Federal estabelece a presunção de culpa das pessoas jurídicas de direito público e de direito privado prestadoras de serviço público pelos danos que, no exercício de suas atividades, causarem a terceiros. Em regra, a vítima de danos que ajuíza ação postulando o ressarcimento tem o ônus de provar a culpa do réu, fato constitutivo do seu di.reito (art. 373 do CPC). Mas se o réu for uma das pessoas jurídicas mencionadas no dispositivo constitucional, a culpa será presumida, o autor ficará dispensado de prová-la, incumbindo àquela a prova contrária, de que o acidente deu-se por caso fortuito, força maior, culpa da vítima ou de terceiro. Há uma presunção legal que redunda em inversão do ônus da prova. Outro exemplo: a vítima de um acidente ajuíza ação de ressarcimento contra o causador, aduzindo que houve colisão traseira. Ora, as regras de experiência comum indicam que a colisão traseira é, quase sempre, provocada porque o veículo que está atrás não manteve a distância mínima ou não atentou para o fluxo dos veículos à frente. Ainda que a lei nada mencione, as regras de experiência (presunção simples ou hominis) fazem concluir que a culpa é daquele que colidiu na traseira, cumprindo a este demonstrar o contrário (por exemplo, que houve uma marcha à ré do carro da frente) Inversão judicial Pode ocorrer em duas hipóteses: a) quando houver lei que a autorize. Não se confunde com a inversão legal, pois não decorre direta e automaticamente da lei. Ela apenas atribui ao juiz o poder de determiná-la, nos casos concretos, desde que verificadas determinadas circunstâncias. Distingue-se da presunção legal, em que a lei preestabelece os requisitos, não dando ao juiz nenhuma margem de avaliação; na judicial, a lei condiciona a inversão a que, a critério do juiz, estejam presentes determinadas circunstâncias; b) em razão das peculiaridades da causa relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo nos termos do caput do art. 373 ou à maior facilidade de obtenção de prova, caso em que o juiz redistribuirá o ônus por decisão fundamentada. Nessa segunda hipótese, o legislador acolheu a regra da dinâmica do ônus da prova, que poderá ser alterada se, com a aplicação da regra geral, o juiz verificar que a prova ficou excessivamente difícil para quem normalmente teria o ônus, ou excessivamente fácil para a parte contrária. Trata-se da aplicação da regra de que o ônus deve ser atribuído a quem manifestamente tenha mais facilidade de obter ou produzir a prova. Se pela regra geral do caput o juiz verificar que o ônus será atribuído a quem terá muita dificuldade de dele se desincumbir, ou perceber que a parte contrária terá maior facilidade de obtenção da prova, ele redistribuirá dinamicamente o ônus. Ao fazê -lo, porém, ele deverá fundamentar a sua decisão para que haja o controle dos 126

127 VIl 111 Do Processo e do Procedimento fundamentos em que ela se embasou. O juiz, então, deverá indicar o motivo por que a prova seria impossível ou excessivamente difícil para a parte que, em princípio, tinha o ônus. ou mais fácil para quem não o tinha, de forma a propiciar a alteração. Não haverá discricionariedade do juiz, que deverá observar estritamente os requisitos do art. 373 e seus parágrafos. O exemplo mais importante de inversão judicial autorizada por lei é o do art. 6, VIII, do Código do Consumidor, que assegura, entre os direitos básicos do consumidor: "a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for hipossuficiente, segundo as regras ordinárias da experiência". São duas as hipóteses que autorizam a inversão. Basta que uma delas esteja presente para que o juiz a autorize: 11 Quando for verossímil a alegação: o Código do Consumidor busca a facilitação da defesa dos direitos do consumidor. Para tanto, estabelece que o juiz pode considerar provado um fato não em um juízo de certeza, mas de verossimilhança ou de probabilidade. Cumprirá ao juiz, no caso concreto, examinar se isso é suficiente para formar-lhe o convencimento, dispensando, então, a prova do fato plausível. 111 Quando o consumidor for hipossuficiente: há dois tipos de hipossuficiência e ambas podem levar à inversão. A econômica, quando o consumidor tiver dificuldade de comprovar o alegado por força de dificuldades materiais, que o impedem, por exemplo, de se defender adequadamente ou de conseguir as provas necessárias; e a técnica, quando a comprovação de fatos relacionados à coisa fornecida ou ao serviço prestado demande conhecimento técnico de que o consumidor não dispõe, mas que pode ser facilmente obtido pelo fornecedor, que conhece os aspectos técnicos do produto ou serviço que colocou no mercado O problema do momento em que o juiz deverá promover a inversão do ônus Nos casos de inversão convencional e legal, a dificuldade não se coloca. Os litigantes saberão desde logo que há a inversão, seja porque transigiram a respeito, seja porque existe lei estabelecendo a presunção em favor de um deles. Mas a inversão judicial pode trazer alguns problemas, porque depende de uma decisão judicial, que pode ou não deferi-la. Como visto, o ônus da prova tem um aspecto subjetivo, uma vez que orienta as partes, serve de norte para que elas saibam quem sofret á as consequências nega" tivas, caso os fatos não sejam elucidados. Ora, se o juiz só fizesse a inversão do ônus na sentença, o litigante prejudicado por ela seria surpreendido. Ele poderia ter deixado de produzir provas na fase de instrução, sabendo que o ônus era do adversárto. Com a inversão na sentença, ele terá sido prejudicado, sem ter tido a oportunidade de requerer e produzir as provas que, se tivesse sabido de antemão, teria postulado. 127

128 476 Direito Processual Civil Esquematizado Marcus Vinicius Rios Gonçalves Por isso, embora o ônus da prova seja, antes de qualquer coisa, regra de julgamento, caberá ao juiz na decisão de saneamento e organização do processo definir a sua distribuição, observado o art. 373, cabendo agravo de instrumento sempre que houver redistribuição, na forma do art. 373, 1 (art , XI). Com isso, evita-se ofensa ao princípio do contraditório e eventual cerceamento de defesa daquele que ficaria prejudicado com a alteração do ônus, já que a questão será apreciada em momento processual tal que permita àquele a quem o ônus for carreado socorrer-se das provas necessárias. As consequências da falta de provas do fato só serão aplicadas na sentença, mas o juiz, ao redistribuir o ônus, fará com que as partes, de antemão, saibam a quem elas serão carreadas, para que possam diligenciar no sentido de obtê-las. i!i A inversão do ônus da prova e a responsabilidade com as despesas As regras do ônus da prova, fixadas no art. 373 do CPC são dirigidas, principalmente, ao juiz; sua função é possibilitar o julgamento, ainda que os fatos não tenham ficado suficientemente esclarecidos, orientando, ainda que reflexamente, o comportamento das partes. Os arts. 82 e 95 do CPC tratam da responsabilidade pelas despesas que a produção das provas pode causar. A regra é de que o vencido as suporte, mas há as que precisam ser antecipadas, quando não se sabe quem serão os vencedores e vencidos. Manda a lei que seja quem requereu a prova; se tiver sido o Ministério Público fiscal da ordem jurídica ou houver, de ofício, sido determinada pelo juiz, cumprirá ao autor antecipá-las (art. 82), salvo quando se tratar de prova pericial, caso em que, se determinada de ofício ou a requerimento de ambas as partes os valores a sere~ antecipados, deverão ser rateados (art. 95). Quando o Ministério Público é autor, como nas ações civis públicas, por exemplo, tem-se entendido que cumpre a ele, na forma da Súmula 232 do STJ. Têm sido frequentes, na prática, os casos em que um dos litigantes não postula, propriamente, a inversão do ônus da prova, mas da responsabilidade pela antecipação das despesas com a sua produção, alegando ou que uma coisa se confunde com a outra, ou que uma coisa decorre da outra. Conquanto ainda haja grande controvérsia doutrinária e jurisprudencial a respeito, tem prevalecido o entendimento de que a inversão do ônus da prova não se confunde com a da responsabilidade pela antecipação dessas despesas. Já foi decidido que, pelo Superior Tribunal de Justiça no REsp , Rei. Min. Teori A. Zavascki, publicado em DJU de 20 de maio de 2009, que: l PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. SISTEMA FINANCEIRO DE HABI TAÇÃO. COBERTURA PELO FCVS. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. ART. 6, VIII, DA LEI N /90. ADIANTAMENTO DAS DESPESAS PROCESSUAIS. 1 "A simples inversão do ônus da prova, no sistema do Código de Defesa do Consumidor, não gera a obrigação de custear as despesas com a perícia, embora sofra a parte ré as consequências decorrentes de sua não produção. (... ) O deferimento da inversão do ônus 128

129 VIl c Do Processo e do Procedimento 477 da prova e da assistência judiciária, pelo princípio da ponderação, impõe que seja beneficiado o consumidor, com o que não cabe a orientação jurisprudencial sobre o custeio da prova pericial nos termos da Lei n /50" (REsp , 2" Seção, Min. Menezes Direito, DJ de 13/02/2006). Precedentes das Thrmas da 1" e 2" Seções. 2. Recurso especial provido. Como deixa claro o acórdão, a inversão do ônus não gera a responsabilidade pela antecipação de despesas. Mas pode fazer com que a prova, que seria requerida por um dos litigantes, passe a sê-lo pelo adversário a quem o ônus foi carreado, com o que cumprirá a este antecipá-las. 10. HIERARQUIA DAS PROVAS Entre os princípios fundamentais do processo civil referentes às provas, destaca -se o da persuasão racional, ou livre convencimento. fundamentado, consagrado no art. 371 do CPC. O juiz as aprecia livremente, devendo apresentar os motivos que o levaram à decisão. Como regra, a lei processual não estabelece hierarquia entre as provas: em princípio, nenhuma tem valor superior à outra, cabendo ao juiz sopesá-las ao formar o seu convencimento. Não se acolheu entre nós o princípio da prova legal, segundo o qual cada uma tem um valor previamente fixado por lei, cabendo ao juiz decidir de acordo com isso, sem sopesá-la. A adoção desse princípio implicaria restrição completa ao do livre convencimento, uma vez que o juiz não teria possibilidade de avaliar as provas colhidas, previamente ponderadas pelo legislador. Não poderia, por exemplo, julgar com base em prova testerimnhal, desconsiderando as conclusões da pericial, se a lei dissesse que esta deve sobr~por-se àquela; ao passo que no sistema da persuasão racional, ele as avaliará livremente. Existem resquícios, em nosso ordenamento, do sistema de prova legal: o art. 406, por exemplo, dá valor absoluto ao instrumento público, como prova do ato cuja celebração o exige. Mas mais do que prova, o instrumento público é necessário para a própria formação e constituição do negócio jurídico, cuja existência se pretende demonstrar. O sistema da persuasão racional - acolhido entre nós - é intermediário entre o da prova legal, já mencionado, e o da convicção íntima, pelo qual o juiz teria liberdade absoluta para avaliar as provas, sem necessidade de nem mesmo fundamentar a sua decisão: o que valeria é a sua impressão pessoal, sendo desnecessário que indique quais as provas que a sustentam. O juiz poderia julgar apenas com base na ciência privada ou na opinião que tem dos fatos. O Tribunal do Júri é o único exemplo, em nosso sistema;. da adoção dei princípio da convicção íntima. O sistema da persuasão racional exige que o juiz indique as razões pelas quais formou o seu convencimento, expondo fundamentos e provas que o sustentam. Conquanto haja o livre convencimento, é preciso que seja motivado e racional, amparado nos elementos dos autos e que deles resulte como consequência lógica. 129

130 478 Direito Processual Civil Esquematizado Marcus Vinicius Rios Gonçalves 11. PROVAS ILÍCITAS A Constituição Federal, no art. 5, LVI, veda a utilização de provas obtidas por meios ilícitos, sem fazer nenhuma ressalva. O art. 369 do CPC, por sua vez, estabelece que "As partes têm o direito de empregar todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos ainda que não especificados neste Código, são hábeis para provar a verdade dos fatos, em que se funda o pedido ou a defesa e influir eficazmente na convicção do juiz". A contrario sensu, são vedadas a provas ilegais ou moralmente ilegítimas. A ilicitude da prova pode decorrer de duas causas: da obtenção por meios indevidos (exs.: emprego de violência ou grave ameaça, tortura, entre outras); e do meio empregado para a demonstração do fato (exs.: as interceptações telefônicas, a violação de sigilo bancário, sem autorização judicial, a violação de sigilo de correspondência). A proibição da prova ilícita suscita importantes questões: se é ou não absoluta, se admite mitigações, decorrentes do princípio da proporcionalidade; se atinge tão somente a própria prova, ou se também macula as dela d,erivadas (teoria dos frutos da árvore contaminada). Embora hqja enormes controvérsias doutrinárias a respeito, existe posição firmada do Supremo Tribunal Federal de que a prova obtida por meios ilícitos e as provas dela derivadas não podem ser admitidas no processo, salvo por razões de legítima defesa. Houve a adoção da teoria dos frutos da árvore contaminada: a ilicitude de uma prova impedirá que não só ela, mas também as provas dela derivadas, sejam utilizadas. Por exemplo, se forem apreendidos ilicitamente livros de contabilidade de uma empresa, uma perícia que venha a ser realizada neles também não poderá ser empregada. A teoria da proporcionalidade, desenvolvida, sobretudo, pelo direito alemão, autoriza a utilização da prova ilícita, quando os bens jurídicos que se pretende proteger são mais elevados do que aqueles que se pretende preservar com a vedação. Assim, se a prova foi colhida com violação ao direito de intimidade, mas serve para preservar, por exemplo, a vida ou a saúde da coletividade, seria autorizada. Embora não acolhido, entre nós, o princípio da proporcionalidade, tem-se admitido a utilização da prova ilícita, quando obtida para legítima defesa, própria ou de terceiro: a interceptação telefônica de uma ligação feita por sequestrador, por exemplo A gravação e a interceptação telefônica A gravação telefônica é feita por um dos participantes da conversa, ao passo que a interceptação é feita por um terceiro, que não a protagonizava. A gravação pode ser validamente utilizada como prova, mesmo sem o consentimento do outro participante. Se um dos protagonistas grava uma conversa que tem com outro ao telefone, a gravação pode ser por ele utilizada como prova, ainda que o outro não consinta. Não há violação ao direito de intimidade porque foi feita por um dos participantes. 130

131 VIl Do Processo e do Procedimento 479 Diferente é a interceptação, em que há afronta ao direito de intimidade: a conversa está sendo gravada sem o conhecimento e o consentimento dos envolvidos. Não pode ser usada como prova, salvo nos casos especiais previstos em lei. No Brasil, a interceptação só poderá ser usada como prova quando autorizada pelo juiz para instrução em processo crime. É o que estabelece o art. 5, XII, da CF, regulamentado pela Lei n /96, que trata da interceptação telefônica por ordem judicial para instrução processual penal. 12. PRODUÇÃO ANTECIPADA DE PROVAS Introdução É uma ação autônoma, que pode ter natureza preparatória ou incidental e que visa antecipar a produção de determinada prova, realizando-a em momento anterior àquele em que normalmente seria produzida. Não tem, como no CPC de 1973, natureza de ação cautelar, ajuizada sempre em razão de risco de a prova perecer. O risco é uma das justificativas da antecipação da prova, mas não a única. A antecipação pode ser deferida para viabilizar a autocomposição ou outro meio adequado de solução do conflito, ou para permitir ao interessado que tenha prévio conhecimento dos fatos, que possa justificar ou evitar o ajuizamento da ação. Poderá ser aforada no curso de processo já ajuizado, em fase anterior àquela na qual normalmente a prova seria produzida, ou antes do ajuizamento do processo, quando terá a natureza de procedimento preparatório. Em regra, as provas são produzidas depois de concluída a fase postulatória e a ordinatória. Isto é, depois que o réu foi citado ofereceu contestação, que o juiz determinou as providências preliminares, verificou que não é caso de julgamento antecipado e saneou o processo, abrindo-se a fase de instrução. Há três razões para que a prova seja antecipada: o temor de que se perca. É a causa mais comum de antecipação. Teme-se, por exemplo, que uma testemunha não possa ser ouvida no momento oportuno, seja porque vai se mudar para local distante, seja porque está muito doente ou muito idosa. Teme o autor que pretende reformar o imóvel em que habita que, no momento oportuno, a prova pericial fique prejudicada, diante da alteração do local. Pode ser realizada uma vistoria ad perpetuam rei memoriam, que retratará a situação do imóvel antes da reforma; prova suscetível de viabilizar a autocomposição ou outro meio de solução de conflito. Já foi mencionado que o CPC estimula a autocomposição e outras formas alternativas de solução do conflito, a ponto de tratar delas entre as suas normas fundamentais (art. 3, 3 ). Pode ocorrer que, somente com a colheita de determinada prova, as partes possam tentar conciliar-se, uma vez que só por meio dela poderão ter mais conhecimento do que de fato ocorreu, ou das consequências de determinado fato. Assim, a prova pode servir para definir de forma mais evidente e precisa os contornos do conflito de interesse, viabilizando a autocomposição. Ela também fornecerá maiores elementos ao conciliador e ao 131

132 480 Direito Processual Civil Esquematizado Marcus Vinicius Rios Gonçalves mediador para tentarem sugerir uma solução consensual, ou para conduzir as partes a que a encontre; 111 o prévio conhecimento dos fatos que possa justificar ou evitar o ajuizamento de ação. Há casos em que a antecipação servirá para colheita de elementos necessários ao ajuizamento da demanda. Sem ela, o autor terá dificuldade para ajuizar a ação. Por exemplo: ele pretende postular indenização porque houve um vazamento, que trouxe graves danos para o seu apartamento. Porém, não sabe ainda qual foi a causa, nem onde se originou, se na coluna central do prédio, caso em que a responsabilidade será do condomínio, ou se no encanamento do imóvel superior, caso em que a ação deverá ser dirigida contra o seu titular. A antecipação da prova servirá para que colha elementos necessários para a ação principal. O mesmo se passa em relação à exibição de um documento. Sem ele, a parte não terá condições de saber se pode ou não ajuizar a ação. A antecipação fornecerá elementos ao interessado para que decida se deve ou não ajuizá-la. Só na primeira dessas situações a produção antecipada de provas terá natureza cautelar, porque só então será considerada tutela provisória de urgência, que depende do perigo da demora. Nas demais, será satisfativa, porque não servirá para afastar um risco, mas para fornecer uma informação, um esclarecimento. Ela servirá para colher elementos para a eventual propositura da ação, mas não haverá a urgência, que é,o requisito indispensável das tutelas cautelares Tipos de provas que podem ser antecipadas Não há nenhuma restrição à antecipação das provas. Ela pode ter por objeto qualquer meio de prova, seja documental, seja testemunhal, seja pericial. O depoimento pessoal da parte, a respeito de algum fato que possa ser relevante para o desfecho do processo, também pode ser antecipado. É certo que se a ação ainda não foi aforada, nem há contestação, não será possível saber quais os fatos controvertidos a ensejar confissão. Mas sempre será possível saber quais fatos são relevantes para a causa, e uma das partes pode ter interesse em colher o depoimento da outra, quando houver perigo de que, oportunamente, essa prova não possa ser colhida, ou quando isso possa esclarecer os fatos relacionados ao conflito. Não há óbice a que seja antecipada a inspeção judicial, quando houver necessidade de que o juiz verifique, com os próprios olhos, a situação atual de determinado bem. O arrolamento de bens, quando tiver por finalidade apenas a documentação e não a prática de atos de apreensão, também pode ser deferido como antecipação de prova ~ Procedimento A produção antecipada de provas é ação autônoma e pode ter caráter preparatório, quando ainda não ajuizada a ação; ou caráter incidental, se já há ação, que ainda não alcançou a fase de instrução. Só não haverá interesse se o processo principal já estiver nessa fase. Ao se mencionar que ela pode ter caráter preparatório, não se quer dizer com isso que, deferida e acolhida a antecipação e 132

133 VIl El Do Processo e do Pr:xedimento 481 realizada a prova, haverá necessidade de ajuizamento de uma ação principal. Entre as finalidades da antecipação está justamente a de viabilizar a autocomposição, ou evitar, por meio de um melhor esclarecimento dos fatos, o ajuizamento da ação. A expressão "procedimento preparatório" deve ser entendida aqui em sentido amplo: ela pode servir para preparar uma eventual autocomposição, ou preparar a decisão dos interessados a respeito da propositura ou não de eventual ação. Quando incidental, ela pode ser requerida tanto pelo autor quanto pelo réu da ação. O autor da ação principal pode ser requerido da antecipação de provas e vice-versa. Por exemplo: em ação de indenização proposta por A contra B, o réu tem necessidade de antecipar a ouvida de uma testemunha, ou uma prova pericial. Requererá, então, a antecipação, em face do autor da ação. R Petição em que se requer a antecipação A petição inicial em que o interessado requerer a antecipação da prova deve indicar a justificativa para que ela seja deferida. Deve haver certa liberalidade do juízo na avaliação da justificativa, já que a antecipação da prova não traz prejuízos ou coerção para a parte contrária. Isso não significa que ele pode deferir a medida, sem razão para tanto; no entanto, deve ser tolerante no exame dos requisitos. Além da justificativa, o requerente mencionará com precisão os fatos sobre que há de recair a prova. Sem isso, o juiz não teria, por exemplo, como questionar a testemunha ou a parte, porque não saberá quais os fatos relevantes para a causa, e o perito não saberia que. aspec:os técnicos investigar Competência O art. 381, 3, afasta a controvérsia que havia na vigência do CPC anterior a respeito da aptidão da ação de produção antecipada de provas para prevenir o juízo. O dispositivo acolhe a lição da Súmula 263 do extinto Tribunal Federal de Recursos: "A produção antecipada rie provas, por si só, não previne a competência para a ação principal". De fato, ele dispõe que "A produção antecipada da prova não previne a competência do juízo para a ação que venha a ser proposta". Como a medida não exige ação principal, nem mesmo a indicação da lide e seus fundamentos, não haveria razão para que seu ajuizamento prevenisse a competência. A regra geral de competência da antecipação de prova é dada pelo art. 381, 2, do CPC: "A produção antecipada de prova é da competência do juízo do foro onde esta deve ser produzida ou do foro de domicílio do réu".. o a:rt. 381, 4", estabeieee a competência.subsidiária da JustiÇaEstadual para colheita antecipada de provas em processos dos quais participem a União, suas entidades autárquicas ou empresa pública federal, se na localidade não houver vara federal. Mas isso não significa que a mesma autorização se estenda para a ação principal, para a qual a Justiça Estadual só terá competência subsidiária nos casos expressamente previstos na Constituição Federal. 133

134 482 Direito Processual Civil Esquematizado Marcus Vinicius Rios Gonçalves I I Procedimento Ao receber a petição inicial, o juiz, se a entender justificada, determinará a antecipação da prova e a citação dos interessados para acompanhá-la. A citação deve se aperfeiçoar antes que a produção da prova tenha início. Serão citados todos aqueles que, de qualquer forma, possam ter interesse, seja porque venham a participar de futura ação como partes ou intervenientes, seja porque figurem já no processo principal, seja porque a prova possa ser útil para uma autocomposição da qual eles participem. Sem a citação para participação, a prova não pode ser usada contra eles por causa do princípio do contraditório. Se uma das partes pretende valer-se da denunciação da lide no processo principal, convém que a informe na antecipação preventiva, para que o futuro denunciado seja incluído e possa participar da prova, que só assim poderá ser eficaz em relação a ele. A citação dos interessados será determinada a requerimento do réu ou de ofício pelo juiz. A razão do dispositivo é permitir ao juiz determinar a inclusão de eventuais interessados na prova que possam não ter sido mencionados pelo requerente. A citação só se fará necessária quando a antecipação de prova' tiver caráter contencioso, pois em determinadas circunstâncias pode não o ter. Por ex~mplo: quando não há nenhum conflito de interesses, mas se tem interesse em obter a comprovação de determinado fato. É possível, por exemplo, que duas pessoas, querendo compor-se, mas sem elementos a respeito da extensão de determinados danos sobre os quais a composição possa versar, ingressem juntas em juízo e conjuntamente peçam a antecipação da prova, com a finalidade de que a composição se viabilize. Nesse caso, não haverá citação. Deferida a antecipação de prova e a citação do interessado nos casos em que ela é necessária, se a prova for oral, o citando será intimado da data da audiência, para que possa comparecer; e se for pericial, terá oportunidade de formular quesitos e indicar assistente técnico que acompanhe a produção da prova. Se a prova consistir em inspeção judicial, será intimado para acompanhá-la. O art. 382, 3, do CPC não permite defesa no procedimento de antecipação da prova. Diante dos termos peremptórios da lei, tem-se a impressão de que não se poderia nem mesmo impugnar a justificativa apresentada para antecipação. Parece-nos, no entanto, que isso se poderá fazer, já'que não há aí propriamente uma defesa, mas a indicação de que faltam os requisitos autorizadores do deferimento da medida. É comum que o requerido queira já se defender de uma futura e eventual ação principal, aduzindo, por exemplo, que não é culpado pelos danos, ou que o contrato celebrado com o autor não tem a extensão que este lhe quer dar. Não é esse o momento apropriado para fazê-lo, já que, na ação de antecipação, o juiz não se pronunciará sobre os fatos e sobre as consequências deles decorrentes, mas tão somente sobre a necessidade de antecipação da prova e sobre a regularidade de sua realização. Apesar da vedação de defesa, o réu poderá arguir a incompetência do juízo, ou o impedimento e a suspeição do juiz, já que isso repercutirá sobre a própria validade das provas colhidas. 134

135 VIl 11 Do Processo e do Procedimento 483 Diante da limitação do direito de defesa, caso o requerente desista da ação de antecipação, a homologação independerá do consentimento do réu. A audiência, a prova pericial e a inspeção judicial far-se-ão na forma prevista no CPC, sem nenhuma peculiaridade. Além da prova deferida originariamente, outras provas, desde que relacionadas ao mesmo fato, também poderão ser produzidas no mesmo procedimento, em caráter antecipado, desde que isso não acarrete excessiva demora na conclusão do procedimento (art. 382, 3, do CPC). Ao final, verificando o juiz que a prova foi colhida regularmente, apenas a homologará, não cabendo recurso de seu pronunciamento. Caberá recurso de apelação apenas nos casos em que ele indeferir totalmente a antecipação de prova requerida. Se ele a indeferir parcialmente, não caberá agravo de instrumento, já que a hipótese não se insere naquelas mencionadas no art Após a homologação. os autos permanecerão em cartório durante um mês, sendo lícito aos interessados solicitar as certidões que quiserem (art. 383, do CPC). Não há prazo para a propositura de eventual ação principal: a prova continuará eficaz mesmo depois de transcorrido o prazo de um mês. 13. MEIOS DE PROVA Os meios de prova são os mecanismos que podem ser usados no processo para investigação e demonstração dos fatos. São os tipos genéricos de provas que se admitem no processo. Não se confundem com as fontes de prova que são os elementos específicos, concretos, que servem para a comprovação de um fato em determinado processo. Um exemplo ajudará a clarificar a diferença: a prova testemunhal é um meio de prova; determinada testemunha, que tenha presenciado um fato relevante para o processo é uma fonte de prova. Deve haver uma correlação direta entre uma fonte e um meio de prova. Uma informação só poderá ser obtida de uma fonte se isso se enquadrar entre os meios de prova. A respeito destes, vigora a regra geral do art. 369 do CPC, que tem grande relevância, por sua generalidade: 1 "As partes têm o direito de empregar todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, para provar a verdade dos fatos em que se funda o pedido ou a defesa e influir eficazmente na convicção do juiz". São meios de prova: 11 A confissão. A ata notarial. 11 O depoimento pessoal das partes. A prova testemunhal. 11 A prova documental. 11 A prova pericial. 11 A inspeção judicial. 135

136 484 Direito Processual Civil Esquematizado Marcus Vinicius Rios Gonçalves Esse rol não pode ser considerado taxativo, diante do caráter genérico do art Além dos meios acima elencados, qualquer outro será admitido, desde que não viole a lei ou a moral. 14. DA PROVA DOCUMENTAL Introdução A prova documental tem se tornado cada vez mais comum, diante da tendência moderna de documentar todas as relações jurídicas, ainda que a lei não exija forma escrita. Quando ela o exige, o documento deixa de ser apenas um mecanismo de prova e se torna da essência do próprio negócio jurídico, que não pode ser provado por outras maneiras. É o que ocorre na hipótese do art. 406 do CPC. Afora essas situações, em que o documento é da essência do negócio, a prova documental é apenas um meio de prova, que, conquanto muito prestigiado, não pode ser considerado, a priori, como de maior valor do que os outros. Não se acolheu no Brasil o princípio da prova legal, em que o legislador prefixa o valor de cada uma, retirando do juiz o poder de apreciá-las consoante a sua livre convicção. Entre nós, foi acatado o princípio do livre convencimento motivado, e a prova documental deve ser examinada em conjunto com as demais, podendo o juiz preteri-la, caso se convença, por outros meios, que o documento não retrata a realidade. Feitas essas considerações, é forçoso admitir que a prova documental tem sido o meio preferido entre os contratantes para demonstrar a existência de um negócio jurídico. São raros os contratos celebrados verbalmente- ainda que a lei o autorize Conceito de documento A ideia de documento sugere, em um primeiro momento, a de prova escrita, de um conjunto de palavras e expressões que usam o papel como suporte. Mas não se restringe a isso, e abrange outras formas de representação material, como a mecânica, a fotográfica, a cinematográfica, a fonográfica e outras (CPC, art. 422). Além dessas, pode -se acrescentar o documento eletrônico, disciplinado pela Lei n /2006. O que há de comum entre todos esses meios, para que possamos qualificá-los de documentos? O fato de utilizarem um suporte material, que não precisa ser necessariamente o papel, mas que deverá ser anexado aos autos para apreciação do juiz. Esse suporte pode ter as mais variadas formas: fotografias, gravações eletrônicas, CDs ou DVDs, filmagens. O que distingue a prova documental das demais é que ela constitui sempre uma fonte de prova passiva, a informação que ela contém pode ser obtida da coisa em si, sem que haja necessidade de ser extraída pelo juiz, ou por-_que~ quer que seja. É diferente do que ocorre, por exemplo, com a prova testemunhal e com a pericial, em que há necessidade de participação do juiz e das partes Classificação dos documentos São várias as formas pelas quais os documentos podem ser classificados. É possível usar como critérios de distinção autoria, conteúdo e forma. 136

137 VIl 1!1 Do Processo e do Procedimento 485 li Quanto à autoria Os documentos podem ser autógrafos ou heterógrafos. Os primeiros são produzidos pelo próprio autor da declaração de vontade nele contida. Contém, portanto, uma declaração de próprio punho, daquele que emite a sua vontade; já os segundos são aqueles redigidos por outrem, que não o autor da declaração de vontade. Um contrato particular é geralmente autógrafo, porque redigido e assinado pelos próprios contratantes; já uma escritura pública é um documento heterógrafo, porque redigida por um tabelião, que dela faz constar a vontade dos declarantes. Ainda quanto à autoria, os documentos podem ser públicos ou privados, conforme expedidos por funcionários públicos em geral (art. 405 do CPC) ou por particulares. IJ!I Quanto ao conteúdo Os documentos podem ser narrativos ou dispositivos. Os primeiros são aqueles que contêm declarações referentes a um fato, do qual o subscritor tem conhecimento. Os segundos contêm uma declaração de vontade e se prestam a constituir, extinguir ou modificar as relações jurídicas. Os contratos são exemplos de documentos dispositivos. 'ti Quanto à forma Os documentos podem ser solenes, quando exigirem forma especial para sua validade, como as escrituras públicas nos contratos de compra e venda de imóveis, ou não solenes, quando não exigem forma especial. RESUMO DA CLASSIFICAÇÃO DOS DOCUMENTOS Autógrafo- redigido pelo autor da declaração de vontade Dispositivo - contém declaração de vontade Solene..:... dependede forma especial Não. solene- não exige forma especial 137

138 486 Direito Processual Civil Esquematizado Marcus Vinicius Rios Gonçalves Exibição de documento ou coisa Nem sempre o documento que se pretende usar como prova está em poder do interessado. Há casos em que está com o adversário, ou com terceiro. Em determinados casos, a lei concede à parte interessada o poder de exigir daquele que tem consigo o documento que o apresente em juízo, seja ele a parte contrária, seja alguém de fora do processo. Há duas maneiras pelas quais se pode conseguir a vinda dos documentos aos autos: a requisição judicial e a exibição de documento. a A requisição judicial (CPC, art. 438) Será cabível quando o documento estiver em poder de repartições públicas, obrigadas a cumprir a ordem do juiz de que o apresentem. De acordo com o art. 438 do CPC, o juiz "requisitará às repartições públicas em qualquer tempo ou grau de jurisdição: I - as certidões necessárias à prova das alegações das partes; li -os procedimentos administrativos,nas causas em que forem interessados a União, os Estados, os Municípios, ou as respectivas entidades da administração indireta". A requisição será feita pelo juiz de ofício ou a requerimento da parte interessada no documento, sempre que este for relevante para a apuração dos fatos e não puder ser obtido sem a intervenção judicial. As requisições judiciais têm sido cada vez mais usadas nos processos em geral, seja para a obtenção de documentos, seja de informações relevantes, como o endereço do réu ou de alguma testemunha fundamental, ou a existência de bens ou contas bancárias do devedor, que permitam tornar eficaz a execução. Conquanto o art. 438 aluda apenas as repartições públicas, nada impede que as requisições sejam dirigidas às entidades particulares, que terão de cumpri-las. Por exemplo, as de prontuários médicos a hospitais, ainda que particulares, ou a órgãos de proteção de crédito Da exibição de documentos O CPC prevê mecanismo pelo qual é possível que um dos litigantes exija do outro, ou de terceiro, a apresentação de documentos que estejam em poder deles. Ele tem por fim obrigar aquele que detém o documento - seja parte ou terceiro - a apresentá-lo. Só existirá o procedimento da exibição do documento, previsto nos arts. 396 e ss., sejqr.requerido por uma das partes, esteja o documento em poder da outra ou de terceiro. O juiz pode, de ofício, determinar a apresentação de documentos em juízo. Mas não se estará diante do procedimento de exibição. A circunstância de o documento estar em mãos do adversário ou de terceiro fará diferença, quando do julgamento do incidente, porque, de acordo com a lei, o adversário não tem propriamente o dever de apresentar o documento que tenha consigo, mas tão somente o ônus de fazê-lo, se o juiz o determinar. É o que resulta da 138

139 VIl Do Processo e do Procedimento leitura do art. 400 do CPC: "Ao decidir o pedido, o juiz admitirá como verdadeiros os fatos que, por meio do documento ou da coisa, a parte pretendia provar". Se o juiz determinar a exibição de documento a um dos litigantes, este não estará propriamente obrigado a apresentá-lo, mas se não o fizer, sofrerá as consequências negativas da sua omissão: os fatos que se pretendia comprovar por meio dos documentos sonegados reputar-se-ão verdadeiros. Mas, se o documento estiver em mãos de terceiro, terá este a obrigação de cumprir a determinação judicial de apresentá-los, e não somente o ônus. O descumprimento implicará desobediência e o juiz tomará as providências necessárias para que a sua ordem seja cumprida. O art. 403, parágrafo único, estabelece as medidas que podem ser tomadas em caso de desrespeito, pelo terceiro, da determinação judicial. Diante das distinções acima mencionadas, é preciso examinar, em capítulos separados, a exibição dirigida em face d<j parte e em face de terceiro Exibição dirigida em face da parte A exibição será requerida pela parte interessada-- autor ou réu- em petição que individualizará, da maneira mais completa possível, o documento, para que o adversário possa defender-se ou entregá-lo, se entender que é o caso. É indispensável que o autor do incidente esclareça a finalidade da prova, indicando os fatos que se relacionam ao documento, porque, caso o juiz o. acolha, e ele não seja apresentado, haverá a presunção de veracidade dos fatos que com ele se pretendia comprovar. Por fim, é fundamental que se esclareçam as circunstâncias em que o requerente se funda para afirmar que o documento existe e se acha em poder do adversário. Para o acolhimento do incidente, é indispensável que fique demonstrada a posse do documento pelo adversário. O juiz não pode determinar que alguém apresente um documento que não possui. Não cumpridas as exigências mencionadas, previstas no art. 397 do CPC, o juiz indeferirá de plano o incidente. Do contrário, mandará intimar o requerido para, querendo, oferecer resposta no prazo de cinco dias. Este poderá tomar uma entre várias atitudes. Poderá: apresentar o documento solicitado, caso em que o incidente será encerrado; oferecer resposta, no prazo de cinco dias. São duas as defesas de que poderá valer-se: a de que não tem o documento consigo, ou de que não está obrigado a apresentá-lo, podendo escusar-se. Se negar a posse, o juiz "permitirá que o requerente prove, por qualquer meio, que a declaração não corresponde à verdade" (art. 398, do CPC). O ônus da prova, como evidencia o dispositivo legal, é do requerente. O requerido pode ainda escusar-se de apresentar o documento, nas hipóteses do art. 404 do CPC, quando conéernente a negócios da própria vida da família; a sua apresentação puder violar dever de honra; a publicidade do documento redundar em desonra à parte ou a terceiro, bem como a seus parentes 139

140 488 Direito Processual Civil Esquematizado" Marcus Vinicius Rios Gonçalves consanguíneos ou afins até o terceiro grau; ou lhes representar perigo de ação penal; se a exibição acarretar a divulgação de fatos, a cujo respeito, por estado ou profissão, deva guardar segredo; se subsistirem outros motivos graves que, segundo o prudente arbítrio do juiz, justifiquem a recusa da exibição; ou houver disposição legal que justifique a recusa. Mas a escusa não será admitida nas hipóteses do art. 399, se o requerido tiver obrigação legal de exibir; se ele aludiu ao documento ou à coisa, no processo, com o intuito de constituir prova; ou se o documento, por seu conteúdo, for comum às partes; B silenciar, deixando transcorrer in albis o prazo de cinco dias, caso em que o juiz presumirá a posse do requerido e a inexistência de causas de recusa. Em qualquer das situações supramencionadas, o juiz julgará o incidente, acolhendo-o ou rejeitando-o. No primeiro caso, admitirá como verdadeiros os fatos que, por meio do documento ou da coisa, a parte pretendia provar (art. 400, do CPC). Ele não imporá a apresentação do documento, sob pena de desobediência, nem utilizará meios coercitivos para forçar a entrega, mas se valerá do disposto no art. 400 do CPC. E mes!jlo a presunção de veracidade decorrente da omissão não deverá ser tida por absoluta, mas apenas relativa, não podendo admitir-se como verdadeiros os fatos que sejam contrariados por outros elementos de convicção dos autos. Como a exibição dirigida contra a parte contrária tem natureza de mero incidente, a solução será dada por decisão interlocutória, contra a qual o recurso adequado será o de agravo de instrumento (art , VI) Exibição requerida em face de terceiro Se o documento estiver em poder de terceiro, o juiz pode determinar a sua apresentação de ofício, ou a requerimento de qualquer das partes. Se for a requerimento, não constituirá um mero incidente (nem poderia, pois o terceiro não é parte no processo originário), mas terá a natureza de uma nova ação incidente. Disso decorrem importantes consequências. Como o requerimento tem natureza de ação (actio exhibendum), deverão ser observados os requisitos da petição inicial, previstos nos arts. 319 e 320 do CPC. O terceiro figurará como réu da ação incidente. Por isso, não basta que seja intimado a responder, devendo ser citado, como determina o art. 401, para oferecer resposta no prazo de quinze dias. Ao defender-se, poderá apresentar as mesmas alegações que o adversário poderia oferecer, se o pedido de exibição fosse oferecido contra ele, mencionadas no item anterior: que não tem o documento ou a coisa consigo, ou que estão presentes as causásâe-êscusã, previstas no art. 404 do CPC. O juiz, se houver necessidade de provas, designará audiência, na qual poderá ouvir as partes, e eventuais testemunhas, e, em seguida, proferirá decisão (art. 402), contra a qual caberá agravo de instrumento (art , VI). O art. 403, parágrafo único, do CPC enumera as consequências imputáveis ao terceiro que não cumpre a determinação judicial de apresentar os documentos: o juiz concederá prazo de cinco 140

141 VIl EJ Do Processo e do Proced mento 489 dias para que os apresente em cartório ou em outro lugar designado; se a ordem for descumprida, será emitido mandado de apreensão, com requisição de força policial se necessário, sem prejuízo de responsabilidade por crime de desobediência. Além disso, imporá ao terceiro pagamento de multa, sem prejuízo de outras medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias para assegurar a efetivação da sua decisão.!i Esquema da exibição de documento REQUISIÇÃO : EXIBIÇÃO CONTRA A PARTE I EXIBIÇÃO CONTRA TERCEIRO 1!1 É a determinação, feita pelo juiz, às repartições públicas, para que apresentem em juízo documentos relevantes para o processo. Vem tratada no art. 438 do CPC. Admite-se que o juiz ainda possa requisitar documentos de entidades particulares, como, por exemplo, prontuários médicos de internações hospitalares. A exibição é sempre requerida por uma das partes. O suscitante deverá precisar o documento, o fato que se pretende provar por seu intermédio e as razões pelas quais se supõe que ele esteja com o suscitado. O juiz o ouvirá em cinco dias. Ele poderá apresentar o documento, oferecer escusa nos casos autorizados por lei, ou demonstrar que não o tem consigo. Se acolhido o incidente (por decisão interlocutória), o juiz considerará provados os fatos que com ele se pretendia demonstrar. É sempre suscitada pela parte, e será dirigida contra terceiro se for este que tiver em seu poder o documento. Tem natureza de ação autônoma incidente, uma vez que o terceiro não integra o processo originário. Por isso, ele será citado para contestar em quinze dias (art. 401). O terceiro poderá negar a obrigação de apresentar o documento ou a sua posse, caso em que, se necessário, o juiz designará audiência e julgará, por decisão interlocutória, podendo condenar o réu a apresentar os documentos, sob pena de busca e apreensão e' outras medidas coercitivas, sem prejuízo de responsabifidade criminal. R Força probante dos documentos O CPC trata da força probante dos documentos em subseção que se estende dos arts. 405 a 429. Diante do princípio do livre convencimento motivado, o juiz deve considerar a prova documental em conjunto com as demais, salvo na hipótese em que a escritura pública seja da essência do negócio (CPC, art. 406). Mas o que provam os documentos juntados aos autos? A lei processual, para responder a essa pergunta, distingue entre os públicos e os particulares. De acordo com o art. 405 do CPC, os documentos públicos fazem prova "não só da sua formação, mas também dos fatos que o escrivão, o chefe de secretaria, o tabelião, ou o servidor declarar que ocorreram em sua presença". Isto é, de sua própria regularidade formal e da regularidade na sua formação, mas não da veracidade de seu conteúdo. Por exemplo, um boletim de ocorrência, documento público, faz prova de que o particular compareceu à Delegacia de Polícia ou ao Posto Policial e prestou as decla-. rações a:rr contiôas; mas rião que os fatos ocorreram na forma por ele~ declarada. Nesse sentido: "O boletim de ocorrência faz com que, em princípio, se tenha como provado que as declarações dele constantes foram efetivamente prestadas, mas não que seu conteúdo corresponde à verdade. O art. 364 (atual 405) do CPC não estabelece a presunção juris tantum da veracidade das declarações prestadas ao agente público, de modo a inverter o ônus da prova" (STJ, RT 726/206). 141

142 490 Direito Processual Civil Esquematizado Mar cus Vinicius Rios Gonçalves A eficácia probante dos documentos particulares vem tratada no art. 408 do CPC: "As declarações constantes do documento particular, escrito e assinado, ou somente assinado, presumem-se verdadeiras em relação ao signatário". Mas a presunção é relativa, pois cede se o subscritor comprovar, por exemplo, que não o assinou livremente Eficácia das reproduções A respeito da força probante das reproduções, é preciso distinguir quatro espécies de documentos: os públicos, os particulares, as peças do processo e os digitalizados. 11 Sobre as cópias de documentos públicos, dispõe o art. 425, III, do CPC, que fazem a mesma prova que os originais: "As reproduções de documentos públicos, desde que autenticadas por oficial público ou conferidas em cartório, com os respectivos originais". B A regra a respeito dos documentos particulares vem estabelecida no art. 424, que assim dispõe: "A cópia de documento particular tem o mesmo valor probante que o original, cabendo ao escrivão, intimadas as partes, proceder à conferência e certificar a conformidade entre a cópia e o original". O Superior Tribunal de Justiça tem decidido que, se o documento particular está autenticado, tem a mesma força probante que o original; se não está, o seu valor dependerá de eventual impugnação do adversário. Se este não a apresentar, presumir-se-á a autenticidade. Nesse sentido, RSTJ 87/ O art. 425, IV, do CPC trata das cópias de peças do processo, aduzindo que fazem a mesma prova que os originais, "as cópias reprográficas de peças do próprio processo judicial declaradas autênticas pelo próprio advogado sob sua responsabilidade pessoal, se não lhes for impugnada a autenticidade". B Por fim, o art. 425, VI, atribui o mesmo valor que ao original "às reproduções digitalizadas de qualquer documento, público ou particular, quando juntadas aos autos pelos órgãos de Justiça e seus auxiliares, pelo Ministério Público e seus auxiliares, pela Defensoria Pública e seus auxiliares, pelas procuradorias, pelas repartições públicas em geral e por advogados, ressalvada a alegação motivada e fundamentada de adulteração" O incidente de falsidade documental Vem disciplinado nos arts. 430 a 433 do CPC que atribuem às partes a possibilidade de suscitar a falsidade de documento contra elas produzido, na contestação, na réplica ou no prazo de 15 dias, contado a partir da intimação da juntada do documento aos autos. A sua finalidade é obter a declaração judicial, com força de coisa julgada, da falsidade de documento juntado aos autos Natureza jurídica do incidente de falsidade Conquanto ainda possa haver alguma controvérsia doutrinária ou jurisprudencial, predomina amplamente o entendimento de que o incidente de falsidade tem 142

143 VIl 1!1 Do Processo e do Procedimento 491 natureza de verdadeira ação incidente, de cunho declaratório. Conquanto a ação declaratória incidental tenha sido extinta pelo CPC atual, o incidente de falsidade documental constitui um último resquício dessa espécie de mecanismo. Seu objeto é obter do juízo uma declaração definitiva sobre a falsidade ou autenticidade do documento. O art. 19, li, do CPC autoriza o ajuizamento das ações declaratórias com essa finalidade. Ajuizado o incidente, haverá uma nova ação, mas de natureza incidente, que não implica a formação de um novo processo O incidente de falsidade, o reconhecimento incidental da falsidade de documento e as ações declaratórias autônomas de falsidade É preciso fazer uma distinção importante. A parte contra quem o documento foi produzido pode arguir a sua falsidade, no curso processo, sem valer-se do incidente de falsidade. Por exemplo: em sua contestação, o réu poderá qualificar de falso um documento juntado com a inicial, sem suscitá-lo. Se a questão for relevante, o juiz poderá determinar as provas necessárias para apurar a falsidade ou autenticidade do documento, mas, se não foi suscitado o incidente, a questão só poderá ser decidida incidente r tantum, sem força de coisa julgada. Será decidida na fundamentação da sentença, não no dispositivo. Diferentemente, se a parte valer-se do incidente, o juiz declarará, no mesmo processo e com força de coisa julgada, a falsidade ou autenticidade do documento, o que figurará no dispositivo da sentença. Por fim, há ainda a possibilidade de a parte interessada valer-se de uma ação autônoma de declaração de falsidade, com fulcro no art. 19, li, do CPC: haverá uma nova ação e um novo processo. Distingue-se do incidente, porque este não forma um novo processo, prestando-se a declarar a falsidade ou autenticidade de um documento juntado a um processo em curso, para nele servir de prova dos fatos O objeto do incidente de falsidade Podem ser objeto da ação incidental de falsidade os documentos públicos e os particulares, juntados aos autos. De acordo com o art. 427 do CPC, a falsidade pode consistir em formar documento não verdadeiro, ou em alterar documento verdadeiro. Existe grande controvérsia a respeito do tipo de falsidade que pode ser objeto do incidente, se só a material ou também a ideológica. A material é a que diz respeito ao..... suporte material do documento e a ideológica, ao seu conteúdo. Como o art. 432 do CPC estabelece que, não havendo a sua retirada, nem o reconhecimento da falsidade, será determinada prova pericial, tem predominado o entendimento de que somente a falsidade material pode ser discutida, já que só ela pode ser apurada por perícia. A falsidade do conteúdo do documento não pode ser constatada, em regra, por prova técnica, mas por outros meios, o que afasta a possibilidade do incidente. 143

144 492 Direito Processual Civil Esquematizado Marcus Vinicius Rios Gonçalves Há, no entanto, numerosos acórdãos do Superior Tribunal de Justiça que têm admitido o incidente de falsidade ideológica, mas não de maneira generalizada. Em regra, o permitem quando o conteúdo do documento é meramente narrativo, e não constitutivo de situações jurídicas. Nesse sentido, o AgRg , Rei. Min. Sálvio de Figueiredo. E, mais recentemente, o AgRg no REsp 1.024~640/DF, de 16 de dezembro de 2008, Rei. Min. Massami Uyeda, no qual ficou decidido: "Esta Corte assentou que, na via do incidente de falsidade documental, somente se poderá reconhecer o falso ideológico quando tal não importar desconstituição de situação jurídica. Nesse sentido, confira-se: 'INCIDENTE DE FALSIDADE IDEOLÓGICA. (... ) I- A jurisprudência da egrégia Segunda Seção tem admitido o incidente de falsidade ideológica, quando o documento tiver caráter declaratório e o seu reconhecimento não implicar desconstituição de situação jurídica.' (AgRg no Ag /MT, 3" Turma, Rei. Min. Castro Filho, DJ ). E, ainda: Ag /MS, Rei. Min. Sidnei Beneti, DJ ; REsp /DF, Rei. Min. César Asfor Rocha, DJ ; REsp /SP, 3" Thrma, Rei. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, DJ In casu, a ora recorrente busca, por meio do incidente de falsidade, o reconhecimento de que o recibo apresentado pelos agravados foi fruto de uma simulação e, por conseguinte, a declaração de nulidade do negócio. Para tanto, ele requer 'a quebra do sigilo bancário do emitente do cheque a que faz referência o recibo, a expedição de ofícios aos cartórios a fim de esclarecer os imóveis dados em pagamento e realização de audiência para colher depoimento pessoal dos signatários do recibo cuja falsidade se investiga' (fi. 427). Como se vê, a intenção do recorrente é a desconstituição de situação jurídica por meio do reconhecimento de uma falsidade ideológica, o que, à luz do entendimento acima (acompanhado pela Corte a quo), não é viável". Como se vê, os acórdãos que admitem o reconhecimento da falsidade ideológica ressalvam que o incidente não se presta ao reconhecimento de vício de vontade ou vício social, isto é, de defeitos relativos à declaração de vontade, que podem gerar a nulidade ou anulabilidade do negócio jurídico, na forma da lei civil, mas não a declaração de falsidade. As decisões que admitem o incidente de falsidade ideológica o restringem apenas a eventual narrativa contida no documento, não a declaração de vontade constitutiva de ato jurídico. As decisões que autorizam tais incidentes, fundados em falsidade ideológica. baseiam-se na permissão, concedida pelo art. 431, parte final, do CPC, de que outras provas, além da pericial, sejam produzidas. ~-H,.Z4,_ Procedimento do incidente de falsidade De acordo com o art. 430 do CPC, se o documento tiver sido juntado com a petição inicial, o réu formulará o incidente no prazo de contestação; se for juntado na contestação, o autor o apresentará na réplica; e se for juntado posteriormente, em quinze dias, a contar da intimação da juntada, feita à parte contra quem foi produzido. 144

145 Vil a Do Processo e do Procedimento 493 O prazo é preclusivo. Se ultrapassado, a parte interessada não mais poderá aforá-lo. Nada impede, porém, que suscite a questão incidente r tantum, a ser resolvida sem força de coisa julgada r:j.aterial. Nem que se valha de ação autônoma de declaração de falsidade. O incidente correrá nos mesmos autos do processo da ação originária e será suscitado por petição dirigida ao juiz da causa, na qual o suscitante arguirá o documento de falso, expondo os motivos em que funda a sua pretensão e os meios com que provará o alegado. O juiz poderá indeferi-lo de plano, se, por exemplo, verificar que não foram preenchidos os requisitos de admissibilidade, que é intempestivo, ou que o tipo de falsidade não permite a declaração incidental. Se não o fizer, intimará o sescitado para manifestar-se no prazo de quinze dias. O suscitado pode concordar em retirá-lo dos autos, reconhecendo-lhe a falsidade, caso em que, não havendo oposição do suscitante, será dispensado o exame pericial, e o juiz julgará extinto o incidente. Se ele for impugnado, o juiz ordenará a realização de prova pericial. Apesar dos termos peremptórios do art. 432 do CPC, parece-nos que o incidente pode admitir outros tipos de provas (tanto que a parte final do art. 431 determina que o suscitante informe as provas que pretende produzir), e que, em determinados casos, pode até ser dispensada a perícia, quando se verificar que, por outro meio mais eficiente, a falsidade pode ser comprovada. A arguição de falsidade que, a nosso ver, constitui o único resquício, no CPC atual, da antiga ação declan:otória incidental, será examinada no dispositivo da sentença. Além das pretensões formuladas na inicial e na reconvenção, o dispositivo conterá ainda a decisão do juiz sobre eventual falsidade do documento. Sobre ela incidirá a autoridade da coisa julgada material, o que impedirá que a questão seja rediscutida em qualquer outro processo Produção da prova documental O tema vem tratado nos úts. 396 a 399 do CPC. O primeiro desses dispositivos determina que as partes apresentem os documentos com a petição inicial e a contestação. O segundo acrescenta que, posteriormente, poderão ser juntados novos documentos, desde que para fazer prova de fatos supervenientes, ou para contrapô-los aos que foram juntados aos autos. Ambos poderiam levar à conclusão de que a lei não permite a juntada de documentos novos, após ã. fase postulatória, salvo se referentes a fatos supérveiiientes. Mas a eles tem sido dada interpretação muito mais elástica. O Superior Tribunal de Justiça tem decidido que os documentos que devem ser juntados com a inicial são apenas os indispensáveis para a propositura da demanda, uma vez que, sem eles, o juiz nem sequer a receberia. Por exemplo, a certidão imobiliária, nas ações reivindicatórias de bens imóveis. 145

146 494 Direito Processual Civil Esquematizado Marcus Vinicius Rios Gonçalves Outros documentos, que não esses, podem ser juntados a qualquer tempo, mesmo em fase recursal, cabendo ao juiz apenas dar ciência ao adversário, permitindo-lhe que se manifeste no prazo de quinze dias. 15. A ATA NOTARIAL Entre os meios de prova, o legislador incluiu expressamente a ata notarial. Dispõe o art. 384 que "A existência e o modo de existir de algum fato podem ser atestados ou documentados, a requerimento do interessado, mediante ata lavrada por tabelião". Da ata poderão constar dados representados por imagem ou sons gravados em arquivos eletrônicos. A ata notarial é o documento lavrado por tabelião público, que goza de fé pública e que atesta a existência ou o modo de existir de algum fato. Para que o tabelião possa atestá-lo, é necessário que ele tenha ::onhecimento do fato. Por isso, será necessário que ele o verifique, o acompanhe ou o presencie. Ao fazê-lo, deverá descrever o fato, apresentando as circunstâncias e o modo em que ele ocorreu, com as informações necessárias para que o fato seja esclarecido. A ata notarial não é a atestação de uma declaração de vontade, como são as escrituras públicas, mas de um fato cuja existência ou forma de existir é apreensível pelos sentidos (pela visão, pela audição, pelo tato etc.). Ela não é produzida em juízo, mas extrajudicialmente, com a atuação de um tabelião. No entanto, como ele goza de fé pública, presume-se a veracidade daquilo que ele, por meio dos sentidos, constatou a respeito da existência e do modo de existir dos fatos. Já antes da entrada em vigor do CPC atual, a ata notarial vinha sendo utilizada por aqueles que pretendiam documentar um fato, valendo-se da ata como prova, o que era admissível porque, tal como agora, também na legislação anterior vigorava o princípio da atipicidade dos meios de prova. Eram comuns, assim, as situações em que o tabelião era chamado para atestar determinado acontecimento, como a realização de uma assembleia condominial ou societária, ou para verificar a situação de determinado bem. 16. PROVA PERICIAL Introdução Prova pericial é o meio adequado para a comprovação de fatos cuja apuração depende de conhecimentos técnicos, que exigem o auxílio de profissionais especializados. No curso do processo, podem surgir fatos controvertidos, cujo esclarecimento exija conhecimentos especializados. Por exemplo, de medicina, de engenharia, de contabilidade, entre outros. Quando isso ocorrer, tornar-se-á necessária a nomeação do perito, profissional que detém o conhecimento técnico necessário. O juiz, ainda que o detenha, não pode utilizá-lo para apuração dos fatos. Afinal, é necessário que as partes tenham oportunidade de participar da produção da prova, formulando ao perito suas questões e as dúvidas pertinentes ao caso. 146

147 VIl Do Processo e do Procedimento Espécies de perícia De acordo com o art. 464 do CPC, a perícia consiste em exame, vistoria ou avaliação: O exame consiste na análise ou observação de pessoas ou coisas, para delas extrair as informações desejadas. O perito médico examinará a pessoa, para verificar se ficou incapacitada, em virtude de acidente que sofreu, por exemplo. A vistoria é a análise de bens imóveis, que objetiva constatar se eles foram ou estão danificados. A avaliação é a atribuição de Yalor a determinado bem Admissibilidade da prova pericial Só será determinada perícia quando houver um fato controvertido, cuja apuração depende de conhecimento técnico ou científico (art. 156, do CPC). O art. 464, 1, enumera as hipóteses em que o juiz deverá indeferi-la: g a prova do fato não depender do conhecimento especial de técnico. Há certos conhecimentos que são gerais e que fazem parte do repertório das pessoas comuns, como os básicos de matemática ou de biologia. Quando apenas esse tipo de conhecimento for exigido, a perícia não será cabível. Mas, se houver necessidade de noções que fogem ao comum das pessoas, o juiz nomeará o perito, ainda que ele próprio detenha tais conhecimentos; for desnecessária em vista de outras provas produzidas. A perícia é frequentemente de realização demorada e onerosa. Se os fatos puderem ser provados por outros meios, o juiz deverá preferi-los; a verificação for impraticável. Há casos em que a perícia não se viabiliza, ou porque a pessoa ou coisa a ser examinada está inacessível, ou porque os conhecimentos técnicos que seriam necessários não estão à disposição da ciência da época. A primeira hipótese suscita a interessante questão relacionada às consequências da recusa, por uma das partes, de submeter-se a exame ou inspeção. O tema é relevante, porque não há como coagir alguém a, contra a sua vontade, submeter-se a exame físico ou médico, como ficou decidido pelo Supremo Tribunal Federal (STF -Pleno, HC /RS, Rei. Min. Marco Aurélio). Mas, se a submissão ao exame não pode ser considerada uma obrigação, deve ao menos ser considerada um ônus, pois quem se recusar sofre as consequências negativas da sua omissão. Os arts. 231 e 232 do Código Civil tratam do tema. O primeiro estabelece que "aquele que se nega a submeter-se a exame médico necessário não poderá aproveitar-se de sua recusa" e o segundo dispõe que "a recusa à perícia médica ordenada pelo juiz poderá suprir a prova que se pretendia obter como exame". Ambos mostram que da recusa pode-se extrair uma presunção de veracidade do fato que se queria demonstrar, por intermédio da perícia. Mas apenas relativa, podendo ser afastada pelo exame do contexto e das circunstâncias em que a recusa se deu, e em consonância com as demais provas colhidas. 147

148 496 Direito Processual Civil Esquematizado Marcus Vinicius Rios Gonçalves Os dois dispositivos do Código Civil ganharam reforço com a Lei n , de 29 de julho de 2009, que acrescentou o art. 2 -A, à Lei n /92, assim dispondo: "Na ação de investigação de paternidade, todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, serão hábeis para provar a verdade dos fatos. Parágrafo único. A recusa do réu em se submeter ao exame de código genético- DNA gerará a presunção da paternidade, a ser apreciada em conjunto com o contexto probatório". Esse dispositivo nada mais fez do que cristalizar o que a jurisprudência há muito vinha estabelecendo O perito 1! Requisitos para a nomeação O perito é um dos auxiliares da justiça, que assistirão o juiz, quando a prova depender de conhecimento técnico ou científico. Os requisitos para a sua nomeação são: lil que se trate de profissional legalmente habilitado ou órgão técnico ou científico; li!!j que esteja devidamente inscrito em cadastro mantido pelo tribunal ao qual o juiz está vinculado. Caso não haja nenhum profissional ou órgão cadastrado, a nomeação é de livre escolha do juiz, mas deverá recair sobre profissional ou órgão técnico ou científico comprovadamente detentor do conhecimento necessário à realização da perícia; que estejam ausentes as causas de impedimento ou suspensão, que são as mesmas aplicáveis aos juízes (arts. 144 e 145). Permite-se, ainda, que as partes capazes, de comum acordo, e desde que o processo permita a autocomposição, escolham o perito, indicando-o mediante requerimento Deveres do perito De acordo com o art. 157, "o perito tem o dever de cumprir o ofício, no prazo que lhe designar o juiz, empregando toda a sua diligência, podendo, todavia, escusar -se do encargo alegando motivo legítimo". A escusa deverá ser apresentada em quinze dias, a contar da data em que tem ciência de sua nomeação, salvo impedimento superveniente. Se o perito deixar transcorrer in a/bis o prazo, reputar-se-á renunciado o direito de alegar a escusa. Ele pode escusar-se nos casos de impedimento ou suspeição, que são os mesmos que se aplicam ao juiz. Ou por outra razão fundamen ~tada,-como por exemplo, se não detiver os conhecimentos técnicos exigíveis para o bom desempenho da função. Havendo impedimento ou suspeição, se ele não se escusar, qualquer interessado poderá suscitá-lo (art. 148, 111), caso em que se observará o procedimento do art. 148, 1 e 2 : o incidente será processado em apenso, sem suspensão do processo, ouvindo-se o perito no prazo de quinze dias. Se necessário, o juiz autorizará provas e em seguida decidirá. 148

149 VIl li! Do Processo e do Procedimento 497 O art. 158 apresenta as sanções aplicáveis ao perito que, por dolo ou culpa, prestar informações inverídicas. Além das sanções penais cabíveis, ele ficará inabilitado por dois a cinco anos de atuar em outras causas, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei, devendo o juiz comunicar o fato ao respectivo órgão de classe, para a adoção das medidas cabíveis. Além disso, o art. 468 prevê a possibilidade de substituição do perito, quando ele carecer do conhecimento necessário, ou sem motivo legítimo deixar de cumprir o encargo, no prazo que foi estabelecido. Nesta última hipótese, o juiz comunicará a ocorrência à corporação profissional a que ele pertence e poderá aplicar multa, na forma do 1 do art O perito deve limitar-se a esclarecer as questões técnicas que interessem à causa, e que lhe sejam submetidas, não podendo enveredar por questões jurídicas, nem emitir opinião sobre o julgamento. O seu papel é apenas o de fornecer subsídios técnicos para que o juiz possa melhor decidir. 111! Poderes do perito A lei processual mune o perito de poderes que são necessários para o exercício de sua função e que estão resumidos no art. 473, 3, do CPC: "Para o desempenho de sua função, o perito e os assistentes técnicos podem valer-se de todos os meios necessários, ouvindo testemunhas, obtendo informações, solicitando documentos que estejam em poder da parte, de terceiros ou repartições públicas, bem como instruir o laudo com planilhas, mapas, plantas, desenhos, fotografias e outros elementos necessários ao esclarecimento do objeto da perícia". Como o perito, por si, não tem poderes de requisição, se for necessário algum documento, solicitará que o juiz o requisite Nomeação de mais de um perito O art. 475 afastou qualquer dúvida quanto à possibilidade de nomeação de mais de um perito, quando a apuração dos fatos exigir conhecimentos técnicos relacionados a mais de uma área de especialização: "Tratando-se de perícia complexa, que abranja mais de uma área de conhecimento especializado, o juiz poderá nomear mais de um perito e a parte indicar mais de um assistente técnico" Assistentes técnicos Determinada a perícia, e nomeado o perito, as partes poderão, no prazo de quinze dias, indicar assistentes técnicos. Sua função é assisti-ias na prova pericial, acompanhando a produção e apresentando um parecer, a respeito das questões i técnicas que são objeto da prova. ; O assistente técnico, ao contrário do perito, não é da confiança do juízo, mas das 11 partes, sendo por elas contratado. Por isso, não está sujeito às causas de impedi- ( mento e de suspeiça-o. I. ', j it. 149

150 498 Direito Processual Civil Esquematizado Marcus Vinicius Rios Gonçalves Ao apresentar o seu parecer, ele pode concordar com c laudo, ou divergir, em manifestação fundamentada na qual buscará demonstrar os eq1ívocos cometidos. Sobre as críticas, o juiz poderá ouvir o perito, que poderá manter ou não as suas conclusões. Para o exercício de suas funções, o assistente tem os mesmos poderes que o perito (CPC, art. 473, 3 ). Além disso, o perito deve assegurar a eles o acesso e o acompanhamento das diligências e dos exames que realizar, com prévia comunicação, comprovada nos autos, com antecedência mínima de cinco dias O papel do juiz na prova pericial O juiz nomeia o perito de sua confiança, que detém o:> conhecimentos especializados para a produção da prova. Além disso, preside e fiscaliza a atuação dele, podendo solicitar esclarecimentos e formular indagações a respeito dos pontos controvertidos. Ao determinar a prova, deve ainda delimitar a respeito do que ela versará, isto é, qual a questão técnica controvertida, sobre a qu::tl o perito prestará esclarecimentos. Deve ainda fixar o prazo para a apresentação do 1audo, fazendo-o cumprir. Cumpre-lhe ainda fiscalizar a atuação das partes, indeferindo quesitos impertinentes, e vedando que elas, de alguma forma, possam atrapalhar a atuação do perito. Por fim, cabe-lhe verificar se ele prestou a contento m esclarecimentos, podendo substituí-lo a qualquer tempo, e determinar a realização de outra perícia, quando necessário O procedimento da prova pericial Ela pode ser determinada a requerimento das partes, do Ministério Público, ou de ofício pelo juiz. Ele nomeará o perito, e concederá às partes e ao Ministério Público o prazo de quinze dias para formular quesitos e indicar assistentes técnicos. Ele próprio poderá complementar os formulados, se entender necessário algum esclarecimento. Em regra, a determinação de perkia é feita na decisão saneadora, quando o juiz já nomeia o perito e toma as providências determinadas pelo art. 465, fixando, se possível, calendário para a realização de prova. Os quesitos são as indagações que as partes formula:n ao perito. Cumpre ao juiz fiscalizá-los, indeferindo os impertinentes, que não tenh::tm relevância ou que extrapolem os limites técnicos especializados. O prazo de quinze dias estabelecido por lei não tem sido considerado, pela jurisprudência, preclusivo. Há inúmeras decisões do Superior Tribunal de Justiça considerando que, enquanto ainda não iniciada a prova pericial, as partes podem ainda formular quesitos, complementar os já formulad::>s, indicar ou substituir o~. assistentes técnicos. Após a entrega do laudo, as partes, o Ministério Público e o juiz poderão solicitar esclarecimentos e formular quesitos suplementares ao perito. Sempre que forem apresentados por uma das partes, o juiz dará ciência à outra (art. 469, do CPC). A lei não fixa prazo para a apresentação do laudo, deixando a tarefa ao juiz, conforme seu prudente arbítrio, conforme a complexidade das questões suscitadas. 150

151 VIl 111 Do Processo e do Procedimento Cumpre ao perito respeitar o prazo fixado, podendo, no entanto, solicitar, por uma vez, prorrogação, que será concedida se a demora decorrer de motivo justificado, pela metade do prazo originalmente fixado (CPC, art. 476). O art. 477 do CPC determina que o laudo seja entregue com, pelo menos, vinte dias de antecedência da audiência de instrução e julgamento. Isso mostra que a perícia é sempre realizada antes dela, pois as partes poderão formular requerimento de ouvida do perito na audiência, para eventuais esclarecimentos sobre o laudo (art. 477, 3 ). Na prática, no entanto, tem sido mais comum que os juízes só designem audiência de instrução e julgamento depois de concluída a prova pericial, pois as possibilidades de atraso podem fazer com que a audiência originalmente marcada fique prejudicada. Cumpre ao juiz, portanto, designá-la com, pelo menos, vinte dias de distância da apresentação do laudo. Caso as partes queiram ouvir o perito, ou os assistentes técnicos, em audiência, devem requerê-lo ao juiz, apresentando as questões que lhes serão submetidas. As partes não podem formular, na audiência, questionamentos que não tenham sido previamente apresentados: como a prova versa sobre questões técnicas, o perito e os assistentes podem ter necessidade de se preparar. Por essa razão, o art. 477, 4, determina que eles sejam intimados dos quesitos e da data da audiência com, pelo menos, dez dias de antecedência. Para que as partes e seus assistentes possam acompanhar a produção da prova, o art. 474 determina que eles sejam intimados da data e do local designados pelo juiz ou indicados pelo perito para início da produção da prova. Apresentado o laudo, as partes serão intimadas e terão o prazo comum de quinze dias para manifestar-se sobre ele e para apresentar os pareceres de seus assistentes técnicos. Estes não são intimados, cabendo às partes comunicar-lhes o início do prazo. Diante do princípio do livre convencimento motivado, o juiz não fica adstrito ao laudo, podendo julgar de acordo com outros elementos de convicção. Se a coisa ou pessoa a ser examinada estiver em outra comarca, a prova pericial será realizada por carta precatória, podendo o juiz deprecante solicitar ao deprecado que nomeie o perito incumbido da tarefa Segunda perícia Se a perícia não for suficientemente esclarecedora, o juiz poderá determinar, de ofício ou a requerimento das partes, a realização de uma segunda, que terá por objeto os mesmos fatos sobre os quais recaiu a primeira, e que servirá para corrigir eventuais omissões ou inexati~~es Perícia simplificada O art. 464, 2, buscou acelerar o aridamep.to do processo, trazendo importante novidade: "De ofício ou a requerimento das partes, o juiz poderá, em substituição à perícia, determinar a produção de prova técnica simplificada, quando o ponto controvertido for de menor complexidade". 151

152 500 Direito Processual Civil Esquematizado Marcus Vinicius Rios Gonçalves Essa prova técnica simplificada difere da comum porque não haverá apresentação de laudo, mas apenas a inquirição do especialista, pelo juiz, sobre o ponto controvertido da causa que demanda especial conhecimento científico ou técnico. Dessa inquirição as partes participarão, podendo formular indagações e solicitar esclarecimentos Despesas com a perícia A prova pericial é, em regra, onerosa. A qual das partes as despesas devem ser carreadas? A regra é que o vencido as suporte, inclusive os honorários do perito e do assistente técnico da parte contrária. É o que estabelece o art. 82, 2, do CPC: "A sentença condenará o vencido a pagar ao vencedor as despesas que antecipou". Com frequência, há necessidade de que os honorários do perito sejam, ao menos em parte, antecipados, uma vez que há despesas com a realização da prova. Ora, a quem caberá tal antecipação, uma vez que não se sabe, antes da sentença, quem será o vencido e o vencedor? A resposta é dada pelo art. 95 do CPC: "Cada parte adiantará a remuneração do assistente técnico que houver indicado sendo a do perito adiantada pela parte que houver requerido a perícia ou rateada quando a perícia for determinada de ofício ou a requerimento de ambas as partes". Aquele que antecipou poderá reaver do vencido o que despendeu, se ao final sair vencedor. O valor dos honorários será fixado pelo juiz, após a apresentação de proposta do perito, no prazo de 5 dias. Sobre a estimativa serão ouvidas as partes; em seguida, o juiz fixará o valor que lhe parecer adequado. O juiz poderá determinar a antecipação de até 50% dos honorários fixados, devendo o remanescente ser pago no final, depois da entrega do laudo e prestados os esclarecimentos necessários. Se a parte que solicitou a prova não os recolher, o juiz considerará prejudicada a perícia. Não há razão para que julgue extinto o processo: a falta do recolhimento repercute apenas sobre a perícia, não sobre o processo todo. Se não foram recolhidos os honorários fixados por decisão judicial, será expedida certidão em favor do perito, que valerá como título executivo judicial (CPC, art. 515, V). Um problema de difícil solução ocorrerá quando a parte que requerer a perícia for beneficiária da justiça gratuita. Em casos assim, não haverá antecipação dos honorários: se ela afinal sair vencedora, o valor dos honorários poderá ser cobrado do vencido; mas se este for o beneficiário, como fará o perito para receber os seus honorários? Quando possível, tem sido determinado que a perícia seja realizada por integrantes de órgãos públicos que prestem assistência judiciária gratuita (como o IMESC), para que o problema seja evitado ~ INSPEÇÃOJUDICIAL Introdução É um meio típico de prova, tratado nos arts. 481 a 484 do CPC. Consiste no exame feito direta e pessoalmente pelo juiz, em pessoas ou coisas, com a finalidade de aclarar fatos que interessam à causa. Difere de outros tipos de prova, porque o juiz não obtém a informação desejada de forma indireta, por meio de outras 152

153 VIl 13 Do Processo e do Procedimento 501 pessoas ou de um perito dotado de conhecimentos técnicos, mas diretamente, pelo exame imediato da coisa, sem intermediários Procedimento A inspeção judicial pode ser feita em qualquer fase do processo, de ofício ou a requerimento das partes, e terá por objeto o exame de pessoas ou de coisas, com o intuito de esclarecer o juiz a respeito de um fato que tenha relevância para o julgamento. O mais comum é que o juiz faça a inspeção quando, produzidas as provas, persi~ta em seu espírito alguma dúvida, que possa ser esclarecida pelo exame direito da coisa ou da pessoa. Daí se dizer, c::>m frequência, que a inspeção tem natureza complementar, servindo para auxiliar na convicção do juiz, quando as outras provas não tiverem sido suficientemente esclarecedoras. Mas não é necessário que ela seja determinada apenas no final, depois das outras provas, podendo o juiz marcá-la a qualquer tempo, sobretudo quando issa possa dispensar outros meios mais onerosos. O art. 482 do CPC autoriza que o juiz, na inspeção, seja assistido por um ou mais peritos. Isso não altera a natureza da prova, nem a faz confundir-se com a pericial: nesta, é o perito quem examina as pessoas ou coisas, e por seu intermédio as informações são prestadas ao juiz; na inspeção, o exame é feito diretamente por este, sem intermediários. Os peritos que o acompanham servirão apenas para assisti-lo, auxiliá-lo com eventuais informações técnicas, a respeito da coisa ou da pessoa, que estará sendo examinado ictu oculi, pelo próprio magistrado. O juiz designará a data e o local em que a inspeção será realizada, para que as partes possam acompanhá-la, prestando esclarecimentos e fazendo as observações que reputem de interesse para a causa. A coisa ou pessoa poderá ser apresentada em juízo, para que o juiz a examine; ou ele poderá deslocar-se até onde estão, nas hipóteses do art. 483 do CPC. Concluída a diligência, será lavrado auto circunstanciado, que mencionará tudo o que for de interesse para o julgamento da causa (CPC, art. 484) PROVA TESTEMUNHAl Introdução É um dos meios de prova mais comumente utilizados. Consiste na inquirição, em audiência, de pessoas estranhas ao processo, a respeito dos fatos relevantes para o julgamento. Com alguma frequência, a prova testemunhal tem sido criticada, sob o fundamento de que a memória humana é falha e que circunstâncias de ordem emocional ou psicoiógica podem lnfluendar a visão ou àslembrimças das testemunhas. os críticos sugerem que a ela seja dado um valor menor que às outras provas. Mas ela continua sendo fundamental, e, à exceção de eventuais ressalvas legais (arts. 406, 443 e 444), não há razão para considerá-la de menor valor. O juiz dará à prova testemunhal o valor que merecer, em cotejo com os demais elementos de convicção, observado o livre convencimento motivado. ji ij :;.I :I!( 153I

154 502 Direito Processual Civil Esquematizado Marcus Vinicius Rios Gonçalves É possível, por exemplo, que, ouvidas várias testemunhas, o juiz se baseie no depoimento de apenas uma ou de algumas delas, que lhe parecerem mais verossímeis e em harmonia com os demais elementos de convicção Admissibilidade e valor da prova testemunhal Ela só será admitida para a comprovação de fatos controvertidos, que tenham relevância para o julgamento. Nisso, não se encontra nenhuma novidade, já que a mesma regra aplica-se a todos os tipos de provas. Não se podem ouvir testemunhas a respeito de questões jurídicas ou técnicas, nem sobre fatos que não sejam controvertidos. O art. 442 do CPC estabelece a regra a respeito da admissibilidade: "A prova testemunhal é sempre admissível, não dispondo a lei de modo diverso". Esse dispositivo traduz a regra da admissibilidade genérica, mas autoriza a lei a estabelecer restrições. O art. 443 apresenta duas: quando o fato sobre o qual a testemunha seria inquiridajá estiver provado por documento ou confissão da parte; qu quando só por documentos ou por exame pericial puder ser provado. Questão de grande relevância é a relativa à comprovação da existência e conteúdo dos negócios jurídicos. Há os que, para sua celebração, não exigem forma escrita e podem ser celebrados sem a observância de forma específica (contratos não solenes). E há os que exigem forma escrita, como o de fiança (CC, art. 819), o de depósito voluntário (CC, art. 646) e o de seguro (art. 758), por exemplo. O art. 227, caput, do CC só autorizava o uso de prova exclusivamente testemunhal para negócios jurídicos de até dez salários mínimos, e essa regra estava em consonância com o disposto no art. 401 do CPC de Mas o art. 227, caput, do CC e o art. 401 do CPC de 1973 foram revogados. Permanece em vigor o art. 227, parágrafo único do CC: "Qualquer que seja o valor do negócio jurídico, a prova testemunhal é admissível como subsidiária ou complementar da prova por escrito". Esse dispositivo está em consonância com o art. 444 do CPC atual: "Nos casos em que lei exigir prova escrita da obrigação, é admissível a prova testemunhal quando houver começo de prova por escrito, emanado da parte contra a qual se pretende produzir a prova". E o art. 445 autoriza expressamente a prova testemunhal quando o credor não pode ou não podia, moral ou materialmente, obter a prova escrita da obrigação, em casos como o de parentesco, de depósito necessário ou de hospedagem em hotel ou em razão das práticas comerciais do local onde contraída a obrigação. Desses dispositivos extrai-se que: a) se o contrato só pode ser celebrado por escritura pública, que é da substância do negócio, nenhuma outra prova pode ser admitida (art. 406); b) se o contrato pode ser celebrado por qualquer forma, inclusive verbal, a prova testemunhal pode ser usada sem restrições, independentemente do valor do negócio; 154

155 VIl Do Processo e do Procedimento 503 c) se o contrato exige forma escrita, a prova testemunhal pode ser utilizada, desde que haja começo de prova por escrito, emanado da parte contra a qual se pretende produzir a prova (art. 444) ou quando o credor não podia, moral ou materialmente, obter a prova escrita da obrigação, nas hipóteses do art O começo de prova escrita a que se refere o art. 444 há de ser, diante dos termos peremptórios da lei, documento escrito, não podendo ser substituído por fotografias ou gravações. E deve ter sido produzido pelo adversário e trazer indícios da existência do contrato. Se for um documento que, por si só, basta para comprová-lo, nem será necessária a prova testemunhal. Mas se trouxer apenas indícios, poderá ser complementado por ela. O disposto nos arts. 444 e 445 do CPC estende-se ao pagamento e à remissão da dívida. A prova testemunhal não poderá ser utilizada para comprovar a existência daqueles contratos que exigem instrumento público, como da substância do ato (art. 406); mas poderá, para comprovar simulação em contrato e vícios de consentimento (CPC, art. 446) A testemunha É a pessoa que comparece a juízo, para prestar informações a respeito dos fatos relevantes para o julgamento. Somente as pessoas físicas podem ser testemunhas, nunca as jurídicas. É preciso que sejam alheias ao processo. As partes podem ser ouvidas em depoimento pessoal ou interrogatório, nunca como testemunhas. Elas serão ouvidas diretamente em audiência presidida pelo juiz da causa, salvo nas hipóteses do art. 453 do CPC, e terão o dever de colaborar com o juízo, prestando informações verdadeiras Restrições à ouvida de testemunhas Em princípio, qualquer pessoa pode ser ouvida como testemunha, não se exigindo nenhuma qualificação especial. Há, no entanto, três circunstâncias que obstam a sua ouvida: a incapacidade, o impedimento e a suspeição. O art. 447 do CPC enumera quando essas circunstâncias estão presentes. De acordo com o 1, são incapazes de testemunhar: o interdito por enfermidade ou deficiência mental; o que, acometido por enfermidade ou retardamento mental, ao tempo em que ocorreram os fatos, não podia discerni-los; ou, ao tempo em que deve depor, não está habilitado a transmitir as percepções; o que tiver menos de dezesseis anos; o cego e o surdo, quando a ciência do fato depender dos sentidos que lhes faltam. 155

156 504 Direito Processual Civil Esquematizado Marcus Vinicius Rios Gonçalves Nos dois primeiros casos, faltará à testemunha o discernimento para discorrer sobre os fatos. No terceiro, a maturidade necessária, e no quarto, a aptidão para ter informações a respeito dos fatos. A capacidade para ser testemunha, que se inicia aos dezesseis anos, não coincide com a capacidade civil geral, que só se torna plena aos dezoito. A exigência dos dezesseis anos é à data do depoimento em juízo, não na dos fatos a respeito dos quais se deve testemunhar. O art. 447, 1, do CPC está em consonância com o disposto no art. 228 do Código Civil. A Lei n , de 6 de julho de 2015, acrescentou, porém, ao dispositivo do Código Civil um 2, que assim estabelece: "A pessoa com deficiência poderá testemunhar em igualdade de condições com as demais pessoas, sendo-lhe assegurado todos os recursos de tecnologia assistida". Entende-se, assim, que, se for possível, deve-se assegurar ao deficiente o direito de ser ouvido como testemunha, com a utilização dos recursos necessários. Mas para isso é preciso que ele tenha condições de prestar informações a respeito dos fatos que interessam ao processo. Se, em razão da deficiência, ou falta de discernimento, ele não as tiver, parece-nos que a incapacidade persistirá. Os impedidos de depor estão enumerados no art. 447, 2. As causas de impedimento são objetivas e estão associadas à participação no processo, em qualquer qualidade, ou à relação direta com algum dos participantes. Os impedidos são: 1!1 o cônjuge, o companheiro, o ascendente e o descendente em qualquer grau, ou colateral, até o terceiro grau, de alguma das partes, por consanguinidade ou afinidade, salvo se o exigir o interesse público, ou, tratando-se de causa relativa ao estado da pessoa, não se puder obter de outro modo a prova, que o juiz repute necessária ao julgamento do mérito; liilll o que é parte na causa; lilll o que intervém em nome de uma parte, como o tutor, o representante legal das pessoas jurídicas, o juiz, o advogado e outros, que assistam ou tenham assistido às partes. O juiz que tenha conhecimento direto dos fatos da causa, antes de impedido de testemunhar, está impedido de julgar, devendo transferir a condução do processo para o seu substituto automático, caso em que poderá ser ouvido como testemunha. Quando, na condução do processo, for arrolado como testemunha, deverá proceder na forma do art. 452 do CPC: se efetivamente tiver ciência do ocorrido, dar-se-á por impedido, caso em que será defeso à parte, que o incluiu no rol, desistir de seu depoimento; se nada souber, mandará excluir o seu nome. As hipóteses de suspeição estão previstas no art. 447, 2 : 111 o inimigo da parte, ou o seu amigo íntimo; lil o que tiver interesse no litígio. As hipóteses têm certo grau de subjetividade, cumprindo ao juiz examinar o caso concreto. A simples amizade ou a mera desavença não é suficiente para tornar suspeita a testemunha, exigindo-se que uma e outra sejam de tal ordem que possam comprometer a isenção das declarações. 156

157 VIl m Do Processo e do Procedimento 505 O interesse no litígio pode provir das mais variadas razões. Pode ocorrer, por exemplo, que a testemunha esteja litigando com uma das partes, em causa semelhante; ou que possa vir a ser demandada em via de regresso. Com frequência, testemunhas são contraditadas como suspeitas, por manterem com uma das partes relação de emprego. Mas isso, por si só, não é suficiente para torná-ia suspeita, sendo indispensável que se constate, no caso concreto, a existência de uma circunstância que possa afastar a sua isenção Da possibilidade de ouvir testemunhas suspeitas e impedidas O art. 447, 4, traz importante disposição a respeito da ouvida das testemunhas: "Sendo necessário, pode o juiz admitir o depoimento das menores, impedidas ou suspeitas". E o 5 acrescenta: "Os depoimentos referidos no 4 serão prestados independentemente de compromisso (art. 415) e o juiz lhes atribuirá o valor que possam merecer". Há casos em que o juiz pode, apesar das causas de impedimento ou suspeição, ouvir uma testemunha, seja porque ela presenciou diretamente os fatos, seja porque não há outra que deles tenha conhecimento. Ele avaliará essa prova no caso concreto, cotejando-a com os demais elementos de convicção e verificando, no contato com a testemunha, a verossimilhança de suas alegações A contradita Antes do início do depoimento, a testemunha é qualificada, na forma do art. 457 do CPC. O juiz indagará se ela tem relações de parentesco com a parte, ou interesse no objeto do processp. Nessa ocasião, que precede o depoimento, a parte pode contraditar a testemunha, arguindo-lhe a incapacidade, o impedimento ou a suspeição. Quem pode suscitar a contradita é a parte contrária a que arrolou a testemunha. Ao apresentá-la, oferecerá as razões pelas quais entende que a testemunha não pode ser ouvida. A contradita deverá ser sempre fundamentada, sob pena de ser indeferida de plano. Sobre os fatos alegados, o juiz indagará a própria testemunha. Se esta os negar, o juiz dará ao suscitante a possibilidade de comprovar o alegado, com documentos ou testemunhas, até três, apresentadas no ato e inquiridas em separado. Por essa razão é sempre indispensável que a testemunha, ainda que seja trazida independentemente de intimação, seja arrolada com antecedência e devidamente qualificada. Afinal, a parte contrária tem o direito de conhecer-lhe o nome e qualificação ôe antemão, para poder contraditá-lá e trazer eventuais testemunhas (até três) ou documentos que comprovem as causas de incapacidade, impedimento ou suspeição. A lei não exige que a parte que arrolou a testemunha seja ouvida na contradita, mas o princípio constitucional do contraditório recomenda que isso ocorra, sobretudo quando há necessidade de instrução do incidente. 157

158 506 Direito Processual Civil Esquematizado Marcus Vinicius Rios Gonçalves o juiz só admitirá a contradita se a testemunha ainda não foi advertida nem começou a depor. Depois disso, será intempestiva. Ouvida a testemunha sobre o alegado e colhidas as eventuais provas, o juiz decidirá. Se a testemunha confirmar os fatos ou a contradita ficar demonstrada, o juiz dispensará o depoimento, ou então o colherá na forma do art. 447, 5, do CPC. li i!i Direitos e deveres das testemunhas A lei considera o depoimento prestado pela testemunha como serviço público (art. 463). Por isso, ela não pode, quando sujeita ao regime da legislação trabalhista, sofrer perda de salário nem desconto no tempo de serviço, por comparecer à audiência. Se necessário, ser-lhe-á dado um atestado de comparecimento, para que possa apresentar ao empregador. Além disso, pode ressarcir-se das despesas que teve para o comparecimento, cabendo à parte que arrolou pagá-las logo que arbitradas, ou depositar o valor em cartório, no prazo de três dias, na forma do art. 462 do CPC. Os deveres das testemunhas são três: 1!1!1 Comparecer na data para a qual foi intimada. Ela deve comparecer para ser ouvida em audiência perante o juiz da causa, salvo nas hipóteses do art. 453 do CPC: a) quando prestar depoimento antecipadamente, nos casos de produção antecipada de provas; quando residir em outra comarca ou país, em que será ouvida por carta; quando, por doença ou outro motivo relevante, estiver impossibilitada de comparecer a juízo, caso em que, se possível, o juiz poderá deslocar-se até o lugar em que ela está ou designar lugar para ouvi-la (art. 449, parágrafo único; b) nas hipóteses do art Esse dispositivo enumera as pessoas que, em razão do cargo ou função que ocupam, têm o direito de ser inquiridos em sua residência, ou onde exercem a sua função, caso em que o juiz lhes solicitará que designem dia, hora e local em que poderão ser ouvidas, remetendo-lhes cópia da petição inicial e da defesa da parte que a tenha arrolado como testemunha. Além das pessoas indicadas no art. 454, também os juízes de direito e promotores de justiça têm a prerrogativa de indicar dia, hora e local para sua ouvida, conforme as respectivas leis orgânicas. Caso a testemunha, intimada a comparecer, não o faça, o juiz determinará a condução coercitiva, condenando-a ao pagamento das custas decorrentes do adiamento, sem prejuízo de eventual sanção penal por desobediência. B Prestar depoimento, não podendo recusar-se a falar. O art. 458, parágrafo único, esclarece que o juiz, ao início do depoimento, advertirá a testemunha das sanções penais imputáveis a quem prestar declaração falsa, e a quem calar ou ocultar a verdade. O art. 448 enumera as hipóteses em que a testemunha pode escusar-se; Ela não é obrigada a depor sobre fatos que lhe acarretem grave dano, bem como ao seu cônjuge, companheiro e aos seus parentes, consangufneos ou afins, em linha reta, ou na colateral até o terceiro grau; ou a cujo respeito, por estado ou profissão, deva guardar sigilo. São exemplos de sigilo profissional os do sacerdote, do advogado a respeito do que lhe contou o cliente; do médico ou do psicólogo, a respeito do que lhe in formou o paciente. 158

159 VIl 11 Do Processo e do Procedimento 507 A testemunha deve prestar as suas declarações - oralmente, não por escrito - que devem versar sobre os fatos relevantes para a causa. Não pode emitir opiniões pessoais sobre a causa, ou sobre a matéria jurídica discutida. Mas nada impede que o juiz a questione a respeito das suas impressões dos fatos, como, por exemplo, se a parte parecia embriagada ou se aparentava nervosismo. Dizer a verdade. Antes de iniciar o depoimento, a testemunha prestará compromisso, devendo o juiz adverti-la das penas do falso testemunho (art. 458). A obrigação existe ainda que o juiz, por um lapso, esqueça-se de tomá-lo e de fazer a advertência, já que a omissão constitui mera irregularidade. Se a testemunha for menor de dezoito anos, o juiz não a advertirá pelo crime de falso testemunho (art. 342, do CP), mas de ato infracional, que poderá sujeitá-ia às medidas do Estatuto da Criança e do Adolescente Produção de prova testemunhal Requerimento da prova A prova testemunhal deve ser requerida pelo autor na inicial, e pelo réu, na contestação. Mas eventual omissão não torna preclusa a possibilidade de requerê-la oportunamente. Afinal, só depois da resposta do réu o autor poderá saber os fatos que se tornaram controvertidos e se a prova testemunhal é necessária. Após a resposta do réu, ou o juiz julgará antecipadamente a lide, ou saneará o processo, abrindo a fase instrutória e determinando as provas necessárias. Se houver deferimento de prova oral, designará audiência de instrução e julgamento O arrolamento das testemunhas As testemunhas devem ser arroladas pelas partes. Para que o juiz defira a prova, não é necessário que elas já estejam arroladas e especificadas. Basta que ele verifique que é pertinente. Ao proferir a decisão saneadora e de organização do processo. o juiz, caso verifique a necessidade de prova oral, designará a audiência de instrução e fixará o prazo comum no qual as partes deverão arrolar suas testemunhas, prazo que será de até 15 dias. Pode ser menor, mas não maior do que quinze dias. Mas se a causa for complexa e o juiz designar audiência para promover o saneamento do processo em cooperação com as partes (art. 357, 3 ), elas já deverão levar o rol de testemunhas para a audiência (art. 357, 5 ). Os prazos estabelecidos no art. 357, 4 e 5 são preclusivos e devem ser observados, ainda que a testemunha compareça independentemente de intimação, pois é preciso que a parte contrária conheça o seu nome e qualificação para, querendo, oferecer contradita. Ao arrolar a testemunha, a parte deve qualificá-la, apresentando o seu nome, profissão, o estado civil, a idade, o número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas, o registro de identidade e o endereço completo da residência e local de trabalho, para que possa ser identificada. No entanto, te~-se entendido que a falta de um ou mais elementos da qualificação constitui mera irregularidade, não constituindo óbice para que seja ouvida, salvo se ficar comprovado prejuízo. 159

160 508 Direito Processual Civil Esquematizado Marcus Vinicius Rios Gonçalves ill Substituição das testemunhas Depois de arroladas, as testemunhas só podem ser substituídas em caso de falecimento, enfermidade que as incapacite de depor, ou mudança de residência ou local de trabalho, que impeça a localização (art. 451, do CPC). Mas a jurisprudência tem ampliado a possibilidade, permitindo que qualquer testemunha seja substituída, desde que dentro do prazo para arrolá-la. Assim, se uma das partes apresenta o rol antes do prazo, pode livremente substituir as suas testemunhas, desde que o faça antes de ele se findar. l!í Número de testemunhas O art. 357, 6, do CPC limita o número de testemunhas a dez, sendo, no máximo, três para cada fato. Além das arroladas. o juiz pode determinar, de ofício, ou a requerimento da parte, a inquirição de outras. que tenham sido referidas no depoimento das partes ou das testemunhas Acareação O art. 461, II, do CPC autoriza ao juiz determinar, de ofício ou a requerimento das partes, "a acareação de duas ou mais testemunhas ou de algumas delas com a parte, quando, sobre fato determinado, que possa influir na decisão da causa, divergirem as suas declarações". Aqueles que prestaram os depoimentos divergentes serão colocados frente a frente e indagados a respeito da divergência ocorrida; o juiz pode advertir novamente as testemunhas das penas do falso testemunho. Em seguida, indagará se os depoentes mantêm as suas declarações, ou se têm retificação a fazer. De tudo, será lavrado termo. A acareação pode ser realizada por videoconferência ou por outro recurso tecnológico de transmissão de sons e imagens em tempo real Intimação das testemunhas A parte que arrola a testemunha pode comprometer-se a levá-la à audiência independentemente de intimação. Isso não a dispensa de arrolá-la no prazo fixado em lei. Mas, se ela faltar, reputa-se que a parte desistiu de ouvi-la, salvo se demonstrar que a ausência decorreu de caso fortuito ou força maior. Se a parte que a arrolou não se comprometer a levar a testemunha, esta deverá ser intimada. Cabe ao advogado da parte informar ou intimar a testemunha por ele arrolada do dia, hora e local da audiência, por carta com aviso de recebimento, dispensando-se a intimação judicial. Para comprovação de que a intimação foi realizada, o advogado deverá juntar aos autos cópia da correspondência de intimação e do aviso de recebimento com antecedência de, pelo menos, três dias da data da audiência, sob pena de considerar-se que houve desistência de sua inquirição. A intimação só será feita pela via judicial quando: a) frustrada a intimação pelo advogado; b) a parte demonstrar a sua necessidade; c) figurar do rol servidor público 160

161 VIl m Do Processo e do Procedimento 509 ou militar; d) a testemunha for arrolada pelo Ministério Público ou Defensoria Pública; ou e) for daquelas que devem ser ouvidas em sua residência ou onde exercerem sua função (art. 454). ::! Inquirição das testemunhas A inquirição é feita em audiência perante o juiz da causa, salvo nas hipóteses do art. 453 do CPC. As perguntas serão feitas diretamente pelas partes (e pelo Ministério Público, quando fiscal da ordem jurídica), começando pela parte que arrolou a testemunha. O juiz não admitirá as que possam induzir a resposta, ou não tiverem relação com a questão de fato objeto da atividade probatória ou importarem repetição de outra já respondida, velando para que as testemunhas sejam tratadas com urbanidade e impedindo que lhe sejam dirigidas perguntas ou considerações impertinentes, capciosas ou vexatórias. Antes ou depois das perguntas feitas pelas partes, o juiz poderá inquirir a testemunha, formulando-lhe as indagações que entende relevantes para a formação de seu convencimento. As testemunhas serão inquiridas, separada e sucessivamente, primeiro as do autor e depois as do réu, providenciando-se para que umas não ouçam o depoimento das outras. Se as partes concordarem, a ordem poderá ser invertida. Depois da qualificação, resolvidas eventuais contraditas e tomado o compromisso, passar-se-á à inquirição das testemunhas, na forma supramencionada. O depoimento será reduzido a termo ou gravado (art. 460). Quando reduzido a termo será assinado pelo juiz, pelo depoente e pelos procuradores. No caso de processo eletrônico, deve-se observar o disposto nos 1 e 2, do art. 209, do CPC e na legislação específica. Se a testemunha resitlir em comarca, seção ou subseção judiciária, diferente daquela em que corre o processo, a ouvida será feita por precatória. Mas o art. 453, 1, permite que seja feita por videoconferência ou outro recurso tecnológico de transmissão e recepção de sons e imagens em tempo real, o que pode ocorrer, inclusive, durante a audiência de instrução e julgamento. 19. DEPOIMENTO PESSOAL Introdução É um meio de prova, pelo qual o juiz, a requerimento de uma das partes, colhe as declarações do adversário dela, com a finalidade de obter informações a respeito de fatos relevantes para o processo. Só quem pode prestá-lo são as partes, os autores e os réus, jamais um terceiro. E só quem poderá requerê-lo é a parte contrária. Ninguém pode requerer o próprio depoimento pessoal, mas somente o do adversário. O juiz pode, a qualquer momento, ouvir, de ofício às partes. Porém não haverá depoimento pessoal, mas interrogatório. A finalidade do depoimento pessoal é fazer com que a parte preste informações a respeito de fatos, que possam contrariar os seus interesses. É obter a confissão a!~'1.'.1!'., 161 '

162 51 O Direito Processual Civil Esquematizado Marcus Vinicius Rios Gonçalves respeito de fatos relevantes para a causa, o reconhecimento de fatos que contrariem as suas pretensões. Por essa razão é que só o adversário pode requerê-lo. Mas o juiz, ao examinar as declarações prestadas no depoimento pessoal, deve considerá-las em conjunto. Não pode levar em conta apenas aquilo que a parte confessou, mas as informações todas que foram prestadas, dando-lhes o valor que possam merecer.! Quem pode requerê-lo e prestá-lo O art. 385 do CPC manteve a impropriedade do art. 343 da lei anterior, ao permitir que o depoimento pessoal seja determinado de ofício. O depoimento pessoal sempre dependerá do requerimento do adversário. O que pode ser determinado de ofício é o interrogatório, que não se confunde com o depoimento pessoal; as diferenças serão examinadas em capítulo próprio. Tem-se admitido que, além do adversário, possa o Ministério Público, na condição de fiscal da ordem jurídica, requerê-lo. Quem o presta é sempre pessoa física que figura comb parte no processo. Se for pessoa jurídica, o depoimento será prestado por seus representantes legais. Discute-se sobre a possibilidade de o depoimento pessoal ser prestado por procurador, e não pela parte propriamente dita. Embora haja controvérsia, tem prevalecido o entendimento de que isso é possível, desde que tenha poderes especiais para confessar, finalidade precípua do depoimento. Também se admite que deponham em nome da pessoa jurídica prepostos por ela indicados, desde que tenham poderes para cónfessar e conhecimento dos fatos. De nada adiantaria ouvir os representantes legais de uma empresa se estes não participaram dos fatos que têm interesse para o deslinde da causa, sendo de admitir-se a ouvida de funcionários e prepostos que efetivamente possam prestar esclarecimentos úteis. Se a parte for absolutamente incapaz, o depoimento será prestado por seu representante legal; se relativamente incapaz, por ele mesmo Pena de confissão A finalidade principal do depoimento pessoal é a confissão da parte a respeito de fatos que contrariem os seus interesses. Por isso, o art. 385, 1, do CPC estabelece que ela deverá ser intimada pessoalmente para a audiência, sob pena de confesso, que será aplicada caso ela não compareça ou, comparecendo, se recuse a depor. A presunção é relativa, e deverá ser considerada em conjunto com os demais elementos de convicção. O art. 388 do CPC dispensa a parte de depor sobre: a) fatos criminosos ou torpes que lhe forem imputados; b) fatos a cujo respeito, por estado ou profissão, deva guardar sigilo; ou c) acerca dos quais não possa responder sem desonra própria, de seu cônjuge, de seu companheiro ou de parente em grau sucessível. Mas essas hipóteses não se aplicam às ações de estado e família. 162

163 VIl Do Processo e do Procedimento Procedimento Havendo o requerimento de depoimento pessoal, que pode ser feito na inicial, na contestação ou no momento de especificação de provas, o juiz determinará a intimação da parte, na forma do art. 385, 1", do CPC, sob pena de confissão. O depoimento pessoal é colhido diretamente pelo juiz (não há inquirição direta, como na prova testemunhal), em audiência de instrução e julgamento, salvo nas hipóteses do art. 453 que, conquanto versem sobre a prova testemunhal, aplicam-se também a ele. Se forem requeridos os depoimentos de ambas as partes, primeiro serão ouvidos os autores e depois os réus. Aquele que ainda não depôs não pode assistir ao depoimento da outra parte. Enquanto o autor estiver depondo, o réu deverá aguardar fora do recinto em que se realiza a audiência. Mas isso se o réu for depor em seguida. Caso ele não vá prestar depoimento, desnecessária a sua retirada. Também desnecessário que o autor que já depôs saia da sala, enquanto o réu depõe. Depois de o juiz formular as suas perguntas à parte, terão possibilidade de fazê -lo o advogado da parte contrária e o Ministério Público. Não há oportunidade de reperguntas do advogado do próprio depoente. Ao prestar o depoimento, as partes responderão oralmente às perguntas formuladas, não podendo apresentar as respostas por escrito. A lei faculta apenas a consulta a notas breves, com finalidade de complementar os esclarecimentos INTERROGATÓRIO DAS PARTES Introdução É um meio de prova, de caráter complementar, no qual o juiz ouve as partes, para delas obter esclarecimentos a respeito de fatos que permaneçam confusos ou obscuros. É expressamente autorizado pelo art. 139, VIII, do CPC. Não se confunde com o depoimento pessoal, por várias razões: DEPOIMENTO PESSOAL É sempre requerido pela parte contr~ria. INTERROGATÓRIO,É determinado pelo juiz, de oficio ou a requerimento das partes. É prestado na audiência de instrução e julgamento, Pode ser determinado pelo juiz a qualquer tempo. para a qual a parte é intimada sob pena de confissão. Tem por finalidade principal obter, do adversário, a Tem finalidade complementar, sendo detern1inado confissão a respeito de fatos contrários aos seus inte- pelo juiz para obter, das partes, informaç?es a resresses. peito de fatos que périnánecem confusos ou obscuros, Por,isso, é majs comum que se realize a9}inaj<ji!,.. instrução, quando ainda restarem dúvidas ao juiz Procedimento O juiz designará a data para o interrogatórió da parte e a intimará para a audiência. Não haverá pena de confesso, prevista exclusivamente para a recusa em prestar depoimento pessoal. 163

164 512 Direito Processual Civil Esquematizado Marcus Vinicius Rios Gonçalves No entanto, como o interrogatório serve para que o juiz possa obter esclarecimentos de fatos ainda obscuros, a ausência da parte poderá prejudicá-la, já que o juiz possivelmente não considerará provado o fato, tudo de acordo com o princípio do livre convencimento motivado. Os advogados de ambas as partes e o Ministério Público; nos casos em que intervenha, serão intimados para participar e poderão formular perguntas CONFISSÃO Introdução Confissão é a declaração da parte que reconhece como verdadeiros fatos que são contrários ao seu próprio interesse e favoráveis aos do adversário. Existe acesa controvérsia na doutrina a respeito da natureza da confissão, se seria ou não meio de prova. Parece-nos que ela não pode ser considerada como tal, já que não constitui mecanismo para que as partes obtenham informações a respeito de fatos relevantes para o processo. Ela é declaração unilateral da parte, e pode, eventualmente, tornar dispensáveis as provas de determinado fato. Embora não seja uma declaração de vontade, mas de ciência de um fato, a lei a considera negócio jurídico, permitindo que seja anulada, na forma do art. 393 do CPC. A confissão só pode ter por objeto fatos, jamais as consequências jurídicas que deles possam advir, e que serão extraídas pelo juiz. Cumpre-lhe dar a ela o valor que possa merecer, em conformidade com as demais provas colhidas e com o princípio do livre convencimento. Não se pode negar que a confissão costuma ter forte influência na convicção do juiz, já que prestada por alguém cujos interesses são por ela contrariados. Não se confunde a confissão com a renúncia ao direito ou com o reconhecimento jurídico do pedido, já que estes envolvem não apenas os fatos controvertidos, mas o direito discutido. A renúncia e o reconhecimento implicam a extinção do processo com resolução de mérito, ao passo que a confissão é só mais um elemento, para que o juiz forme a sua convicção e profira sentença Espécies de confissão São duas as principais classificações da confissão. Pode ser judicial ou extrajudicial. A judicial é a confissão feita, por qualquer meio, no curso do processo. Pode ser escrita ou oral, durante o depoimento pessoal. A eserita pode ser feita em qualquer manifestação no curso do processo, como a contestação, réplica ou petição juntada aos autos. A judicial pode ser, por sua vez, de duas espécies: Espontânea: apresentada pela parte fora do depoimento pessoal, em manifestação por ela apresentada no processo. 164

165 VIl!!I Do Processo e do Procedimento 513 mt Provocada: que se faz em depoimento pessoal, quando a parte responde às perguntas formuladas. A extrajudicial é feita fora do processo, e precisará ser comprovada, seja por documentos, seja por testemunhas. Pode ser feita por escrito ou verbalmente, caso em que só terá eficácia quando a lei não exija prova literal. Além disso, pode ser expressa ou ficta:!si A expressa é manifestada pela parte, por escrito ou verbalmente. 1m A ficta é sempre consequência de omissão da parte, que ou não apresentou contestação, ou não compareceu à audiência para a qual foi intimada para prestar depoimento pessoal, ou compareceu, mas se recusou a prestá-lo. ili Eficácia da confissão A consequência principal da confissão é mencionada no art. 374, II, do CPC: "Não dependem de prova os fatos afirmados por uma parte e confessados pela parte contrária". Essa regra deve ser interpretada em consonância com o princípio do livre convencimento motivado. O juiz não está obrigado a dar valor absoluto à confissão, devendo cotejá-la com os demais elementos de convicção. A presunção de veracidade dos fatos dela decorrente é relativa, não absoluta. Não se há de considerá-la, como antes, superior a todas as outras provas, "a rainha das provas". O princípio do livre convencimento motivado exige que seja confrontada com os demais elementos. Há algumas restrições à eficácia da confissão. Entre elas: Fi! Não se admite corifissão em juízo de fatos relativos a direitos indisponíveis (art. 392). Essa regra está em consonância com a que afasta a presunção de verdade decorrente da revelia, quando o processo versar sobre esse tipo de interesse (art. 345, II). Permitir a confissão seria autorizar que o litigante dispusesse dos direitos que não são disponíveis. Por isso, ainda que haja confissão, o juiz não considerará os fatos incontroversos, determinando as provas necessárias para demonstrá-lo. 1!!1 A confissão não supre a exigência da apresentação de instrumento público, para comprovar a existência de negócio jurídico que o exige, como de sua substância (CPC, art. 406). Ele é indispensável para que o negócio se repute celebrado. 111 Quando houver litisconsórcio, a confissão de um não poderá prejudicar os demais. Se o litisconsórcio for simples, a confissão será eficaz em relação ao próprio confitente, mas não em relação aos demais; se for unitário, nem mesmo para ele, pois o resultado terá de ser o mesmo para todos. rn Nas ações que versarem sobre bens imóveis, a confissão de um dos cônjuges ou companheiros não valerá sem a do outro, salvo no regime da separação absoluta de bens (art. 391, parágrafo único). 165

166 514 Direito Processual Civil Esquematizado Marcus Vinicius Rios Gonçalves Perda de eficácia da confissão o art. 393 considera irrevogável a confissão, mas permite que ela seja anulada, caso decorra de erro de fato ou de coação. Esse dispositivo está em consonância com 0 art. 214 do Código Civil, que também alude apenas a erro e coação. Mas parece-nos que cabe anulação ainda em caso de dolo, que nada mais é do que uma espécie de erro provocado. A anulação deve ser obtida em ação própria, proposta exclusivamente pelo confitente. Se ele já a tiver proposto e falecer no curso do processo, a ação será transferida a seus herdeiros. Mas se ele falecer antes da propositura, os herdeiros não terão legitimidade (art. 393, parágrafo único) do CPC Indivisibilidade da confissão É decorrência do art. 395 do CPC: "A confissão é, em regra, indivisível, não podendo a parte, que a quiser invocar como prova, aceitá-la no tópico que a beneficiar e rejeitá-la no que lhe for desfavorável, porém cindir~se-á quando o confitente a ela aduzir fatos novos, capazes de constituir fundamento de defesa de direito material ou de reconvenção". A indivisibilidade implica que, se a parte confessar fatos contrários aos seus interesses e, ao mesmo tempo, se pronunciar sobre fatos que lhe são favoráveie, o juiz não possa considerar isoladamente apenas os primeiros, mas o conjunto das declarações. O ato de confissão deve ser considerado como um todo. O que for desfavorável ao confitente deve ser apreciado em consonância com as suas outras alegações. Poderá haver cisão se a parte aduzir fatos novos que constituam fundamento de defesa. Por exemplo: se o réu, em sua contestação, confessar que contraiu a dívida, mas aduzir que houve compensação, a existência do débito será incontroversa, mas a compensação deverá ser provada AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO E JULGAMENTO Introdução A última etapa do processo de conhecimento se concluirá com a audiência de instrução e julgamento, necessária quando houver prova oral. Se não houver necessidade de ouvir o perito, colher depoimentos pessoais ou ouvir testemunhas, a audiência será dispensada. Nela, antes da prova oral e do julgamento, se fará nova tentativa de conciliação. Em seguida, o juiz ouvirá o perito e os assistentes técnl.cos, se as partes tiverem requerido esclarecimentos e apresentado, com a antecedência necessária, os quesitos para serem respondidos; em seguida, colherá os depoimentos pessoais requeridos, e ouvirá as testemunhas arroladas. Por fim, encerrada a instrução, concederá oportunidade para que as partes se manifestem, em alegações finais, e proferirá sentença. 166

167 VIl ll Do Processo e do Procedimento 515 É nessa audiência, portanto, que será colhida toda a prova oral, não havendo outra oportunidade, ressalvadas as hipóteses do art. 453 do CPC. A audiência é considerada um ato processual complexo, em razão dos numerosos atos que são praticados durante o seu desenrolar Procedimento da audiência de instrução e julgamento O juiz, verificando a necessidade de prova oral, designará data para a audiência, determinando que sejam intimados os advogados e as testemunhas. As partes não são pessoalmente intimadas, a menos que os adversários tenham requerido o seu depoimento pessoal, na forma do art. 385, 1. Não tendo sido requerido o depoimento pessoal, e tendo o advogado poderes para transigir, nem é necessária a presença da parte. A audiência é pública e deverá ser realizada de portas abertas (art. 358, do CPC), ficando ressalvadas as hipóteses legais, dentre as quais as de segredo de justiça, nas quais ela só poderá ser acompanhada pelas partes, pelos seus procuradores e pelo Ministério Público, quando este intervém. O juiz tem o poder de polícia, cabendo-lhe manter a ordem e o decoro na audiência. Para tanto, pode determinar que se retirem da sala os que não se comportarem adequadaménte, requisitando, se necessário, força policial. No dia e hora designados, o juiz declarará aberta a audiência e mandará apregoar as partes e seus advogados. Se houver intervenção do Ministério Público, este também deverá ser avisado. Em seguida, serão praticados os atos processuais. que serão examinados nos itens seguintes Tentativa de conciliação Ressalvada a hipótese de o processo versar sobre interesses indisponíveis, o juiz tentará mais uma vez a conciliação. Tendo sido designada anteriormente a audiência de conciliação e mediação, ela já terá sido tentada, mas é preciso que o juiz a proponha mais uma vez, pois as partes podem, nessa fase, estar mais abertas à solução consensual. Mesmo que os advogados estejam ausentes, a conciliação deve ser tentada, porque, como negócio jurídico civil, pode ser celebrada sem a participação deles, bastando que as partes sejam capazes. Da mesma forma, se as partes estiverem ausentes, mas comparecerem advogados com poderes de transigir, a conciliação será tentada Prova oral A função primordial da audiência de instrução e julgamento é a colheita de prova oral, que se iniciará desde logo, caso a tentativa de conciliação resulte infrutífera. Há uma sequência a ser observada pelo juiz. Pódem-se distinguir três etapas: a ouvida do perito e dos assistentes técnicos; a colheita dos depoimentos pessoais das partes; e a ouvida das testemunhas. 167

168 516 Direito Processual Civil Esquematizado Marcus Vinicius Rios Gonçalves A ouvida do perito e dos assistentes técnicos As partes, caso ainda tenham alguma dúvida a respeito das conclusões do laudo pericial, podem pedir ao juiz que, na audiência de instrução e julgamento, ouça o perito e os assistentes técnicos. O procedimento é o previsto no art. 477, 3 e 4, do CPC. O perito só é obrigado a responder aos quesitos que lhe tenham sido previamente apresentados, com antecedência de, pelo menos, dez dias da audiência Depoimentos pessoais Depois de ouvidos o perito e os assistentes técnicos, o juiz colherá os depoimentos pessoais que tiverem sido requeridos, primeiro do autor, depois do réu. A respeito do procedimento de colheita dos depoimentos pessoais, ver item 19, supra Ouvida das testemunhas Somente depois de colhidos os depoimentos pessoais, o juiz ouvirá as testemunhas (ver item 18, supra), primeiro as do autor, na ordem que este desejar, e depois as do réu, também conforme a ordem que ele solicitar. As partes podem desistir da ouvida de uma ou de todas as testemunhas arroladas, não havendo necessidade de consentimento do adversário. Se possível, o juiz deverá ouvir todas as testemunhas em uma única ocasião, preservando a sua incomunicabilidade. Por isso, têm sido comuns as audiências adiadas porque uma ou mais de uma testemunha estão ausentes, embora outras tivessem comparecido, para que não haja cisão da prova. Mas haverá casos em que não será possível ouvir todas as testemunhas na mesma ocasião, seja porque uma precisa ser ouvida antecipadamente ou por carta (art. 453, do CPC), seja porque o número é tal que não é possível concluir a audiência no mesmo dia. Disso não advirá nenhuma nulidade para o processo, devendo o juiz marcar data próxima para concluí-la (CPC, art. 365, parágrafo único). Se faltar perito ou testemunha, havendo concordância das partes, o juiz ouvirá os presentes e marcará data próxima para ouvir os faltantes, cindindo a realização da audiência. Se não houver concordância, ele não ouvirá nem mesmo os presentes e designará data próxima para ouvir peritos e testemunhas de uma só vez, para que não se dê a cisão Debates Finda a colheita de prova oral, o juiz dará a palavra às partes, para que apresentem alegações finais orais, na própria audiência. Primeiro falará o advogado do autor, depois o do réu, e por fim, o Ministério Público, que intervenha na condição de fiscal da ordem jurídica. O prazo para a manifestação de cada um é de vinte minutos, que podem ser prorrogados por mais dez, a critério do juiz (CPC, art. 364). Havendo litisconsórcio, o prazo inicial e de prorrogação será um só para todos e deverá ser divido entre eles, salvo se ficar convencionado de modo diverso. 168

169 VIl m Do Processo e do Procedimento 517 Se a causa apresentar que;;tões complexas de fato ou de direito, os debates poderão ser substituídos por memo~iais, que serão apresentados pelo autor, pelo réu e pelo Ministério Público, nos casos em que intervenha, em prazos sucessivos de 15 dias, assegurada a vista dos autos Sentença Apresentadas as alegações finais orais, o juiz poderá, na própria audiência, proferir a sentença, razão pela qual é denominada "de instrução e julgamento". Se, porém, ele não estiver em condições de fazê-lo de imediato, poderá determinar que os autos venham conclusos para JUlgamento, devendo sentenciar no prazo de trinta dias. Caso a sentença seja proferida na audiência, as partes sairão intimadas, passando a correr o prazo de apelação; do contrário, serão intimadas pela imprensa. at Decisões proferidas na audiência A audiência é ato complexo, em que são praticados diferentes atos. É comum que o juiz profira. antes da sentença, decisões interlocutórias, a respeito de questões que surgem no seu curso. Por exemplo, contraditas das testemunhas, requerimentos das partes, pedidos de adiamento. e outros. Se tais decisões forem daquelas que comportam agravo de instrumento (art ), contra elas a parte prejudicada deverá interpor o recurso, sob pena de preclusão. Se não, a questão só poéerá ser reexaminada pelo Tribunal, se suscitada como preliminar nas razões ou nas contrarrazões de apelação Termo de audiência Todos os principais acontecimentos da audiência deverão constar de um termo, que será lavrado pelo escrivão sob ditado do juiz (CPC, art. 367). Do termo constarão, em resumo, os principais fatos ocorridos, quem compareceu e quem esteve ausente, se foi ouvido o perito, se foram colhidos depoimentos pessoais e ouvidas testemunhas e outros atos rele\'antes. Além disso, constarão por extenso as decisões proferidas e a sentença, caso dada no ato. O termo de audiência deverá ser assinado pelo juiz, pelo Ministério Público, pelos advogados e pelo escrivão. Não há necessidade de que as partes o assinem, salvo se houver ato de disposição para cuja prática os advogados não tenham poderes. Em seguida, será encartado aos autos. Quando eles forem eletrônicos, observar-se-ão as normas do CPC, da legislação específica e as normas internas dos tribunais.! Adiamento da audiência A possibilidade de adiamento da audiência vem prevista no art. 362 do CPC, que a admite em três situações: 11 por convenção das partes, o que só será admissível uma vez; 169

170 518 Direito Processual Civil Esquematizado faarcus Vinicius Rios Gonçalves 1!1 por atraso injustificado de seu início em tempo superior a 30 minutos do horário marcado. Só justifica o adiamento o atraso que não for justificado; 111 se não puder comparecer, por motivo justificado, qualquer pessoa que dela deve necessariamente participar. O dispositivo abrange o perito, as partes, as testemunhas ou os advogados. São variados os motivos que podem justificar a ausência na audiência, como problemas de saúde, via.sem inadiável marcada anteriormente, a necessidade de o advogado comparecer, na mesma data, a outra audiência, marcada anteriormente, não havendo, naquele processo, nenhum outro advogado que possa substituí-lo. O impedimento deve ser comprovado até a abertura da audiência (CPC, art. 362, 2 ), sob pena de ser realizada a i:jstrução. Essa exigência, no entanto, só poderá ser atendida quando a causa de adiamento tiver se verificada com antecedência. Há casos em que não será possível alertar o juiz antes do início, como, por exemplo, o de um mal súbito que acomete o advogado a caminho do Fórum. Em casos assim, a justificativa poderá ser posterior e a instrução, se tiver se realizado, terá de ser renovada. A situação poderá se complicar se o juiz, na audiência, proferir sentença, caso em que o advogado ausente terá de apelar, pedindo a nulidade da audiência e da sentença. Se a parte ou o advogado não comparecerem, nem justificarem a sua ausência, haverá alguma sanção? Se a parte tiver sido intimada para depoimento pessoal, haverá a pena de confesso, já examinada. Do contrário, a sila ausência não traz nenhuma consequência, uma vez que a sua presença só é necessária para a tentativa de conciliação - e pode ser suprida se o advogado tiver poderes para transigir - e para o depoimento pessoal. Apesar disso, é direito da parte, se o desejar, assistir à audiência, de forma que, se houver algum motivo justificado para o não comparecimento, poderá postular o seu adiamento. A ausência injustificada do advogado pode fazer com o que o juiz dispense a produção das provas requeridas pela parte defendida por ele ou requeridas pelo Ministério Público ou Defensor Público (CPC, art. 362, 2 ). Não haverá extinção do processo, nem aplicação de efeitos da revelia, mas apenas a dispensa das provas, que ainda assim é apenas facultada ao juiz. Ele poderá colhê-las, se o preferir, apesar da ausência do advogado, se isso o ajudar a elucidar os fatos. A ausência do perito e das testemunhas ensejará o adiamento, se a parte que requereu insistir em que sejam ouvidos. Não havendo razão fundada para a ausência, o juiz determinará a condução coercitiva e que o ausente arque com as despesas decorrentes do adiamento. O rol de hipóteses de adiamento do art. 362 não é taxativo, e podem existir outras causas, como a não observância do prazo mínimo de vinte dias de antecedência entre a entrega do laudo pericial e a sua realização. 23. QUESTÕES 1. (Juiz de Direito- TJ/MG ) Havendo antecipação da audiência de instrução e julgamento, o juiz, de ofício ou a requerimento da parte, mandará intimar: a) pessoalmente as partes para ciência da nova designação; 170

171 ALEXANDRE FREITAS CÂMARA 171

172 14 SENTENÇA 14.1 Conceito Chama-se sentença ao mais importante dos provimentos judiciais. Nos termos do que dispõe o Ia do art. 203, "[rjessalvadas as disposições expressas dos procedimentos especiais, sentença é o pronunciamento por meio do qual o juiz, com fundamento nos arts. 485 e 487, põe fim à fase cognitiva do procedimento comum, bem como extingue a execução. Esta definição legal, porém, não é imune a críticas, sendo relevante buscar-se determinar com mais precisão o conceito de sentença. Importa afirmar, pois, e em primeiro lugar, que o conceito de sentença não é universal, mas decorre do direito positivo. Assim, por exemplo, nada impediría que algum sistema processual estabelecesse que sentença é qualquer ato decisório do juiz, ou que se trata do ato pelo qual o juiz provê sobre o mérito. Não é assim, porém, que se conceitua a sentença no Direito brasileiro, devendo tal conceito ser extraído do modo como o ordenamento processual pátrio, compreendido sistematicamente, trata este ato jurisdicional. E é importante estabelecer o conceito de sentença por uma razão de ordem prática: é que, proferida a sentença, torna-se possível a interposição de um recurso denominado apelação (art ). Pois o direito processual civil brasileiro trata a sentença como um ato de encerramento. Dito de outro modo, a sentença é definida pela posição que o pronunciamento judicial ocupa no procedimento, que deve ser uma posição de encerramento do procedimento ou de alguma de suas fases. Explique-se um pouco melhor: o processo, como já visto, é um procedimento que se desenvolve em contraditório. A este conjunto formado pelo binômio "procedimento + contraditório pode-se chamar módulo processual. Ocorre que há processos formados por mais de um módulo processual. É que no sistema processual civil brasileiro podem ser encontradas três diferentes situações: (a) o processo cujo objeto é a produção de um julgamento; (b) o processo cujo objeto é a transformação da realidade fática, de modo a fazer com que as coisas sejam como deveríam ser; (c) o processo que tem por objeto a produção de ambos esses resultados. 172

173 264 O NOVO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO Câmara No primeiro caso, tem-se o processo de conhecimento. No segundo, processo de execução. E no último, tem-se o processo sincrético, assim chamado aquele que se desenvolve em duas fases, a primeira de conhecimento e a segunda de execução (ou, como se diz na linguagem adotada pelo CPC, cumprimento de sentença ). Há, então, processos formados por um só módulo processual e processos formados por dois (ou mais, porque poderá haver casos em que se terá, após a fase de conhecimento, o desenvolvimento de mais de uma fase executiva, bastando pensar no caso em que tenha havido condenação ao cumprimento de duas ou mais prestações de naturezas distintas, como fazer e entregar coisa) módulos processuais. Pois sentença é o ato que põe fim a um módulo processual. Assim, nos casos em que o processo se desenvolva em um só módulo (processo de conhecimento ou processo de execução), a sentença será o ato de encerramento do procedimento em contraditório (ou, como se costuma dizer no jargão forense, o ato que põe fim ao processo). E nos casos em que haja mais de um módulo processual (ou, se se preferir, mais de uma fase do processo), haverá tantas sentenças quantos sejam os módulos, cada uma delas encerrando um desses módulos (isto é, um desses procedimentos em contraditório). E o pronunciamento que encerrar o último desses módulos processuais será o ato de encerramento do processo (considerado como um todo). Pode-se, então, dizer que sentença é o ato do juiz que põe fim ao processo ou a alguma de suas fases. O art. 203, 1E estabelece, porém, uma ressalva, relativa aos procedimentos especiais. É que existem alguns desses procedimentos (como é o caso da "ação de demarcação ) em que existe a previsão de um pronunciamento judicial que, sem encerrar a fase cognitiva do processo, resolve parcialmente o mérito da causa (art. 581) e, posteriormente, se prevê outro ato, este sim destinado a dar por encerrada a fase cognitiva do processo (art. 587). Pois a lei dá a ambos esses pronunciamentos o nome de sentença. É que há procedimentos "bifásicos, em que a fase cognitiva se divide em duas partes bem distintas. Nesses casos, o ato de encerramento do primeiro segmento do módulo cognitivo é uma "sentença parcial (e o ato de encerramento do segundo segmento é a sentença final ). E sendo ambos tratados como sentenças, contra ambos é cabível a interposição de apelação. Ressalvados, assim, os procedimentos especiais que sejam segmentados em duas etapas, sentença é o ato judicial que põe termo ao processo ou a alguma de suas fases (isto é, a algum de seus módulos). E isto é confirmado pelo disposto no art. 316 ("[a] extinção do processo dar-se-á por sentença ), pelo art. 354 ("[ojcorrendo qualquer das hipóteses previstas nos arts. 485 e 487, incisos II e III, o juiz proferirá sentença ) - que integra uma Seção do Código chamada Da Extinção do Processo -, e pelo art. 925 ( [a] extinção [da execução] só produz efeito quando declarada por sentença ). Sentença é, pois, o ato que extingue o processo ou alguma de suas fases (cognitiva ou executiva). 173

174 Sentença Sentenças Terminativas e Definitivas Existem duas espécies de sentença: a terminativa e a definitiva. Terminativa é a sentença que não contém a resolução do mérito da causa; definitiva, a que contém a resolução do mérito. O CPC estabelece, no art. 485, quais são as hipóteses que acarretam a prolação de sentença terminativa, devendo-se extinguir o processo de conhecimento (ou a fase cognitiva do processo sincrético) sem resolução do mérito. E no art. 487 estão as hipóteses em que se proferirá sentença definitiva, extinguindo-se o processo de conhecimento (ou a fase cognitiva do processo sincrético) com resolução do mérito. A primeira hipótese de prolação de sentença terminativa é a de indeferimento da petição inicial (art ,1), o qual ocorre nos casos previstos no art Em qualquer dos casos em que o juiz indefere a petição inicial, portanto, será extinto o processo de conhecimento sem resolução do mérito. Será, também, proferida sentença terminativa quando ocorrer o abandono do processo (art. 485, II e III). Este pode ser bilateral (art. 485, II) ou unilateral (art. 485, III). Ocorre o abandono bilateral quando o processo ficar parado por mais de um ano por negligência de ambas as partes. Para adequadamente compreender-se esta situação, porém, impende recordar que a regra geral do sistema processual civil brasileiro é que se dê andamento ao processo de ofício (trata-se da regra - muitas vezes impropriamente chamada de princípio - do impulso oficial, prevista no art. 2a). Significa isto dizer que na maior parte dos casos, se um processo estiver parado, sem ter andamento, isto será devido à desídia do juízo, a quem incumbe, independentemente de provocação, dar-lhe seguimento. Casos há, porém, em que ao juiz não é dado prosseguir com o processo ex officio, dependendo seu andamento de ato a ser praticado por parte. Pois nos casos em que não seja possível o impulso oficial do processo, só podendo este ter andamento por ato que possa ser praticado por qualquer das partes, a negligência de ambas, deixando o processo paralisado por mais de um ano, acarreta o abandono bilateral do processo. Acontece que, na prática, situações como esta não existem. Pense-se, por exemplo, no caso de se ter encerrado a fase cognitiva do processo de conhecimento com uma sentença que reconhece a existência de uma obrigação de pagar dinheiro, sem, contudo, haver a determinação do quantum devido. Pois, neste caso, o andamento do processo depende da instauração de um incidente de "liquidação de sentença, destinado exatamente a determinar o valor devido. Tal incidente pode ter início por provocação de qualquer das partes (art. 509), mas não pode ser instaurado de ofício. Assim, se a liquidação não for postulada em um ano (a contar do trânsito em julgado da sentença condenatória), poder-se-ia considerar que ocorreu o abandono unilateral da causa, devendo o processo ser extinto. Acontece que tudo isso ocorre depois da sentença e, evidentemente, não há como extinguir-se o que extinto já estava. Não há, a rigor, qualquer situação em que o processo fique paralisado por não 174

175 266 O NOVO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO Câmara ser possível o impulso oficial, mas seu andamento dependa de ato que pode ser praticado por qualquer das partes. Por isso, na prática, não se vislumbra qualquer situação de extinção por abandono bilateral. Diversamente, o abandono unilateral (art. 485, III) é muito.comum na prática. É que existem várias situações em que ao juiz não é dado promover o impulso oficial do processo, dependendo-se, para que o feito tenha andamento, de ato que pelo autor pode ser praticado. É o que se tem, por exemplo, no caso em que o juiz determina ao autor que forneça elementos necessários para realizar-se a citação (como, por exemplo, a indicação do endereço correto do demandado, ou a indicação da pessoa natural que receberá citação em nome de réu pessoa jurídica). Pois em casos assim, se o autor, por não promover os atos e diligências que lhe incumbem, abandonar a causa por mais de trinta dias, o processo será extinto sem resolução do mérito. Em qualquer caso de abandono (bilateral ou unilateral), exige o Código que, antes de proferir sentença, o juiz determine a intimação pessoal da parte desidiosa para que dê andamento ao processo no prazo de cinco dias (art. 485, Ia). Só depois da intimação, pessoal e do decurso do prazo é que se poderá considerar configurada a hipótese de extinção do processo, proferindo-se, então, a sentença terminativa. No caso de abandono unilateral ocorrido depois do oferecimento de contestação, a intimação pessoal do autor para dar andamento ao processo em cinco dias não pode ser determinada de ofício, dependendo, para ser efetivada, de requerimento do réu (art. 485, 6a). Ocorrendo a extinção do processo por abandono bilateral (se vier a ser identificado algum caso em que ela seja possível), as despesas processuais serão rateadas proporcionalmente pelas partes. No caso de extinção por abandono unilateral, o autor pagará as despesas do processo e honorários de advogado (caso o réu já tenha oferecido contestação), tudo nos termos do art. 485, 2a. Outro caso de prolação de sentença terminativa se dá quando o juiz verifica a ausência de algum dos pressupostos processuais (art. 485, IV), tema sobre o qual já se tratou neste trabalho. Deve, também, extinguir-se o processo sem resolução do mérito quando se reconhecer a existência de perempção, de litispendência ou de coisa julgada" (art. 485, V). Este é tema que neste trabalho já se examinou, não sendo necessário retornar ao ponto. Dá-se a perempção quando o autor der causa, por três vezes, à extinção do processo por abandono unilateral, caso em que não poderá ele propor novamente a mesma demanda, mas lhe sendo ressalvada a possibilidade de alegar seu direito como defesa (art. 486, 3a). Pois se o mesmo autor abandonar três processos, todos instaurados para apreciação da mesma demanda (entre as mesmas partes, fundada na mesma causa de pedir e com a dedução do mesmo pedido), acarretando assim a prolação de três sentenças terminativas fundadas no inciso III do art. 485, ocorrerá a perempção. 175

176 Sentença 267 Neste caso, se o autor demandar pela quarta vez, este quarto processo (assim como os seguintes) deverá ser extinto sem resolução do mérito, ficando esse autor impedido de ajuizar essa mesma demanda novamente. Trata-se, sem dúvida, de uma sanção contra um comportamento que é evidentemente abusivo, contrário ao princípio da cooperação que norteia todo o sistema processual. Não terá, porém, ocorrido a perda do direito material. Este, todavia, só poderá ser alegado como defesa. Já a extinção do processo por litispendência ou coisa julgada se dá por conta da vedação do bis in idem. Em outros termos, o que se quer dizer aqui é que o sistema processual não admite que haja uma ilegítima duplicação de atividades processuais em torno do mesmo objeto. E que a litispendência e a coisa julgada são obstáculos a que se tenha um novo ajuizamento de uma demanda repetida (art. 337, 2a, 3a e 4a). Assim, proposta uma demanda e instaurado o processo, este estará pendente (litispendência significa pendência do processo). Imagine-se, então, que pendente esse processo, o autor ajuize novamente a mesma demanda (com as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido), instaurando assim um segundo processo. Pois o estado de litispendência do primeiro será causa de extinção do segundo. O mesmo raciocínio se aplica à coisa julgada. E que se uma demanda tiver sido proposta e decidida (com resolução do mérito), já não mais sendo admissível qualquer recurso, terá a decisão se tornado imutável, adquirindo uma autoridade a que se dá o nome de coisa julgada (que será objeto de exame adiante), e este fato impede que a mesma demanda seja novamente ajuizada. Caso se proponha novamente uma demanda já definitivamente julgada (com as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido), o novo processo que agora se instaura será extinto, sem resolução do mérito, em razão da coisa julgada já formada. Outra hipótese de prolação de sentença terminativa é a da ausência de qualquer das condições da ação (legitimidade das partes ou interesse processual), caso em que o processo deverá ser extinto sem resolução do mérito (art. 485, VI). Mais uma vez, está-se diante de tema já apreciado, sendo desnecessária qualquer repetição. Deve, também, ser proferida sentença terminativa quando se "acolher a alegação de existência de convenção de arbitragem ou quando o juízo arbitrai reconhecer sua competência (art. 485, VII). Como sabido, conflitos que envolvem partes capazes e direitos patrimoniais disponíveis podem ser solucionados através da arbitragem, nos termos da Lei n /1996. A arbitragem, porém, só poderá ser empregada como mecanismo de resolução do conflito se assim convencionarem as partes (através de alguma das modalidades de convenção de arbitragem: cláusula compromissória ou compromisso arbitrai). Convencionada a arbitragem como meio adequado para a resolução do litígio, exclui-se a atuação do Judiciário, que não poderá apreciar o mérito da causa, uma vez que a competência para tal apreciação terá sido transferida, por convenção das partes, para o árbitro ou tribunal arbitrai. 176

177 268 0 NOVO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO Câmara Pode ocorrer, no entanto, de haver sido celebrada uma convenção de arbitragem e ainda assim uma das partes ajuizar demanda perante órgão do Judiciário. Neste caso, se a parte demandada alegar, na contestação, a existência da convenção de arbitragem (demonstrando sua existência, evidentemente), caberá ao juiz proferir sentença terminativa, extinguindo o processo sem resolução do mérito, a fim de assegurar que em sede arbitrai seja resolvido o conflito. Não se pode, porém, extinguir o processo por este fundamento ex officio (art. 337, 5a), sendo certo que a ausência de alegação da existência de convenção de arbitragem na contestação implica aceitação da jurisdição estatal e renúncia à arbitragem (art. 337, 6a). Situação análoga é a daquela em que há dois processos instaurados simultaneamente com o mesmo objeto, sendo um deles perante órgão do Judiciário e o outro perante árbitro ou tribunal arbitrai. Pois neste caso, reconhecida pelo árbitro (ou tribunal arbitrai) sua competência, e chegando tal decisão áo conhecimento do juiz, deverá ser extinto o processo judicial sem resolução do mérito. Isto se dá em respeito ao princípio por força do qual incumbe ao árbitro apreciar e afirmar sua própria competência (princípio Kompetenz-Kompetenz). Neste caso, então,' o processo arbitrai prosseguirá e o processo judicial será extinto sem resolução do mérito. Caso se queira discutir a validade da convenção de arbitragem ou do processo arbitrai, isto só podérá acontecer após a prolação da sentença arbitrai, em processo que se instaure para apreciação de demanda de anulação da sentença arbitrai (art. 20, 2a, da Lei de Arbitragem). Também será proferida sentença terminativa, extinguindo-se o processo sem resolução do mérito, quando for homologada a desistência da ação (art. 485, VIII). O direito de ação, como já se pôde ver em passagem anterior deste estudo, é direito de que todos são titulares, e que a todos permite atuar em juízo, em contraditório, ao longo de todo o processo, para contribuir para a formação de um resultado que a parte pretende lhe seja favorável. Pois é perfeitamente possível que o demandante, com o processo em curso, desista de continuar a exercer seu direito de ação, requerendo ao juiz, então, que dê por encerrado o processo, mas sem resolver o mérito da causa (o qual, permanecendo sem solução, poderá ser posteriormente trazido ajuizo novamente, em outro processo). Manifestada a desistência da ação, este ato da parte será homologado por sentença, encerrando-se o processo sem resolução do mérito. Acontece que, conforme também já se viu em passagem anterior deste livro, o direito de ação não é exercido no processo apenas pelo autor, mas também pelo réu. Este, a partir do momento em que oferece contestação, passa a exercer seu direito de ação e tem tanto direito quanto o autor a ver o mérito da causa resolvido. Exatamente por isso é que, nos termos do 4a do art. 485, depois do oferecimento da contestação o processo só pode ser extinto por desistência se o réu concordar. Impende, então, que ambas as partes desistam de continuar a exercer seus direitos de ação no processo, de modo que não haja mais razão para com ele prosseguir. Tendo o autor, porém, desistido da ação depois do oferecimento da contestação, mas não concordando o réu com a prolação de sentença terminativa, o processo deverá seguir normalmente em direção à resolução do mérito da causa. 177

178 Sentença 269 Estabelece o inciso IX do art. 485 que será proferida sentença terminativa se, "em caso de morte da pane, a ação for considerada intransmissível por disposição legal. Este é dispositivo cuja redação merece crítica. Em primeiro lugar, equivoca-se o texto normativo ao usar o termo morte". É que apenas as partes que sejam pessoas naturais morrem, mas não as pessoas jurídicas. E estas também podem encontrar-se na posição jurídica de que aqui se trata. Melhor do que falar em morte da parte, então, seria falar da hipótese em que a parte deixa de existir. Além disso, fala a lei processual em ser instransmissível a ação. Tem-se, aí, uma inaceitável (e inexplicável) confusão entre a ação, fenômeno que se manifesta no plano processual, e as posições jurídicas de direito material. Estas é que, sendo intransmissíveis, podem levar à extinção do processo. É que pode acontecer de em um processo ter sido deduzida alguma posição jurídica ativa (como um direito) ou passiva (como uma obrigação) que seja intransmissível aos sucessores de seu titular. Pois nesses casos, deixando a parte de existir, o processo precisa ser extinto sem resolução do mérito. Pense-se, por exemplo, no caso de o demandante ter ido a juízo para pedir a condenação do Estado a lhe fornecer um medicamento muito caro. Ocorrendo o falecimento do demandante, não há qualquer Utilidade em prosseguir-se com este processo (já que nenhuma utilidade havería em se fornecer o medicamento para os sucessores do demandante), devendo ele ser extinto sem resolução do mérito. O mesmo se dá no processo em que o autor postula a condenação do réu ao cumprimento de obrigação de fazer personalíssima, que só pelo devedor pode ser cumprida. Pois se o devedor deixar de existir (morrer, no caso de pessoa natural, ou se extinguir, no caso de pessoa jurídica), não haverá mais quem possa cumprir a prestação, também aqui se tornando inútil prosseguir com o processo, que deverá ser extinto sem resolução do mérito. Assim, deve-se compreender este inciso IX do art. 485 no sentido de que ele determina a prolação de sentença terminativa quando a causa versar sobre posição jurídica intransmissível e seu titular deixar de existir. Além desses casos aqui examinados, o processo de conhecimento será extinto sem resolução do mérito em outros casos previstos em lei (art. 485, X), como, por exemplo, se o autor não requerer, no prazo fixado pelo juiz, a citação de todos os litisconsortes passivos necessários (art. 115, parágrafo único). Dentre todas as causas de prolação de sentença terminativa enumeradas no art. 485, podem ser conhecidas de ofício as previstas nos incisos IV (falta de pressupostos processuais), V (perempção, litispendência e coisa julgada), VI (falta de alguma "condição da ação ) e IX (intransmissibilidade da posição jurídica de direito material cujo titular era parte que, no curso do processo, deixou de existir). Estas são matérias cognoscíveis de ofício, em qualquer tempo e grau de jurisdição, sobre elas não incidindo preclusão (art. 485, 32). 178

179 270 O NOVO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO Câmara O pronunciamento judicial que não resolve o mérito da causa, via de regra, não impede que a mesma demanda (com as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido) seja novamente proposta (art. 486). Há casos, porém, em que esta repropositura não será possível. E o que se dá no caso de extinção por litispendên- cia, em que só seria possível ajuizar novamente a demanda se o primeiro processo pendente viesse a ser extinto sem resolução do mérito. Do mesmo modo, no caso de extinção por indeferimento da petição inicial só se admite uma nova propositura da mesma demanda se a nova petição inicial for elaborada, corrigido o vício que acarretou a extinção do primeiro processo. Assim também, no caso de extinção por falta de pressuposto processual ou de "condição da ação a demanda só poderá ser proposta novamente se o pressuposto faltante ou a "condição ausente for preenchida, sanando-se o vício. Por fim, no caso de extinção fundada na existência de convenção de arbitragem, só poderá ser proposta novamente a mesma demanda se a convenção arbitrai for reputada inválida (pelo árbitro ou tribunal arbitrai) ou se a sentença arbitrai for anulada por não ser caso de solução arbitrai do litígio. Pois ê exàtamente para tratar dessas hipóteses que o CPC estabelece, expressamente (art. 486, l 2), que "[n]o caso de extinção em razão de litispendência e nos casos dos incisos I, IV, VI e VII do art. 485, a propositura da nova ação depende da correção do vício que levou à sentença sem resolução do mérito". Em qualquer caso em que tenha sido extinto o processo sem resolução do mérito, só se admitirá nova propositura da demanda se a petição inicial vier acompanhada da prova do pagamento ou do depósito das custas processuais e honorários advocatícips devidos em função do processo anterior (art. 486, 22). Vistos os casos em que se profere sentença terminativa, impende agora examinar as hipóteses que levam à prolação de sentença terminativa, que são aqueles casos em que o processo de conhecimento é extinto com resolução do mérito (art. 487). O primeiro caso, mencionado na legislação processual, em que deve o juiz proferir sentença definitiva, é o que se pode considerar como o da extinção normal do processo de conhecimento: aquele em que o juiz acolhe ou rejeita o pedido formulado na demanda principal ou na reconvenção (art. 487, I). Trata-se da hipótese em que o juiz emite um julgamento acerca da pretensão deduzida através do pedido formulado, seja para julgá-lo procedente, seja para considerá-lo improcedente. Entre os casos de improcedência do pedido estão aqueles em que o juiz, de ofício ou por provocação, pronuncia a decadência ou a prescrição (art. 487, II). É que, na verdade, prescrição e decadência são fundamentos de decisões de improcedência. Pense-se, por exemplo, no caso em que alguém postula a anulação de um negócio jurídico depois de decorrido o prazo decadencial a que se submete o direito à anulação. Pois neste caso o juiz deverá declarar improcedente o pedido formulado pelo autor, uma vez que não tem ele direito à anulação pretendida. 179

180 Sentença 271 O mesmo raciocínio se aplica aos casos de prescrição. Figure-se, à guisa de exemplo, a hipótese de se cobrar dívida prescrita. Sendo reconhecida a prescrição, deverá o juiz julgar improcedente o pedido de cobrança, rejeitando-o. A rigor, portanto, prescrição e decadência são fundamentos da improcedência, e este inciso II do art. 487 sequer precisaria existir autonomamente. Deixar claro o ponto, porém, evita dúvidas e divergências absolutamente desnecessárias, motivo pelo qual não há razão para se criticar o texto normativo por sua clareza. Interessante notar que, nos termos do parágrafo único do art. 487, e como aplicação do princípio do contraditório - entendido como garantia de participação com influência e não surpresa - a prescrição e a decadência não serão reconhecidas sem que antes seja dada às partes oportunidade de manifestar-se". Ora, se a decadência ou a prescrição tiver sido deduzida como matéria de defesa pelo réu, evidentemente terá de ser ouvido o autor. Tendo a alegação ocorrido na contestação, aliás, o autor necessariamente terá garantida a oportunidade de manifestar-se em réplica (art. 350). A disposição deste parágrafo único é relevante, especialmente, para os casos em que o juiz suscitar a questão da decadência ou da prescrição de ofício. Neste caso, deverá ser dada a ambas as partes oportunidade para manifestarem-se acerca da prescrição ou da decadência. E aqui há um dado relevante: suscitada de ofício a questão atinente a ter havido prescrição, e aberta a oportunidade para manifestação das partes, o silêncio do devedor deve ser interpretado como renúncia tácita à prescrição (art. 191 do CC). Assim, silenciando o devedor sobre a matéria quando provocado de ofício pelo juiz para sobre ela manifestar-se, deverá o juiz reputar tacitamente renunciada a prescrição, o que a impedirá de a pronunciar. Há, porém, nesse parágrafo único do art. 487 uma ressalva que precisa ser adequadamente compreendida. É que ali se faz uma ressalva ao disposto no art. 332, l 2, que prevê o julgamento de improcedência liminar do pedido quando se reconhecer desde logo a decadência ou a prescrição. Impende, porém, considerar que a ressalva prevista na lei significa que nesse caso o juiz não terá de ouvir, antes de proferir a sentença por este fundamento, [as] partes (como consta do texto normativo do parágrafo único do art. 487). Não se extraia daí, porém, que não seria necessário ouvir sequer o autor. É que a prévia oitiva deste resulta da incidência do disposto no art. 92. Em outros termos, caso o juiz verifique desde logo que pode ter ocorrido a prescrição ou a decadência e, portanto, que pode ser caso de julgamento de improcedência liminar do pedido, deverá abrir vista ao autor para que se manifeste sobre o ponto, somente podendo decidir com base nesse fundamento depois de ter assegurado ao autor oportunidade para manifestar-se (arts. 92 e 10). De outro lado, verificando o juiz que pode ser caso de ter-se consumado a decadência ou a prescrição após o oferecimento da contestação, a decisão com base nesse fundamento só poderá ser proferida depois de se dar oportunidade de manifestação a ambas as partes (arts. 92, 10 e 487, parágrafo único). Além dos casos em que o juiz julga o pedido (procedente ou improcedente), casos há em que o mérito da causa se resolve sem que ocorra efetivamente um julgamento. 180

181 272 O NOVO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO Câmara São os casos em que as partes alcançam a solução do conflito por autocomposição, incumbindo ao juiz tão somente verificar a validade do ato pelas partes celebrado e, constatada a inexistência de vícios, promover sua homologação. Pois é isto que acontece quando o juiz homologa o reconhecimento da procedência do pedido, a transação ou a renúncia à pretensão, fenômenos que só podem ocorrer validamente se o direito material deduzido no processo admite autocomposição. O reconhecimento da procedência do pedido é o ato pelo qual o demandado (réu ou autor-reconvindo) dá razão ao autor, afirmando expressamente que a pretensão do demandante (autor ou réu-reconvinte) é fundada e deve ser acolhida. Nesse caso, quem afirma ser procedente o pedido formulado pelo demandante não é o juiz, mas o demandado, e a sentença é meramente homologatória do reconhecimento. Tal sentença, porém, é em tudo e por tudo equivalente a uma sentença de procedência do pedido. A transação, por sua vez, é o negócio jurídico por meio do qual as partes, através de concessões mútuas, põem fim ao seu conflito. Neste caso, incumbe ao juiz proferir sentença homologatória da transação, a qual corresponde rigorosamente a uma sentença de procedência parcial, sendo certo que o conteúdo daquilo que ao demandante será reconhecido resulta do negócio jurídico celebrado pelas partes (e não do julgamento do juiz). Por fim, a renúncia à pretensão é o ato pelo qual o demandante abre mão, definitivamente, daquilo que postulou em juízo. Neste caso, a sentença homologatória equivale perfeitamente a uma sentença de improcedência do pedido, tendo sido o próprio demandante, por ato voluntário - e não o juiz - a afirmar que o pedido por ele formulado deveria ser rejeitado. Pode ocorrer de o juiz verificar estarem presentes duas causas de extinção do processo de conhecimento, sendo uma causa de extinção sem resolução do mérito e a outra de extinção com resolução do mérito. Pense-se, por exemplo, na hipótese de o juiz verificar que falta um pressuposto processual (por exemplo, a demanda não foi regularmente formulada, faltando requisitos essenciais à petição inicial e não tendo o demandante, não obstante regularmente intimado a fazê-lo, emendado sua petição) e, também, que se operou a decadência. Pois é preciso verificar qual deve ser a atitude do juiz em casos assim: extinguir o processo com ou sem resolução do mérito. Nesses casos, deverá o juiz verificar, em primeiro lugar, quem seria beneficiado pela extinção do processo sem resolução do mérito. É preciso aqui evitar a solução simplista consistente em achar que a extinção do processo sem resolução do mérito é sempre ruim para o autor e benéfica para o réu. Não é bem assim. É preciso, sempre, verificar quem é o destinatário da proteção jurídica outorgada pela norma jurídica que prevê a hipótese de extinção sem resolução do mérito. Pense-se, por exemplo, na extinção por ausência de capacidade postulatória. Neste caso, prevê-se a extinção do processo sem resolução do mérito porque o demandante não tem advogado regularmente constituído (arts. 76, 1B, I, e 485, IV). Pois a regra é 181

182 Sentença 273 claramente destinada a estabelecer uma proteção para o demandante, evitando que ele prossiga em um processo sem adequada defesa técnica, o que geraria - caso ocorresse - uma grande probabilidade de que ficasse vencido mesmo tendo razão, já que possivelmente não saberia valer-se adequadamente do instrumental jurídico-processual existente. Ora, mas se o juiz verifica que, mesmo não estando o autor representado por advogado, estão presentes elementos que permitam afirmar que seu pedido é procedente, não haveria qualquer razão para extinguir-se o processo sem resolução do mérito. Em situações assim, deve o processo ser extinto com resolução do mérito, o que dará ao beneficiário da norma uma proteção ainda maior do que a que ele teria com a prolação de sentença terminativa. Pense-se, agora, no caso de se verificar que o processo poderia ser extinto sem resolução do mérito por litispendência (o que beneficiaria o réu, evitando que ele tenha de se defender em dois processos distintos), mas também que se operou a decadência. Pois é muito maior a proteção para o réu se for desde logo pronunciada a decadência e, por conseguinte, declarada a improcedência do pedido formulado pelo demandante, do que se o processo for extinto sem resolução do mérito. Adota-se, pois, no sistema processual brasileiro, o princípio da primazia da resolução do mérito, o qual, por força do disposto no art. 488, leva a que se afirme que, [djesde que possível, o juiz resolverá o mérito sempre que a decisão for favorável à parte a quem aproveitaria eventual pronunciamento nos termos do art Elementos A sentença, formalmente considerada, é um conjunto formado por três integrantes: relatório, fundamentação e dispositivo. Sendo estes os integrantes da sentença, as partes do todo, a eles dá-se o nome de elementos da sentença (art. 489). E são todos três elementos essenciais, já que não podem, de maneira alguma, faltar. A ausência de cada um deles, como se poderá ver adiante, acarreta consequências relevantes, as quais podem ser até mesmo conhecidas de ofício. Esses três elementos não precisam, necessariamente, vir expostos na ordem em que aparecem no texto do art É perfeitamente possível, por exemplo, iniciar-se a sentença pelo seu dispositivo (dizendo-se algo como "esta é uma sentença de improcedência do pedido formulado na seguinte causa..., apresentando-se em seguida o relatório do processo e a fundamentação do julgamento já anunciado). Tampouco se deve considerar que os três elementos precisam estar formalmente separados, como capítulos de um livro. Assim, ainda que o juiz anuncie ter separado formalmente os três elementos (o que normalmente se vê, com os juizes se valendo de uma fóimula para anunciar o término do relatório e o início da fundamentação que é algo como "é o relatório, passa-se a decidir e, em seguida, anuncia-se o término da fundamentação e o início da parte dispositiva com algo como diante do exposto, julga-se... ), esta separação não é necessariamente rígida. Basta pensar que - Como se verá melhor 182

183 274 0 NOVO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO Câmara adiante - o dispositivo é a parte conclusiva da sentença e, por isso, todas as decisões que o juiz profira ao longo da sentença o integram. Ocorre que, com muita frequência, vê-se na prática o juiz proferir decisões sobre questões preliminares naquilo que ele formalmente chama de ''fundamentação, reservando o dispositivo apenas para a decisão de mérito. Assim não é, porém, e as decisões acerca das questões preliminares, decisões que são, integram o dispositivo (onde quer que estejam escritas tais decisões). Pois é exatamente por isto que o 3Q do art. 489 estabelece que [a] decisão judicial deve ser interpretada a partir da conjugação de todos os seus elementos e em conformidade com o princípio da boa-fé Relatório Relatório é a síntese do processo. Trata-se de um resumo, no qual o juiz narrará, sinteticamente, tudo aquilo de relevante que tenha ocorrido ao longo do processo. Estabelece o inciso I do art. 489 que o relatório "conterá os nomes das partes, a identificação do caso, com a suma do pedido e da contestação, e o registro das principais ocorrências havidas no andamento do processo. Deve o juiz, então, declarar no relatório quem são as partes, fazer um resumo do caso (o que implica dizer que é preciso fazer uma descrição sintética da causa de pedir), descrevendo - ainda que cbreviadamente - qual foi o pedido formulado. Em seguida, deverá o juiz apresentar uma descrição resumida da contestação e de todos os acontecimentos relevantes do processo (como a existência e o teor de reconvenção, incidentes importantes que tenham sido instaurados e decididos, provas que tenham sido produzidas etc.). Sendo o relatório elemento essencial da sentença, deve-se considerar que a senença a que falte relatório é nula, podendo o vício ser reconhecido de ofício (desde que, evidentemente, se demonstre que da ausência deste elemento resultou algum prejuízo) Fundamentação A Constituição da República estabelece, em seu art. 93, IX, que toda decisão judicial será fundamentada, sob pena de nulidade. O princípio da fundamentação das decisões judiciais, portanto, é um dos integrantes do modelo constitucional de processo que deve necessariamente ser observado no processo civil brasileiro (art. 1B). Pois é exatamente por isso que o art. 11 estabelece, reproduzindo a disposição constitucional, que serão "fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, sendo esta uma das normas fundamentais do processo civil, estudadas em passagem anterior deste trabalho. Impende aqui, porém, aprofundar um pouco mais o estudo da fundamentação da sentença (e das demais decisões judiciais). A fundamentação da decisão judicial é o elemento consistente na indicação dos motivos que justificam, juridicamente, a conclusão a que se tenha chegado. Este é um 183

184 Sentença 275 ponto essencial: fundamentar é justificar. É que a decisão precisa ser legitimada democraticamente, isto é, a decisão precisa ser constitucionalmente legítima. Para isso, é absolutamente essencial que o órgão jurisdicional, ao decidir, aponte os motivos que justificam constitucionalmente aquela decisão, de modo que ela possa ser considerada a decisão correta para a hipótese. E esses fundamentos precisam ser apresentados substancialmente. Afinal, se os direitos processuais fundamentais (como o direito ao contraditório ou o direito à isonomia) têm de ser compreendidos em sua dimensão substancial - e não em uma dimensão meramente formal -, o mesmo deve se aplicar ao direito fundamental a uma decisão fundamentada. O que se pretende dizer com isso é que não terá sido observado o princípio constitucional da fundamentação das decisões se o pronunciamento judicial contiver uma fundamentação meramente formal, que é a rigor um simulacro de fundamentação, ou seja, uma fundamentação fictícia. Afirmações como "presentes os requisitos, deferese a medida, ou indefere-se por falta de amparo legal não são verdadeiras fundamentações, porque não justificam as decisões. Por que se podem considerar presentes os requisitos? E que requisitos são esses? O que significa "falta de amparo legal? Há alguma vedação? Onde está a proibição? Por que ela se aplica ao caso? Nenhuma dessas perguntas é respondida por fundamentações simuladas, fictícias, como as que foram indicadas acima. Exige-se, portanto, uma fundamentação verdadeira, suficiente para justificar a decisão, de modo a demonstrar que ela é constitucionalmente legítima. E daí se extrai a íntima ligação que há entre o princípio do contraditório e o da fundamentação das decisões. É que, sendo a decisão construída em contraditório, através da comparticipação de todos os sujeitos do processo, torna-se absolutamente fundamental que a decisão judicial comprove que o contraditório foi observado, com os argumentos deduzidos pelas partes e os suscitados de ofício pelo juiz, todos eles submetidos ao debate processual, tendo sido considerados na decisão. Sempre vale recordar que um dos elementos formadores do princípio do contraditório é o direito de ver argumentos considerados (que a doutrina alemã chama de Recht au f Berücksichtingung). Pois só se poderá saber, no caso concreto, se os argumentos da parte foram levados em consideração na decisão judicial - e, portanto, se o contraditório substancial foi observado - pela leitura dos fundamentos da decisão. Daí a intrínseca ligação entre contraditório e fundamentação das decisões, por força da qual é possível afirmar que, sendo o processo um procedimento em contraditório, torna-se absolutamente essencial que toda decisão judicial seja substancialmente fundamentada. Ademais, é sempre importante lembrar que as decisões judiciais são atos praticados por agentes estatais. Por força disso, e sendo o juiz um agente estatal que atua em nome do Estado Democrático de Direito (art. I2 da Constituição da República), é preciso que tais atos sejam revestidos de legalidade e de legitimidade. A legalidade da decisão (entendida como juridicidade, isto é, como compatibilidade com o ordenamento jurídico compreendido em seu todo) é exigida expressamente 184

185 276 0 NOVO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO Câmara pelo art. 8a do CPC. A legitimidade é, porém, uma exigência do Estado Democrático de Direito, e precisa estar presente na atuação dos juizes e tribunais. Ocorre que, diferentemente dos agentes que atuam no Poder Legislativo e no Poder Executivo - os quais são legitimados pelos votos que recebem - o magistrado não é eleito e, assim, não recebe legitimidade a priori da sociedade. Sua legitimidade, então, deve ser estabelecida a posteriori. O que se quer dizer com isso é que, enquanto administrador público e legislador são legitimados previamente, e com base nessa legitimidade, conquistada pelo voto, exercem suas funções, o juiz não recebe sua legitimidade previamente por escolha da sociedade. Daí a necessidade de que o juiz se legitime ato a ato. Cada decisão que um juiz ou um tribunal profere precisa ser constitucionalmente legitimada. E isto só ocorrerá se cada uma dessas decisões for proferida em conformidade com a Constituição da República. Acontece que isso só pode ser aferido pela fundamentação da decisão judicial. Os fundamentos da decisão, portanto, são os elementos que permitem a aferição da legitimidade constitucional e democrática dos pronunciamentos judiciais.e tudo isso se revela fundamental quando se considera que uma das características essenciais do exercício do poder em um Estado Democrático de Direito é a controlabilidade dos atos de poder. Em outros termos, ' não haverá Estado Democrático se não existirem mecanismos capazes de permitir algum tipo de controle dos atos de poder do Estado. Afinal, não há Democracia sem controle do poder. Pois é pela fundamentação da decisão judicial que se permite o exercício de dois tipos de controle das decisões: (a) o controle forte, aquele exercido por órgãos superiores ao que tenha proferido a decisão, e que permite, através de mecanismos destinados a promover o reexame das decisões (como os recursos, a remessa necessária e as demandas autônomas de impugnação), a cassação de decisões erradas; e (b) o controle fraco, isto é, o controle que não pode levar à cassação de atos, mas que, sendo exercido de forma difusa pela sociedade, permite que se debata acerca da correção das decisões judiciais, de modo a contribuir para a melhoria constante da qualidade dos. pronunciamentos jurisdicionais. Por força de tudo quanto até aqui se afirmou, o l 2 do art. 489 estabelece uma espécie de conteúdo mínimo da fundamentação da decisão judicial que permita afirmar sua validade. É perfeitamente possível comparar os incisos do art. 489, Ia - que indicam o que deve constar na decisão judicial para que ela seja tida por válida - com os incisos do art. 319 (que indicam os requisitos mínimos para que uma petição inicial seja apta a viabilizar o regular desenvolvimento do processo). Ambos esses dispositivos são roteiros, um a ser seguido por juizes, outro a ser observado por advogados. E do mesmo modo como advogados bem capacitados não precisam ler o art. 319 a cada vez que vão elaborar uma petição inicial, juizes adequadamente capacitados não precisarão ler o disposto no I a do art. 489 a cada vez que forem proferir uma decisão. O que se quer com tal dispositivo é, tão somente, evitar decisões ineptas, absurdamente não fundamentadas. 185

186 Sentença 277 E nem se diga que a exigência de fundamentação substancial da decisão seria um fator de entrave à duração razoável do processo. Em primeiro lugar, não há qualquer exigência de que as decisões sejam longamente fundamentadas. A fundamentação pode ser objetiva, concisa, desde que suficiente. Além disso, a garantia de duração razoável do processo destina-se a assegurar que no processo não haja dilações indevidas, mas todas as dilações devidas devem ocorrer. Uma decisão judicial bem fundamentada, fruto de um contraditório efetivo, pleno e substancial, é uma decisão que mais dificilmente será reformada ou anulada em grau de recurso, e isto, certamente, será um fator de desestimulo a recursos, permitindo um aperfeiçoamento da prestação jurisdicional, que conseguirá, fatalmente, ser alcançada em tempo razoável. Assim é que, nos termos do já citado I a do art. 489, não se considera fundamentada a decisão que "se limitar à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida (art. 489, I a, I). Deste modo, decisões judiciais que nada mais fazem do que indicar o dispositivo legal, sem apresentar uma justificativa para sua incidência no caso concreto (algo como art. X, defiro, ou como art. Y da Lei Z, indefiro ) devem ser reputadas nulas por ausência de fundamentação. Também a decisão que se limita a reproduzir o texto normativo (como, por exemplo, uma decisão em que se lesse algo como "Havendo elementos que evidenciam a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil ao processo, defiro a tutela de urgência, por exemplo) é inválida e deve ser cassada. Considera-se, ainda, nula por vício de fundamentação a decisão que nada faz além de parafrasear o texto do ato normativo (como no caso em que se dissesse algo como "presentes o fumus boni iuris e opericulum in mora, defiro a tutela de urgência ). Pois é evidente que pronunciamentos assim não estão fundamentados mesmo, e devem ser considerados nulos. Também é nula por vício de fundamentação (art. 489, Ia, II) a decisão que emprega conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso. Como sabido, há conceitos jurídicos que são vagos, de definição imprecisa, caracterizando-se por uma fluidez que não permite o estabelecimento exato de seu significado. Resulta daí uma imprecisão semântica que faz com que seja preciso, em cada caso concreto, estabelecer-se as razões que levam à sua aplicação. E que diante desses conceitos indeterminados não se consegue estabelecer, a priori, as situações que se enquadrariam na sua fórmula. E isto que acontece com conceitos como ordem pública, interesse coletivo, justa indenização, entre outros. Impende, assim, em cada caso concreto em que se tenha de aplicar um desses conceitos, que o órgão jurisdicional indique os parâmetros empregados em sua interpretação, estabelecendo o motivo concreto pelo qual é ele aplicado - nos termos em que compreendido - no caso concreto. Permita-se um exemplo. O art. 183, 3a, da Constituição da República estabelece que [a]s desapropriações de imóveis urbanos serão feitas com prévia e justa indenização em dinheiro. Assim, instaurado um processo que tenha por objeto a 186

187 278 0 NOVO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO Câmara determinação do valor a ser pago a título de indenização por um imóvel que o Poder Público pretende desapropriar (o qual é regulado pelo Decreto-Lei n /1941), deve-se estabelecer, na sentença, o preço da indenização (art. 24). É na sentença, então, que se fixa o valor da justa indenização. Pois a sentença só estará fundamentada se ali se indicar os parâmetros empregados para estabelecer-se que um determinado valor é o justo para o caso concreto. Pense-se em outro exemplo: o art , 42, do CC estabelece que [o] proprietário [pode] ser privado da coisa se o imóvel [consistir] em extensa área, na posse ininterrupta e de boa-fé, por mais de cinco anos, de considerável número de pessoas, e estas nela houverem realizado, em conjunto ou separadamente, obras e serviços considerados pelo juiz de interesse social e econômico relevante. Ora, parece evidente jue extensa área, considerável número de pessoas e interesse social e econômico relevante são conceitos vagos, imprecisos, juridicamente indeterminados. Pois não se pode admitir iue se profira uma decisão judicial que diga algo como tendo o imóvel extensa área, endo ocupado por considerável número de pessoas que nele fizeram obras de rele- ante interesse social e econômico, priva-se o proprietário do bem. É absolutamente sssencial, para que se tenha por verdadeiramente justificada a decisão judicial, que o órgão jurisdicional indique, em sua decisão, os parâmetros empregados para afirmar que a área daqüele imóvel em particular é realmente extensa; que o número de pessoas que ocupa aquele prédio é considerável, e que as obras realizadas têm interesse social e econômico relevante. Em outras palavras, é preciso deixar claro o modo como se hegou à conclusão de que realmente deveria incidir a norma jurídica que resulta da nterpretação do 52 do art do CC. Não se estabelecendo isso na decisão, de orma precisa, é ela nula. Afinal, se o conceito jurídico é indeterminado, sua aplicação no caso concreto deve dar-se de forma determinada, precisa, a fim de permitir que se encontre, na fundamentação da decisão, elementos que levem a afirmar que aquela era a decisão correta para o caso concreto posto sob julgamento. Também é viciada por ausência de fundamentação a decisão judicial que [invoca] motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão (art. 489, l 2, III). Tem-se, aí, um comando destinado a impedir a utilização de decisões prêt-à-porter (expressão francesa que significa pronto para vestir, e que indica a roupa que, produzida em larga escala, é posta à venda já pronta, sem que seja produzida de modo individualizado para cada consumidor). É que incumbe ao órgão jurisdicional proferir uma decisão que seja a solução do caso concreto, personalizada, e não ter decisões prontas, produzidas para utilização em larga escala, sem respeitar as características de cada caso concreto que seja deduzido em juízo. Isto é extremamente importante especialmente (mas não apenas) no que diz respeito às demandas de massa, repetitivas. É que não obstante o caráter repetitivo que ostentam, todas elas têm características individuais que são irrepetíveis, e que precisam ser consideradas pelo órgão jurisdicional no momento de se proferir a decisão. 187

188 Sentença 279 Pense-se, por exemplo, na imensa quantidade de processos que já se instauraram no País para postular o reconhecimento de que teria havido um registro indevido do nome do demandante em um cadastro restritivo de crédito (ou seja, um cadastro de maus pagadores, de devedores inadimplentes). Por mais que essas causas sejam exaustivamente repetitivas, sendo incontável o número de casos de pessoas que, embora nada devam, têm seus nomes inscritos nesses cadastros por terem sido vítimas de fraudes perpetradas por indivíduos que obtêm indevidamente seus dados pessoais e os empregam para praticar atos ilícitos, sempre será necessário que se verifique, no caso concreto, se aquele demandante é realmente vítima de fraude ou se ele é, na verdade, um devedor inadimplente que tenta se passar por alguém que inocentemente descobriu que teve seu nome indevidamente levado àquele banco de dados. E de se exigir, portanto, que o pronunciamento judicial seja criado para o caso concreto, identificando as circunstâncias fáticas e jurídicas que o envolvem, não se podendo conviver com decisões produzidas em escala industrial. Tenha-se claro este ponto: ao Judiciário incumbe julgar os casos que lhe são submetidos. E cada caso é um caso, por mais que hoje existam casos iguais, muitas vezes em quantidades impressionantes. Os casos podem até ser iguais, mas não se trata sempre do mesmo caso. E é preciso que a decisão justifique até mesmo os motivos que levam a se considerar que aquele caso em julgamento é igual a outros já julgados, demonstrando-se que realmente as circunstâncias fáticas deles são idênticas. Não sendo feita essa demonstração, a decisão será nula por vício de fundamentação, pois não estará adequadamente fundamentada. É, ainda, nula por falta de fundamentação a decisão que não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador (art. 489, l,2, IV). Este é um elo de ligação entre os princípios do contraditório e da fundamentação das decisões, ligação esta já tantas vezes afirmada neste estudo. Como deve ser sempre lembrado, o princípio do contraditório assegura aos sujeitos interessados no resultado do processo o direito de participar com influência na formação do seu resultado (além de assegurar que não haverá decisões-surpresa). Pois este direito de participação com influência não se resume à garantia de que as partes poderão manifestar-se ao longo do processo ("direito de falar ), mas também - e principalmente - à garantia de que serão Ouvidas ( direito de ser ouvido", right to be heard). Em outros termos, significa isto que as partes do processo têm o direito à consideração de seus argumentos (Recht auf Berücksichtingung). Pois só será possível fiscalizar a atuação do juiz - a quem cabe, nos termos do art. 72, zelar pelo efetivo contraditório -, verificando-se se houve efetiva participação das partes, em contraditório, na formação do resultado do processo se todos os argumentos pela parte deduzidos no processo, e que sejam (ao menos em tese) capazes de levar a resultado que à parte favoreça, tiverem sido examinados. Pode acontecer, por exemplo, de uma das partes deduzir, na petição inicial ou na contestação, diversos fundamentos, cada um deles - ainda que isoladamente 188

189 2 8 0 O NOVO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO C â m a r a considerado - capaz de justificar, em tese, um resultado que lhe seja favorável. Pois para que a parte possa ser legitimamente vencida, com a rejeição de sua pretensão ou defesa, é essencial que o órgão jurisdicional justifique os motivos pelos quais todos esses fundamentos são rejeitados. Perceba-se: tendo o juízo acolhido um desses fundamentos, e chegado a uma conclusão favorável a uma das partes, não será preciso examinar os demais fundamentos suscitados pela mesma parte (afinal, os demais argumentos da parte só poderíam servir para justificar a mesma conclusão a que o juízo já chegou). Neste caso, deve-se considerar que os demais_argumentos estão prejudicados (isto é, que desapareceu, por absoluta inutilidade, o interesse em que tais argumentos sejam examinados). De outro lado, a rejeição do primeiro argumento deduzido pela parte deve, necessariamente, levar o órgão jurisdicional ao exame do segundo argumento (que seja, em tese, capaz de justificar um resultado favorável à parte que o suscitou). E a rejeição deste segundo argumento deverá levar ao exame do seguinte, e assim sucessivamente. Só se pode julgar contra a parte, insista-se, se todos os argumentos por ela suscitados e que sejam, em tese, capazes de lhe garantir um resultado favorável, tiverem sido expressamente rejeitados. O não cumprimento, por parte do órgão jurisdicional, do seu dever de considerar todos os argumentos da parte implica, então, violação à garantia constitucional do contraditório, negando-se deste modo a nota essencial e característica do processo (que é, precisamente, o contraditório), o que acarreta a nulidade da decisão. Por fim, exige-se que na fundamentação das decisões judiciais sejam levados a sério os precedentes, tanto nos casos em que eles são aplicados, como nas hipóteses em que a eles se nega aplicação. É o que se obtém com a interpretação dos incisos V e VI deste art. 489, l e. Será nula, então, por vício de fundamentação, a decisão que se limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos ou que deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento. Mais adiante, quando do éstudo dos precedentes judiciais, será possível retornar a este ponto com mais profundidade. De todo modo, não se pode deixar de dizer, desde logo, que decidir a partir de precedentes judiciais não é o mesmo que fazer uma colagem de ementas de acórdãos ou de referências vágas a enunciados de súmula. E preciso que se faça um confronto entre o caso precedente (isto é, o caso concreto que deu origem à decisão judicial que em um novo processo se pretende invocar como precedente) e o caso seguinte (ou seja, o novo caso, só agora submetido à apreciação judicial, e no qual se pretende invocar o precedente como fundamento da decisão). Impende que se faça uma análise dos fundamentos determinantes do precedente (ou, para usar aqui uma expressão consagrada no estudo da teoria dos precedentes, é preciso examinar as rationes decidendi), justificando-se de forma precisa a aplicação desses 189

190 Sentença 281 fundamentos determinantes no caso sob julgamento com a demonstração de que este se ajusta àqueles fundamentos. É que através do uso de precedentes como fontes do Direito o que se busca, ao menos no Direito brasileiro, é uma padronização decisória que permita que casos iguais (ou, pelo menos, análogos) recebam decisões iguais (ou, pelo menos, análogas). Como se costuma dizer na doutrina de língua inglesa, to treat like cases alike. É absolutamente essencial, então, que se promova este confronto analítico entre o caso precedente e o caso sob julgamento, indicando-se os pontos que os aproximam a ponto de aplicar-se o precedente ao novo caso.. E o mesmo raciocínio se aplica aos casos de distinção. Só através do confronto analítico entre o caso precedente e o novo caso, agora sob julgamento, se poderá demonstrar que o precedente é inaplicável, motivo pelo qual a decisão agora proferida dele se afasta. A não realização do confronto analítico entre o caso precedente e o caso sob julgamento gera, então, nulidade, pois o distinguishing, a distinção, se terá feito de forma irregular. Por fim, nos casos em que não se aplica o precedente invocado pela parte por ter sido ele superado (através da técnica conhecida como overruling), é também preciso justificar a não aplicação do precedente invocado pela parte, demonstrando-se as razões da superação. Vale registrar, aliás, que nos casos em que a parte tiver invocado um precedente que sustenta ser aplicável ao caso e capaz de justificar uma decisão que lhe favoreça, o dever de fundamentar adequadamente sua não utilização, por ser caso de distinção ou de superação, resulta do mesmo direito à consideração dos argumentos que exige que a decisão se manifeste sobre todos os argumentos trazidos pela parte. Ora, a invocação de um precedente é, certamente, um argumento deduzido pela parte em seu favor e, por isso, precisa ser analisada adequadamente pelo órgão jurisdicional, que só terá bem fundamentado sua decisão se justificar - por ser caso de distinção ou de superação - a não utilização daquele precedente como fundamento do julgamento da causa. A enumeração contida no l 2 do art. 489, registre-se, é meramente exemplificativa. Outros casos haverá de decisão não fundamentada (bastando pensar, por exemplo, em uma decisão que se limite a dizer algo como defiro ou "indefiro, sem qualquer indicação de razões para fazê-lo: FPPC, enunciado 303). Estabelecido este mínimo essencial da decisão para que se repute estar ela fundamentada de modo constitucionalmente legítimo, substancialmente motivada, é preciso tecer algumas considerações acerca do disposto no 22 do art. 489, por força do qual "[n]o caso de colisão entre normas, o juiz deve justificar o objeto e os critérios gerais da ponderação efetuada, enunciando as razões que autorizam a interferência na norma afastada e as premissas fáticas que fundamentam a conclusão. Há casos em que o julgador se depara com normas em conflito. Pode se tratar de um conflito entre regras (o qual se resolve pelas técnicas tradicionais de solução de antinomias, de modo que a regra hierarquicamente superior prevalece sobre a inferior; sendo ambas de mesma hierarquia, a regra especial prevalece sobre a geral; não havendo relação de especialização entre elas, a regra mais recente prevalece sobre a mais antiga, revogando-a) ou de um conflito entre princípios. 190

191 282 O NOVO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO Câmara No caso de conflito entre princípios, é preciso sempre recordar que no caso de colisão entre eles não é possível ao julgador afirmar que um revogue o outro. Ainda que, por algum motivo, um deles prevaleça no caso concreto, o outro permanece em vigor, íntegro. Pense-se, por exemplo, no caso em que um artista tenta impedir um jornal de divulgar uma matéria jornalística sobre algo de sua intimidade. Colidem, aí, dois princípios: o da dignidade da pessoa humana (garantidor do direito à privacidade) e o da liberdade de expressão (assegurador da liberdade de imprensa). Pois sempre será possível construir-se, discursivamente, uma justificativa para que um desses princípios estipule uma exceção ao outro, de modo que em cada caso concreto um deles prevaleça. Pois tanto nos casos de conflito entre regras como naquele de colisão de princípios cabe ao juiz esclarecer, na decisão judicial, o critério usado para solucioná-lo, não bastando a vaga afirmação de que se usou este ou aquele método. * Fala o texto legal em ponderação. Este é termo que costuma ser vinculado a uma certa corrente de pensamento jurídico, não sendo elogiável um texto normativo que o empregue. Afinal, pode ficar a impressão de que se estaria, aqui, a tentar impor um determinado pensamento (ò qual, registre-se, é incompatível com tudo quanto se tem sustentado neste trabalho acerca do modo como se deve compreender o Direito a partir da Constituição da República). Assim não é, porém, e é perfeitamente possível dar ao dispositivo interpretação compatível com o ordenamento constitucional. Basta considerar que, no caso de colisão de princípios, deverá o julgador esclarecer, discursivamente, como se justifica o afastamento de um princípio, excepcionado pelo outro. Em outros termos, tem-se neste 2a do art. 489 algo perfeitamente compatível com o que até aqui se afirmara acerca da fundamentação das decisões judiciais: uma exigência de, que a decisão seja completa e substancialmente justificada, cabendo ao órgão julgador argumentar de modo a demonstrar que a decisão proferida é a correta, mesmo que se esteja diante de um caso de conflito entre normas (conflito entre regras ou colisão de princípios), tendo sido adotado o critério correto para sua solução, com a consequente prolação de uma decisão correta para o caso concreto. Reafirma-se, pois, a exigência de fundamentação substancial das decisões judiciais. Reafirme-se, por fim, que a existência de um vício de fundamentação (que pode consistir em sua absoluta ausência ou na existência de uma fundamentação inadmissível, assim entendida a que se enquadra em alguma das hipóteses previstas nos incisos do Ia do art. 489, ou que não atende à exigência feita pelo 2a do mesmo artigo) acarreta a nulidade da decisão judicial Dispositivo O dispositivo é a parte conclusiva da sentença, em que se encontra a decisão. É nele que, nos termos do art. 489, III, o juiz "resolverá as questões principais que as partes lhes submeterem. O dispositivo, porém, vai muito além disso. É nele que serão encontradas todas as decisões que o órgão julgador profira em sua sentença. 191

192 Sentença 283 Pense-se, por exemplo, em um processo em que o juiz tenha de examinar três questões preliminares ao mérito (como seriam, e.g., a alegação de falta de legitimidade ativa, de ausência de interesse de agir e de irregularidade formal da demanda por falta de um requisito essencial da petição inicial) e, na eventualidade de serem ultrapassadas estas questões, haja dois pedidos cumulados a apreciar (por exemplo, os pedidos de indenização de um dano material e de compensação por dano moral). Pois pode ocorrer de, em um caso assim, o juiz proferir cinco decisões (uma para rejeitar cada uma das preliminares, e uma para a resolução de cada um dos pedidos cumulados). Pois todas essas decisões integram a parte dispositiva da sentença (ou, simplesmente, dispositivo). A cada decisão proferida no pronunciamento judicial corresponde um capítulo da sentença (ou, mais propriamente, um capítulo do pronunciamento, já que este pode não ser exatamente uma sentença). E tais capítulos podem ser independentes (como é, por exemplo, o caso dos capítulos que julgam pedidos formulados em um mesmo processo em cumulação simples) ou não (como no caso em que o juiz aprecia o pedido principal e, além disso, impõe ao vencido o custo econômico do processo, condenando-o a pagar despesas processuais e honorários advocatícios). A teoria dos capítulos de sentença (rectius, capítulos de pronunciamento judicial) é expressamente adotada pelo CPC. Assim é que, no art. 966, 3a, se afirma expressamente ser possível o ajuizamento de ação rescisória para impugnar apenas um capítulo da decisão. O art , 3a trata da possibilidade de haver questões processuais, estranhas ao mérito, capazes de levarem a pronunciamentos que são capítulos da sentença. E o art , 5a faz referência ao capítulo de sentença que confirma, concede ou revoga tutela provisória. Pois a existência de distintos capítulos em um mesmo dispositivo tem efeitos práticos relevantíssimos. Pense-se, por exemplo, em dois capítulos que sejam inteiramente independentes um do outro (como seriam os capítulos nos quais são julgadas pretensões de indenização por dano material e de compensação por dano moral). Em casos assim, a interposição de recurso apenas contra um dos capítulos (recurso parcial, de que trata o art ) implica o trânsito em julgado dos capítulos não recorridos. E é precisamente por isso que o l 2 do art estabelece, no trato do recurso de apelação, que [sjerão [objeto] de apreciação e julgamento pelo tribunal todas as questões suscitadas e discutidas no processo, ainda que não tenham sido solucionadas, desde que relativas ao capítulo impugnado". É que capítulos não impugnados, por terem transitado em julgado, são imutáveis e indiscutíveis.. Do mesmo modo, pode haver decisão interlocutória que, dividida em capítulos, tem um (ou mais de um) capítulo impugnável por agravo de instrumento, não sendo possível a interposição deste recurso contra os demais capítulos. É o que acontece, por exemplo, com a decisão de saneamento e organização do processo (art. 357), em que só se admite agravo de instrumento contra o capítulo da decisão que define a distribuição do ônus da prova (art. 357, III, combinado com o art , XI). 192

193 284 O NOVO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO Câmara No caso da sentença, é o dispositivo que permite saber se o mérito da causa foi ou não resolvido e, tendo sido, se o pedido foi (no todo ou em parte) procedente ou improcedente. É no dispositivo que se sabe qual é o comando estatal que estabelece a solução do caso concreto. Pois é precisamente por isso que a ausência de dispositivo faz com que se considere a decisão viciada como inexistente. A decisão judicial que é proferida sem parte dispositiva não é, pois, e propriamente, uma decisão judicial. É algo que não se reconhece como decisão, sendo seu vício insanável. Contra ela não se admite qualquer recurso (afinal, não seria possível recorrer contra uma não decisão ), não pode ela ser executada (já que não existirá título que sirva de base para esta execução) nem transita ela em julgado (pois não pode transitar em julgado o que não existe) Interpretação da Sentença Estabelece o 3S do art. 489 que a decisão judicial deve ser interpretada a partir da conjugação de todos os seus elementos e em conformidade com o princípio da boa-fé. Tem-se, aí, pois, uma regra de interpretação'da sentença (mas que se aplica, evidentemente, a todas as decisões judiciais). Em primeiro lugar, é preciso ter claro que a decisão precisa ser interpretada sistematicamente, de modo que se leve em consideração todos os seus elementos (e não só o dispositivo isoladamente). Isto é especialmente importante em casos nos quais o dispositivo da sentença é incompleto ou incongruente com a fundamentação. Pense-se, por exemplo, um processo no qual o autor tenha cumulado dois pedidos: rescisão contratual e reintegração na posse. Imagine-se, agora, que o juiz tenha, na fundamentação da sentença, expressamente afirmado que os elementos dos autos justificavam a rescisão do contrato e, como consequência desta, a reintegração na posse do bem. Figure-se, agora, a possibilidade de o juiz ter-se limitado a afirmar, na parte dispositiva da sentença, que acolhia o pedido de rescisão contratual, silenciando acerca da reintegração na posse. Deve-se considerar, porém, diante da exigência de compreensão da sentença em seu todo, que também o pedido de reintegração de posse foi acolhido. Além disso, a decisão judicial deve ser interpretada em conformidade com o princípio da boa-fé". É que a sentença gera, nos sujeitos que participam do processo (e também em terceiros) expectativas legítimas, o que impõe a proteção da legítima confiança que na sentença se deposite. Assim, por exemplo, o fato de se ter empregado na sentença terminologia equivocada (como se falar em nulidade em vez de anulabilidade, ou de resilição em vez de resolução) não deve levar a se ter por viciado o pronunciamento, se é legítimo considerar que o órgão julgador decidiu a causa que lhe foi submetida. Existe, aliás, uma íntima ligação entre esta regra de interpretação da sentença, de forma sistemática e em consonância com a boa-fé, e a regra de interpretação do pedido que se estabelece a partir do art. 322, 22 (por força do qual o pedido deve 193

194 Sentença 285 ser interpretado levando-se em conta o conjunto da postulação e o princípio da boafé). E não podería mesmo ser diferente. Afinal, demanda e sentença devem ser como espelhos, um a refletir o outro. E isto por força da regra da necessária correlação entre demanda e sentença (arts. 490 e 492). É que incumbe ao juízo, na sentença de mérito, apreciar todos os pedidos formulados pelo autor (na demanda principal) e pelo réu (em sede reconvencional), acolhendo-os ou os rejeitando total ou parcialmente (art. 490). A sentença que não aprecia todos os pedidos formulados é citra petita, devendo o tribunal, em sede de apelação, determinar ao juízo de primeiro grau que a complete ou, se a causa já estiver em condições de ser inteiramente apreciada, julgar desde logo o pedido não julgado no grau inferior (art , 3a, III). E não se pode proferir sentença ultra ou extra petita (isto é, que conceda mais do que se postulou ou que defira bem jurídico diverso do que tenha sido postulado), diante da expressa vedação contida no art A sentença ultra petita deve ter seu excesso podado pelo tribunal, em grau de recurso, a ele cabendo invalidar o excesso. Já a sentença extra petita é inteiramerite nula (ou, no caso de apenas um capítulo de sentença ser extra petitum, nulo será este capítulo,.. já que a nulidade de parte da sentença não contamina o restante do pronunciamento, sendo a invalidação parcial da decisão judicial expressamente prevista no art. 520, III). Além de congruente com os elementos da demanda, a sentença (de mérito) deve ser certa, ainda quando decida relação jurídica condicional (art. 492, parágrafo único). Significa isto que a sentença deve ser capaz de conter uma certificação, um acertamento, da existência ou inexistência de um direito. E que se espera da sentença que ela afirme, categoricamente, se determinado direito subjetivo existe mesmo ou não. Sentenças condicionais, que não produzem essa certificação (e, portanto, não eliminam a incerteza jurídica que está à base da necessidade do processo de conhecimento) são inservíveis e, portanto, nulas. Basta pensar, por exemplo, em uma sentença que afirme condenar o réu a reparar um dano se ficar posteriormente constatado que este não ocorreu. Parece evidente que esta sentença não seria capaz de permitir afirmar com segurança se o demandado é ou não credor do demandante, mantida assim a crise de certeza jurídica que legitimou a movimentação da máquina judiciária. Por fim, deve-se dizer que a sentença, uma vez publicada, só pode ser alterada se houver necessidade de corrigir alguma inexatidão material (como seria um erro de grafia do nome de uma das partes) ou erros de cálculo, ou se forem opostos embargos de declaração (tudo nos termos do art. 494). Trata-se da regra do exaurimento da competência, por força da qual o juiz dá por encerrado o exercício da atividade cognitiva ao prolatar sentença Classificação da Sentença Definitiva A sentença de mérito (sentença definitiva) é tradicionalmente classificada em três espécies: declaratória (também chamada de meramente declaratória), constitutiva e 194

195 286 O NOVO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO Câmara condenatória. A estas três categorias alguns autores acrescentam mais uma (mandamen- tal) ou duas (incluindo, além da mandamental, a sentença executiva). O CPC fala em demanda meramente declaratória" (a que correspondería uma sentença de mérito meramente declaratória) em seu art. 20. Fala, ainda, em condenação nos arts. 81, 82, 85, 92, 94, 95, 128, 129, 145, 323, 324, 492, 495, 496, 509, 520, 523, 524, 528, 550, 553, 555, 572, 702, 818, 903 e Não há dispositivo algum falando de sentenças constitutivas (o que, evidentemente, não significa que elas não existam). Quanto às sentenças mandamentais, encontram-se no CPC quatro dispositivos que fazem alusão a "medidas mandamentais (arts. 139, 380, 400 e 403). Nada há, de outro lado, a fazer referência expressa aos pronunciamentos que teriam natureza executiva. E preciso, então, examinar essas sentenças, buscando-se determinar seu conteúdo. E o que se passa a fazer. Chama-se sentença declaratória (ou meramente declaratória) à que contém, apenas, a certificação da existência, inexistência ou modo de ser de uma relação jurídica, ou da autenticidade ou falsidade de um documento. Como já se viu anteriormente, toda sentença de mérito deve ser certa (art. 492, oarágrafo único), isto é, deve conter uma certificação, um acertamento. Pois é preciso igora deixar claro que a esta certificação dá-se o nome de declaração. Declarar é tornar certo, induvidoso, eliminando oficialmente qualquer dúvida ou incerteza que pudesse haver. Pois toda sentença de mérito deve conter uma declaração e, por isso, é comum - e correta - a afirmação de que toda sentença de mérito é declaratória. Há, porém, sentenças de mérito que contêm apenas esta certificação e, por isso, são meramente declaratórias. E o que se dá, por exemplo, com a sentença que julga procedente pedido de reconhecimento de paternidade. Este pronunciamento judicial se limita a certificar que uma pessoa é pai de outra. É, também, o que se tem na sentença que reconhece a aquisição de propriedade por usucapião (já que tal sentença não constitui o direito de propriedade, mas certifica que tal direito foi adquirido no momento em que se completaram os requisitos, inclusive o temporal, para a usucapião). E importante ter claro que, como regra geral, a sentença de mérito não declara fatos. Declaram-se relações jurídicas. Assim, não é tecnicamente correto declarar-se, por exemplo, que o autor emprestou dinheiro ao réu (pois isto seria declarar um fato). Declara-se, isto sim, que o autor é credor do réu (já que aí se estaria a declarar a existência, entre eles, de uma relação obrigacional). Prevê o art. 1 9,1, a possibilidade de se declarar não só a existência ou inexistência de relação jurídica, mas também seu modo de ser. É o que se dá em casos nos quais não existe controvérsia sobre a existência de uma determinada relação jurídica, mas sobre algum de seus aspectos. Cabe à sentença, em casos assim, certificar não que a relação existe, mas como ela é (declarando-se, por exemplo, que a relação jurídica está sujeita 195

196 Sentença 287 ] i a uma condição resolutiva; ou que existe uma condição suspensiva; ou, ainda, que a relação jurídica tem duração limitada no tempo, indicando seu termo final). Normalmente se afirma que só em um caso se admite a prolação de sentença meramente declaratória de um fato: na hipótese em que o pronunciamento judicial se limita a certificar a autenticidade ou falsidade de um documento (art. 19, II). É preciso reconhecer, porém, pelo menos mais uma hipótese de sentença meramente declaratória de um fato: a da sentença que acolhe pedido de demarcação de terras, determinando o traçado da linha demarcanda (art. 581). É que esta sentença não constitui o limite entre duas áreas de terra, mas certifica o lugar exato em que tal limite está (e estava, mesmo antes da sentença, embora isto fosse objeto de dúvida). E não se pode negar que o lugar onde fica o limite entre dois imóveis não é uma relação jurídica, mas um fato. As demais sentenças de mérito são mais complexas do que esta que acaba de ser vista. E que todas as demais sentenças de mérito são declaratórias, mas não o são meramente. Em outros termos, as demais sentenças de mérito declaram e, além disso, fazem algo mais (constituem, condenam). São sentenças que têm dois momentos lógicos, um declaratório e outro que a identifica como sentença de outra natureza que não meramente declaratória. Pois é entre essas sentenças mais complexas que se encontra a sentença constitutiva. Esta se caracteriza por conter ato judicial que determina a criação, modificação ou extinção de relação jurídica. Casos há, pois, em que a sentença contém comando que determina a criação de uma relação jurídica. E o que se dá, por exemplo, com a sentença que defere a adoção de pessoa maior de dezoito anos (caso em que, nos estritos termos do art do CC, depende-se de "sentença constitutiva"). No caso de adoção de crianças e adolescentes também se profere sentença constitutiva (art. 47, caput e 7a - este falando expressamente em sentença constitutiva - do ECA). Em outras hipóteses, a sentença determina uma modificação em relação jurídica já existente. E o que se tem, por exemplo, na sentença que determina a revisão judicial de aluguel (art. 69 da Lei de Locações) ou na sentença que decreta a separação judicial, a qual dissolve a sociedade conjugal sem encerrar a relação matrimonial (CC, arts a 1.577). Por fim, há sentenças que determinam a extinção de uma relação jurídica. É o que se tem com a sentença que decreta o divórcio, ou com aquela que anula um contrato (dissolvendo a relação existente entre os contratantes). Caso especial de sentença constitutiva se encontra no art Trata-se da hipótese em que o demandante é credor de obrigação de emitir declaração de vontade (como a que resulta, por exemplo, de um contrato-promessa, como é a promessa de compra e venda). Pois, neste caso, a sentença de procedência do pedido de reconhecimento dessa obrigação prescinde de execução (e, por isso, não é condenatória), sendo capaz de, 196

197 288 0 NOVO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO Câmara uma vez transitada em julgado, produzir todos os efeitos da declaração de vontade não emitida (art. 501, infiné). Assim, por exemplo, se as partes celebraram uma promessa de compra e venda de imóvel e, depois, não foi celebrado o contrato definitivo (isto é, o contratq de compra e venda), a sentença a que se refere o art. 501 substitui o contrato definitivo, que não terá mais de ser celebrado, sendo possível promover-se o registro da sentença no registro de imóveis, do mesmo modo como se teria, normalmente, promovido o registro da escritura de compra e venda. Em todos esses casos, a sentença de mérito é constitutiva. Por fim, chama-se sentença condenatória àquela sentença que, reconhecendo a existência de um dever jurídico, permite a prática de atividade jurisdicional posterior destinada a efetivar aquilo que na sentença se reconheceu ser direito de uma das partes. Em outros termos, sentença condenatória é aquela que permite o desenvolvimento de atividade executiva (em sentido amplo, aí incluídas tanto a execução por sub-rogação, em que o Estado-juiz substitui a atividade do sujeito passivo do dever jurídico, como se dá no caso em que o devedor de dinheiro vê seus bens expropriados para satisfação do crédito exequendo; como a execução por coerçãó, em que medidas destinadas a constranger o titular do dever jurídico, como multas por atraso no cumprimento da decisão ou prisão civil - expressamente autorizada no caso de dívida inescusável de alimentos -, são empregadas para forçar o devedor a cumprir seu dever). Toda sentença que permite o desenvolvimento de atividade jurisdicional posterior, de natureza executiva, é, portanto, condenatória. Discutia-se, ao tempo da legislação processual anterior, se haveria sentenças meramente declaratórias que poderíam ser consideradas título hábil a permitir a instauração da execução (título executivo). Com a vigente legislação processual, porém, esta discussão perde sentido por completo. É que qualquer sentença, seja ela de procedência ou de improcedência, que declare a existência de um dever jurídico ainda não cumprido, certo, líquido e exigível (art. 783) permite a instauração de atividade executiva e, portanto, deve ser considerada sentença condenatória. Dito de outro modo, a diferença fundamental entre uma sentença meramente declaratória (da existência de uma obrigação ou outro dever jurídico) e uma sentença condenatória é que esta permite a instauração de atividade executiva, e aquela, não permite que tal atividade se desenvolva (por ser absolutamente desnecessário, como se dá nos casos de usucapião ou de reconhecimento de paternidade, nenhum dever jurídico tendo sido reconhecido na sentença; ou por não ser ainda possível, por não ser a obrigação reconhecida certa, líquida e exigível, como se daria no caso de se reconhecer a existência de obrigação ainda não vencida). Não é por outra razão, aliás, que o art ,1, afirma ser título executivo judicial (e, portanto, ter natureza condenatória) a decisão judicial que reconhece a exigibilidade de obrigação. Registre-se, porém, e desde logo, que existe um tipo especial de sentença condenatória: a condenação genérica. Esta reconhece a existência de obrigação certa e exigível sem estabelecer o quantum devido e, portanto, não sendo capaz de certificar a liquidez 197

198 Sentença 289 da obrigação. Neste caso, há uma condenação incompleta" (na verdade, a declaração é que será incompleta, já que não se terá ainda certificado o quantum devido), já que não será possível desde logo promover-se atividade executiva, mas permite a lei processual a instauração de um incidente processual posterior à sentença, chamado de liquidação de sentença" (arts. 509 a 512), após o qual a execução poderá instaurar-se. Usa-se falar em sentenças mandamentais para se fazer referência àquelas sentenças de mérito que impõem o cumprimento de deveres jurídicos infungíveis, que só pelo devedor pttderiam ser cumpridos (como se dá nas obrigáções personalíssimas ou - em qualquer obrigação de não fazer), motivo pelo qual sua efetivação se dá exclusivamente através de meios coercitivos. Esta não deve, porém, ser considerada uma categoria separada, como se fosse um quarto tipo de sentença de mérito. Na verdade, toda sentença mandamental é uma sentença condenatória. Permita-se afirmar que toda sentença mandamental é condenatória, mas nem toda sentença condenatória é mandamental. Sentença mandamental, portanto, é a sentença condenatória cuja efetivação se dá exclusivamente através do emprego de meios coercitivos (como multas, por exemplo), o que resulta da natureza do dever jurídico a ser cumprido. Por fim, há quem fale em sentenças executivas (há, mesmo, quem fale em sentença executiva lato sensu, mas esta expressão não faz sentido algum, já que não existe, em contraposição, uma "sentença executiva stricto sensu ). Sentença executiva seria uma sentença que contém a determinação para que se instaure a execução, a qual poderia dar-se per officium iudicis, desenvolvendo-se no mesmo processo. Ocorre que há muito tempo (desde muito antes da aprovação do CPC de 2015) a execução civil se desenvolve no mesmo processo em que a sentença é proferida. Além disso, ser ou não possível a instauração de ofício da atividade executiva é uma questão de opção legislativa, que nada interfere na natureza da sentença. Basta ver o seguinte: no regime do CPC, as sentenças que condenam a cumprir deveres jurídicos de fazer, não fazer ou entregar coisa podem ser executadas de ofício, o mesmo não acontecendo com a sentença que condena a pagar dinheiro, cuja execução depende de requerimento do credo (art. 513, l 2). Fosse correto o entendimento aqui criticado, e se diria então que só no caso de obrigações pecuniárias a sentença seria condenatória, sendo executiva nos demais casos. No processo trabalhista, porém, a sentença que condena a pagar dinheiro pode ser executada ex officio (art. 878 da CLT). Ora, a sentença que condena a pagar dinheiro por força de uma obrigação civil e a que condena a pagar dinheiro por força de uma obrigação trabalhista têm idênticos conteúdos. Ambas reconhecem a existência de dever jurídico de cumprir obrigação pecuniária. Se é assim, ambas têm a mesma natureza (já que a natureza jurídica é determinada pelo conteúdo, e não pelo efeito, que lhe é necessariamente externo). Assim, são ambas condenatórias. A opção legislativa de permitir ou não a instauração de ofício da execução não interfere na natureza da sentença. São, pois, três os tipos de sentença de mérito: meramente declaratória, constitutiva e condenatória. 198

199 290 O NOVO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO Câmara Destas, a terceira espécie merece um exame mais cuidadoso, já que existem regras próprias para os casos de condenação a pagar dinheiro e para os casos de condenação ao cumprimento de deveres jurídicos de outras naturezas (entregar coisa, fazer e não fazer). No caso de sentença que condena ao cumprimento de obrigação pecuniária, ainda que o demandante tenha formulado pedido genérico, a decisão deve definir desde logo a extensão da obrigação, o índice de correção monetária, a taxa de juros, o termo inicial de ambos e a periodicidade da capitalização de juros (se for o caso), tudo nos termos do art Em outros termos, a regra é que a sentença reconheça obrigações pecuniárias líquidas (sendo apropriado chamar essas sentenças de condenações ordinárias). Excepcionalmente, porém, se admite a prolação da condenação genérica, assim entendida aquela sentença que reconhece obrigação pecuniária sem determinar o quantum debeatur (reconhecendo-se, portanto, a exigibilidade de obrigação ilíquida). Isto só é possível naqueles casos em que ao longo do processo de conhecimento não tenha sido possível determinar, de modo definitivo, o montante devido (art. 491, I) ou se a apuração do valor devido depender da produção de prova de realização demorada ou excessivamente dispendiosa, assim reconhecida na sentença (art. 491, II). Nesses casos, como dito anteriormente, far-se-á necessária a instauração de um incidente processual posterior à condenação (e prévio à execução) chamado de liquidação de sentença (como se pode ver pelo texto do art. 491, l 2). Tudo isso se aplica, tanto no que diz respeito à condenação ordinária como no que é pertinente à condenação genérica, aos casos em que se profira acórdão condenatório que altere a sentença de primeiro grau de jurisdição (art. 491, 22). Quando a sentença reconhecer dever jurídico de fazer ou de não fazer, deve-se conceder a tutela jurisdicional específica. Significa isto dizer que a sentença condenatória imporá ao devedor o cumprimento específico daquilo a que estava originariamente obrigado. Também na sentença se deverá estabelecer providências que assegurem a tutela pelo resultado prático equivalente (tudo nos termos do art. 497). Assim, por exemplo, se uma pessoa jurídica é devedora da prestação de consertar um produto eletrônico e não cumpriu sua obrigação, a sentença reconhecerá seu dever jurídico de promover o conserto (tutela específica) mas, além disso, estabelecerá meios para assegurar que, não sendo efetuado o reparo, o credor receba um aparelho equivalente em perfeito estado de funcionamento (tutela pelo resultado equivalente). A obrigação só se converterá em perdas e danos se o autor assim o preferir, ou se for impossível a tutela específica ou a obtenção de resultado prático equivalente (art. 499). Para compelir o devedor a cumprir a decisão, poderá ser estabelecido um prazo e fixada multa periódica pelo atraso (art. 500). Caso posteriormente, não tendo sido cumprido o dever jurídico, o credor opte por finalmente converter a obrigação em perdas e danos (ou se verifique que há uma absoluta impossibilidade de cumprimento 199

200 Sentença 291 específico ou pelo equivalente), a indenização devida será paga cumulativamente com a multa que tenha se vencido até a data em que o credor tenha requerido a conversão (porque a partir dessa data, evidentemente, não há qualquer razão para que a multa continue a incidir, uma vez que o credor não quer mais compelir o devedor ao cumprimento específico ou pelo equivalente). E importante perceber que nos casos de sentença que condena a cumprir obrigação de fazer e não fazer duas regras gerais do processo civil são afastadas: a da correlação entre demanda e sentença (já que a lei expressamente permite que, postulada a tutela específica, o juiz conceda a tutela pelo resultado prático equivalente, como se dá, por exemplo, no processo em que o autor pede a condenação do Estado a fornecer um medicamento e a sentença determina que o Poder Público entregue o remédio genérico, o qual é capaz de produzir resultado prático equivalente) e a do exaurimento da competência, já que é possível, mesmo depois da sentença, estabelecer-se a conversão da obrigação de fazer ou de não fazer em perdas e danos. Há uma regulamentação específica para o caso da tutela inibitória. Esta deve ser compreendida como a tutela de prevenção do ilícito. Em outros termos, tem-se aí uma decisão judicial proferida em caráter preventivo, com o objetivo de impedir a prática, a reiteração ou a continuação de um ilícito. Pense-se, por exemplo, no caso de uma decisão que proíba a divulgação da foto de uma pessoa em um filme publicitário por não ter sido autorizada a utilização da imagem. Pois neste caso, "é irrelevante a demonstração da ocorrência de dano ou da existência de culpa ou dolo" (art. 497, parágrafo único). Este dispositivo é extremamente importante para que se consiga evitar a confusão conceituai que resulta do Código Civil. É que o art. 186 do CC estabelece que [a] quele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. Da leitura desse texto normativo, fica a impressão - equivocada, diga-se desde logo - que só comete ato ilícito quem, agindo culposamente, causa dano a outrem. Isto, porém, não é correto. Ato ilícito é o ato contrário ao direito. Sua aptidão para causar dano é absolutamente irrelevante para que se qualifique o ato como ilícito. Pense-se, por exemplo, nos crimes de mera conduta, que não produzem qualquer resultado danoso (como é, por exemplo, o caso do crime de porte ilegal de arma de fogo). Não há dano, mas inegavelmente é ato ilícito. O mesmo se pode dizer daquele que faz publicidade abusiva por ser capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial à saúde (art. 37, 22, do CDC). O mero fato de se veicular essa publicidade é ilícito, pouco importando se alguém sofreu ou não dano. A questão é que o Código Civil definiu o conceito de ato ilícito para o único fim de regular a responsabilidade civil, estabelecendo os casos em que haverá obrigação de indenizar (daí a razão pela qual o art. 927 do CC estabelece que [a]quele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo ). 200

201 292 O NOVO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO Câmara E tudo quanto se disse até aqui sobre o dano pode ser dito também do elemento subjetivo da conduta (dolo ou culpa, nos termos do art. 497, parágrafo único, embora a linguagem típica do Direito Civil permita falar aqui apenas em culpa, termo que, nessa área do conhecimento, engloba as condutas intencionais, já que no jargão do Direito Civil o termo dolo designa fenômeno completamente distinto, um vício de consentimento previsto nos arts. 145 a 150 do CC). Ocorre que na demanda inibitória o objeto do processo não é o reconhecimento da obrigação de indenizar. O que se busca é, tão somente, uma decisão destinada a inibir a prática do ato. Por isso, é absolutamente irrelevante saber se o demandado agiu culposamente ou se algum dano foi - ou está na iminência de ser - produzido. Estas são questões que poderão ser relevantes em outro processo, no qual se busque alguma indenização. Não, porém, no processo cujo objeto é a tutela inibitória. Neste, basta a demonstração de que se está na iminência da prática de um ato ilícito (contrário ao Direito), ou que este é um ato de duração prolongada no tempo e que está sendo praticado, para que se profira decisão que determine a abstenção de sua prática ou que ele não seja reiterado ou que não continue a'ser praticado. Já nos casos em que a sentença condene ao cumprimento de obrigação de entregar coisa, o juiz, ao conceder a tutela específica (isto é, ao determinar a própria entrega da coisa devida), deverá fixar o prazo para que o devedor cumpra a obrigação (art. 498), e uma multa pelo atraso (art. 500). Também aqui só haverá conversão em perdas e danos se for impossível a tutela específica ou se o credor optar pela conversão (art. 499), caso em que a multa que já vinha incidindo permanecerá até a data do protocolo da petição em que se requer a conversão em perdas e danos (ou até a data em que se percebe a absoluta impossibilidade de cumprimento específico), e será devida cumulativamente com a indenização. Nos processos que tenham por objeto o cumprimento de obrigação de entregar coisa não se aplica a regra do exaurimento da competência (prevista no art. 494), já que é possível, mesmo depois de publicada a sentença, que seu comando seja alterado para que se converta a obrigação de entregar coisa em perdas e danos. Não se pode, por fim, deixar de examinar um efeito dos pronunciamentos que condenam a pagar dinheiro (ou que convertem em pecúnia obrigações de fazer, não fazer ou entregar coisa): a hipoteca judiciária (art. 495). Hipoteca é uma pré-penhora de imóveis (ou outros bens que aos imóveis são equiparados para fins de hipoteca, nos termos do art do CC). Pode ser convencional, legal ou judiciária. É convencional quando surge por força de um negócio jurídico celebrado entre as partes. Legal quando resulta diretamente da lei, como se pode ver pelo art do CC. E judiciária quando sua constituição é efeito de decisão judicial. Afirmou-se que a hipoteca judiciária é uma penhora antecipada, uma pré-penhora. Em outros termos, o que se tem aqui, como efeito da decisão, é uma antecipação de um ato executivo típico das execuções por quantia certa, destinada não só a assegurar 201

202 Sentença 293 que em uma futura e eventual execução o credor tenha seu direito satisfeito, mas também para servir como um poderoso mecanismo inibidor de fraudes. A decisão (que condena a pagar dinheiro ou que converte obrigação de outra natureza em perdas e danos) produz a hipoteca judiciária ainda que seja genérica, ou seja, que não tenha determinado o quantum da obrigação (art. 495, Ia, I). Produz-se, também, mesmo que esteja pendente medida cautelar de arresto sobre bem do devedor (art. 495, l 2, II). E se produz ainda que a sentença seja impugnada por recurso, pouco importando se tal recurso é dotado de efeito suspensivo (art. 495, Ia, III) ou não (art. 495, Ia, I). Não se produz, porém, a hipoteca judiciária quando a decisão condena ao cumprimento da obrigação de entregar coisa distinta de dinheiro (FPPC, enunciado 310). Constitui-se a hipoteca judiciária mediante apresentação de cópia da sentença perante o cartório do registro imobiliário, independentemente de ordem judicial, declaração expressa do juiz ou demonstração de urgência (art. 495, 2a). Uma vez efetuado o registro da hipoteca judiciária, o credor que o tenha promovido terá o prazo de quinze dias para informá-lo ao juiz da causa, que determinará a intimação do devedor para que tome ciência do ato (art. 495, 3a). A hipoteca judiciária, ncs termos do 4a do art. 495, implica direito de preferência, quanto ao pagamento, em relação a outros credores. E este direito de preferência observará a prioridade do registro (o que significa dizer que, havendo mais de uma hipoteca pendente sobre o mesmo bem, receberá primeiro o dinheiro obtido com a expropriação aquele que tenha registrado a hipoteca em primeiro lugar, observando-se a partir daí a ordem dos registros). O direito de preferência é efeito processual da penhora (art. 797) e, por conseguinte, da hipoteca (art , parágrafo único, do CC). Caso sobrevenha reforma ou invalidação da decisão que condenou a pagar dinheiro ou que converteu obrigação em perdas e danos, a parte responderá objetivamente (isto é, independentemente de culpa) pelos danos resultantes da constituição da hipoteca judiciária (a qual será, evidentemente, cancelada, já que terá desaparecido o título que legitimara sua constituição). O valor da liquidação será liquidado e executado nos mesmos autos, sem necessidade de ajuizamento de demanda autônoma de reparação de danos (art. 495, 5a). 202

203 16 ESTABILIZAÇÃO, PRECLUSÃO E COISA JULGADA 16.1 Estabilização Os atos jurídicos em geral tendem a adquirir estabilidade, o que é uma exigência de segurança jurídica. Assim é que, preenchidos determinados requisitos (que, evidentemente, variam de um ato para outro), todo ato tende a adquirir uma certa estabilidade, o que permite sua permanência no ordenamento jurídico. O fenômeno da estabilidade alcança atos jurídicos de Direito privado (como um estatuto de sociedade anônima ou um contrato, atos que não podem ser modificados livremente) e de Direito público (como acontece com decisões judiciais ou atos administrativos, entre outros). A estabilidade, porém, pode ser de graus variados. Em outros termos, pode-se mesmo dizer que existem atos mais estáveis do que outros. Assim, por exemplo, um ato administrativo só pode ser revogado pela própria Administração Pública, e mesmo assim desde que alguns pontos sejam observados. Por exemplo, não se admite a revogação de ato administrativo cujos efeitos já se tenham exaurido. No Direito Processual Civil encontram-se algumas espécies diferentes de estabilidade do ato processual. E a diferença se dá pelo grau de intensidade da estabilidade. Duas formas de conferir estabilidade ao ato processual são bastante conhecidas de todos os estudiosos do Direito Processual: a preclusão e a coisa julgada. Há, porém, outro fenômeno, que não pode deixar de ser examinado, e que com aqueles não se confunde: o da estabilização. O CPC faz alusão ao fenômeno da estabilização em duas passagens: ao tratar da estabilização da tutela antecipada (art. 303) e ao regular a estabilização da derísão de saneamento e organização do processo (art. 357, l 2). Embora já se tenha feito alusão a esses dois casos, quando do estudo das tutelas provisórias e ao se analisar o procedimento comum do processo de conhecimento, é interessante voltar a tocar no assunto, para fins de organização do pensamento. Assim é que a decisão que declara saneado o processo e o organiza para preparar a atividade de instrução probatória se torna estável após o decurso do prazo de cinco dias de que dispõem as partes para requerer esclarecimentos ou solicitar ajustes (art. 357, l 2). Como se trata de decisão que não pode ser impugnada por agravo de 203

204 300 O NOVO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO Câmara instrumento (com a única exceção do capítulo que versa sobre distribuição do ônus da prova), deve-se considerar que essa estabilização implica a impossibilidade de - no mesmo grau de jurisdição - tornar-se a discutir o conteúdo da decisão. Às partes, evidentemente, se assegura a possibilidade de impugnar tal decisão na apelação ou em contrarrazões de apelação (art , I a). Mas para o juízo de primeiro grau não é mais possível alterar o que tenha sido decidido naquele pronunciamento, ainda que se trate de matéria de ordem pública. Isto é extremamente importante para a organização do processo de conhecimento, que é estruturado em dúas fases bem distintas: uma introdutória, destinada a estabelecer o que será objeto da cognição; outra, principal, que tem por fim permitir a instrução e o julgamento da causa. Pois a decisão de saneamento e organização do processo é o ato que põe fim à primeira fase do processo de conhecimento, permitindo assim o início da fase principal. E é extremamente relevante que essa decisão tenha alguma estabilidade, de modo a permitir que o processo se desenvolva em direção a um resultado que deve ser alcançado em tempo razoável. Deste modo, incumbe ao juiz estabelecer, na aludida decisão, quais são as questões de fato e de direito que serão debatidas e resolvidas na segunda fase do processo. E, ultrapassado o prazo de cinco dias de que dispõem as partes para solicitar ajustes ou esclarecimentos, tal decisão se torna estável, vinculando o juízo de primeiro grau a ela de forma absoluta. Incumbirá, pois, ao juízo de primeiro grau respeitar aquela decisão, examinando todas as questões de fato e de direito controvertidas que ali tenham sido fixadas. E não poderá o juízo extinguir o processo sem resolução de mérito com base em fundamento já debatido e afastado na primeira fase do procedimento. Evidentemente, fatos supervenientes poderão - e deverão - ser levados em conta (art. 493), assim como é possível que depois dessa decisão ter-se tornado estável surja alguma questão nova, daquelas que podem ser suscitadas a qualquer tempo (e que ainda não tivesse sido suscitada). Há, aí, porém, alguma estabilidade da decisão, cujos termos não poderão ser posteriormente modificados pelo juízo de primeiro grau de jurisdição. Ainda mais intensa é a estabilização da tutela antecipada. Neste caso - que ocorre, nos termos do art. 304, quando da decisão concessiva de tutela de urgência satisfativa antecedente não se interpõe recurso - há um grau maior de estabilidade, de modo que a decisão - que não é alcançada pela autoridade de coisa julgada, uma estabilidade ainda mais intensa (art. 304, 6a) - permanecerá eficaz e só poderá ser afastada por decisão que a revir, reformar ou invalidar, proferida em processo autônomo, o qual precisa instaurar-se no prazo de dois anos a contar da ciência da decisão que extinguiu o processo em que a tutela antecipada foi deferida (art. 304, 5a). Neste caso, então, deferida a tutela antecipada antecedente, e não havendo recurso contra tal decisão, tem-se uma relativa estabilidade da decisão, a qual acarreta a extinção do processo sem resolução do mérito, permanecendo, porém, eficaz a decisão antecipatória de tutela até que, em processo autônomo cujo objeto é sua revisão, 204

205 Estabilização, predusão e coisa julgada 301 reforma ou invalidação, venha ela a ser cassada ou substituída. Resulta daí, pois, uma inversão do ônus de demandar, já que caberá àquele contra quem a tutela antecipada estável produz efeitos o ônus de ajuizar a demanda de revisão, reforma ou invalidação (o que só poderá ser feito dentro do prazo de dois anos a que já se fez alusão). Enquanto essa demanda não for proposta (e julgada), porém, a decisão estável produz todos os seus efeitos. Há, pois, aí dois diferentes níveis de estabilização, com intensidades distintas, mas nenhum deles chega =o grau de estabilidade da coisa julgada (de que se falará adiante). E entre elas há algo em comum: é que a estabilidade resultante da estabilização da decisão de saneamento e organização do processo, assim como a que resulta da estabilização da tutela antecipada, implica um obstáculo ao reexame do que foi decidido que não é absoluto, sendo permitido às partes tornar a suscitar a matéria (em grau de recurso, no caso da estabilização da decisão de saneamento e organização do processo; por demanda revocatória, no caso de estabilização da tutela antecipada) Preclusão Chama-se preclusão à perda da possibilidade de praticar um ato processual. Pense-se, por exemplo, no caso de se ter proferido uma sentença. Contra esta, é possível a interposição de apelação. Pode ocorrer alguma situação (como, por exemplo, o decurso do prazo dentro do qual o recurso é admissível) que faça desaparecer a possibilidade de prática do ato. Da preclusão sempre resultará uma estabilidade processual. Assim é que, para se usar uma vez mais o mesmo exemplo, preclusa a possibilidade de interpor apelação, resulta daí a estabilidade da sentença. Costumeiramente se cogita de três modalidades de preclusão: temporal, lógica e consumativa. Chama-se preclusão temporal à perda da possibilidade de prática de um ato processual em razão do decurso do prazo dentro do qual tal ato era admissível. Estabelece o art. 223 que [djecorrido o prazo, extingue-se o direito de praticar ou de emendar o ato processual, independentemente de declaração judicial. Assim, sempre que houver prazo (fixado em lei ou assinado pelo juiz) para a prática de ato processual, seu decurso in albis (isto é, sem que o ato tenha sido praticado) acarreta preclusão. Há alguns casos de predusão temporal expressamente previstos no CPC. E o que se tem, por exemplo, no art. 63, 3e, que prevê a preclusão temporal da possibilidade de alegação, pelo réu, da abusividade da cláusula de eleição de foro; no art. 209, 22 (preclusão temporal da possibilidade de alegar existência de contradição na transcrição eletrônica de atos processuais praticados diante do juiz); no art. 278 (preclusão temporal da possibilidade de alegar a anulabilidáde de ato processual); e no art. 293 (preclusão temporal da possibilidade de impugnar o valor atribuído à causa pelo demandante). c 205

206 302 O NOVO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO Câmara É costume ouvir-se afirmar que só existiría preclusão temporal para as partes, e que os prazos para os órgãos jurisdicionais seriam impróprios (isto é, que de seu decurso não resultaria preclusão). Isto, porém, não é sempre verdadeiro. Basta ver o que consta do art. 235 e seus parágrafos. Ali há a previsão do caso em que se representa contra o magistrado por excesso de prazo. Pois distribuída a representação, seu relator, após o decurso do prazo para apresentação de justificativa pelo magistrado representado, determinará a intimação do representado por meio eletrônico para que, em 10 (dez) dias, pratique o ato. Decorrido este prazo de dez dias sem que o ato tenha sido praticado, perde o juiz a possibilidade de o praticar, devendo os autos ser remetidos ao substituto legal (art. 235, 32). Tem-se, aí, pois, preclusão temporal para o juiz. Ocorre a preclusão lógica quando o sujeito do processo, em razão da prática de um determinado ato, perde a possibilidade de praticar outro que com ele seja incompatível. É o que se tem, por exemplo, no caso de a parte vencida aceitar a sentença e, posteriormente, pretender impugná-la por meio de recurso (art ). A preclusão lógica é uma manifestação da boa-fé processual (art. 5e), que tem, entre seus corolários, a vedação de comportamentos contraditórios (nemo vetiire contra factum proprium). Também para o juiz há preclusão lógica, e não só para as partes. Pense-se, por exemplo, no caso de o juiz indeferir prova testemunhai ao fundamento de que o fato que se pretende provar já está demonstrado nos autos por documento (art ,1). Pois esta decisão impede que o juiz, no futuro, julgue contra a parte que pretendera produzir essa prova oral ao fundamento de que havia insuficiência de provas acerca daquele mesmo fato. Isto seria uma violação à boa-fé objetiva por consistir em comportamento contraditório e, portanto, alcançado pela preclusão lógica. Em caso como este, caberá ao juiz, verificando a insuficiência do material probatório, revogar a decisão anteriormente proferida e autorizar a produção da prova testemunhai, sob pena de frustrar a legítima expectativa que seu pronunciamento gerou na parte. Por fim, tem-se a preclusão consumativa quando o sujeito do processo, por já ter praticado o ato, perde a possibilidade de praticá-lo novamente (ou de o complementar). Assim, por exemplo, oferecida a contestação, não pode o réu posteriormente (ainda que em tese ainda houvesse prazo para fazê-lo), contestar outra vez ou complementar sua contestação. Do mesmo modo, não se admite que contra uma mesma decisão a mesma parte interponha dois recursos (com a ressalva do cabimento simultâneo de recurso especial e recurso extraordinário, nos termos do art ), o que é manifestação de algo que no jargão forense é costumeira e impropriamente chamado de princípio da unirrecorribilidade", mas que, na verdade, é apenas uma consequência da regra (e não princípio) da preclusão. E também para o juiz há preclusão consumativa. Pense-se no caso de ter-se tornado estável a decisão de saneamento e organização do processo. Pois preclui para o juiz (mas não para as partes, que poderão sobre elas se manifestar em apelação ou em contrarrazões de apelação) a possibilidade de tornar a decidir sobre aquilo que tenha sido expressamente resolvido naquele pronunciamento (com a ressalva da distribuição do ônus da prova, que, tendo sido 206

207 Estabilização, preclusão e coisa julgada 303 impugnada por agravo de instrumento, pode ser objeto de retratação pelo juiz, nos termos do art , I a). Além dessas três espécies de preclusão que, como dito, são tradicionalmente reconhecidas, pode-se cogitar de uma quarta espécie: a preclusão por fases do processo. E que às vezes um ato processual se torna prática impossível simplesmente por se ter alcançado fase processual que com ele é incompatível. Assim é que, por exemplo, não se pode cogitar do julgamento de improcedência liminar do pedido (art. 332) se o réu já foi citado; nem seria possível o julgamento antecipado parcial do mérito se toda a instrução probatória já se concluiu e é possível a prolação de sentença. É preciso ter claro, porém, que há situações que afastam a preclusão. Assim, por exemplo, a preclusão temporal pode ser afastada por justa causa (art. 223; art. 278, parágrafo único), assim considerado o evento alheio à vontade da parte e que a impediu de praticar o ato (art. 223, I a). Nestes casos, releva-se a preclusão, e se admite a prática do ato que a princípio parecia já não mais ser admissível, devendo o juiz fixar prazo para que isto ocorra (art. 223, 2a). A preclusão gera uma estabilidade que é endoprocessual, isto é, se produz apenas internamente ao processo em que se forma (diferentemente da coisa julgada, que é uma estabilidade exoprocessual, projetando-se para fora do processo em que se forma). E é por isso que o art. 507 expressamente impede que se volte a discutir, no curso do processo, as matérias já alcançadas pela preclusão Coisa Julgada Contra uma decisão judicial pode (e em regra assim é) ser cabível a interposição de recurso. Em alguns casos, como no da sentença, o cabimento do recurso é imediato. Em outros (como no caso das decisões interlocutórias que não constam do rol do art ), o cabimento do recurso é diferido. De toda maneira, a maioria das decisões é recorrível. Fatores há, porém, que tornam a decisão irrecorrível. E que os recursos no Direito Processual Civil brasileiro são limitados e sujeitos a prazo de interposição. Assim, esgotados todos os recursos, ou decorrido o prazo para que o recurso admissível seja interposto, a decisão se torna irrecorrível. A passagem da decisão da situação original (em que era recorrível) para esta nova situação (de irrecorribilidade) é chamada de trânsito em julgado. E algumas decisões, por serem irrecorríveis, já nascem transitadas em julgado (como é, por exemplo, o caso da decisão proferida pelo Pleno do STF no julgamento de arguição de descumpri- mento de preceito fundamental, nos termos do art. 12 da Lei na 9.882/1999). Dá-se o trânsito em julgado da decisão, então, quando precluem os recursos. Pode-se, pois, dizer que o trânsito em julgado é efeito da preclusão dos recursos (ou por terem sido todos usados, ou por ter decorrido o prazo sem que o recurso admissível tivesse sido interposto). 207

208 304 O NOVO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO Câmara Casos há em que, transitada em julgado a sentença, é ela alcançada por uma estabilidade mais intensa, a que se chama coisa julgada. Coisa julgada é, pois, a estabilidade da sentença irrecorrível. Mas, como se verá adiante, nem todas as sentenças alcançam, mesmo sendo irrecorríveis, este grau de estabilidade (e, além disso, há diferentes graus de coisa julgada, como se poderá verificar). Vale registrar, aqui, que a denominação coisa julgada, muito tradicional na linguagem processual, não é exatamente a mâis apropriada. É que o vocábulo coisa, na terminologia jurídica, designa os bens corpóreos, o que a coisa julgada definitivamente não é. Melhor seria que se usasse caso julgado (como se lê, por exemplo, no art. 6a, 3a, da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro) ou, como parece preferível, causa julgada. Dever-se-ia, então, afirmar que se já há causa julgada (isto é, se a sentença deu à causa um julgamento final, não mais se admitindo recurso, e tendo ela adquirido, por força da lei, a estabilidade de que se está aqui a tratar), não seria possível ajuizar novamente a mesma demanda e, caso isto viesse a acontecer, o novo processo teria de ser extinto, sem resolução do mérito, por já estar aquela causa julgada. A denominação "coisa julgada", porém, é não só a mais tradicional, mas também a expressamente empregada pela legislação processual brasileira, motivo pelo qual será aqui empregada Coisa Julgada Formal e Coisa Julgada Material A coisa julgada é uma estabilidade alcançada por certas sentenças (mas não todas). E produz ela uma relevante consequência (que se pode chamar de efeito negativo da coisa julgada): o impedimento à repropositura da demanda já decidida por sentença coberta pela autoridade de coisa julgada, sendo o caso de extinguir-se o processo, sem resolução do mérito, se a demanda vier a ser proposta novamente (art. 485, V), com as mesmas partes, mesma causa de pedir e mesmo pedido (art. 337, 2a e 4a). Mas há duas espécies de coisa julgada, com diferentes graus de estabilidade: coisa julgada form al e coisa julgada material (ou substancial). Chama-se coisa julgada formal à estabilidade alcançada, ao se tornarem irrecorríveis, por certas (mas.não todas as) sentenças terminativas, isto é, sentenças que não contêm a resolução do mérito da causa. É que em alguns casos, expressamente previstos na lei processual, embora terminativa a sentença, não será possível propor-se novamente a mesma demanda (salvo se corrigido o vício que acarretou a extinção). É o que se verifica pela leitura do disposto no art. 486, I a. Esse texto normativo faz alusão aos casos em que o processo é extinto sem resolução do mérito por indeferimento da petição inicial (art ,1), falta de pressuposto processual (art. 485, IV), falta de condição da ação (art. 485, VI) e existência de convenção de arbitragem ou de decisão de tribunal arbitrai reconhecendo sua competência (art. 485, VII). Pois nesses casos a sentença terminativa tem uma 208

209 Estabilização, preclusão e coisa julgada 305 estabilidade maior do que nos demais casos de extinção do processo sem resolução do mérito, não sendo possível simplesmente propor outra vez a demanda, o que só será admitido se o obstáculo ao exame do mérito vier a ser removido. Em alguns casos, essa remoção é fácil. Basta pensar, por exemplo, na sentença terminativa por indeferimento da petição inicial. Pois bastará elaborar-se nova petição, sem o vício da anterior, para que se possa demandar novamente. Há, porém, situações em que essa estabilidade é ainda maior. Pense-se, por exemplo, no caso de ter sido proferida sentença terminativa por se ter entendido que o demandante não tinha legitimidade ativa. Pois neste caso será preciso demonstrar que o autor passou a ter uma legitimidade que anteriormente não tinha (como se daria, e.g., se viesse a ser posteriormente editada lei que conferisse legitimidade extraordinária ativa àquele demandante). Sem a correção do vício - que em alguns casos será virtualmente impossível - não se poderá demandar novamente. Isto, porém, ocorre com sentenças que terão julgado extinto o processo sem resolução do mérito e, portanto, por razões processuais, formais. Daí o motivo pelo qual se fala, na hipótese, em coisa julgada formal. Insista-se, porém, que nem'toda sentença terminativa é alcançada pela coisa julgada formal. E o que se dá, por exemplo, com a sentença que extingue o processo por ter o autor desistido da ação (art. 485, VIII). Neste caso, pode o demandante, livremente, repetir sua demanda e dar origem a novo processo, sem que haja qualquer impedimento (salvo a exigência de que tenham sido pagos as custas e os honorários advocatícios relativos ao processo anterior, nos termos do art. 486, 22). Diferente da coisa julgada formal, e ainda mais intensa (já que nem com a correção do vício" seria possível demandar-se novamente), é a coisa julgada material, autoridade que acoberta as decisões de mérito irrecorríveis, tornando-as imutáveis e indiscutíveis (art. 502). Formada a coisa julgada material, o conteúdo da decisão de mérito se torna imutável e indiscutível, não mais podendo ser alterado nem rediscutido, seja em que processo for. Aqui, mais do que em qualquer outra situação, pode-se falar em causa julgada. E que a coisa julgada material é a imutabilidade do conteúdo da decisão de mérito irrecorrível. Sintetizando, então, pode-se afirmar que as sentenças terminativas em jgeral ficam sujeitas à preclusão. As sentenças terminativas resultantes de indeferimento da petição inicial, de ausência de pressuposto processual ou de "condição da ação ou da existência de convenção de arbitragem ou de pronunciamento de árbitro ou tribunal arbitrai que reconheça sua competência são alcançadas pela coisa julgada formal, só se admitindo a repropositura da demanda se o obstáculo à apreciação do mérito for removido. Por fim, as sentenças de mérito são alcançadas pela coisa julgada material, não se admitindo, em hipótese alguma, que a mesma demanda seja novamente proposta. Tenha-se claro, então, que coisa julgada é um gênero (que deve ser compreendido como a imutabilidade da sentença irrecorrível, capaz de impedir a repropositura da mesma demanda por aquela sentença já julgada), que comporta duas espécies: coisa 209

210 306 O NOVO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO Câmara julgada formal (que incide sobre algumas sentenças terminativas) e coisa julgada material (que incide sobre sentenças definitivas) Limites Objetivos da Coisa Julgada A afirmação de que a sentença, uma vez formada a coisa julgada, se torna imutável, deve ser compreendida dentro de certos limites (objetivos e subjetivos). Importa, neste momento, examinar os limites objetivos, ou seja, é preciso verificar o que se torna imutável e indiscutível com a coisa julgada. Estabelece a lei processual que "[a] decisão que julgar total ou parcialmente o mérito tem força de lei nos limites da questão principal expressamente decidida ;,art. 503). A expressão força de lei, certamente, aparece como uma tradução da expressão alemã Rechtskraft, termo usado pelos juristas germânicos para denominar o que no Brasil se chamou "coisa julgada. Assim, o que se tem no art. 503 é a afirmação de que a sentença de mérito faz coisa julgada material nos limites da questão principal expressamente decidida. A leitura do caput do art. 503 e do art. 504 (que afirma não fazerem coisa julgada os motivos, ainda que importantes para determinar o alcance da parte dispositiva da sentença e a verdade dos fatos, estabelecida como fundamento da sentença ), permite asseverar que apenas o dispositivo da sentença é alcançado pela coisa julgada. Evidentemente, nada se encontra no texto legal acerca de a coisa julgada alcançar ou não o relatório da sentença. É que, perdoe-se a obviedade, onde coisa nenhuma é julgada não existe coisa julgada. Quanto à fundamentação da sentença, porém, poderia pairar alguma dúvida e, por isso, é extremamente importante ter clara a opção legislativa por excluir dos limites da coisa julgada o que é afirmado na fundamentação da decisão judicial. A coisa julgada, portanto, fica objetivamente limitada ao dispositivo da sentença. E preciso, porém, compreender como se harmoniza tudo o que até aqui foi dito com o disposto nos Ia e 2a do art. 503, acerca da inclusão, nos limites objetivos da coisa julgada, da resolução das questões prejudiciais ao mérito. Há casos em que a resolução de questão prejudicial ao mérito (art. 503, I a, I) será também alcançada pela coisa julgada material, independentemente de pedido expressamente formulado por qualquer das partes (FPPC, enunciado 165). Como já se viu anteriormente, nem sempre a questão prejudicial se relaciona com uma questão (prejudicada) de mérito. Quando isto ocorrer, porém, sua resolução - desde que preenchidos alguns outros requisitos - se tornará imutável e indiscutível, sendo alcançada pela autoridade de coisa julgada material. Tais requisitos, registre-se, são cumulativos e, portanto, devem todos estar preenchidos para que a resolução da questão prejudicial seja alcançada pela coisa julgada (FPPC, enunciado 313). Em primeiro lugar, para que a resolução da questão prejudicial seja tida por incluída nos limites objetivos da coisa julgada, é preciso que o juízo prolator da decisão 210

211 Estabilização, preclusão e coisa julgada 307 tenha competência em razão da matéria e da pessoa para resolvê-la como questão principal (art. 503, l 2, III). Figure-se aqui um exemplo: proposta demanda de alimentos, o réu contesta alegando, entre outras matérias de defesa, não ser pai do autor. Neste processo, a questão principal é, evidentemente, a de saber se o réu deve ou não alimentos ao autor (o que passa, por exemplo, pela análise do binômio necessidadepossibilidade). Antes de resolver a questão principal, porém, incumbe ao juiz verificar se as partes são, mesmo, pai e filho (e, caso não sejam, deverá julgar improcedente o pedido de alimentos). Pois neste caso, o juízo competente, em razão da matéria e da pessoa, para conhecer de uma demanda em que se suscita a questão da filiação é o mesmo (juízo de família) competente para conhecer da demanda de alimentos, o que permite (desde que todos os demais requisitos sejam preenchidos) a formação da coisa julgada material sobre a solução da questão prejudicial. Outro exemplo pode ajudar: proposta demanda de cobrança de juros moratórios devidos em função do não cumprimento de obrigação resultante de um contrato, alega o réu em defesa que não a cumpriu porque o próprio contrato é nulo. Pois neste caso, já que o mesmo juízo é competente para conhecer do pedido de cobrança e da validade do contrato, a coisa julgada alcançará, também, a declaração de validade ou de invalidade do contrato. Pode-se, porém, pensar em exemplos nos quais a coisa julgada não alcançaria a solução da questão prejudicial por incompetência do juízo. Figure-se a seguinte hipótese: uma pessoa ajuiza, em face do Estado, perante juízo especializado nas causas da Fazenda Pública, demanda de reparação de danos resultantes da morte de seu companheiro, o qual teria sido assassinado dentro de um estabelecimento prisional enquanto cumpria pena. O Estado se defende, então, alegando que a autora não era companheira do falecido, mas apenas uma visitante ocasional, que com ele não mantinha qualquer vínculo familiar. Neste caso, o pronunciamento do juízo acerca da existência ou não de entidade familiar não será alcançado pela autoridade de coisa julgada material, dado que o juízo fazendário não é competente para causas de família. Perceba-se que a competência que deve ser aferida como requisito para a formação da coisa julgada sobre a resolução de questão prejudicial ao mérito é a do órgão jurisdicional que conhece da causa em primeiro grau de jurisdição. É que pode acontecer de o órgão com competência recursal ter competência mais ampla que o de primeiro grau. No Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, por exemplo, as Câmaras Cíveis Comuns têm competência em razão da matéria para todas as causas que não versem sobre matéria criminal ou sobre relações de consumo. Assim, por exemplo, se no primeiro grau de jurisdição o juízo fazendário e o das causas de família são órgãos distintos, no segundo grau o mesmo órgão acumula ambas as competências. Isto, porém, não é relevante para definir se a resolução da questão prejudicial é ou não alcançada pela coisa julgada. O que importa é a competência, em razão da matéria e da pessoa, do órgão jurisdicional competente para conhecer da causa em primeiro grau de jurisdição. 211

212 308 O NOVO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO Câmara O requisito da competência, porém, não é suficiente. Exige-se, ainda, para que a solução da questão prejudicial ao mérito se insira nos limites objetivos da coisa julgada, que a seu respeito [tenha] havido contraditório prévio e efetivo, não se aplicando no caso de revelia (art. 503, l 2, II). Fica, então, e desde logo, excluída a possibilidade de formar-se coisa julgada material sobre a resolução da questão prejudicial ao mérito se o réu tiver sido revel. Mesmo que não se tenha configurado a revelia, porém, a coisa julgada pode não se formar. E que se exige, para que a solução da questão prejudicial ao mérito seja inserida nos limites objetivos da coisa julgada, que sobre ela tenha havido contraditório prévio e efetivo. Assim, será preciso sempre verificar se sobre a questão as partes tiveram, antes da decisão, oportunidade para se manifestar de forma efetiva, tendo sido possível esgotar-se o debate acerca da mesma. Figure-se, por exemplo, o caso da decisão liminar proferida no procedimento especial da ação monitoria (art. 701), a qual é prolatada sem contraditório prévio e, pois, jamais permitirá a formação de coisa julgada sobre a resolução de questão prejudicial. Pois este requisito pode gerar, na prática, alguma perplexidade. Afinal, nada impede que em outro processo se suscite novamente a questão, ao argumento de que no processo anterior não houve contraditório prévio e efetivo sobre ela, não tendo as partes debatido de forma completa todos os aspectos da questão. Figure-se um exemplo: Fulano demanda em face de Beltrano e Sicrano, alegando na petição inicial que os réus formam uma sociedade não personificada, e postulando a condenação solidária dos demandados a reparar um dano que afirma ter sofrido em razão do exercício, por um deles, de ato relacionado ao objetivo social. O primeiro réu, Beltrano, contesta alegando inexistência de dano a indenizar. Já o segundo réu, Sicrano, alega que não é sócio de Beltrano, não existindo a sociedade mencionada pelo autor. Sustenta, ainda, que se algum dano houve que deva ser indenizado, a responsabilidade seria inteiramente do primeiro réu. Parece evidente que para julgar a pretensão do autor, incumbirá ao juízo da causa (competente em razão da matéria e da pessoa) verificar se a sociedade não personificada entre os réus existe ou não (o que será essencial para definir se os réus são ou não solidariamente responsáveis, nos termos do art. 990 do CC). Imagine-se, então, que o juiz da causa profira sentença em que se afirma a inexistência da sociedade, condenando-se apenas o primeiro réu, responsável pelo dano sofrido pelo autor, mas não o segundo, exatamente em razão da afirmada inexistência de sociedade. Transitada em julgado esta sentença, instaurase outro processo, agora apenas entre os réus daquele primeiro, no qual se pretende discutir se a sociedade entre eles existe mesmo ou não (deduzidas, por exemplo, pretensões cumuladas de dissolução dessa sociedade e partilha do patrimônio social). Poderia, neste segundo processo, surgir discussão sobre se houve ou não a formação, no processo anterior, de coisa julgada sobre a solução dessa questão. Afinal, pode acontecer de uma das partes, a quem o resultado do processo anterior não interessa, sustentar que naquele primeiro processo não houve contraditório efetivo acerca da questão, não tendo sido completo o debate ou não tendo sido produzidas todas as provas que poderíam ter sido produzidas, acerca da existência ou não da sociedade, já 212

213 Estabilização, predusão e coisa julgada 309 que sua preocupação principal teria sido discutir a existência ou não de dano, e não a existência ou não da sociedade. Isto levará à necessidade de que o juiz do segundo processo se pronuncie sobre se houve ou não a formação de coisa julgada sobre a resolução dessa questão prejudicial (e, caso considere que não houve, isso ainda pode resultar na posterior interposição de recursos para rediscutir esse ponto e, até mesmo, na propositura posterior de ação rescisória, ao fundamento de que a sentença do segundo processo teria ofendido a coisa julgada formada no primeiro, apoiando-se a ação rescisória no disposto no art. 966, IV). Há, ainda, um requisito negativo para a formação da coisá julgada sobre a resolução da questão prejudicial: ela não se formará se no processo houver restrições probatórias ou limitações à cognição que impeçam o aprofundamento da análise da questão prejudicial. Existem procedimentos que, por força de lei, têm restrições probatórias. É o que se dá, por exemplo, com o mandado de segurança (em que só se admite prova documental preconstituída) ou com o procedimento previsto para os Juizados Especiais Cíveis (em que não se admite perícia complexa, além de só se admitir que cada parte arrole três testemunhas). Nestes casos, a mera existência de limitações probatórias já é suficiente para afastar a possibilidade de formação de coisa julgada material sobre a resolução de questão prejudicial. Em outros casos, pode haver limitações cognitivas que impeçam o exame aprofundado da questão prejudicial (como se dá nas "ações possessórias, em que não se admite debate sobre a existência de domínio ou outro direito sobre a coisa, ou nos processos em que se discuta obrigação representada por título de crédito que tenha sido posto em circulação, no qual não se admite discussão acerca da relação jurídica de direito material que tenha dado origem aò crédito). Pois nesses casos a resolução de questão prejudicial não será capaz de alcançar a autoridade de coisa julgada material. No que diz respeito à vedação de formação de coisa julgada material sobre a resolução de questão prejudicial em processo no qual haja restrições probatórias, porém, há um dado adicional a considerar: seriam apenas as restrições probatórias decorrentes da lei (como as dos exemplos acima mencionados) capazes de afastar a formação da coisa julgada sobre a resolução da questão prejudicial? Ou o mesmo resultado ocorrería se a restrição probatória resultasse de uma decisão judicial? Deve-se considerar que qualquer restrição probatória, seja ela derivada da lei ou de decisão judicial, é suficiente para excluir a formação da coisa julgada sobre a resolução da prejudicial ao mérito. E que no caso de o juízo ter indeferido a produção de alguma prova (relacionada com a questão prejudicial, evidentemente), não se poderá considerar que houve contraditório efetivo sobre a matéria, uma vez que se poderá demonstrar, em processo posterior, que esta prova poderia levar a resultado distinto. E o mero fato de ser possível examinar-se esta alegação já implica dizer que não há coisa julgada, uma vez que esta impede qualquer nova apreciação daquilo que já tenha sido julgado. 213

214 310 O NOVO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO Câmara Em síntese, o que se viu até aqui é que a solução da questão prejudicial ao mérito estará incluída nos limites objetivos da coisa julgada se for objeto de contraditório prévio, efetivo e completo em processo que se tenha desenvolvido perante juízo competente em razão da matéria e da pessoa para resolvê-la, não tendo sido revel o réu. Há, porém, um outro ponto a enfrentar, e que é essencial para compreender-se este sistema de definição dos limites objetivos da coisa julgada. É que se faz necessário afastar a equivocada ideia segundo a qual, presentes os requisitos para que a resolução da questão prejudicial faça coisa julgada, esta alcançaria uma parte da fundamentação da decisão. Assim não é. Presentes os requisitos já examinados, a questão prejudicial ao mérito será decidida na parte dispositiva da sentença. Fundamentação não ransita em julgado, em hipótese alguma (art. 504). Nos casos em que estiverem preenchidos os requisitos estabelecidos nos Ia. e 2- do art. 503, a questão prejudicial deverá ser resolvida na parte dispositiva da sentença, independentemente de pedido expresso. Ter-se-á, aí, a inclusão dessa questão ío objeto do processo por força de lei. Trata-se de fenômeno que na linguagem processual costuma ser chamado de "pedido implícito, ccmo se tem em relação aos juros legais, à correção monetária e às verbas de sucumbência (art. 322, Ia), que devem ser objeto de decisão (no dispositivo da sentença) ainda que não tenham sido objeto de pedido expresso. Pois o mesmo deve dar-se com a resolução da questão prejudicial. Sendo o juízo de primeiro grau competente em razão da matéria e da pessoa, não tendo sido revel o réu, tendo havido contraditório prévio e efetivo e não existindo restrições probatórias ou limitações à cognição que impeçam o aprofundamento da análise da questão prejudicial, deverá o juiz proferir decisão sobre ela, a qual integrará a parte dispositiva da sentença e, assim, alcançará a autoridade de coisa julgada material (equivocado, portanto, o enunciado 438 do FPPC, por força do qual "[é] desnecessário que a resolução expressa da questão prejudicial incidental esteja no dispositivo da decisão para ter aptidão de fazer coisa julgada, já que tal decisão integrará o dispositivo da sentença, ainda que seu prolator formalmente não a tenha incluído na parte final de seu texto) Limites Subjetivos da Coisa Julgada Estabelece o art. 506 que [a] sentença faz coisa julgada às partes entre as quais é dada, não prejudicando terceiros. Tem-se, aí, a regulamentação dos limites subjetivos da coisa julgada, isto é, da determinação das pessoas que se sujeitam à coisa julgada, não podendo tornar a discutir o que tenha sido decidido. Pois a coisa julgada alcança as partes da demanda (demandante e demandado). São eles os sujeitos da demanda decidida pelo pronunciamento que alcança a autoridade de coisa julgada e, por isso, são eles os alcançados pela res iudicata. Apenas as partes da demanda são alcançados pela coisa julgada. Outras partes do processo que não sejam consideradas partes da demanda (como é o caso do assistente, por exemplo) 214

215 Estabilização, predusão e coisa julgada 311 não se sujeitam à coisa julgada (embora o assistente fique sujeito à assim chamada eficácia da intervenção, de que se falou anteriormente, e que é tratada no art. 123). Terceiros, estranhos à demanda, não são alcançados pela coisa julgada, de modo que esta não pode prejudicá-los. É interessante observar que o Direito Processual Civil brasileiro se afasta, em alguma medida, de suas fontes romanas (e de um modelo que vigorou no Brasil até a entrada em vigor do CPC de 2015), quando se considerava acertado afirmar que a coisa julgada produzida entre as partes não beneficiaria nem prejudicaria terceiros (ou, como se encontrava nas fontes romanas, res inter alios iudicata aliis neque nocet neque prodest). Pois o art. 506 estabelece que terceiros não podem ser prejudicados pela coisa julgada, o que implica dizer que podem eles se beneficiar de uma coisa julgada formada em processo de que não tenham participado. Pense-se, por exemplo, em processo no qual os sujeitos de um contrato garantido por fiança litigam sobre se o contrato já foi ou não inteiramente cumprido pelo devedor, sem que do processo participe o fiador (o que é perfeitamente possível ocorrer, dada a natureza autônoma do contrato de fiança). Pois a coisa julgada formada sobre sentença que afirmasse que o contrato ainda não foi cumprido não seria capaz de prejudicar o fiador, o qual estaria livre para, em processo futuro, tornar a suscitar a discussão acerca da extinção da obrigação principal. De outro lado, porém, a coisa julgada formada sobre sentença que afirmasse que o contrato principal já fora integralmente cumprido podería ser invocada pelo fiador, por ela beneficiado sem ter participado do processo (já que, extinta a obrigação principal, extingue-se também a fiança). A coisa julgada, portanto, fica limitada às partes da demanda, não prejudicando (mas podendo beneficiar) terceiros. E preciso considerar, porém, que nos casos de sucessão, a coisa julgada alcançará também o sucessor. É que na sucessão, o sucessor ocupa a mesma posição jurídica que antes era ocupada pelo seu antecessor. E isto se aplica tanto aos casos de sucessão mortis causa (seria absurdo, por exemplo, que existindo coisa julgada sobre sentença que afirma que um bem pertence a A e não a B, com a morte deste pudessem seus sucessores reivindicar o bem de A ao argumento de que receberam sua propriedade por herança), como nos casos de sucessão resultante de ato inter vivos. Pense-se, por exemplo, no caso de se ter formado coisa julgada no processo entre A e B no qual estes disputavam a propriedade de um bem, tendo sido declarada a propriedade de A. Este, posteriormente, vende o bem a C. Evidentemente, não poderá B disputar com C a titularidade do bem (pelos mesmos fundamentos já rejeitados no processo em que litigou com A), ao argumento de que C não foi parte naquele processo. C, sucessor (inter vivos) de A, é alcançado pela coisa julgada, inserindo-se em seus limites subjetivos. Também é preciso afirmar que nos casos de substituição processual - isto é, naqueles casos em que um legitimado extraordinário atua no processo no lugar do legitimado ordinário - a coisa julgada alcança a ambos, substituto e substituído. O substituto processual é alcançado por ser ele parte da demanda (demandante ou demandado). E o substituído processual é alcançado pela coisa julgada por ser ele o verdadeiro titular 215

216 312 O NOVO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO Câmara do interesse em disputa. Para ambos, então, forma-se coisa julgada, não se podendo mais tornar a discutir, seja em que processo for, aquilo que tenha sido decidido Coisa Julgada nas Sentenças Determinativas O art. 505, I, estabelece que não se tornará a decidir o que já tenha sido coberto pela autoridade de coisa julgada material, salvo [se], tratando-se de relação jurídica de trato continuado, sobreveio modificação no estado de fato ou de direito, caso em que poderá a parte pedir a revisão do que foi estatuído na sentença. Trata-se, aí, do (falso, como se verá) problema da coisa julgada nas sentenças determinativas. Chama-se sentença determinativa àquela que provê sobre relação jurídica de trato sucessivo ou continuado (também chamada de relação jurídica continuativa). São aquelas relações jurídicas de natureza obrigacional que se protraem no tempo de um modo tal que o pagamento das prestações não é capaz de extinguir a relação obrigacional. Uma vez efetuado o pagamento, nova prestação surge para ser paga, e assim sucessivamente. E o caso da obrigação alimentar ou da obrigação de prestar alimentos. Essas relações continuativas, evidentemente, podem extinguir-se. Seu fato ex- tintivo, porém, nunca será o pagamento. Podem elas extinguir-se apenas por outros motivos (como a morte de algum de seus sujeitos ou a resilição do contrato que lhe dá origem), mas nunca pelo pagamento. E por isso não se confunde a obrigação de trato continuado com a obrigação de pagar em parcelas. É que, neste último caso, o pagamento da última parcela extingue a obrigação. Pois acontece com alguma frequência de se deduzir em juízo alguma causa relacionada a uma obrigação de trato sucessivo, como se dá nas ações de alimentos ou nas ações revisionais de aluguel. Pois nestes processos são proferidas sentenças que proveem sobre relações jurídicas de trato sucessivo, as quais são as sentenças determinativas. A questão que aqui se põe está em saber se há alguma peculiaridade na coisa julgada material que se forma sobre as sentenças determinativas. É que, uma vez transitadas em julgado, pode surgir a necessidade de instaurar-se novo processo para rever o que havia sido anteriormente estabelecido. É o caso, por exemplo, de se ter fixado um certo valor de prestação alimentícia e, posteriormente, alguma modificação de fato ou de direito levar à necessidade de revisão do valor anteriormente fixado. Questiona- se, então, se tais sentenças são aptas a alcançar a autoridade de coisa julgada e, caso positivo, como explicar a possibilidade de revisão do que foi decidido. Pois é preciso dizer, em primeiro lugar, que tais sentenças transitam em julgado. Uma vez preclusas as vias recursais, terá a sentença transitado em julgado, não mais sendo possível, no mesmo processo, alterar o que foi decidido. Além disso, como quaisquer sentenças de mérito, as sentenças determinativas são aptas a alcançar a autoridade de coisa julgada material. E a coisa julgada que se forma 216

217 Estabilização, predusão e coisa julgada 313 sobre as sentenças determinativas é igual a qualquer outra. Pois é precisamente por isso que pode haver revisão. Estranho seria se não pudesse. E que, uma vez preclusas as vias recursais, não será mais possível tornar a discutir, em outro processo, a mesma demanda (isto é, a mesma causa), entre as mesmas partes, fundada na mesma causa de pedir e com o mesmo objeto. É preciso, porém, lembrar que a coisa julgada (rectius, causa julgada) é um impedimento apenas a que se julgue novamente a mesma causa. A demanda de revisão, porém, é distinta das anteriores, tendo causa de pedir e pedidos diferentes. E, portanto, uma demanda que nunca foi julgada anteriormente. Passe, pois, o truísmo: a coisa julgada (causa julgada) não pode impedir a apreciação de uma coisa (causa) que nunca foi julgada. Compare-se, por exemplo, a demanda de condenação ao pagamento de alimentos com a demanda revisional de alimentos. Na primeira delas, a causa de pedir é a existência de uma situação de necessidade, associada à possibilidade de o demandado arcar com a prestação. E o pedido que aí se formula é de condenação do réu ao pagamento da pensão. Já na demanda revisional de alimentos, a causa de pedir é uma modificação superveniente à sentença condenatória de pelo menos um dos elementos do binômio necessidade + possibilidade. E,o pedido é de modificação do valor anteriormente fixado. Causas de pedir e pedidos completamente diferentes, que jamais foram apreciados em juízo anteriormente. Nada há, pois, capaz de impedir o exame, agora, desta nova demanda. Como se pode ver, então, a coisa julgada que se forma sobre as sentenças determinativas é igual a qualquer outra coisa julgada. 217

218 X COGNIÇÃO: CONCEITO, OBJETO E ESPÉCIES 218

219 Após a análise dos aspectos ligados à teoria geral do Direito Processual, passa-se ao estudo das três espécies adm itidas de m ódulo processual, com e çando-se pelo m ódulo processual de conhecim ento, ou cognitivo. Esse tipo de m ódulo processual é assim denom inado por ter, com o atividade preponderante, a cognição, objeto de atenção nesse m om ento.1 Cognição é a técnica utilizada pelo juiz para, através da consideração, análise e valoração das alegações e provas produzidas pelas partes, formar juízos de valor acerca das questões suscitadas no processo, a fim de decidi-las.2 Trata- -se de atividade comum a todas as categorias de m ódulo processual, em bora se revele predom inante no m ódulo cognitivo. Explique-se esse conceito: a finalidade essencial do m ódulo processual de conhecim ento é a obtenção de um a declaração, consistente em conferir-se certeza jurídica à existência ou inexistência do direito afirm ado pelo dem andan 1 É de se notar que a denominação processo de conhecimento (ou, como prefiro dizer aqui, mais genericamente, módulo processual de conhecimento) é típica da linguagem dos processualistas brasileiros e italianos. Não é, porém, a mais freqüente entre os juristas portugueses, que preferem designar essa espécie de processo pelo fim básico a que se destina, qual seja, a declaração da existência ou inexistência do direito afirmado pelo demandante, razão pela qual se fala, naquele país, em processo declarativo. Assim, por todos, Fernando Luso Soares, Direito processual civil, p Watanabe, Da cognição no processo civil, p. 41; Freitas Câmara, "O objeto da cognição no processo civil, p

220 3 0 8 Lições de Direito Processual Civil Câmara te em sua petição inicial. Para prolatar o provim ento capaz de perm itir que se alcance essa finalidade, é preciso que o juiz examine e valore as alegações e as provas produzidas no processo, a fim de em itir seus juízos de valor acerca das mesmas. A essa técnica de análise e valoração é que se dá o nome de cognição. A cognição é elem ento essencial para a adequação do processo às necessidades do direito material, como facilmente se com preenderá quando da análise das diversas espécies em que a m esm a pode ser dividida. Discute-se em doutrina qual é o objeto da cognição. Note-se, antes de mais nada, que o conceito de objeto da cognição não coincide com o de objeto do processo, já estudado, sendo certo que este é m ais restrito, e encontra-se contido naquele.3 O que se busca aqui é saber sobre o que incide a atividade cognitiva do juiz, havendo profunda dissensão entre os autores que trataram do tem a em definir os com ponentes desse objeto. Há que se referir, em prim eiro lugar, aos autores que defendem a ideia de que o objeto da cognição é um binômio,4 formado pelos pressupostos processuais e pelas "condições da ação.5 De outro lado, encontram os os defensores da ideia segundo a qual o objeto da cognição judicial é formado por um trinômio de questões: "condições da ação, pressupostos processuais e m érito.6 Não se pode, ainda, deixar de referir a teoria segundo a qual o objeto da cognição seria um quadrinômio: pressuposto processual, supostos processuais, "condições da ação e m érito da causa.7 A questão que ora m e ocupa já me preocupou antes, a ponto de ter elaborado, a seu respeito, ensaio já aqui referido.8 Reitero, agora, a ideia ali enunciada, de que o objeto da cognição é, sim, formado por um trinômio de questões, mas não o trinôm io tradicionalm ente enunciado. Em vez de falar em pressupostos 3 Sobre a distinção entre objeto da cognição e objeto do processo, consulte-se Freitas Câmara, O objeto da cognição no processo civil, p. 222, esp. nota de rodapé n 30; Dinamarco, O conceito de mérito em processo civil", Fundamentos do processo civil moderno, p Entre estes destaca-se, sem sombra de dúvida, a figura maior de Chiovenda, Instituições de direito processual civil, vol. I, p Nunca é demais recordar que Chiovenda defendia uma concepção concreta da ação, o que o levava a considerar que as condições da ação eram os requisitos para obtenção de um julgamento favorável, aí incluindo, portanto, a existência do direito substancial afirmado pelo demandante. 6 Essa é, sem dúvida, a doutrina dominante. Assim, entre outros, Buzaid, Do agravo de petição no sistema do Código de Processo Civil, p. 90; Dinamarco, O conceito de mérito em processo civil, p. 205; Watanabe, Da cognição no processo civil, p. 51; Machado Guimarães, Estudos de direito processual civil, p. 99; Luís Eulálio de Bueno Vidigal, Pressupostos processuais e condições da ação, Revista de direito processual civil, vol. VI, 1967, p. 5-11; Greco Filho, Direito processual civil brasileiro, vol. II, p Neves, Estrutura fundamental do processo civil, p Freitas Câmara, "O objeto da cognição no processo civil, passim. 220

221 Cognição: Conceito, Objeto e Espécies processuais, "condições da ação e mérito da causa como com ponentes do objeto da cognição, parece-me mais acertado falar-se que os com ponentes de tal trinômio são questões preliminares, questões prejudiciais e questões referentes ao mérito da causa (objeto do processo).9 Em prim eiro lugar, a m eu sentir, devem ser apreciadas as questões preliminares. Estas são um a espécie de questão prévia, assim com preendida toda e qualquer questão que deva ser apreciada antes do m érito da causa. Entre as questões prévias encontram -se duas espécies: preliminares e prejudiciais.10 As prim eiras, com que m e preocupo nesse m om ento, são aquelas questões prévias cuja solução pode im pedir o julgam ento do objeto do processo.11 Assim, por exemplo, a análise das questões sobre as "condições da ação, ou das questões sobre o processo (entre as quais se situam os pressupostos processuais e os im pedim entos processuais, entre outras), são prelim inares, visto que sua resolução pode im pedir a apreciação do m érito, extinguindo-se o processo sem que este seja resolvido. São prelim inares as questões enunciadas no art. 301 do CPC, cabendo ao réu alegá-las na contestação, sob pena de responder pelas "custas do retardam ento. Registre-se que, no art. 301, são incluídas duas questões que não se enquadram propriam ente no conceito apresentado de prelim inares: a incom petência absoluta e a conexão (aí utilizado o term o em sentido amplo, abrangendo tan to a conexão stricto sensu com o a continência). Essas duas questões não chegam jamais a im pedir a apreciação do m érito da causa, razão pela qual são denom inadas preliminares impróprias ou dilatórios.12 Note-se, aqui, que a inclusão das "condições da ação e dos pressupostos processuais (e dem ais questões sobre o processo) num a m esm a categoria não implica negar sua diversidade ontológica. Já ficou claro, ao longo da exposição de m inhas ideias, que "condições da ação e pressupostos processuais são categorias distintas, da m esm a forma como são distintos os institutos da ação e do processo. O que pretendo é, tão som ente, a inclusão dessas categorias ontologicam ente distintas num a única categoria quanto à cognição judicial, um a vez que ambas têm um elem ento em comum, qual seja, o fato de serem ambas questões que devem ser apreciadas antes do objeto do processo, e cuja resolução pode im pedir a apreciação deste. Ultrapassadas as prelim inares, o que significa dizer que é possível a apreciação do objeto do processo, passa-se à segunda espécie de questão prévia, a 9 Freitas Câmara, O objeto da cognição no processo civil", p Sobre as questões prévias como gênero, de que são espécies as preliminares e as prejudiciais. Pontes de Miranda, Comentários ao Código de Processo Civil [de 1939], tomo IV, p Barbosa Moreira, Questões prejudiciais e coisa julgada, p Freitas Câmara, O objeto da cognição no processo civil, p

222 3 1 0 Lições de Direito Processual Civil Câmara prejudicial. Entra-se, nesse m om ento, no segundo elem ento com ponente do trinôm io de questões que com põe o objeto da cognição judicial. Q uestão prejudicial é a segunda espécie de questão prévia, e pode ser definida como o antecedente lógico e necessário do julgam ento do m érito (questão prejudicada), e que vincula a solução deste, podendo ser objeto de dem anda autônom a.13 Trata-se, com o se verifica facilmente pela definição apresentada, de questão que deve ser apreciada antes do objeto do processo, o que justifica sua inclusão como elem ento distinto do m érito no objeto da cognição judicial. A prejudicial é um a questão prévia ao m érito e cuja solução terá forte influência na resolução do objeto do processo. Exemplo tradicional é o que se tem na "ação de alim entos, em que o autor alega ser filho do réu, e este contesta a pretensão do dem andante, negando a filiação. A ntes de julgar a pretensão do autor, com o facilm ente se deduz, caberá ao juiz verificar se ele é ou não filho do réu. Essa questão não integra o objeto do processo, sendo a ele anterior (questão prévia, portanto). Salta aos olhos, porém, que a solução que se dê à prejudicial influirá no julgam ento da pretensão. N ote-se que o juiz não julga a questão prejudicial, mas tão som ente dela conhece. Isso explica por que, por exemplo, afirma o art. 469, III, do CPC que a resolução da questão prejudicial não é alcançada pela coisa julgada. Essa afirmação contida na lei fica mais clara quando se sabe que só pode ser alcançado pela coisa julgada aquilo que é julgado, e isso não ocorre com as prejudiciais, que são apenas conhecidas. O juiz apenas conhece incidenter tantum das prejudiciais, e não principaliter.14 A questão prejudicial pode ser interna (quando surge no m esm o processo onde será apreciada a questão prejudicada, com o ocorre no exem plo anteriorm ente aventado, da "ação de alim entos ), ou externa (quando sua apreciação se dará em outro processo, o que ocorreria, por exemplo, se a negação de paternidade do exem plo aventado tivesse ocorrido em "ação negatória de paternidade ). Pode, ainda, ser classificada em homogênea (quando pertence ao mesmo ram o do Direito que a questão prejudicada, e mais um a vez cito o exemplo referido da "ação de alim entos, um a vez que a obrigação de alim entar e a filiação pertencem, ambas, ao m esm o ram o da ciência jurídica: o Direito Civil) e heterogênea (quando a prejudicial pertence a ram o do Direito diverso da questão prejudicada, o que se dá, por exemplo, quando num a dem anda fundada no Direito Civil surge um a prejudicial de inconstitucionalidade de lei). 13 Antônio Scarance Fernandes, Prejudicialidade, p. 53; Freitas Câmara, "O objeto da cognição no processo civil, p Será visto mais adiante que há uma possibilidade de o juiz conhecer principaliter das questões prejudiciais, hipótese em que a postulação referente a estas será julgada e, por conseguinte, alcançada pela autoridade de coisa julgada. É o que se dá quando existe "ação declaratória incidental" (arts. 5o, 325 e 470 do CPC). 222

223 Cognição: Conceito, Objeto e Espécies Após a análise de eventual questão prejudicial que tenha surgido no processo, passa-se ao terceiro elem ento do objeto da cognição, qual seja, o conjunto de questões referentes ao m érito da causa, ou objeto do processo (o Streitgegenstand da doutrina alemã). Esse conceito já foi analisado anteriorm ente, sendo de lembrar, apenas, que o m érito da causa nada mais é do que a pretensão m anifestada pelo autor em sua dem anda. Em outras palavras, após a apreciação das questões prévias, passa o juiz a apreciar o mérito, ou seja, a julgar o pedido do autor.15 Registro, porém, e desde logo, que resolver questões não é julgar, mas algo que se faz a cam inho do julgam ento. Julgar é concluir, e só se consegue chegar à conclusão depois de resolvidas todas as questões. É preciso, então, que o juiz conheça de todas as questões de mérito, e as resolva, para que possa proferir seu julgam ento sobre a pretensão do dem andante. Essa observação deve ser feita para que se possa, depois, voltar ao ponto (quando do estudo dos elem entos essenciais da sentença). Após conceituar a cognição, e depois da exposição de seu objeto, há que se passar à classificação da cognição, analisando-se cada um a de suas espécies. Ainda aqui não há consenso doutrinário, em bora se possa verificar um a certa uniform idade no pensam ento da m aioria dos autores que tratou do tema. Uma prim eira tentativa de classificação da cognição foi feita por Chiovenda, que reconhecia a existência de um a cognição ordinária ao lado de outra, sumária.16 Para esse autor há um a espécie ordinária de cognição, que seria "plena e com pleta, na qual o juiz teria "por objeto o exame afundo de todas as razões das partes, ou seja, de todas as condições para a existência do direito e da ação e de todas as exceções do réu.17 Ao lado dessa prim eira espécie, reconhece Chiovenda um a cognição sumária, incompleta, "quando o exame das razões das partes ou não é exaustivo ou é parcial.18 A cognição sumária, para este autor, poderia se m anifestar de três formas: a) na condenação com execução provisória, quando se adm ite que u m a sentença condenatória, ainda sujeita a recurso, produza o efeito de abrir caminho para a instauração da execução forçada; 15 Note-se que, como julgar o mérito é julgar o pedido do autor, caberá ao juiz, quando da prolação da sentença de mérito, julgar procedente ou improcedente o pedido (e não a ação, como se vê todos os dias na linguagem forense, e até mesmo na obra de diversos processualistas). Não se deve falar em ação procedente ou em ação improcedente, uma vez que não é do julgamento da existência ou inexistência do poder de ação que se trata aqui. O que está sob julgamento, quando da apreciação do objeto do processo, é o pedido formulado pelo demandante. Admitir-se como corretas as expressões aqui criticadas implicaria fazer-se uma concessão inadmissível às teorias concretas sobre a ação. 16 Chiovenda, Instituições de direito processual civil, vol. I, p Chiovenda, Instituições de direito processual civil, vol. I, p Chiovenda, Instituições de direito processual civil, vol. I, p

224 3 1 2 Lições de Direito Processual Civil Câmara b) na condenação sob reserva, quando se adm ite que o juiz possa proferir sentença condenatória, reservando o exame de determ inadas exceções do réu para m om ento posterior; e c) no procedim ento m onitório, quando a lei adm ite que se possa ordenar um pagam ento antes de ser ouvido o pretenso devedor. Ter-se-ia cognição sum ária nos três casos, sendo a cognição não definitiva (na hipótese sub a), parcial (na hipótese sub b) ou superficial (na hipótese sub c).19 Nas três espécies de cognição sumária, ter-se-ia como objetivo a antecipação da execução, razão pela qual deu Chiovenda a essas m edidas provenientes de cognição incom pleta o nom e de "declarações com predom inante função executiva.20 Admitia, ainda, Chiovenda, haver cognição sum ária, em razão da urgência, para concessão de m edidas provisórias, acauteladoras ou não.21 Essa classificação da cognição, em bora extrem am ente lógica, e tendo sido defendida pelo m ais influente entre todos os processualistas, não recebeu acolhida da m elhor doutrina. É realm ente preferível adotar-se outra forma de classificação, proposta no Brasil pelas vozes mais autorizadas que trataram do tem a.22 Assim é que a cognição deve ser examinada em dois planos, o horizontal (da extensão ou am plitude) e o vertical (da profundidade). No plano horizontal, em que se verifica a am plitude da cognição judicial, o que se busca é saber qual a extensão com que são analisados os elem entos com ponentes do objeto da cognição. Fala-se, assim, em cognição plena (quando todos os com ponentes do trinôm io são apreciados) e limitada (quando ocorre alguma restrição na am plitude da cognição). A prim eira espécie é a mais freqüente no módulo processual de conhecim ento, já que o princípio da economia processual impõe se busque a existência de um processo capaz de assegurar o máximo de vantagem com o m ínim o de dispêndio. Assim sendo, na maioria dos processos cognitivos o objeto da cognição é inteiram ente analisado pelo juízo, com o que se garante que a sentença resolverá a questão subm etida ao crivo do judiciário da form a mais com pleta possível. Exemplo da segunda espécie, em que a cognição é lim itada no plano horizontal, restringindo-se assim a análise do objeto da cognição, é o que se tem nas "ações possessórias, em que - como notório - não se pode examinar a existência do dom ínio (vedação da "exceção de dom ínio ). Assim, por exemplo, se for proposta um a "ação possessória em que figure como réu o proprietário do bem, este não poderá alegar em defesa o domínio. A cognição é, 19 Chiovenda, Instituições de direito processual civil, vol. I, p Chiovenda, Instituições de direito processual civil, vol. I, p Chiovenda, Instituições de direito processual civil, vol. I, p Watanabe, Da cognição no processo civil, p ; Marinoni, Tutela cautelar e tutela antecipatória, p

225 Cognição: Conceito, Objeto e Espécies portanto, limitada, restringindo-se à análise da posse. Fica aberta, obviamente, a via da "ação petitória para que aquele que se considere proprietário possa fazer valer esse direito em juízo. No plano vertical, em que se busca saber a profundidade da análise dos elem entos a serem apreciados pelo juiz, têm -se três espécies de cognição: exauriente, sumária e superficial. A prim eira espécie é aquela em que a decisão judicial será proferida com base em juízo de certeza. Cabe, aqui, um a explicação. É que todo juízo de certeza é, em verdade, um juízo de verossim ilhança.23 Tal se dá porque o juiz atua, em relação aos fatos da causa, como o historiador em relação aos fatos históricos, buscando reconstruí-los. Assim é que o juiz, em sua atividade cognitiva, afirma que dado fato é verdadeiro quando alcança aquele grau de convencim ento que lhe é outorgado por um a m áxim a verossim ilhança. A certeza a que se refere aqui, portanto, não é um a certeza psicológica, mas um a certeza jurídica.24 A cognição exauriente, portanto, perm ite a prolação de um a decisão baseada em juízo de certeza (jurídica), o que justifica a formação da coisa julgada, m anto que reveste de im utabilidade e indiscutibilidade o conteúdo dessa decisão. Em outros term os, a cognição exauriente perm ite a resolução definitiva da questão trazida ao crivo do judiciário, impedindo, assim, o surgim ento de processo posterior que tenha o m esm o objeto. As principais características da cognição exauriente são a existência de um contraditório antecedente ao provim ento jurisdicional (eis que o juiz só poderá form ar o juízo de certeza após ouvir as razões de ambas as partes), o qual deverá se realizar nos term os predeterm inados por lei, e na possibilidade de o provim ento assim proferido ser alcançado pela im utabilidade e indiscutibilidade da coisa julgada substancial.25 A cognição exauriente, com o facilmente se verifica, é freqüente nos m ó dulos processuais de conhecim ento, um a vez que a finalidade essencial destes é, precisam ente, a obtenção de certeza jurídica quanto à existência ou inexistência do direito substancial afirm ado pelo dem andante. A segunda modalidade de cognição no plano vertical é a cognição sumária. Esta se caracteriza por levar o juiz a em itir um provim ento baseado em juízo de probabilidade. Cabe, aqui, o u tra rápida digressão. Os conceitos de possibilidade, 23 Piero Calamandrei, Verità e verosimiglianza nel processo civile, Opere giuridiche, vol. V, p Piero Calamandrei, Verità e verosimiglianza nel processo civile", p Essas as características apontadas para o que chama cognizione piena, e que corresponde ao que aqui venho chamando cognição exauriente, Proto Pisani, Lezioni di diritto processuale civile, p

226 3 1 4 Lições de Direito Processual Civil Câmara verossimilhança e probabilidade são, em verdade, m uito próximos, sendo m esm o com um que sejam em pregados como sinônim os. Não parece, porém, que essa seja a m elhor form a de se interpretar esses term os. Assim é que opto por dar a esses três conceitos o sentido que lhes dá Calamandrei, em obra clássica já referida: possível é aquilo que pode ser verdade; verossímil é aquilo que tem a aparência de verdade; por fim, provável é aquilo que se pode considerar como razoável, ou seja, aquilo que dem onstra grandes motivos para fazer crer que corresponde à verdade.26 Apresentam -se, pois, esses três term os como um a escala em direção à certeza: a mais tênue das três figuras é a m era possibilidade (capaz de excluir, apenas, os fatos impossíveis de terem ocorrido). Um pouco mais forte é a verossimilhança (que se afigura como aparência de que o fato ocorreu) e, por fim, a probabilidade, algo como um a quase-certeza. Na cognição sumária, busca-se um juízo de probabilidade, devendo o provim ento a ser proferido afirmar, apenas e tão som ente, que é provável a existência do direito, ou seja, que há fortes indícios no sentido de sua existência, convergindo para tal conclusão a m aioria dos fatores postos sob o exame do juiz. Tal provimento, obviamente, não poderá jamais ser tido por imutável e indiscutível, já que não é capaz de afirm ar a existência do direito, sendo, portanto, incapaz de ser alcançado pela im utabilidade e indiscutibilidade decorrentes da autoridade de coisa julgada substancial.27 São diversas as hipóteses em que o juiz é cham ado a em itir provim entos com base em cognição sum ária, entre eles se destacando as m edidas cautelares e a tutela antecipada.28 A cognição sum ária é um a técnica destinada a assegurar três escopos principais: econom ia processual, evitar o abuso do direito de defesa e busca de efetividade da tutela quando esta seja com prom etida pelo tem po Calamandrei, Verità e verosimiglianza nel processo civile, p Não concordando com o que vai no texto, afirmando a possibilidade de um provimento baseado em cognição sumária alcançar a coisa julgada material, Luiz Fux, Tutela de segurança e tutela da evidência, p Registro, aqui, que o ordenamento pode estabelecer casos em que a decisão proferida com base em cognição sumária, em razão de algum fato posterior, passa a se equiparar a decisões baseadas em cognição exauriente. É o que se tem, por exemplo, no procedimento monitório, em que o provimento liminar, baseado em juízo de probabilidade, somado à contumácia do demandado, permite a formação da coisa julgada material. 28 Sobre a natureza sumária da cognição em sede de tutela cautelar, para não multiplicar desnecessariamente as citações, basta referir a principal obra já escrita sobre o tema: Piero Calamandrei, "Introduzione alio studio sistemático dei prowedimenti cautelari, Opere giuridiche, vol. IX, p Sobre a índole sumária da cognição na tutela antecipada, é farta a literatura no Brasil. Consulte-se, entre outros, Baptista da Silva, Curso de processo civil, vol. I, p. 113; Nery Júnior, Atualidades sobre o processo civil, p. 61; Dinamarco, A reforma do Código de Processo Civil, p. 145; Marinoni, A antecipação da tutela na reforma do processo civil, p ; Freitas Câmara, Lineamentos do novo processo civil, p Proto Pisani, Lezioni di diritto processuale civile, p

227 Cognição: Conceito, Objeto e Espécies É de se notar, por fim, que, em razão da diversidade conceptual anteriorm ente ap o n tad a en tre possibilidade, verossimilhança e probabilidade, não parece correto afirmar que a cognição sum ária perm ite um "juízo de verossim ilhança.30 Este, como se verá adiante, é o que se forma na cognição superficial, terceira e últim a espécie de cognição no aspecto vertical. A probabilidade, exigida na cognição sumária, corresponde a um a "quase-certeza, razão pela qual se exige, nesse campo, a existência de alguma produção probatória.31 E à luz dessas provas, insuficientes para produzir um juízo de certeza, m as capazes de convencer o juiz da probabilidade de existência do direito afirm ado, que se p rolatará o provim ento judicial decorrente de cognição sum ária. Afirme-se, para encerrar essa rápida exposição do conceito e das características da cognição sum ária, que estou convencido de que a probabilidade de existência do direito exigida para a prolação de um provim ento cautelar é a m esm a que se exige para a antecipação da tutela jurisdicional satisfativa.32 A terceira e últim a das modalidades de cognição quanto à profundidade é a cognição superficial ou rarefeita. Esta se caracteriza por levar o juiz a um juízo de possibilidade (ou, pode-se dizer, a um juízo de verossimilhança). É de se notar que é aqui, na cognição superficial, e não na cognição sum ária, que haverá verdadeiro juízo de verossimilhança. A utilização indevida dessa palavra no caput do art. 273 do CPC pode induzir o intérprete em erro, um a vez que a hipótese ali versada, tutela antecipada, é exemplo típico de cognição sumária. V erossim ilhança, com o se sabe, é a aparência de verdade, sendo conceito mais rarefeito que o de probabilidade. O juízo de verossimilhança, é de se deixar claro, não é um juízo a ser exercido sobre os fatos, mas sobre as afirmações.33 O juízo de verossimilhança, portanto, característico da cognição superficial, se dá num prim eiro m om ento, o das alegações, antes de se iniciar o procedim ento probatório. Trata-se de um juízo que se produz sobre um a m áxim a de experiência, decorrente da verificação da frequência com que se produz o fato alegado pela parte.34 O juízo de verossimilhança, pois, difere do 30 Vários autores, porém, fazem essa equiparação entre probabilidade e verossimilhança, que me parece errônea. Por todos, Baptista da Silva, Curso de processo civil, vol. I, p Marinoni, Tutela cautelar e tutela antecipatória, p Já afirmei isso anteriormente, em Freitas Câmara, Lineamentos do novo processo civil, p. 68. No mesmo sentido, Marinoni, Tutela cautelar e tutela antecipatória, p. 24, esp. nota de rodapé n 30. Em sentido contrário, afirmando haver diferença de profundidade entre a cognição para a tutela antecipada e para a tutela cautelar, entendendo ser a exigência para a tutela cautelar mais tênue, Dinamarco, A reforma do Código de Processo Civil, p Calamandrei, Verità e verosimiglianza nel processo civile, p Calamandrei, Verità e verosimiglianza nel processo civile, p

228 3 1 6 Lições de Direito Processual Civil Câmara juízo de probabilidade, típico da cognição sumária, pois este se realiza após a produção de algum as provas. A cognição superficial é típica das decisões lim inares em processo cautelar (mas não em todas as lim inares, visto que algumas são deferidas com base em cognição sumária, com o no caso do m andado de segurança).35 Pode- -se, pois, afirmar que a decisão lim inar será deferida com base num a cognição que, no plano vertical, encontra-se um "degrau acima daquela exigida para o provim ento final do processo onde a m esm a é prolatada. Assim, por exemplo, no processo de conhecim ento de rito ordinário, o provim ento final - a sentença - é proferido com base em cognição exauriente. Conseqüência disso é que a lim inar antecipatória dos efeitos da sentença deverá ser deferida com base em cognição sum ária (um "degrau acima). Já no processo cautelar, em que o provim ento final é de cognição sumária, a lim inar deverá ser proferida à luz de um juízo de m era verossim ilhança, ou seja, cognição superficial. Afirme-se, por fim, que as diversas m odalidades de cognição podem ser com binadas num m esm o processo, sendo possível adm itir-se a existência de processos com cognição plena e exauriente, plena e sumária, lim itada e exauriente, e todas as outras combinações que se revelem possíveis entre a am plitu d e (plano horizontal) e a profundidade (plano vertical) da cognição Marinoni, Tutela cautelar e tutela antecipatória, p Watanabe, Da cognição no processo civil, p ; Freitas Câmara, "O objeto da cognição no processo civil", p

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