Anemias Tipos e Como Iniciar a Investigação

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Transcrição:

Compartilhe conhecimento: Revisão completa sobre anemias microcíticas, normocíticas e macrocíticas, com informações essenciais para o diagnóstico e acompanhamento. A anemia é uma doença muito prevalente entre as crianças, principalmente nos países em desenvolvimento, nos quais chega a afetar mais da metade de toda a população abaixo dos 5 anos. Embora a fisiopatologia seja bem conhecida, vale lembrar que as anemias hipocrômicas microcíticas nem sempre são ferroprivas. Costumamos classificar inicialmente as anemias em 3 tipos: microcítica, normocítica ou macrocítica. Você sabe investigá-las? Sabe como reconhecer o valor normal de hemoglobina por faixa etária? Relembre conceitos, recomendações e como investigar este grupo de doenças neste post, baseado no estudo de artigo publicado na American Family Physician.

O ESTUDO Iron Deficiency and Other Types of Anemia in Infants and Children MARY WANG, MD, University of California San Diego, San Diego, California Am Fam Physician. 2016 Feb 15;93(4):270-278. Leia o Paper Online ANEMIA: Definição e Aspectos Gerais Anemia é definida como nível de hemoglobina com dois desvios padrões (DP) abaixo da média para a idade (confira na Tabela abaixo). Sua prevalência é maior nos lactentes e nas crianças quando comparado à população adulta. Toda criança com anemia deve ter sua avaliação iniciada por história completa e análise de risco. Níveis de Hemoglobina Normal por Idade, em Crianças e Adolescentes

ERA NÍVEL MÉDIO DE HEMOGLOBINA -2 DESVIOS PADRÃO Nascimento (termo infantil) 16,5 g/dl 13,5 g/dl 1 mês 13,9 g/dl 10,7 g/dl 2 meses 11,2 g/dl 9,4 g/dl 3 a 6 meses 11,5 g/dl 9,5 g/dl 6 meses a 2 anos 12 g/dl 10,5 g/dl 2 a 6 anos 12,5 g/dl 11,5 g/dl 6 a 12 anos 13,5 g/dl 11,5 g/dl 12 a 18 anos Masculino 14,5 g/dl 13 g/dl Feminino 14 g/dl 12 g/dl A Academia Americana de Pediatria (AAP) e a Organização Mundial da Saúde (OMS) recomendam triagem de rotina para anemia aos 12 meses de idade. Tanto a OMS quanto a AAP recomendam triagem universal para anemia nas crianças com 1 ano de idade. A AAP também recomenda o investigação em qualquer idade nas crianças com fatores de risco para anemia, como problemas de alimentação, crescimento deficiente e ingestão inadequada de ferro na dieta. A classificação da anemia de acordo com o volume corpuscular médio (VCM) em microcítica, normocítica ou macrocítica auxilia na investigação e no tratamento. Quando a anemia é diagnosticada, o acompanhamento do caso é essencial. Um estudo mostrou que 25% dos pacientes que foram diagnosticados com anemia não tiveram exames de acompanhamento documentados. A forma mais comum de anemia em crianças é a microcítica por deficiência de ferro. A anemia ferropriva, que pode ser associada a problemas cognitivos durante o desenvolvimento, é prevenida e tratada com suplementação de ferro ou aumento da ingestão do mineral na dieta. O clampeamento tardio do cordão umbilical (1 3 minutos) pode melhorar a quantidade de ferro na infância, especialmente para populações de risco, como os bebês prematuros ou fetos pequenos para a idade gestacional. A anemia normocítica pode ser causada por membranopatias congênitas, hemoglobinopatias, enzimopatias,

defeitos metabólicos e destruição imunomediada. É necessária uma contagem inicial de reticulócitos para determinar a função da medula óssea. A anemia macrocítica, que é incomum em crianças, justifica a avaliação subsequente da vitamina B 12 e deficiências de folato, hipotireoidismo, doença hepática e distúrbios da medula óssea. Causas de anemia em crianças IDADE TIPO DE ANEMIA MICROCÍTICA NORMOCÍTICA MACROCÍTICA Neonatos Deleção de 3 genes α- talassemia Perda de sangue aguda Isoimunização (hemólise mediada por anticorpos) Anemias hemolíticas congênitas (esferocitose, deficiência de glucose-6-fosfato desidrogenase) Infecções congênitas (incluindo parvovírus B19) Aplasia congênita

IDADE TIPO DE ANEMIA MICROCÍTICA NORMOCÍTICA MACROCÍTICA Lactentes e crianças jovens Anemia por deficiência de ferro Infecção concomitante Talassemia Infecção concomitante Perda de sangue aguda Anemia por deficiência de ferro Doença falciforme Deficiência de enzimas dos glóbulos vermelhos (deficiência de glucose-6-fosfato desidrogenase, deficiência de piruvato quinase) Defeitos da membrana dos glóbulos vermelhos (esferocitose, eliptocitose) Anemia hemolítica adquirida Anemia hemolítica autoimune Hiperesplenismo Eritroblastopenia transitória da infância Distúrbios da medula óssea (leucemia, mielofibrose) Deficiência de Vitamina B 12 ou folato Hipotireoidismo Hiperesplenismo Aplasia congênita Crianças mais velhas e adolescentes Anemia por deficiência de ferro Anemia de doença crônica Talassemia Perda de sangue aguda Anemia por deficiência de ferro Anemia por doença crônica Anemia hemolítica adquirida Doença falciforme Distúrbios da medula óssea (leucemia, mielofibrose) Deficiência de Vitamina B 12 ou folato Hipotiroidismo Triagem para anemia

Avaliação inicial A maioria dos bebês e das crianças com anemia leve não têm sinais ou sintomas clínicos. Assim, a avaliação inicial deve incluir uma história completa, procurando identificar: antecedente de prematuridade e/ou baixo peso ao nascer, hábito alimentar, doenças crônicas, história familiar de anemia e origens étnicas. O exame inicial a ser solicitado é o hemograma completo. Caso o valor da hemoglobina seja inferior a 2 DP do valor normal para idade, fechamos o diagnóstico de anemia. Em seguida, avalia-se o volume corpuscular médio e classificamos em microcítica, normocítica ou macrocítica. Avaliação de Anemia (Fluxograma 1) Passe o mouse sobre o fluxograma e utilize os controles para

ampliar Anemia microcítica 1. Anemia Ferropriva 1.1 Diagnóstico A anemia microcítica devido à deficiência de ferro é o tipo mais comum de anemia em crianças. Crianças com anemia microcítica e uma história de baixa ingestão de ferro na dieta devem receber um teste de suplementação de ferro e aconselhamento dietético. Embora a anemia por deficiência de ferro seja geralmente microcítica, alguns pacientes podem ter glóbulos vermelhos normocíticos. Se houver aumento do nível de hemoglobina em 1 g/dl após um mês de suplementação de ferro, a anemia por deficiência de ferro é o diagnóstico mais provável. Nos casos que não respondem ao tratamento empírico, outros exames devem ser realizados. A dosagem da ferritina é o teste mais sensível para o diagnóstico de anemia ferropriva, sendo seu valor normal entre 10 a 16 µg/l. A ferritina é um bom reflexo do estoque de ferro total do organismo e também é o primeiro índice laboratorial a diminuir na deficiência de ferro. A ferritina também é um reagente de fase aguda; desta forma, seu valor é menos confiável em crianças com doenças infecciosas ou inflamatórias. Levandose este ponto em consideração, sua solicitação, se possível, deve ser evitada ou adiada nessas condições. Outro parâmetro utilizado é a variação no tamanho dos glóbulos vermelhos (RDW); ele é elevado na anemia ferropriva, ou seja, há grande variação no tamanho das glóbulos vermelhos (anisocitose). A capacidade total de ligação do ferro (CTLF) está aumentada na deficiência de ferro e diminuída nos quadros inflamatórios. Numa situação de deficiência de ferro e inflamação simultâneos, os valores podem ser normais. Os valores de referência para CTLF são: 45 70 µmol/l, ou 250 390 µg/dl [Anemia Carencial Ferropriva SBP]. A dosagem de ferro sérico, transferrina e saturação da transferrina são limitadas para avaliação da deficiência de ferro.

A protoporfirina eritrocitária livre, precursora do grupamento heme, tende a aumentar na deficiência de ferro, indicando desequilíbrio entre a produção de porfirina e a oferta de ferro na célula, o que acarreta baixa eritropoiese. Grande parte da protoporfirina livre no interior das células liga-se ao zinco, formando um complexo zincoprotoporfirina. Assim, a concentração de protoporfirina pode ser determinada diretamente no sangue ou por meio de medida de zincoprotoporfirina, sendo esta última a preferencial. A infecção e/ou inflamação, a intoxicação por chumbo e a anemia hemolítica também podem levar à elevação da zincoprotoporfirina [Anemia Carencial Ferropriva SBP]. 1.2 Prevenção Gravidez e parto. Mais de 42% das grávidas terão anemia. A necessidade de ferro aumenta a cada trimestre e deve haver aumento proporcional na ingesta materna deste mineral. Entre 60% e 80% do armazenamento de ferro de um recém-nascido ocorre durante o terceiro trimestre, mas não está claro se o tratamento da anemia materna previne a anemia em recém-nascidos e lactentes. Alguns estudos mostraram que existem evidências insuficientes para recomendar a triagem ou o tratamento de anemia ferropriva em mulheres grávidas para melhorar os resultados maternos ou neonatais. Embora duas revisões Cochrane tenham constatado que os níveis de hemoglobina materna melhoram com a suplementação de ferro anteparto, os estudos não demonstraram benefícios estatisticamente significativos nos resultados clínicos (por exemplo, baixo peso ao nascer, parto prematuro, infecção, hemorragia pós-parto) para mães ou recém nascidos. O clampeamento tardio do cordão umbilical (aproximadamente 120 a 180 segundos após o parto) está associado a maior quantidade de ferro (níveis de ferritina) dos 2 aos 6 meses de idade. Este benefício pode ser especialmente importante para aqueles susceptíveis à deficiência de ferro, como prematuros ou pequenos para idade gestacional. Uma revisão da Cochrane analisando os efeitos do momento do clampeamento do cordão umbilical durante os partos prematuros evidenciou uma redução da necessidade de transfusões sanguíneas quando o clampeamento foi tardio (24% vs 36%). Suplementação de ferro durante a infância. A deficiência nutricional isolada mais comum é a de ferro. Os recém-nascidos prematuros (<37 semanas de gestação) que são amamentados exclusivamente devem receber suplementação de 2 mg/kg/dia de ferro elementar de 1 até 12 meses de idade, exceto aqueles que receberam múltiplas transfusões de sangue. Nos lactentes a termo saudáveis, o

armazenamento de ferro proveniente do útero é adequado para os primeiros quatro a seis meses de vida. A AAP recomenda que os lactentes de termo, amamentados exclusivamente, iniciem 1 mg/kg/dia de suplementação de ferro elementar aos 4 meses de idade até a introdução de alimentos apropriados contendo ferro. Na tabela a seguir são exibidas as necessidade de suplementação diária de ferro para as crianças. Os lactentes alimentados com fórmulas geralmente recebem quantidades adequadas de ferro (a fórmula contém, em média, 10 a 12 mg/l de ferro) e, portanto, raramente requerem suplementação adicional. Suplementação de Ferro Elementar em Crianças ERA Bebês prematuros (<37 semanas de gestação): 1 a 12 meses SUPLEMENTO OU REQUISITO DE FERRO 2 mg/kg/dia de suplementação, se exclusivamente amamentada 1 mg/kg/dia de suplementação, se estiver usando fórmula fortificada com ferro Bebês a termo: 4 a 6 meses a 12 meses 1 mg/kg/dia de suplementação, se exclusivamente amamentada Suplementação não necessária se estiver usando fórmula fortificada com ferro Crianças de 1 a 3 anos Crianças de 4 a 8 anos Requer 7 mg/dia; modificar dieta e/ou suplementar se anêmico Requer 10 mg/dia; modificar dieta e/ou suplementar se anêmico Existem várias formulações de ferro oral, suas dosagens para suplementação e tratamento estão listadas abaixo.

Formulações de Ferro Oral e Dosagem FORMULAÇÃO Ferro Quelato Glicinato (Pode ser utilizado com alimentos) DOSAGEM (FERRO ELEMENTAR) Comprimido com 150 mg (30 mg de Fe +++ ) Comprimido com 300 mg (60 mg de Fe +++ ) Comprimido mastigável com 500 mg (100 mg de Fe +++ ) Solução com 250 mg/5 ml (50 mg/5 ml de Fe +++ ) Gotas com 250 mg/ml (50 mg de Fe +++ em 20 gotas (1 ml) 1 gota = 2,5 mg de Fe +++ Ferripolimaltose Comprimido mastigáveis (100 mg de Fe +++ ) Solução (50 mg/5 ml de Fe +++ ) Gotas (50 mg/ml de Fe +++ ) Sulfato ferroso (Absorção dificultada por alimentos) Gluconato e Fumarato Ferroso Ferriproteinato (complexo ferroprotéico semissintético) Solução com 125 mg/5 ml (25 mg de de Fe ++ em 25 gotas (1 ml) 1 gota=1 mg de Fe ++ Comprimido com 121,72 mg (40 mg de Fe ++ ) Gotas Gluconato (20 mg/ml de Fe ++ ) 24 gotas=1 ml; 1 gota=0,83 mg Solução (25 mg/5 ml de Fe ++ ) Comprimido Fumarato (50 mg de Fe++) Solução com 800 mg/15 ml (40 mg de Fe +++ /15 ml) Existem outras apresentações de ferro associadas a vitaminas que fogem ao objetivo do texto. A necessidade diária estimada de ferro para crianças de 1 3 anos é de aproximadamente 7 mg/dia e deve ser obtida por meio da ingesta de alimentos ricos em ferro. O consumo de grandes quantidades de leite de vaca não fortificado pelo ferro aumenta o risco de deficiência do mineral. Abaixo, apresentamos uma lista de alimentos e seu teor de ferro elementar. Se não for atingida a necessidade diária de ferro por ingesta de alimentos, pode ser necessária a suplementação de forma intermitente, melhorando a concentração de hemoglobina e reduzindo o risco de deficiências.

Conteúdo de ferro nos alimentos ALIMENTOS (TAMANHO DA PORÇÃO) QUANTIDADE DE FERRO ELEMENTAR (mg) Soja: cozida (1/2 xícara) 4,4 Lentilhas: cozidas (1/2 xícara) 3,3 Espinafre: cozido/cozido, drenado (1/2 xícara) 3,2 Carne: cozida (85 g) 2,5 Feijão: cozido (1/2 xícara) 1,8 a 2,2 Peru e frango: carne escura (85 g) 1,1 a 2,0 Deficiência de ferro x Cognição O ferro, importante para o desenvolvimento neurológico, é necessário para a mielinização adequada de neurônios, a neurogênese e a diferenciação das células cerebrais, sendo que sua falta pode afetar sistemas sensoriais, aprendizado, memória e comportamento. O ferro também serve como cofator para enzimas que sintetizam neurotransmissores. Um estudo histórico de crianças costa-riquenhas concluiu que a anemia ferropriva aumenta o risco de alterações permanentes no desenvolvimento. No entanto, não é claro se a suplementação de ferro pode afetar o desenvolvimento psicomotor ou a função cognitiva em crianças. Uma revisão Cochrane concluiu que não há evidências de que a suplementação de ferro melhore o desenvolvimento psicomotor ou cognitivo em crianças pequenas com anemia ferropriva (após 30 dias de tratamento). Além disso, uma outra revisão sistemática mostrou que a suplementação de ferro em crianças com deficiência, mas não anêmicas, não influenciou positivamente os escores de desenvolvimento de um a cinco anos de idade. Assim, o rastreamento de deficiência de ferro em lactentes não anêmicos não é recomendado. Uma revisão sistemática recente não encontrou estudos que mostrem associação entre a suplementação de ferro e os resultados clínicos em uma população relevante nos Estados Unidos.

2. Talassemia A talassemia é uma hemoglobinopatia por um defeito na produção de α-globina ou β-globina e deve ser considerada em crianças com anemia microcítica se a história ou os exames laboratoriais forem inconsistentes com a deficiência de ferro. A α-talassemia ocorre com maior frequência em pessoas de ascendência africana e do sudeste asiático, e a β-talassemia é mais comum em pessoas de origem mediterrânea, africana e do sudeste asiático. Devido à presença de hemoglobina fetal (F) ao nascer, os recém-nascidos com talassemia são suscetíveis de serem assintomáticos até a hemoglobina A se tornar predominante, o que ocorre próximo aos seis meses de idade. 2.1 Diagnóstico O índice Mentzer (volume corpuscular médio/contagem de glóbulos vermelhos) usa a contagem sanguínea completa para diferenciar a talassemia da anemia ferropriva. Um índice Mentzer de menos de 13 sugere talassemia e um índice de mais de 13 sugere deficiência de ferro. A confirmação de talassemia é feita pela eletroforese de hemoglobina. Pacientes com uma ou duas deleções de genes α (portador silencioso ou traço) podem ser assintomáticos com eletroforese normal de hemoglobina, enquanto pacientes com deleções de três genes α (doença de hemoglobina H) terão anemia moderada a grave. A presença de quatro deleções de genes α (hemoglobina Bart ou α-talassemia maior) geralmente é incompatível com a sobrevivência neonatal. Os bebês e as crianças com traço de β- talassemia ou β-talassemia menor podem ter aumento da hemoglobina A2 e da hemoglobina F na eletroforese, são assintomáticos e apresentam anemia leve. Os portadores de β-talassemia intermediária ou major geralmente apresentam complicações de anemia moderada a grave, incluindo hiperesplenismo, endocrinopatias, complicações cardíacas e hipercoagulopatia, devido à sobrecarga de ferro decorrente de transfusões repetidas.

Anemia Normocítica As anemias por deficiência de ferro e perda de sangue aguda são as causas mais comuns de anemia normocítica em lactentes e crianças. A avaliação da anemia normocítica começa com história, contagem de reticulócitos e esfregaço de sangue periférico. Uma alta contagem de reticulócitos indica aumento da produção de glóbulos vermelhos. Uma alta contagem de reticulócitos juntamente com marcadores laboratoriais de hemólise (por exemplo, aumento da bilirrubina, aumento da desidrogenase láctica e diminuição da haptoglobina) pode ajudar a confirmar a anemia hemolítica. A anemia hemolítica possui muitas causas, incluindo membranopatias congênitas, hemoglobinopatias, enzimopatias, defeitos metabólicos e destruição imunomediada. Outros testes podem ser necessários para seu diagnóstico, como um teste de fragilidade osmótica para esferocitose hereditária e dosagem de glicose-6- fosfato desidrogenase (G6PD). Avaliação da Anemia Normocítica em Crianças Passe o mouse sobre o fluxograma e utilize os controles para ampliar A doença falciforme, causada por um defeito genético na β-globina, é uma hemoglobinopatia que resulta em anemia normocítica. Tipicamente é diagnosticada por meio de triagem neonatal. Uma baixa contagem de reticulócitos com anemia normocítica em bebês e crianças sugere uma alteração na função da medula óssea. Isso pode ser devido a anemia secundária à inflamação crônica, a aplasia dos glóbulos vermelhos adquirido e a distúrbios da medula óssea, como leucemia. As aplasias adquiridas podem ter uma causa infecciosa, como o parvovírus B19 ou a eritroblastopenia transitória da infância. A eritroblastopenia transitória da infância geralmente se resolve espontaneamente dentro de quatro a oito semanas, sem recorrência ou distúrbios hematológicos subsequentes até 15 dias de seguimento. Se suspeitar de distúrbios da medula óssea, o esfregaço de sangue periférico e a aspiração da

medula óssea são indicados, além, é claro, de referenciar o paciente a um hematologista pediátrico. Anemia Macrocítica O início da investigação da anemia macrocítica em crianças começa com o exame de um esfregaço de sangue periférico para neutrófilos hipersegmentados, que indicam anemia megaloblástica. Se a anemia megaloblástica for evidenciada, devem ser dosados o folato e a vitamina B 12. Níveis baixos de vitamina B 12 podem ser devidos a causas nutricionais, absortivas ou congênitas, e têm consequências neurológicas severas, que vão do retardo do crescimento aos distúrbios convulsivos. Esses casos devem ser preferencialmente acompanhados pelo hematologista pediátrico. As causas não metabólicas de anemia macrocítica em crianças incluem hemólise, hemorragia, distúrbios da medula óssea, hipotireoidismo e doença hepática. Avaliação da anemia macrocítica em crianças Passe o mouse sobre o fluxograma e utilize os controles para ampliar Agora, tendo em mãos os algorítimos de investigação dos 3 tipos de anemias e seus subtipos mais prevalentes, você não terá mais dúvidas sobre o que fazer na próxima investigação de anemia e quando encaminhar ao especialista.