PROCESSO Nº: 0803495-29.2015.4.05.8500 - AÇÃO CIVIL PÚBLICA AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL RÉU: UNIÃO FEDERAL (e outros) 3ª VARA FEDERAL - JUIZ FEDERAL TITULAR ADMINISTRATIVO. CONSTITUCIONAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. SAÚDE PÚBLICA. ATRASO NO REPASSE DE RECURSOS. PARALISAÇÃO DE SERVIÇOS PÚBLICOS DE SAÚDE NAS ENTIDADES HOSPITALARES. DIREITO FUNDAMENTAL À VIDA E À SAÚDE. DEVER DO ESTADO. LIBERAÇÃO DE RECURSOS FEDERAIS SOB A RUBRICA "ESTRUTURAÇÃO REDE DE SERVIÇO ATENÇÃO BÁSICA DE SAÚDE". BLOQUEIO DE FPM. SUSPENSÃO DE REPASSE DE RECURSOS PARA FESTEJOS, EXCETO OS DE CARNAVAL 2016. ABSTENÇÃO DE DESPESAS COM PUBLICIDADE E PROPAGANDA. TUTELA ANTECIPADA DEFERIDA. DECISÃO: Trata-se de AÇÃO CIVIL PÚBLICA, ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, em face da UNIÃO, do ESTADO DE SERGIPE e do MUNICÍPIO DE ARACAJU, objetivando a concessão de medida antecipatória dos efeitos da tutela, para: a) autorizar e determinar, em caráter excepcional, o MUNICÍPIO DE ARACAJU-SE a utilizar os recursos federais de que dispõe na rubrica "Estruturação Rede de Serviço Atenção Básica de Saúde" no valor de R$ 5.025.505,00 (cinco milhões, vinte e cinco mil, quinhentos e cinco reais), de forma a garantir o regular funcionamento dos Hospitais Santa Isabel, São José e Cirurgia, devendo o MUNICÍPIO DE ARACAJU-SE prestar contas, ao Juízo Federal, da utilização desses recursos, comprovando e justificando as quantias destinadas e o porquê da destinação, bem como devolvê-los, integralmente, à rubrica de origem até a data limite apresentada pelo Gestor Municipal de Saúde, isto é, 18/02/2016; b) que seja determinado ao MUNICÍPIO DE ARACAJU-SE que suspenda quaisquer tipo de repasses para festejos, dentre eles o Carnaval 2016, e patrocínios de toda ordem,
bem como se abstenha de realizar despesas com publicidade/propaganda, salvo aquelas de campanhas educativas de interesse público, até que seja devidamente regularizada a situação em tela c) autorizar e determinar, em caráter excepcional, a UNIÃO a reter (como forma de garantia - artigo 160, incisos I e II, da Constituição da República), o valor de R$ 5.025.505,00 (cinco milhões, vinte e cinco mil, quinhentos e cinco reais), do Fundo de Participação dos Municípios - FPM, destinado a Aracaju-SE, até que ocorra a recomposição integral dos valores utilizados para manter os serviços de saúde (item precedente) Em resumo, o MPF alegou, em sua inicial, atrasos por parte da União na transferência de recursos no âmbito do Sistema Único de Saúde - SUS ao Estado de Sergipe e ao Município de Aracaju, que teriam determinado o atraso nos pagamentos das unidades de saúde conveniadas, especialmente do Hospital de Cirurgia, que teria suspendido o atendimento aos usuários do SUS a partir de 17/12/2015, por impossibilidade física de prestar os serviços, em razão de não poder pagar fornecedores e empregados. Os pedidos de antecipação dos efeitos de tutela foram indeferidos em decisão proferida pelo Juiz Federal Plantonista (ID n.4058500.511890), em 21 de dezembro de 2015. Em petição identificada sob o n. 4058500.545440, o digno Representante do Ministério Público Federal elabora novo pedido de antecipação de tutela e pede, alternativamente, a designação urgente de audiência judicial. No novo pedido, o MPF relatou que a situação da saúde se agrava a cada dia em razão da paralisação de serviços de saúde na Maternidade Santa Isabel e ameaças de novas paralisações de serviços essenciais no Hospital Cirurgia, e no Hospital São José, sobrecarregando, por óbvio, o Hospital de Urgência de Sergipe - HUSE, e afetando toda a Rede SUS. Juntou documentos (IDs n. 4058500.545463, 4058500.545445, 4058500.545444, 4058500.545442). É O BREVE RELATO. DECIDO. Noticiam os autos a crise pela qual passa a prestação do serviço público de saúde no Município de Aracaju/SE, causada pela falta de repasses de recursos. Diante da falta de verbas, os Hospitais de Cirurgia, São José e Santa Isabel, correm o risco iminente de paralisação de suas atividades, o que acarretará graves prejuízos à população não só deste Município quanto daqueles outros que recorrem a Aracaju na busca de atendimento médico. Conforme relatado no novo pedido do MPF, a situação da saúde se agrava a cada dia em razão das novas notícias de paralisações, com prejuízo manifesto à saúde da população,
de forma que se faz urgente autorizar e determinar, em caráter excepcional, o Município de Aracaju/SE a utilizar os recursos federais de que dispõe na rubrica "Estruturação Rede de Serviço Atenção Básica de Saúde" Demonstrou-se que o débito com o Hospital São José supera R$ 2 milhões e com a Maternidade Santa Isabel ultrapassa a marca de 2,7 milhões, sendo que esta última está com "diversos serviços paralisados. Vê-se, de tal forma, que a situação é extremamente grave e urgente, evidenciando-se que a saúde das pessoas não pode esperar pelos trâmites burocráticos do Executivo Municipal, tampouco as enfermidades sairão de recesso no Carnaval que se aproxima. É indispensável a intervenção do Poder Judiciário para que recursos federais disponíveis sejam utilizados (com as devidas garantias) em favor da saúde da população sergipana, até que o ente municipal regularize a situação perante os hospitais locais. A fumaça do bom direito, pois, está exaustivamente demonstrada a partir dos elementos trazidos neste requerimento e, sobretudo, dos documentos que a instruem (anexados digitalmente), de modo que a narrativa efetuada pelo MPF revelam fatos novos já com paralisação de serviços de saúde à população sergipana (Maternidade Santa Isabel: nem o direito de nascer adequadamente está sendo garantido em Aracaju-SE). Ademais, a qualquer momento, podem ocorrer novas paralisações de serviços essenciais no Hospital Cirurgia, e no Hospital São José, sobrecarregando, por óbvio, o Hospital de Urgência de Sergipe - HUSE, e afetando toda a Rede SUS. O perigo da demora, por sua vez, exsurge do fato de que é imperioso reafirmar que a situação fática posta compromete o funcionamento não apenas da Maternidade Santa Isabel (já com serviços paralisados, repita-se), mas também do Hospital São José e do Hospital Cirurgia (que a qualquer momento podem também parar, comprometendo, ainda mais, a Rede SUS em Sergipe). Por último, cumpre-me analisar se o ordenamento jurídico pátrio vem agasalhar o direito invocado pelo MPF, para o fim de se aferir, em consonância com os elementos probatórios já acostados aos autos, a existência do primeiro requisito legal para a concessão da tutela ora requerida. Na hipótese em exame e, à luz dos princípios que regem o ordenamento jurídico pátrio, deve ser admitida a invocação da excepcionalidade da medida requerida ante a imprescindibilidade do provimento urgente. O art. 196 da Constituição Federal é enfático ao prever que "A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação". Logo, a continuidade na prestação do serviço público de saúde é um direito do paciente e dever do Estado, que se inclui no âmbito do direito à saúde de que todos são titulares e no dever do Estado de patrocinar. É incumbência do Sistema Único de Saúde - SUS - garantir a integralidade da assistência à saúde, individual ou coletiva, e em qualquer grau de complexidade, não se
justificando que atrasos nos repasses de verbas comprometam o bom funcionamento das entidades hospitalares, tão fundamentais na rede de saúde desta capital e do Estado de Sergipe. Corroboram as alegações expostas pelo autor os documentos anexados aos autos (IDs n. 4058500.545463, 4058500.545445, 4058500.545444, 4058500.545442), os quais revelam a suspensão na prestação de serviços na Maternidade Santa Isabel e a iminência de paralisação de outros serviços essenciais no Hospital Cirurgia, Hospital São José e, por conseqüência, a super lotação do Hospital de Urgência de Sergipe - HUSE. O Poder Judiciário deve atuar sempre com o propósito de neutralizar a ocorrência de risco que possa comprometer, de modo grave e/ou irreversível, a continuidade da execução de políticas públicas ou a prestação de serviços essenciais à coletividade, notadamente quando se trata de saúde pública. Cabe ao Judiciário remover qualquer entrave administrativo ao acesso aos direitos fundamentais, conquanto o acesso à saúde, em qualquer de seus níveis, máxime por ser direito de todos e dever do Estado, insculpido no art. 6º da Constituição Federal. Pacificado, outrossim, no âmbito dos Tribunais, que o dever de prestar assistência à saúde, é solidário da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim que a concessão de antecipação de tutela, em tais casos, é absolutamente viável dentro da sistemática processual civil adotado no Brasil, à luz do art. 273 do CPC. Presentes, assim, a relevância do fundamento do pedido, à luz dos argumentos expendidos pelo digno representante do Ministério Público Federal e consoante a jurisprudência dominante, além de concorrer o perigo na demora da decisão, tendo em vista o risco à saúde e à vida da população sergipana, impõe-se o deferimento do pleito autoral. Todavia, quanto ao pedido de que seja determinado ao Município de Aracaju-SE que suspenda quaisquer tipo de repasses para festejos, dentre eles o Carnaval 2016, e patrocínios de toda ordem, bem como se abstenha de realizar despesas com publicidade/ propaganda, salvo aquelas de campanhas educativas de interesse público, até que seja devidamente regularizada a situação em tela, entendo que o mesmo não merece prosperar, em parte, pois, a essa altura, os recursos destinados aos festejos carnavalescos já foram repassados. Ademais, isso implicaria no cancelamento de diversos contratos já celebrados, em sua maioria com artistas da terra; prejudicaria as pessoas mais humildes, que são aquelas que freqüentam o carnaval de rua, já que as pessoas que detém mais recursos geralmente procuram viajar para participar dos festejos em locais mais tradicionais, como Recife, Salvador e Rio de Janeiro; além de causar prejuízos aos pequenos comerciantes locais, que já compraram seus produtos para revenda. POSTO ISSO, e ante aos argumentos expendidos, defiro a antecipação de tutela reclamada: a) autorizar e determinar, em caráter excepcional, o MUNICÍPIO DE ARACAJU-SE a utilizar os recursos federais de que dispõe na rubrica "Estruturação Rede de Serviço Atenção Básica de Saúde" no valor de R$ 5.025.505,00 (cinco milhões, vinte e cinco
mil, quinhentos e cinco reais), de forma a garantir o regular funcionamento dos Hospitais Santa Isabel, São José e Cirurgia, devendo o MUNICÍPIO DE ARACAJU-SE prestar contas, ao Juízo Federal, da utilização desses recursos, comprovando e justificando as quantias destinadas e o porquê da destinação, bem como devolvê-los, integralmente, à rubrica de origem até a data limite apresentada pelo Gestor Municipal de Saúde, isto é, 18/02/2016; b) que seja determinado ao MUNICÍPIO DE ARACAJU-SE que suspenda quaisquer tipo de repasses para festejos, exceto os de Carnaval 2016, e patrocínios de toda ordem, bem como se abstenha de realizar despesas com publicidade/propaganda, salvo aquelas de campanhas educativas de interesse público, até que seja devidamente regularizada a situação em tela c) autorizar e determinar, em caráter excepcional, a UNIÃO a reter (como forma de garantia - artigo 160, incisos I e II, da Constituição da República), o valor de R$ 5.025.505,00 (cinco milhões, vinte e cinco mil, quinhentos e cinco reais), do Fundo de Participação dos Municípios - FPM, destinado a Aracaju-SE, até que ocorra a recomposição integral dos valores utilizados para manter os serviços de saúde (item precedente) Determino, ainda, a imposição de multa diária, no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), por obrigação descumprida e em relação a cada dia de descumprimento, ao Município de Aracaju e à União. Intimem-se os Excelentíssimos Senhores Ministro de Estado da Saúde, Governador do Estado de Sergipe e Prefeito Municipal, pessoalmente e em caráter de URGÊNCIA. Intimem-se, também, o Estado de Sergipe, na pessoa de seu Procurador Geral, a União Federal, através da Advocacia da União no Estado de Sergipe e o Município de Aracaju, na pessoa do Procurador Geral do Município. Determino urgência nas intimações e preferência absoluta na tramitação. Após, vista ao Ministério Público Federal. Intimem-se. Juiz Edmilson da Silva Pimenta