ESTUDO TÉCNICO SOBRE AS TAXAS DE JUROS VIGENTES NO BRASIL: Uma análise das hipóteses convencionais. 3ª. versão



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Transcrição:

ESTUDO TÉCNICO SOBRE AS TAXAS DE JUROS VIGENTES NO BRASIL: Uma análise das hipóteses convencionais. 3ª. versão Prof. Dr. Alberto Borges Matias FEA-RP/USP

POR QUE SÃO ELEVADAS AS TAXAS DE JUROS? Prof. Dr. Alberto Borges Matias 1 Muito se tem escrito sobre as elevadas taxas de juros vigentes no Brasil, mas pouco de forma científica, isenta do isolamento teórico ou isenta de interesses financeiros. A imprensa tem propalado pré-concepções emanadas pelos diversos Governos, inclusive pelo Governo Lula, quanto à efetiva necessidade de taxas elevadas de juros no País por conta da instabilidade estrutural do próprio País. Assim, as taxas seriam elevadas para conter o processo inflacionário, para dar estabilidade cambial ou para incentivar o mercado a adquirir os títulos públicos, necessários ao financiamento do Tesouro Federal. Neste curto texto, procuro apresentar análises, de cada uma destas hipóteses, de forma científica, na busca do embasamento sério da discussão da formação das taxas de juros no País. O diagnóstico correto é essencial para a correta decisão de ajuste da política econômica. O gráfico a seguir ilustra as taxas de juros reais do Brasil e alguns países selecionados no mês de janeiro de 2004 calculados pela Global Invest. Podemos observar que as taxas no Brasil são 3,6 vezes a dos países emergentes, 5 vezes dos emergentes tirando os outlayers (Brasil, Rússia, Turquia e Venezuela), chamada de média especial*, 13,8 vezes a média dos desenvolvidos e 35,8 vezes a média dos países pertencentes ao G7. Não podemos imaginar que somente nós estejamos certos e o mundo inteiro errado. JUROS REAIS MUNDIAIS - JAN/04 ABM Consulting & Global Invest Brasil 13,80% Média Emerg. Austrália México Média Especial* Média Geral Chile Argentina Média Desenv. Média G7 3,80% 3,70% 3,20% 2,80% 2,30% 1,80% 1,60% 1,00% 0,39% EUA-0,70% -2,00% 0,00% 2,00% 4,00% 6,00% 8,00% 10,00% 12,00% 14,00% 16,00% 1 Alberto Borges Matias é professor Associado do Departamento de Administração da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo no campus de Ribeirão Preto (FEA- RP/USP), livre docente em finanças, professor nos programas de graduação e pós graduação e consultor de organizações públicas e privadas. Agradecimentos a Felipe Tumenas e Gustavo Pedreira, ambos da FEA- RP/USP, pelo apoio à estruturação e análise de dados, e à ABM Consulting, pelo apoio nos levantamentos.

HIPÓTESE 1: Para reduzir ou controlar a inflação. Para testarmos esta hipótese de forma científica, precisaremos calcular a correlação entre taxa de juros e inflação, em séries longas, pois do contrário iremos cometer um erro científico de podermos relacionar fenômenos que não apresentam efetiva relação. Não podemos, também, esquecer que sob a denominação inflação coexistem três fenômenos distintos, em causa, e que, portanto, caso seja ministrado o remédio de uma para outra o fenômeno poderá ser, inclusive, acirrado. São eles: inflação de demanda, inflação de custos e inflação monetária. Ressalto que esta divisão não apresenta consenso entre os economistas. O gráfico a seguir ilustra a correlação entre inflação e juros. Para analisarmos a inflação utilizamos a variação do Índice Geral de Preços Disponibilidade Interna (IGP- DI) calculado pela Fundação Getulio Vargas (FGV) anualizada e para os juros utilizamos a taxa Selic anualizada. O período da pesquisa foi de jan/95 a fev/04, dividido em dois períodos básicos: até dez/98, quando o câmbio era fixado, e de jan/99 até o final da série com o câmbio livre. Quando defasamos a inflação em dois meses, ou seja, dado os juros de no mês t, comparamos este com a inflação do mês t+2, as correlações não apresentam resultados significativos. Para o período todo não há correlação, 0,6%. No primeiro período a correlação é de 47,7% positiva, que apesar de pequena, pode levar à suspeita de que os juros podem gerar inflação. No segundo período nos deparamos com uma correlação negativa de 20,7%, insignificante. Os testes estatísticos não identificaram significância Vejamos o gráfico: SELIC 90% 80% 70% 60% 50% 40% 30% 20% 10% 0% SELIC X INFLAÇÃO - 2 meses de defasagem ABM Consulting Correlação de todo o peírodo: 0,6% Correlação de 47,5% entre jan/95 a dez/98 Correlação de -20,7% entre jan/99 a fev/04 INFLAÇÃO 120,00% 100,00% 80,00% 60,00% 40,00% 20,00% 0,00% -20,00% Selic IGP-DI Anualizado Podemos então concluir que analisando por esta ótica, não se pode afirmar que altos juros influenciam na queda e/ou controle da inflação. Uma outra análise poderia se dar pela correlação da aceleração das variáveis em questão, ou seja, se aumentarmos (ou diminuirmos) os juros em X%, qual a relação deste

com uma variação de Y% na inflação. Para tal análise utilizamos os mesmo dados e períodos da análise anterior. Defasando 2 meses a inflação em relação aos juros, as correlações também são inexistentes, negativa em 2,18% para todo período, positiva em 12,5% primeiro período e negativa em 9,8% para o segundo período. Vejamos o gráfico. 140% Acel. Selic X Acel IGP-DI - 2 meses defasagem ABM Consulting 4000,00% 120% 100% 80% 60% 40% 20% 0% -20% -40% Total -2,2% jan/95 a dez/98 12,5% jan/99 a fev/04-9,9% 3000,00% 2000,00% 1000,00% 0,00% -1000,00% -2000,00% Aceleração Selic Aceleração IGP-DI PORTANTO, REJEITA-SE A HIPÓTESE DE QUE AS TAXAS DE JUROS SÃO ALTAS PARA REDUZIR E/OU CONTROLAR A INFLAÇÃO.

HIPÓTESE 2: Para dar estabilidade cambial. Esta hipótese considera que existe correlação entre taxa de juros e taxa de câmbio, e que, portanto, para evitar-se instabilidade cambial, há a necessidade de elevação da taxa de juros para estabilizar os fluxos cambiais. Esta hipótese considera que a entrada de fluxos voláteis especulativos de curto prazo seja necessária para a estabilidade econômica, quando o que ocorre é exatamente o inverso: fluxos voláteis aumentam o risco dos países. Os dados analisados são de jan/95 a fev/04 e são analisados de três maneiras: sua totalidade, de jan/95 a dez/98 e jan/99 a fev/04. Defasando a taxa de câmbio em dois meses em relação à Selic, observamos uma correlação negativa de 49%, não significativa. No primeiro período a correlação é negativa de 63,7%, também não significativa, lembrando que este período foi marcado pela taxa fixa de câmbio. No segundo período foi negativa de 6,9%. Vejamos o gráfico. SELIC 90% 80% 70% 60% 50% 40% 30% 20% 10% 0% Selic x Taxa Cambio - 2 meses defasagem ABM Consulting jan/95 a dez/98 Correlação -63,8% Correlação total de -49% jan/99 a fev/04 Correlação -6,9% CÂMBIO 4 3,5 3 2,5 2 1,5 1 0,5 0 Selic Taxa Câmbio No tocante ao fluxo de capitais internacionais, podemos diferenciá-lo de maneira simplificada em dois tipos: especulativo de curto prazo e investimento direto de longo prazo. No tocante à entrada de capital especulativo, este só aumenta a instabilidade cambial e financeira, portanto não deveria ser incentivado, mesmo sob crise, pois as conseqüências a longo prazo são avassaladoras com enorme comprometimento de recursos. Quanto à saída, a evasão de capital especulativo deveria ser administrada. Ainda sob esta ótica, outro aspecto que poderia ser considerado é o de que baixas taxas de juros conduzem à exportação de capital de investimento do país, o que realmente não ocorre somente por causa da redução da taxa de juros do país. Apenas para fomento a esta discussão, no mundo inteiro as taxas são bem inferiores às vigentes no Brasil e não há evasão de capital de investimento por isto. Como podemos observar pelo gráfico a seguir, o capital de longo prazo, IED Investimento Estrangeiro Direto, apresenta taxa negativa de correlação com os juros, ou

seja aumentado-se a taxa de juros reduz-se a entrada de investimento no país, com baixa correlação. 90% 80% 70% 60% 50% 40% 30% 20% 10% Selic x IED - 2 meses defasagem ABM Consulting Período total correlação de -38,2% jan/95 a dez/98 Correlação -53,8% jan/99 a fev/04 Correlação -15,7% 7000 6000 5000 4000 3000 2000 1000 0 0% -1000 jan/95 jun/95 nov/9 abr/96 set/96 fev/97 jul/97 dez/9 mai/98 out/98 mar/9 ago/9 jan/00 jun/00 nov/0 abr/01 set/01 fev/02 jul/02 dez/0 mai/03 out/03 SELIC IED Sem defasagem, as correlações não se alteram muito. Negativa em 37,4% para o período total, negativa de 48,9% para o primeiro período e negativa de 6,6% para o segundo período. PORTANTO, REJEITA-SE A HIPÓTESE DE QUE AS TAXAS DE JUROS SÃO ALTAS PARA GERAR ESTABILIDADE CAMBIAL NO PAÍS.

HIPÓTESE 3: Para vender títulos públicos. Esta hipótese considera que o mercado exige taxas mais elevadas a serem pagas nos títulos públicos para adquirir tais títulos, em razão do risco elevado apresentado pelo Governo Brasileiro. No fundo esta hipótese considera que existe mercado perfeito de compra e venda de títulos públicos. Assim, para podermos analisar de forma científica esta hipótese, precisaremos avaliar o mercado adquirente de tais títulos. Este mercado é formado por instituições do mercado de capitais, que administram recursos para terceiros e mantém parte em suas carteiras, por investidores institucionais, destacando-se fundos de pensão, fundos de investimento e seguradoras, e por instituições bancárias, para suas carteiras próprias ou para mercado aberto. Os investidores institucionais são compulsórios: os fundos de pensão, por regulação da SPC Secretaria de Previdência Complementar do Ministério da Previdência, lembrando, ainda, que os grandes fundos de pensão são ligados a estatais e sob administração do próprio Governo; os fundos de investimento, por regulação da CVM Comissão de Valores Mobiliários; e as seguradoras, por regulação da SUSEP Superintendência de Seguros Privados. Isto significa que a taxa dos títulos nenhuma influência apresenta sobre a decisão de compra dentro dos limites obrigatórios, ou seja, mesmo que a taxa de juros seja zero, a compra é compulsória. Lembro também que o Governo pode, a qualquer momento, aumentar a obrigatoriedade de aquisição. No caso das instituições bancárias, estas precisam, também, manter uma parte de títulos públicos em carteira como forma de constituição de colchão de liquidez, necessário à adequada gestão de risco de seu fluxo de caixa. O gráfico a seguir apresenta a composição do mercado adquirente de títulos públicos no Brasil, pelo qual observa-se a participação significativa de investidores institucionais. DETENTORES DE TÍTULOS PÚBLICOS (jan/04) ABM Consulting & BACEN 1% Carteira Própria 34% Títulos Vinculados 45% PJ não Financeira FIF 6% 15% Outros

Na tabela a seguir apresenta a distribuição da carteira de títulos e valores mobiliários nos maiores bancos do Brasil, considerando o ativo total. Observa-se que 51,1% dos títulos estão em mãos de bancos públicos, que são agentes do Governo Federal e de sua política fiscal. Do restante, 49%, 28% está na mão de Itaú e Bradesco e Unibanco. Lembro que parte desta carteira teria que necessariamente ser alocada como colchão de liquidez. Composição do mercado de títulos - maiores bancos. BANCO TVM CP TVM LP TOTAL TVM % TOTAL CEF 28.143.706,00 49.382.246,00 77.525.952,00 22,5% BANCO DO BRASIL 11.238.850,00 56.883.159,00 68.122.009,00 19,7% BRADESCO 43.537.442,00 10.267.338,00 53.804.780,00 15,6% ITAU 17.838.845,00 11.580.961,00 29.419.806,00 8,5% NOSSA CAIXA 11.796.106,08 5.912.407,94 17.708.514,02 5,1% UNIBANCO 9.812.553,00 5.692.889,00 15.505.442,00 4,5% ABN AMRO REAL 9.947.112,00 5.550.046,00 15.497.158,00 4,5% BANESPA 1.954.247,00 9.473.223,00 11.427.470,00 3,3% VOTORANTIM 9.308.888,14 922.508,81 10.231.396,95 3,0% BNB 3.277.311,86 4.140.998,22 7.418.310,08 2,2% SAFRA 6.457.386,23 837.860,90 7.295.247,13 2,1% BANRISUL 2.398.685,87 3.256.697,11 5.655.382,98 1,6% HSBC BANK BRASIL 3.159.207,12 1.894.916,96 5.054.124,08 1,5% JP MORGAN 3.659.827,08 492.879,91 4.152.706,99 1,2% CITIBANK 3.422.218,00 701.500,00 4.123.718,00 1,2% DEUTSCHE BANK 3.197.593,27 253.838,05 3.451.431,32 1,0% SANTOS 2.860.871,00 2 2.860.873,00 0,8% PACTUAL 2.782.518,62 47.698,21 2.830.216,83 0,8% BANKBOSTON 1.470.939,20 535.106,83 2.006.046,03 0,6% RURAL 884.838,00 0 884.838,00 0,3% Total Bancos Públicos 56.854.659,81 119.575.508,27 176.430.168,08 51,1% Total da amostra 177.149.145,47 167.826.276,94 344.975.422,41 100,0% Dados de 31/12/2003 Fonte: ABM Consulting Para que possamos determinar o excedente de aplicações em títulos, o que em tese constituiria o mercado livre, precisamos comparar a participação da carteira de títulos dos bancos brasileiros com bancos comerciais internacionais, que apresentam uma aplicação em tesouraria da ordem de 8,7%. A tabela a seguir apresenta a aplicação em tesouraria dos maiores bancos brasileiros ao final de 2003, pela qual observa-se que a média de aplicação dos bancos privados é de 34%, havendo um excedente de 25% aplicado em títulos. Assim, somente 25% dos 49%, que tais bancos representam do total deste segmento do mercado, poderia ser considerado mercado, ou seja, apenas cerca de 13% do total aplicado por este segmento. A seguir apresento quadro com a composição dos ativos dos bancos com maior participação de aplicações em títulos e valores mobiliários, pelo qual observa-se a importância desse tipo de ativo para algumas instituições bancárias.

Aplicações de tesouraria em % aplicações totais BANCO % Aplicações DEUTSCHE BANK 76,2% JP MORGAN 66,3% NOSSA CAIXA 64,3% BNB 58,2% CEF 51,5% BANRISUL 47,9% SANTOS 45,6% PACTUAL 45,2% VOTORANTIM 41,7% BANESPA 37,0% BRADESCO 30,6% BANCO DO BRASIL 29,6% ABN AMRO REAL 28,0% ITAU 24,8% SAFRA 23,8% UNIBANCO 22,3% CITIBANK 21,4% HSBC BANK BRASIL 19,2% RURAL 15,5% BANKBOSTON 11,9% Média Geral 38,0% Média Públicos 46,8% Média Privados 34,0% Dados de dez/03 FONTE: ABM Consulting Pelo exposto, não se pode afirmar que o mercado de títulos públicos no Brasil seja perfeito, aliás, está muito distante disto, e nem tão pouco se pode afirmar que as taxas de juros precisam ser elevadas para se vender títulos públicos. Não existe, pelo aqui colocado, mercado perfeito de títulos públicos no Brasil. Assim, não se pode afirmar que as taxas de juros precisem ser elevadas para que se consiga vendê-los. PORTANTO, REJEITA-SE A HIPÓTESE DE QUE AS TAXAS DE JUROS PRECISAM SER ELEVADAS PARA VENDER TÍTULOS PÚBLICOS.

ENTÃO POR QUE SE ADOTOU POLITICA MONETÁRIA DE TÃO ELEVADAS TAXAS DE JUROS NO BRASIL? As organizações mais rentáveis durante os últimos anos foram as bancárias, conforme pode se observar no gráfico a seguir que compara a rentabilidade patrimonial de empresas de capital aberto e de bancos. Em termos econômicos, a definição da taxa de juros é um processo de transferência de renda. Existe alguma razão para fomento à transferência de renda para o setor bancário? 24,0% Rentabilidades dos recursos próprios ABM Consulting 22,0% 20,0% 18,0% 16,0% 14,0% 12,0% 10,0% 8,0% 6,0% 4,0% 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 Empresas Abertas Sistema Financeiro O gráfico a seguir mostra a evolução da relação crédito / PIB no Brasil segundo o BC e a relação crédito / PIB de diversos países segundo o FMI. Podemos observar que o Brasil apresenta a menor taxa do mundo. O México apresenta o efeito das maquiladoras, que contratam crédito nos EUA e produzem no México, e a Argentina vem de uma forte recessão. Então, no Brasil, temos a maior taxa real de juros do mundo com o menor volume de crédito sobre o PIB do mundo: estamos frente a uma economia com fortes anomalias, pelo que não podemos aplicar aqui a teoria econômica convencional.

160,0% crédito total / PIB ABM Consulting & FMI 140,0% 120,0% 100,0% 80,0% 60,0% 40,0% 20,0% 0,0% Inglaterra Zona Euro Korea Japão Chile USA Brasil Mexico Argentina No Brasil os volumes de crédito relativamente ao PIB sempre foram baixos em razão, em alguns momentos, da falsa pré-concepção de que sua elevação iria trazer inflação de demanda e, em outros, da necessidade de se manter baixo o nível de atividade econômica interna para a geração de excedentes de exportação e retração de importações visando o pagamento de compromissos internacionais. 38,0% % crédito / PIB ABM Consulting & Bacen 36,0% 34,0% 32,0% 30,0% 28,0% 26,0% 24,0% 22,0% 20,0% 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 Em decorrência dessa anomalia representada pelo baixo volume de crédito, os bancos no Brasil apresentam uma elevada representatividade de custos estruturais (pessoal e

administrativo) frente às operações de crédito muito pesada para padrões internacionais, em grande parte decorrente do fato exposto do pequeno mercado de crédito. Em síntese, os bancos no Brasil não apresentam economia de escala, pelo que necessitam de apoio de políticas macroeconômicas para sua sustentabilidade. Assim, também, não adianta culpálos pelas elevadas taxas praticadas: são ao mesmo tempo vítimas e beneficiários dessas políticas. O gráfico a seguir apresenta os índices de custo estrutural relativamente às operações de crédito de alguns bancos brasileiros comparativamente a bancos internacionais. 35% CUSTO ESTRUTURAL (%) ABM Consulting 30% 25% 20% 15% 10% 5% Dados referentes a dez/03. Aqui apresento minha teoria quanto à formação de taxas de juros no Brasil, pelo que vejo como necessário trazer uma abordagem histórica. Antes do Plano Real o Governo cobria seu déficit com emissão monetária, provocando os elevados níveis inflacionários que conhecemos. Nesse período os bancos auferiam seus ganhos por floating, isto é pela aplicação de recursos sem remuneração (depósitos à vista, recursos de cobrança e recursos de terceiros em trânsito) a taxas elevadas de correção monetária. O Plano Real apenas alterou a forma de financiamento do déficit público: ao invés de financiá-lo via emissão de dinheiro, passou a fazê-lo pela emissão de dívida, razão que conduziu o País à dívida atual. O quadro a seguir mostra os ganhos com floating dos bancos múltiplos e comerciais de grande e macro porte, pelo qual se observa, um ganho de R$ 9,6 bilhões em 1994, com apenas meio ano de inflação. Em 1995 não passou de R$ 1 bilhão, com uma perda de R$ 8,7 bilhões causado pela mudança na forma de financiamento do déficit público implantada pelo Plano Real.

Ganhos com FLOATING dos bancos de macro e grande porte. Instituição dez-94 dez-95 BANCO ABN AMRO REAL S/A 11.077 0 BANCO BAMERINDUS S/A 506.876 53.224 BANCO BANORTE S/A 39.574 966 BANCO BCN S/A 47.342 8.534 BANCO BRADESCO S/A 1.208.881 0 BANCO DO BRASIL S/A 3.157.462 411.051 BANCO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO S/A (LIQ.EXTRA JUD) 344.370 53.898 BANCO DO NORDESTE DO BRASIL S/A 58.053 13.938 BANCO ECONOMICO S/A 160.751 BANCO ITAU S/A 851.133 68.811 BANCO NACIONAL S/A 456.759 58.455 BANCO NOSSA CAIXA S/A 141.469 33.635 BANCO PONTUAL S/A 9.228 0 BANCO REAL S/A 285.295 90.879 BANCO SAFRA S.A. 35.349 11.348 BANCO SANTANDER BRASIL S/A 24.768-4.063 BANCO SANTANDER NOROESTE S/A 29.936 5.525 BANCO SUDAMERIS BRASIL S/A 57.906 24.597 BANCO VOTORANTIM S/A 4.000 2.075 CAIXA ECONOMICA FEDERAL 1.974.748 39.884 UNIBANCO - UNIAO DE BANCOS BRASILEIROS S/A 213.763 14.907 Total 9.618.740 887.664 FONTE: ABM Consulting Ao alterar a forma de financiamento do déficit, o Plano conduziria o setor bancário à bancarrota, razão pela qual passou-se a conceder uma taxa de juros elevadas na emissão da dívida, e em conseqüência nas operações de crédito. Os juros passaram a ser elevados, nas operações de crédito e na carteira de títulos, para compensar o setor bancário pela perda do floating. O quadro a seguir apresenta as receitas somada de operações de créditos e de títulos dos bancos de macro e grande porte em 1994 e 1995. Observa-se um significativo aumento nas receitas de R$ 23,9 bilhões, uma variação de 55% em apenas um ano.

Receita de operações de crédito e de TVM nos bancos de macro e grande porte. Instituição 1994 1995 Var. % Var. Valor BANCO ABN AMRO REAL S/A 180.002 571.165 217,3% 391.163 BANCO BAMERINDUS S/A 2.171.618 3.209.388 47,8% 1.037.770 BANCO BANORTE S/A 268.285 410.745 53,1% 142.460 BANCO BCN S/A 1.178.782 1.785.733 51,5% 606.951 BANCO BRADESCO S/A 2.538.352 6.690.687 163,6% 4.152.335 BANCO CITIBANK S/A 126.157 59.910-52,5% -66.247 BANCO DO BRASIL S/A 5.591.461 11.127.679 99,0% 5.536.218 BANCO DO ESTADO DE SAO PAULO S/A 13.324.024 15.568.389 16,8% 2.244.365 BANCO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO S/A (LIQ.EXTRA JUD) 124.703 381.702 206,1% 256.999 BANCO DO NORDESTE DO BRASIL S/A 238.324 375.818 57,7% 137.494 BANCO ICATU S/A 667.949 214.229-67,9% -453.720 BANCO ITAMARATI S/A 37.086 180.092 385,6% 143.006 BANCO ITAÚ BBA S.A. 18.862 222.284 1078,5% 203.422 BANCO ITAU S/A 3.313.295 3.688.951 11,3% 375.656 BANCO NACIONAL S/A 2.207.632 2.404.363 8,9% 196.731 BANCO NOSSA CAIXA S/A 915.664 1.669.192 82,3% 753.528 BANCO PONTUAL S/A 72.446 227.687 214,3% 155.241 BANCO REAL S/A 1.146.402 1.750.413 52,7% 604.011 BANCO REGIONAL DE DESENVOLVIMENTO DO EXTREMO SUL 652.867 270.677-58,5% -382.190 BANCO SAFRA S.A. 890.732 1.080.484 21,3% 189.752 BANCO SANTANDER BRASIL S/A 128.977 302.534 134,6% 173.557 BANCO SANTANDER NOROESTE S/A 400.346 711.487 77,7% 311.141 BANCO SUDAMERIS BRASIL S/A 398.311 792.630 99,0% 394.319 BANCO VOTORANTIM S/A 116.784 178.726 53,0% 61.942 BANKBOSTON BANCO MULTIPLO S/A 758.746 428.002-43,6% -330.744 CAIXA ECONOMICA FEDERAL 5.209.991 10.534.326 102,2% 5.324.335 UNIBANCO - UNIAO DE BANCOS BRASILEIROS S/A 1.076.245 2.816.080 161,7% 1.739.835 Total 43.754.043 67.653.373 54,6% 23.899.330 FONTE: ABM Consulting O quadro a seguir nos mostra as despesas de intermediação financeira, excluindo-se a provisão para créditos de liquidação duvidosa, observando-se um aumento de R$ 15,3 bilhões, ou 49%.

Despesas de intermediação (excluindo-se provisão) Instiuição 1994 1995 Var. % Var. Valor BANCO ABN AMRO REAL S/A 118.268 258.023 218% 139.755 BANCO BAMERINDUS S/A 1.600.465 2.002.131 125% 401.666 BANCO BANORTE S/A 168.774 293.949 174% 125.175 BANCO BCN S/A 726.868 1.095.034 151% 368.166 BANCO BRADESCO S/A 1.240.670 4.429.476 357% 3.188.806 BANCO CITIBANK S/A 92.751 30.672 33% -62.079 BANCO DO BRASIL S/A 3.808.115 8.468.311 222% 4.660.196 BANCO DO ESTADO DE SAO PAULO S/A 11.303.841 12.992.208 115% 1.688.367 BANCO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO S/A (LIQ.EXTRA JUD) 119.266 445.459 374% 326.193 BANCO DO NORDESTE DO BRASIL S/A 137.001 245.466 179% 108.465 BANCO ICATU S/A 553.178 162.872 29% -390.306 BANCO ITAMARATI S/A -33.037 94.604-286% 127.641 BANCO ITAÚ BBA S.A. 28.069 157.334 561% 129.265 BANCO ITAU S/A 2.678.264 1.341.234 50% -1.337.030 BANCO NACIONAL S/A 1.572.437 1.806.374 115% 233.937 BANCO NOSSA CAIXA S/A 673.379 1.090.191 162% 416.812 BANCO PONTUAL S/A 77.266 191.740 248% 114.474 BANCO REAL S/A 634.624 762.321 120% 127.697 BANCO REGIONAL DE DESENVOLVIMENTO DO EXTREMO SUL 302.892 95.619 32% -207.273 BANCO SAFRA S.A. 586.065 886.366 151% 300.301 BANCO SANTANDER BRASIL S/A 61.912 124.333 201% 62.421 BANCO SANTANDER NOROESTE S/A 137.745 292.960 213% 155.215 BANCO SUDAMERIS BRASIL S/A 289.375 423.161 146% 133.786 BANCO VOTORANTIM S/A 99.015 158.982 161% 59.967 BANKBOSTON BANCO MULTIPLO S/A 754.659 376.837 50% -377.822 CAIXA ECONOMICA FEDERAL 3.241.603 7.236.510 223% 3.994.907 UNIBANCO - UNIAO DE BANCOS BRASILEIROS S/A 417.772 1.282.721 307% 864.949 Total 31.391.237 46.744.888 49% 15.353.651 Como vimos, as operações de crédito e de títulos dos bancos de macro e grande porte aumentaram R$ 23,9 bilhões e as despesas destes mesmos bancos aumentaram R$ 15,3 bilhões. Houve, assim, um acréscimo líquido de R$ 8,6 bilhões, correspondente, exatamente, à perda de receita que esses bancos tiveram com floating. TABELA RESUMO 1994 1995 Var. Receita Floating 9.618.740 887.664-8.731.076 Receita Crédito e TVM 43.754.043 67.653.373 23.899.330 Despesas Intermediação -31.391.237-46.744.888-15.353.651 Total 21.981.546 21.796.149-185.397 ASSIM, A POLÍTICA MONETÁRIA CENTRADA EM ELEVADAS TAXAS DE JUROS TEVE QUE SER ADOTADA PARA DAR SUSTENTABILIDADE AO SETOR FINANCEIRO BRASILEIRO.

E quais foram as conseqüências? A perpetuação das taxas de juros, haja visto o período tão longo, conduziu o país à formação de negócios orientados a ganhos financeiros, aonde houvesse esta possibilidade, como no caso do grande comércio que passou a fundamentar sua rentabilidade essencialmente em receitas financeiras. Aonde não se pudesse converter a atividade operacional em financeira, e esta fosse aliada à impossibilidade de repasse dos juros ao preço dos produtos, as organizações, principalmente industriais e primárias, passaram a procurar extremos ganhos de produtividade, o que explica em parte a competitividade operacional de segmentos da economia brasileira frente a similares internacionais, ou fecharam as portas. O quadro a seguir apresenta a formação de custos e despesas de empresas selecionadas do segmento agroindustrial da carne, pelo qual se observa a significativa produtividade industrial e a elevada participação das despesas financeiras. Foram comparadas as estruturas de custo do produto vendido sobre receita líquida (CPV/RL) e despesas financeiras sobre receita líquida (DF/RL) de grandes empresas brasileiras e americanas. CPV/RL DF/RL BRASIL 2003 2002 2003 2002 Sadia 71% 69% 0,00% 4,33% Perdigão 73% 72% 3,54% 7,51% Seara 73% 70% 2,48% 4,06% Média 72% 70% 2,01% 5,30% USA 2003 2002 2003 2002 Tyson 93% 92% 1,21% 1,31% Conagra 81% 84% 1,39% 1,57% Média 87% 88% 1,30% 1,44% No setor financeiro, os ganhos foram diretos. A tabela a seguir mostra o resultado líquido dos 15 maiores bancos por ativo nos anos de 2002 e 2003. Observa-se um aumento mediano de 17,4% no resultado líquido.

EVOLUÇÃO DO RESULTADO LÍQUIDO Rank. Banco Lucro 2002 Lucro 2003 Var. 02-03 1º Banrisul 149.651 285.435 91% 2º Nossa Caixa 271.857 449.342 65% 3º CEF 1.081.093 1.616.145 49% 4º Votorantim 379.078 549.946 45% 5º ABN Amro 840.036 1.136.664 35% 6º Safra 464.560 617.006 33% 7º Itau 2.376.723 3.151.820 33% 8º Brasil 2.027.676 2.380.982 17% 9º Bradesco 2.022.588 2.306.339 14% 10º Unibanco 1.010.363 1.052.346 4% 11º Banespa 2.818.149 1.746.997-38% 12º BNB 160.854 84.715-47% 13º HSBC 184.838 94.888-49% 14º BankBoston 829.487 168.915-80% 15º Citibank 1.313.326 1.141-100% Mediana 840.036 617.006 17,4% FONTE: ABM Consulting O quadro a seguir mostra o percentual da receita de títulos dentre as receitas do banco. Em relação à receita total, a relação mediana foi de 38,8%, dentre a receita de intermediação foi de 44,9%. Isso nos mostra a dependência do sistema financeiro a uma política de altas taxas de juros. Participação das receitas de títulos Rank. Banco % na receita total % na receita de intermediação 1º Votorantim 92,9% 93,4% 2º Nossa Caixa 62,7% 66,2% 3º BNB 51,3% 62,0% 4º CEF 50,8% 60,1% 5º Bradesco 39,7% 46,3% 6º BankBoston 39,1% 45,0% 7º Brasil 39,0% 45,4% 8º Safra 38,8% 42,1% 9º Banespa 38,6% 44,9% 10º Citibank 37,0% 41,0% 11º Banrisul 31,4% 34,9% 12º HSBC 26,2% 31,7% 13º Unibanco 25,5% 30,8% 14º Itau 24,2% 34,0% 15º ABN Amro 14,5% 17,5% Mediana 38,8% 44,9% FONTE: ABM Consulting

Desta forma, as conseqüências das elevadas taxas de juros, vigentes há longo período no Brasil, foram: 1. Ineficiência do setor bancário em sua função de intermediário financeiro com baixos custos; 2. Aumento do risco do setor bancário brasileiro em razão das elevadas taxas de juros aplicadas sobre os ativos e da dependência a elevadas taxas de juros para fazer frente à sua estrutura de despesas; 3. Elevação da carga tributária e dos preços dos serviços públicos e dos combustíveis para honrar compromissos financeiros; 4. Aumento do risco País em razão da elevação da dívida pública para honrar despesas financeiras e do elevado custo da dívida. Esta é uma das razões do país não ser recomendado para investimentos internacionais por empresas de rating; 5. Desvirtuamento da atividade produtiva do País, conduzindo as organizações a ganhos financeiros em detrimento de ganhos operacionais. E O QUE FAZER? O ajuste das economias tem-se dado por planejamento ou crise, sendo que nos países emergentes mais por crise do que por planejamento. Imaginando-se uma solução planejada, acredito como bastante razoável que nosso parâmetro de referência pudesse ser o resto do mundo, o que seria uma inversão no pensar até aqui vigente na década: não é possível acreditar que somente o Brasil tenha política econômica correta no mundo. Assim, se temos os menores volumes de crédito sobre o PIB do mundo e uma das maiores taxas de juros do mundo, precisamos nos adequar aos padrões internacionais, reduzindo juros e aumentando os volumes de crédito, de forma a manter a estabilidade do setor bancário e propiciar o crescimento econômico do País pela maior oferta de crédito. Os gráficos a seguir apresentam os volumes de crédito PF e PJ com as respectivas taxas de juros médios. Podemos observar por eles três momentos onde os juros caíram e o volume de crédito aumentou significativamente, meados de 1997, o ano de 2000 e o final do ano de 2003. Isso nos demonstra que é possível adotar uma política expansionista do crédito. Obviamente este processo gerará o desenvolvimento do país e com ele os problemas a ele inerentes, notadamente quanto à necessidade de investimentos em infraestrutura.

Em Bilhões de R$ Corrigidos 195 190 185 180 175 170 165 160 155 150 145 140 135 130 125 120 115 110 jan-97 mai-97 set-97 jan-98 Evolução Juros PJ X Volume Crédito PJ Fonte: Bacen & ABM Consulting CORRELAÇÃO = -74% mai-98 set-98 jan-99 mai-99 set-99 jan-00 mai-00 set-00 jan-01 mai-01 set-01 jan-02 mai-02 set-02 jan-03 mai-03 set-03 jan-04 75 70 65 60 55 50 45 40 Em % a.a 35 30 25 20 Volume Total PJ Média Móvel 12 - Média Geral PJ 115.000 Volume Total PF X JUROS MÉDIOS PF Fonte: Bacen e ABM Consulting 140 105.000 130 Em milhôes R$ corrigidos 95.000 85.000 75.000 65.000 55.000 45.000 CORRELAÇÃO DE -83% 120 110 100 90 80 70 Em % a.a 35.000 60 25.000 jan-97 mai-97 set-97 jan-98 mai-98 set-98 jan-99 mai-99 set-99 jan-00 mai-00 set-00 jan-01 mai-01 set-01 jan-02 mai-02 set-02 jan-03 mai-03 set-03 jan-04 50 Volume Total PF* Média Geral - PF aa

E SE NÃO FIZER? As despesas financeiras constituem a principal despesa do Governo Federal e de muitos Estados e Municípios. O Governo Federal pagou de juros cerca de R$ 120 bilhões no ano de 2003, ou seja, cerca de US$ 40 bilhões: O Governo Federal arrecada para pagar juros, e para não apresentar déficit nominal tem que reduzir os investimentos e postergar outros gastos, o que não é sustentável política e socialmente. O gasto orçado para investimento não é aplicado em desenvolvimento, mas sim em juros. Voltar a investir, nas atuais condições de juros, implicaria em déficit nominal, que teria que ser absorvido por aumento de dívida, para o que não existe mais muito espaço no mercado de fundos de investimento, fundos de pensão, seguradoras e instituições financeiras, o que poderia provocar emissão monetária com um forte processo inflacionário. Este tipo de postura conduziu o México a uma inflação de 64% em dois dias. A manutenção da atual política monetária poderá conduzir o País ao caos inflacionário. Se tivermos que monetizar os juros da dívida de um ano, isto significará o dobro da base monetária e, portanto, uma inflação potencial de cerca de 200%. A mudança consciente e planejada é necessária e urgente.