Obstáculos à prescrição de cereais integrais contraindicações clínicas e nutricionais efeitos indesejáveis



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Transcrição:

Teresa Rodrigues nutricionista no Agrupamento de centros de Saúde de Gaia (AceS Gaia), da Administração Regional de Saúde do norte ip (ARS norte, ip), Portugal Membro da direção da Associação Portuguesa dos nutricionistas (APn) Obstáculos à prescrição de cereais integrais contraindicações clínicas e nutricionais efeitos indesejáveis Palavras-chave: Cereais; Integrais; Recomendações; Nutricionista Resumo Vários estudos têm vindo a demonstrar a importância do consumo regular de cereais integrais, especialmente na prevenção de doenças cardiovasculares e de alguns tipos de cancro. no entanto, e apesar dos benefícios para a saúde, as recomendações quanto ao consumo destes produtos devem ser criteriosas, nomeadamente no que se refere às quantidades diárias aconselhadas e às possíveis contraindicações clínicas, seja por questões ligadas à tolerância individual, seja pela existência de patologias em que a ingestão é desaconselhada, ou mesmo contraindicada. Assim, as orientações para a adequação do consumo de cereais integrais devem ser devidamente balizadas, no âmbito de uma alimentação saudável e equilibrada. Revela-se fundamental o auxílio do nutricionista, enquanto profissional de saúde capacitado para analisar as necessidades nutricionais e alimentares individuais, no sentido de efetuar as recomendações de consumo em conformidade. Vários estudos têm vindo a demonstrar a importância do consumo regular de cereais integrais, especialmente na prevenção de doenças cardiovasculares e de alguns tipos de cancro. Pela sua riqueza nutricional, nomeadamente em hidratos de carbono complexos, vitaminas (sobretudo do complexo B), minerais (selénio, zinco, cobre, ferro, magnésio e fósforo) e fibras, estes alimentos apresentam numerosas propriedades benéficas para a saúde 1. no entanto, e apesar dos benefícios para a saúde, as recomendações quanto ao consumo destes produtos devem ser criteriosas, nomeadamente no que se refere às quantidades diárias aconselhadas e às possíveis contraindicações clínicas, seja por questões ligadas à tolerância individual, seja pela existência de patologias em que a ingestão é desaconselhada, ou mesmo contraindicada. Assim, indivíduos que apresentem um elevado consumo de alimentos à base de cereais integrais podem necessitar de suplementação adicional de minerais, uma vez que os fitatos, presentes nas fibras dos cereais não transformados (integrais), são responsáveis pela redução da absorção e aproveitamento de diversos minerais, incluindo o cálcio e o ferro 2,3. Por outro lado, nem todos os produtos integrais são necessariamente mais saudáveis ou menos calóricos do que os seus equivalentes refinados, como comummente se pensa, pois, para obter o mesmo sabor, utilizando farinha integral, é necessário recor- 52

rer à adição de mais gordura e/ou açúcar e/ou aditivos, o que muitas vezes se traduz num aumento significativo do valor calórico e do preço do produto que, nem por isso, é mais saudável. Por este motivo, muitos dos produtos integrais disponíveis no mercado não têm qualquer interesse no âmbito de um plano alimentar de emagrecimento 4. como exemplos, destacam-se as bolachas integrais e os cereais de pequeno-almoço integrais, pois grande parte destes produtos apresenta, na sua composição, valores elevados de açúcar e de sal. este aspeto assume particular importância no caso das crianças, que constituem um dos principais targets do mercado destes produtos, especialmente tendo em conta que a composição nutricional dos rótulos indica quase sempre valores de referência para adultos, mesmo tratandose de produtos destinados ao público infantil. dada a sua composição, também os indivíduos com excesso de peso, hipertensos e/ou diabéticos deverão ter cuidados acrescidos na escolha destes produtos 5,6. esta sobrevalorização dos produtos integrais tem vindo a ser contrariada em estudos que demonstram que a substituição de produtos refinados por produtos integrais, no âmbito de uma dieta hipocalórica, não contribui para a redução do perímetro abdominal e, apesar de parecer ser eficaz na normalização dos valores de glicemias em indivíduos com pré-diabetes, tem efeitos muito modestos sobre os marcadores da síndrome metabólica 7,8. Outro aspeto relevante a ter em conta é o da tolerância individual, pois o consumo de alimentos integrais, mesmo nas quantidades recomendadas, pode provocar respostas gastrointestinais indesejáveis, nomeadamente dores abdominais, flatulência e diarreias. nestes casos, é importante orientar as escolhas alimentares em função das características de fermentação de cada tipo de fibra presente nos alimentos ricos em cereais integrais, mas sempre tendo em conta que o limite deve ser estabelecido caso a caso, sendo habitualmente definido pelo próprio em função da intensidade e gravidade dos sintomas 9, 10. Paralelamente, nas situações em que haja qualquer tipo de desarranjo gastrointestinal agudo, mesmo que de etiologia não alimentar, a ingestão de produtos ricos em cereais integrais está contraindicada durante o período de duração do episódio 11. Quando existe doença gastrointestinal crónica, nomeadamente doença inflamatória intestinal, como doença de crohn ou colite ulcerosa, a produção de citocinas proinflamatórias (TnF-a) / com atividade catabólica, leva por um lado a diminuição do apetite / diminuição da ingestão alimentar e, por outro lado, a diminuição da resistência à insulina / intolerância acrescida à glicose, que resulta em neoglicogénese. A diminuição do aporte alimentar e o processo de neoglicogénese, associados às perdas decorrentes da diminuição da absorção intestinal, são responsáveis por balanços 53

O consumo de alimentos integrais, mesmo nas quantidades recomendadas, pode provocar respostas gastrointestinais indesejáveis, nomeadamente dores abdominais, flatulência e diarreias energético e azotado negativos, que podem conduzir a situações de má-nutrição severa, por sua vez associada a um mau prognóstico da doença. A terapêutica nutricional, em fase não aguda da doença e para manutenção da remissão na doença persistente, consiste geralmente numa dieta hipolipídica, com restrição de lactose e de fibras, com o objetivo de manter ou recuperar o estado nutricional e proporcionar alívio sintomático, evitando complicações e aumentando a qualidade de vida do doente. na prática, fomentam-se hábitos de vida saudáveis, que incluem a prática de atividade física, a abstinência de álcool e uma alimentação pobre em gorduras e em fibras, como é o caso dos cereais integrais 12, 13. A síndrome do intestino irritável consiste num distúrbio intestinal funcional, caracterizado por dor ou desconforto abdominal e hábitos intestinais alterados na ausência de anormalidades estruturais identificáveis, podendo ser facilmente confundido com as doenças inflamatórias intestinais pela similaridade de alguns sintomas, como presença de cólicas e diarreias. Feito o diagnóstico diferencial, o tratamento nutricional da síndrome do intestino irritável deve ser estabelecido caso a caso, dado que os subtipos dos padrões intestinais são muito instáveis. O padrão mais comum é a alternância entre obstipação e diarreia, geralmente com a predominância de um desses sintomas. Vários estudos têm vindo a demonstrar que as fibras desencadeiam distensão e dor abdominal nestes doentes, aconselhando uma ingestão reduzida de cerais integrais 14. A doença celíaca do adulto ou enteropatia sensível ao glúten é umas das doenças genéticas mais comuns e constitui a condição extrema em que o consumo de cereais à base de trigo, aveia, cevada e centeio está contraindicado. Após diagnóstico da doença, deve proceder-se imediatamente à introdução de uma dieta sem glúten, bem como à identificação e tratamento das deficiências nutricionais, nomeadamente défice de cálcio, ácido fólico, vitamina B12, vitamina B6, cobre, zinco e carnitina. Após duas semanas, 70% dos doentes apresentam melhoria sintomática e, num período entre 3 a 12 meses, verifica-se normalização dos anticorpos anti-transglutaminase, anti-gliadina e anti-endomisio. A não adesão à terapêutica e a ingestão ina - dvertida de glúten constituem as principais causas de agravamento sintomático e das manifestações extra-intestinais, pelo que o empowerment do doente assume particular importância, especialmente no que respeita à leitura de rótulos e à evicção de contaminações cruzadas 15, 16, 17. Algumas alergias a cereais podem produzir sintomas semelhantes aos da doença celíaca, apesar das diferenças no diagnóstico (as primeiras são mediadas por ige e a segunda é uma doença imune) e no tipo de reação. Assim, os grãos dos cereais integrais que têm na sua composição globulinas e glúten são, frequentemente, responsáveis por uma reação de hipersensibilidade imediata após a ingestão, em indivíduos alérgicos, enquanto os cereais mais ricos em albuminas, provocam normalmente reações não imediatas, 54

como é o caso da asma provocada pela inalação de farinha (também conhecida como «doença de padeiro»). O trigo, a cevada e o centeio são espécies de gramíneas que têm, na sua composição, diferentes tipos de proteínas de semente, com poder alergénico: albuminas, globulinas e gliadinas (solúveis em água e principais responsáveis pela resposta imune), bem como gluteninas (insolúveis). Vários estudos têm demonstrado que os alimentos envolvidos nas reações alérgicas tendem a mudar com a idade e, em relação aos cereais, a alergia pode manifestar-se em qualquer idade, mas, no caso concreto do arroz, a alergia é muito mais comum em adultos do que em crianças. As manifestações clínicas também variam com o tipo de alimentos, sendo na sua grande maioria dermatológicas e seguindo-se depois as reações orais, sintomas digestivos e, por último, a anafilaxia. A abordagem terapêutica das alergias aos cereais integrais passa igualmente pela identificação e eliminação dos produtos alergénios da dieta, neste caso, exclusão tanto do cereal como de produtos que o contenham. não se sabe até que ponto as quantidades vestigiais de proteínas encontradas em produtos alimentares derivados de cereais, mesmo depois do seu processamento, podem desencadear sintomas alérgicos em chocolate instantâneo); sobremesas (doces comerciais, gelados e pudins); produtos lácteos (bebida de leite em pó contendo cereais ou derivados, requeijão com amido modificado); carnes (empadas de carne, enchidos com farinha, bola de carne, salsichas ou hambúrgueres de carne pré-preparados); molhos (que possam ter sido engrossados com farinha); outros produtos que apresentem ingredientes sugestivos da presença de proteínas de semente (farelo, extrato de cereal, cuscuz, farinha enriquecida, farinha, glúten, gérmen de trigo, malte de trigo, amido de trigo, farinha integral, amido gelatinizado, proteína vegetal hidrolisada, amido modificado, molho de soja, amido vegetal, goma) 18, 19, 20. Apesar de alguns estudos científicos destacarem o papel dos cereais integrais na saúde, numa perspetiva de alimentação saudável, alguns autores contrariam esta posição. Assim, sugerem a necessidade de investigação adicional para uma melhor compreensão dos fatores que modificam a eficácia da fibra, incluindo propriedades físico-químicas (solubilidade, fermentação e viscosidade), peso molecular, tamanho das partículas de fibra e estrutura botânica do grão fonte de fibra, bem como dos mecanismos fisiológicos em que se baseiam as recomendações de consumo de cereais integrais. Algumas alergias a cereais podem produzir sintomas semelhantes aos da doença celíaca, apesar das diferenças no diagnóstico (as primeiras são mediadas por ige e a segunda é uma doença imune) indivíduos predispostos. Assim, é sempre recomendável limitar ao máximo o consumo de produtos processados, ser prudente ao comer fora de casa e proceder a uma leitura cuidadosa dos rótulos, mesmo em relação a produtos que aparentemente não têm cereais na sua composição, como sejam: algumas bebidas (sucedâneos do café, cerveja, pó de Ao mesmo tempo, um estudo de revisão, realizado com base em 135 artigos relevantes sobre o tema, publicados entre 2000 e 2010, avaliou a relação entre o consumo de grãos refinados e a saúde, concluindo que a totalidade das evidências mostra que um consumo até 50% de cereais sob a forma de grãos refinados (sem altos níveis de gordura adicionada, açú- 55

car ou sódio) não está associado com aumento do risco de doença, quando comparado com um consumo de 100% de cereais integrais 21, 22. Face ao exposto, recomenda-se que o consumo de cereais integrais seja ponderado caso a caso, tendo em conta as necessidades e especificidades individuais, bem como as limitações e contraindicações, sempre que seja o caso. Mais do que marketing de alimentos, é importante dirigir esforços para o marketing da saúde, não sobrevalorizando determinados produtos em detrimento de outros, nem procurando soluções em «superalimentos», pois nenhum alimento é por si só garantia de saúde se não for integrado numa alimentação completa, equilibrada e variada. O nutricionista, enquanto profissional de saúde que desenvolve funções de estudo, orientação e vigilância da alimentação e nutrição, quanto à sua adequação, qualidade e segurança, em indivíduos ou grupos, assume um papel fundamental quer ao nível do indivíduo através da análise das necessidades nutricionais e alimentares individuais e respetivas recomendações de consumo, no âmbito de um plano alimentar individual estruturado quer ao nível populacional através do seu papel de educador e promotor de práticas de saúde e de bem-estar, de acordo com as respetivas regras científicas e técnicas. Bibliografia 1. eva Qing Ye, Sara A. chacko, elizabeth L. chou, et al. Greater Whole-Grain intake is Associated with Lower Risk of Type 2 diabetes, cardiovascular disease, and Weight Gain. J. nutr. 2012; 142: 1304-1313 2. european Food information council (eufic) - Vii Symposium on Wholegrain and human health (2001) Proceedings of the international Symposium, Finland, June 13-15, 2001. Technical Research centre of Finland, pp. 1-145 3. Hunt R. Bioavailability of iron, zinc, and other trace minerals from vegetarian diets. Am J clin nutr. 2003; 78(3 Suppl): 633S-639S 4. McMackin e, dean M, Woodside JV, et al. Whole grains and health: attitudes to whole grains against a prevailing background of increased marketing and promotion. Public Health nutr. 2013; 16: 743 51 5. Harris JL; Schwartz MB; Ustjanauskas A; et al. effects of serving high-sugar cereals on children s breakfast-eating behavior. Pediatrics. 2011; 127:71-6 6. Giacco R; della Pepa G; Luongo d; et al. Whole grain intake in relation to body weight: from epidemiological evidence to clinical trials. nutr Metab cardiovasc dis. 2011; 21: 901-8 7. Harris Jackson K, et al. effects of whole and refined grains in a weight-loss diet on markers of metabolic syndrome in individuals with increased waist circumference: a randomized controlled-feeding trial. Am J clin nutr. 2014; 100: 577-586 8. McKeown nm, Troy LM, Jacques PF, et al. Whole and refined-grain intakes are differentially associated with abdominal visceral and subcutaneous adiposity in healthy adults: The Framingham Heart Study. Am J clin nutr. 2010; 92: 1165 71 9. Hallfrisch J; Behall KM. Breath hydrogen and methane responses of men and women to breads made with white flour or whole wheat flours of different particle sizes. J Am coll nutr. 1999; 18: 296-302 10. Shanti e; Jane M; William dc. Fiber and Functional Gastrointestinal disorders. Am J Gastroenterol. 2013; 108: 718-727 11. islam M; Roy SK; Begum M; et al. dietary intake and clinical response of hospitalized patients with acute diarrhea. Food nutr Bull. 2008; 29: 25-31 12. Zachos M, Tondeur M, Griffiths AM. cochrane database of Systematic Reviews. 2007, issue 1 13. Wall cl, day As, Gearry R. Use of exclusive enteral nutrition in adults with crohn s disease: A review. World J Gastroenterol. 2013; 19: 7652 7660 14. dapoigny M, Stockbrügger RW, Azpiroz F, et al.. Role of alimentation in irritable bowel syndrome. digestion. 2003; 67: 225-33 15. Martin J, Geisel T, Marsh c, et al. inadequate nutrient intake in Patients with celiac disease: Results from a German dietary Survey. Germany digestion 2013; 87: 240-246 16. Rubio-Tapia A, Murray JA. classification and management of refractory coeliac disease. Gut. 2010; 59: 547 557 17. Shepherd S, Gibson R. nutritional inadequacies of the gluten-free diet in both recently-diagnosed and long-term patients with coeliac disease. J Hum nutr diet. 2012; 26: 349 358 18. nermes M, Karvonen H, Sarkkinen e, et al.. Safety of barley starch syrup in patients with allergy to cereals. Br J nutr. 2009; 101: 165-8 19. Rivas F. Food allergy in Alergológica 2005. J investig Allergol clin immunol. 2009; 19 Suppl 2: 37-44 20. Hischenhuber c, crevel R, Jarry B, et al. Review article: safe amounts of gluten for patients with wheat allergy or coeliac disease. Aliment Pharmacol Ther. 2006; 23: 559-75 21. Smith c; Tucker K. Health benefits of cereal fibre: a review of clinical trials. nutr Res Rev. 2011; 24: 118-31 22. Williams PG. evaluation of the evidence between consumption of refined grains and health outcomes. nutr Rev. 2012; 70: 80-99 56