CONSULTA POPULAR BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR

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Transcrição:

CONSULTA POPULAR BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR Equipe : Beatriz Cardoso¹ Andrea Guida Angélica Sepúlveda Kátia Trovato Nicole Paulet Paula Stella 1 Membro do Grupo Movimento Pela Base 1

A EDUCAÇÃO INFANTIL NA BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR A importância do movimento para a construção de uma base curricular comum nacional é indiscutível. Certamente, a existência de uma referência objetiva sobre o que cada criança deve e tem o direito de aprender é elemento relevante em direção ao enfrentamento da iniquidade que vivemos em nosso país. A força da transformação que pode vir a se instalar como consequência dessa manifestação será potencializada a partir de possíveis desdobramentos, tais como o surgimento de novos documentos e materiais responsáveis pela implementação prática dos conteúdos que forem definidos para cada faixa etária e área do conhecimento e, partindo desta premissa, a responsabilidade atribuída ao esforço de construção de uma referência fica ainda maior! No entanto, todo cuidado é pouco quando se trata de efetivamente conceituar os objetos de conhecimento (Língua, Matemática, História, Ciências, etc.) e o processo de desenvolvimento e aprendizagem pelo qual passam as crianças. Um documento que gere capacidade de transformação das práticas em sala de aula (afinal, é o que se espera!) deve necessariamente explicitar a conexão entre os conteúdos especificados, os propósitos do ensino e a capacidade de aprendizagem, de acordo com o momento do desenvolvimento em que elas se encontram uma mesma lista de conteúdos assume contornos bem diferentes em função da rede de aprendizagens a que o sujeito que aprende teve acesso. De maneira geral, o documento analisado produz orientações muito amplas e permanece profundamente referenciado às Diretrizes já existentes. Não restam dúvidas de que as mesmas devam ser um ponto de partida, porém, em algumas passagens, elas ainda se configuram como a espinha dorsal do documento chama atenção o número de vezes em que o texto das Diretrizes é citado e reafirmado em lugar de destaque. Em nossa compreensão, o desafio que se coloca é justamente o de avançar, oferecendo mais recursos para que a tradução dessa intenção se materialize em prática. Sendo assim, nossas observações e sugestões são para incrementar essa dimensão na BNC. 2

Sobre a conexão entre os níveis de ensino: Do mesmo modo como o detalhamento e o embasamento de cada etapa devem ser respeitados, é importante que haja coerência e continuidade entre o que se propõe a cada nível de ensino. Como justificativa, citamos como exemplo o tratamento dispensado à alfabetização e ao desenvolvimento da linguagem na Educação Infantil e no Ensino Fundamental: ao longo dos cinco anos de Educação infantil, não se encontra menção explícita a aquisição da linguagem como processo em construção. E, subitamente, no 1 o ano do Ensino Fundamental, a leitura e a escrita são inauguradas como conteúdos. As pesquisas comprovam a importância de se fomentar, desde muito cedo, as práticas em torno da leitura e da escrita e, apesar do foco deste parecer ser a Educação Infantil, nossas observações referentes ao ensino da língua se estendem também aos três primeiros anos do Ensino Fundamental. Conhecimento acumulado sobre aprendizagem da linguagem na Educação infantil: Se o propósito do currículo é orientar o que se ensina e se aprende nas instituições escolares, por que tanta generalidade com a Educação Infantil? Como garantir, desse modo, o acesso das crianças aos principais instrumentos simbólicos para pensar e aprender? Para situar as observações que serão feitas a seguir, registramos alguns dados referentes ao conhecimento atual sobre o desenvolvimento da linguagem infantil, pois resultam de especial importância para esta discussão: Estima-se que, aos 4 anos de idade, crianças em ambientes menos favorecidos escutam trinta milhões menos de palavras do que seus pares da mesma idade em ambientes mais favorecidos [1]. Crianças sob a responsabilidade de cuidadores de estratos sociais menos favorecidos, estão expostas a menor quantidade de linguagem e a uma linguagem de menor qualidade, onde predominam expressões curtas e incompletas, de formulação de perguntas fechadas e ordens [2]. 3

Aos 3 anos de idade, o conhecimento do vocabulário se relaciona fortemente à compreensão leitora [3, 4] há uma relação recíproca entre vocabulário e leitura; o vocabulário é componente essencial da aprendizagem inicial da leitura e da escrita [5]. A leitura compartilhada de livros de literatura infantil de qualidade se constitui em excelente contexto para promover o desenvolvimento da linguagem. Uma recente revisão [6] destaca três razões para isso: 1) os livros expõem às crianças a uma linguagem variada (formas e estruturas de pouca frequência na linguagem oral) e contextualizada, por isso estimulam o enriquecimento do vocabulário e o desenvolvimento gramatical; 2) a leitura de livros dá lugar a situações nas quais adultos e crianças compartilham o mesmo foco de interesse e atenção, por isso, podem envolver-se em conversações contingentes; 3) a leitura de histórias ajuda a aprender linguagem, porque requer a participação ativa e responsiva em torno do significado do que está escrito e ilustrado nos livros. Essas evidências, entre outras, destacam os desafios de aprendizagem e de desenvolvimento da linguagem aos quais deve atender a Educação Infantil. E daí, cabem as perguntas: a formulação atual dos objetivos de aprendizagem garante às crianças brasileiras do ensino público o acesso a uma linguagem rica e variada? Orienta os educadores para promover mudanças específicas na comunicação e linguagem durante os anos da Educação Infantil? Sabemos que se trata de um documento curricular e não do detalhamento para implementação. No entanto, se a BNC não oferecer os subsídios necessários para a compreensão do encadeamento entre os conteúdos e sua gradação terá bastante reduzidas suas chances de influência sobre as práticas de ensino. O processo de aprendizagem é um processo psicológico com restrições evolutivas importantes. Ou seja, é fundamental considerar quais elementos são importantes de se aprender em cada etapa da vida. Com base em evidências 4

empíricas, cada etapa 2 deve ser explicitada com maior especificidade. Por exemplo, de 0 aos 3 anos é muito importante a atenção conjunta e o início da compreensão da intencionalidade, enquanto que dos 3 aos 5 anos é importante a compreensão mental do outro, das crenças, do pensamento e das emoções. Esse nível de detalhamento dará a pauta da atuação; do contrário, cairemos em conceitos genéricos que não se materializam adequadamente nas diferentes fases pelas quais as crianças passam³. Visto por outro ângulo, poderíamos problematizar, por exemplo: que expectativa pode ter um Educador Infantil sobre as importantes transformações na produção de narrativas? E na participação em rodas de conversas? Ou ainda na reflexão sobre a linguagem a partir da poesia e jogos de linguagem? A excessiva generalidade dos objetivos e a falta de gradação e hierarquização não orientam às práticas desejadas de enriquecimento do desenvolvimento da linguagem que precisam, em especial, as crianças de famílias com baixo nível socioeconômico e os próprios educadores que com elas interagem. Sobre a definição da área de linguagens: No documento, a área de linguagens está definida de forma cuidadosa, incluindo as diferentes modalidades e perspectivas. Em se tratando da proposição de um currículo nacional e para todos os níveis de ensino, essa parece uma decisão pertinente. O marco geral que situa o campo deve ser amplo. No entanto, vale uma observação no sentido de que é preciso organizar o aprendizado considerando o potencial e papel de cada linguagem no desenvolvimento. A pluralidade deve ser preservada, porém sem uma lógica de 2 Vide seção: CAMPOS DE EXPERIÊNCIAS E OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM NA EDUCAÇÃO INFANTIL Os Campos de Experiências e seus objetivos de aprendizagem, apresentados a seguir, deverão orientar o planejamento curricular dos sistemas de ensino e das unidades de Educação Infantil. Como as aprendizagens configuram uma proposta integradora, nesse momento, não estarão especificadas por etapa creche e pré-escola. 3 Tomemos por base, por exemplo EIEFPOA004 ( Participar ativamente de rodas de conversas, de relatos de experiências, de contação de histórias, elaborando narrativas e suas primeiras escritas não convencionais ou convencionais, desenvolvendo seu pensamento, sua imaginação e as formas de expressá-los. ): o avanço que a criança pode fazer depende da forma como ela é convidada a participar das atividades. Para além de ouvir histórias ou participar de conversas, o elemento transformador será decorrente da adequação da situação a faixa etária. O que uma criança é capaz de fazer ao ouvir histórias aos 2 anos é diferente do que pode aos 5 anos. 5

equivalência. O trecho a seguir explicita quase que um ponto de chegada ao final da escolaridade: A utilização do termo linguagens, no plural, aponta para a abrangência do aprendizado na área, que recobre não apenas a linguagem verbal, mas as linguagens musical, visual e corporal. A integração dos quatro componentes em uma área também busca romper com uma lógica de organização escolar que reforça certa dissociação e hierarquia entre as linguagens, considerando que, na vida social, os sentidos de textos, objetos e obras são construídos a partir da articulação de vários recursos expressivos (pg30) Seria produtivo graduar o equilíbrio entre as ênfases e práticas, especialmente na Educação Infantil e séries iniciais, justamente para garantir a inclusão de todos na cultura letrada que, por sua vez, engloba toda a riqueza das diferentes linguagens. Sobre os campos de experiências e objetivos de aprendizagem na Educação Infantil linguagem: Novamente nos deparamos com uma definição genérica: Em todos os campos de experiências da Educação Infantil, os vários tipos de linguagem estão presentes: a verbal, a corporal, a musical, a visual etc. As linguagens, de grande complexidade e constituidoras de subjetividade humana, são instrumentos de expressão, de representação, de interação, de comunicação, de pensamento, de apreciação estética, de construção de conhecimentos, além de se configurarem também como um campo de conhecimentos. (pg22) A experiência matricial que tem de ser favorecida às crianças é a criação de campos de aprendizagem de significados simbólicos, ou seja, não basta oferecer um cardápio diversificado de acesso a diferentes linguagens. É por meio do uso do sistema simbólico falar, ler, escrever, imaginar, desenhar e pensar que as crianças podem aprender linguagem(ns). Novas formas de linguagem preveem novas formas de conhecimento. A linguagem é um objeto cultural simbólico com função de comunicação; é simbólica, porque pode ser usada para referir-se a algo diferente de si mesma. E é aqui que reside a riqueza e potência da linguagem como elemento estruturante do desenvolvimento humano. 6

Essa dimensão deve ficar explícita de tal forma que o detalhamento dos conteúdos não se distancie do fato de que se trata de um fenômeno cultural que se aprende por meio da interação e do uso. Considerando também, como já foi mencionado (vide nota 1), que a forma como as crianças terão acesso às diferentes práticas culturais vão diferir em função de suas idades. Se por um lado o documento considera, tanto nos direitos de aprendizagem quanto nos campos de experiências, a transversalidade da linguagem, por outro, em nenhum dos objetivos especificados, se explicita a linguagem que as crianças podem e precisam aprender durante a Educação Infantil, nem a interdependência do desenvolvimento desta com o desenvolvimento cognitivo, psicossocial e afetivo das crianças. O campo de experiências escuta, fala, pensamento e imaginação, que resulta o mais evidente, carece de referências às possíveis aprendizagens infantis. Consideremos o primeiro objetivo de aprendizagem desse campo: EIEFPOAOO1 Conviver com crianças, jovens e adultos usuários da sua língua materna, de LIBRAS e de outras línguas e ampliar seu conhecimento sobre a linguagem gestual, oral e escrita, apropriando-se de diferentes estratégias de comunicação. A leitura desse objetivo nos desperta as seguintes dúvidas: em que consiste o convívio que leva a ampliar o conhecimento da linguagem gestual, oral e escrita? O que se espera especificamente que se amplie em cada uma das linguagens? Qual a progressão estimada? Como varia tal progressão e em quais condições? A leitura do objetivo (e do conjunto dos objetivos) não oferece nenhuma resposta às questões levantadas e, assim, perde-se a oportunidade para guiar a intencionalidade educativa em torno do desenvolvimento da linguagem gestual, oral e escrita na Educação Infantil. Os outros objetivos, embora orientem sobre o tipo de práticas e contextos que podem favorecer o desenvolvimento da linguagem como os jogos da linguagem (EIEFPOA002, EIEFPOA003) e a participação em conversações e narrativas (EIEFPOA004, EIEFPOA005, EIEFPOA006), também não apontam as possíveis conquistas infantis que ocorrem por meio desse tipo de práticas. Em resumo, resulta duvidoso que esse tipo de formulação dos objetivos garanta os direitos de aprendizagem e desenvolvimento da linguagem gestual, oral e escrita das crianças brasileiras. 7

e sugestão para a revisão dos objetivos: Campo de experiência: o eu, o outro e o nós (...) Conhecer outros grupos sociais, outros modos de vida, por meio de narrativas, de contatos com outras culturas amplia o modo de perceber o outro e desfaz estereótipos e preconceitos. [p. 22] As narrativas são relevantes, porque favorecem o deslocamento da criança no tempo e no espaço (o distanciar-se do aqui e agora) e o uso e a aprendizagem de uma linguagem distinta daquela utilizada nas situações cotidianas. Esta justificativa poderia ser dada no parágrafo inicial desse campo de experiência. EIEONOA005 Comunicar às crianças e/ou adultos suas necessidades, sentimentos, dúvidas, hipóteses, descobertas, oposições utilizando diferentes linguagens de modo autônomo e criativo e empenhando-se em entender o que eles lhe comunicam. [p. 23] O objetivo não está redigido de forma clara. Quais seriam as diferentes linguagens a que se faz referência? O que é considerado um modo criativo de usar a linguagem? Além disso, não há indicações do que é preciso ser assegurado pela Educação Infantil para que esse objetivo possa ser satisfatoriamente alcançado pelas crianças. Campo de experiência: escuta, fala, pensamento e imaginação (...) Na pequena infância a aquisição e o domínio da linguagem verbal estão vinculados está vinculada à constituição do pensamento, à fruição literária, sendo também instrumento de apropriação dos demais conhecimentos. [p. 24] Sugestão de alteração da redação do objetivo: vide modificação realizada no trecho acima. A apresentação do campo de experiência é pertinente. Contudo, resulta incompleta, porque não se mencionam certos aspectos que também estão vinculados à aquisição e ao domínio da linguagem verbal: a possibilidade de interação verbal da criança com o outro e a consequente comunicação/expressão de ideias, pensamentos, opiniões e sentimentos. EIEFPOA001 Conviver com crianças, jovens e adultos usuários da sua língua materna, de LIBRAS e de outras línguas e ampliar seu conhecimento sobre a linguagem gestual, oral e escrita, apropriando-se de diferentes estratégias de comunicação. [p. 24] O objetivo é pertinente para a Educação Infantil, ainda que não seja estejam explícitos quanto aos avanços esperados. Ademais, paralelamente aos benefícios advindos da mera convivência com outras crianças, jovens e adultos, existem outros que requerem situações planejadas intencionalmente para alcançá-los ou a fim de recortar e explorar um aspecto específico da língua, como o vocabulário. EIEFPOA002 Brincar, vocalizando ou verbalizando, com ou sem apoio de objetos, fazendo jogos de memória ou de invenção de palavras, usando e ampliando seu repertório verbal. [p. 25] O objetivo não está redigido de forma clara. São jogos espontâneos ou propostos pelo professor? Por que esses jogos são recomendados? Em que consiste a ampliação de repertório verbal mencionada? 8

EIEFPOA003 Explorar gestos, expressões corporais, sons da língua, rimas além dos significados e dos sentidos das palavras nas falas, nas parlendas, poesias, canções, livros de histórias e outros gêneros textuais, aumentando gradativamente sua compreensão da linguagem verbal. [p. 25] A participação ativa das crianças em situações em que o adulto realiza leitura de histórias em voz alta não aparece; apenas há a exploração dos significados e dos sentidos das palavras nos livros de história. Hoje se sabe da importância da participação ativa das crianças em situações em que o adulto lê para elas tanto para favorecer a aquisição da linguagem quanto para fomentar o processo de letramento. Portanto, essas situações deveriam, necessariamente, constar da BNC Educação Infantil. EIEFPOA004 Participar ativamente de experiências de rodas de conversa, relatos de experiência, de contação de histórias, elaborando narrativas e suas primeiras produções escritas não convencionais ou convencionais, desenvolvendo seu pensamento, sua imaginação e as formas de expressá-los. [p. 25] Apesar da pertinência do objetivo, não fica claro como serão encaminhadas as situações nas quais as narrativas orais e as produções escritas serão elaboradas pelas crianças. Em nenhum momento se deixa claro que a leitura é um tipo de atividade e a escrita, outro. O sistema de escrita dá a possibilidade de ler e escrever, mas esse não é um processo recíproco, muito menos no momento da aprendizagem inicial. O desenvolvimento da escrita é mais analítico e deve ser considerado como tal. O reconto de histórias não é mencionado nos objetivos relativos ao Campo de experiência escuta, fala, pensamento e imaginação; aparece apenas em dois objetivos do Campo de experiência corpo, gestos e movimentos: EICGMOA002 Brincar utilizando criativamente práticas corporais para realizar jogos e brincadeiras e para representar personagens no faz de conta, no reconto de histórias, em danças e dramatizações [p. 23]; EICGMOA00 5 Comunicar corporalmente sentimentos, emoções e representações em diversos tipos de atividade como no reconto oral de histórias, em danças e dramatizações, nos momentos de banho e de outros cuidados pessoais. [p. 24]. Dada a importância dessa prática para o conhecimento das narrativas e da linguagem escrita, deveria aparecer em algum objetivo do campo de experiência relativo à linguagem verbal. Outras considerações: o O desenvolvimento do conhecimento infantil sobre a língua escrita não integra o documento. Existe apenas uma vaga referência às primeiras produções escritas não convencionais ou convencionais (vide objetivo EIEFPOA004 reproduzido acima). o De forma semelhante, deixa-se de fora a recomendação de que se assegurem oportunidades para o contato com e a exploração de diversos objetos portadores de texto, a fim de favorecer a familiarização da criança com a língua escrita. 9

o O trabalho com os nomes próprios também não está indicado, o que exclui Marca do Pantone currículo da Educação Infantil situações relacionadas com o reconhecimento, a identificação e o uso dessas palavras no cotidiano escolar o que, provavelmente, limita a familiarização das crianças com as letras do alfabeto, suas características e funções. o o O tema Vocabulário não recebe o tratamento que merece. Está demonstrado que em qualquer língua é necessário uma massa crítica de vocabulário. Este é um princípio cognitivo geral que criará as condições necessárias para aprendizagens subsequentes. Por fim, não há menção para a dinâmica e equilíbrio necessários entre informação e apropriação por parte da criança ao interagir com os conteúdos. A chave da aprendizagem está na garantia de momentos de produção em que a criança usa os conhecimentos a que tem acesso de forma produtiva. 10

Referências [1] HART, B.; RISLEY, T. R. Meaningful differences in the everyday experience of young American children. Baltimore, MD: Paul Brookes, 1995. [2] CAMERON-FAULKNER, T.; LIEVEN, E.; TOMASELLO, M.. A construction based analysis of child directed speech. Cognitive Science, v. 27, p. 843-873, 2003. [3] ROSKOS, K.; ERGUL, C.; BRYAN, T.; BURSTEIN, K.; CHRISTIE, J; HAN, M. (2008). Who s learning what words and how fast? Preschoolers vocabulary growth in an early literacy program. Journal of Research in Childhood Education 22:275 90. [4] BIEMILLER, A., BOOTE, C. (2006). An effective method for building meaning vocabulary in primary grades. Journal of Educational Psychology, 98, 44-62. [5] TEBEROSKY, A.; JARQUE, M. J.. Interação e continuidade entre a aquisição da linguagem e a aprendizagem da leitura e da escrita. Cadernos Cenpec Nova série, [S.l.], v. 4, n. 1, dez. 2014. ISSN 2237-9983. Disponível em: <http://cadernos.cenpec.org.br/cadernos/index.php/cadernos/article/view/276>. Acesso em: 10 Nov. 2015. [6] DICKINSON, D.; GRIFFITH, J.; GOLINKOFF, R.; HIRSH-PASEK, K.. How reading books fosters language development around the world. Child Development Reasearch, v. 2012. 11