Aula 13: Cálculo de limites. Derivadas.
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- Maria das Neves Fidalgo Assunção
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1 Aula 13: Cálculo de limites. Derivadas. 1. Limites notáveis Estudamos agora três limites importantes. 1 São eles Teorema 1 (Limites notáveis): senx lnx lim = 1 lim x 0 x x 1 x 1 = 1 lim expx 1 = 1 x x Demonstração. Comecemos com o logaritmo. Sabemos que x 1 (1) lnx x 1 x Dividindo por x 1 obtemos 1 x lnx 1 (se x > 1) x 1 1 lnx x 1 1 (se x < 1) x Pelo teorema dos limites enquadrados obtemos lim x 1 lnx x 1 = 1 Passemosàexponencial. Substituindox = e y naequação(1)obtemos1 e y y e y 1. Multiplicando aprimeira desigualdade por e y obtemos também e y 1 ye y. Assim y e y 1 ye y Dividindo por y obtemos 1 ey 1 y e y (se y > 0) e y ey 1 y 1 (se y < 0) Pelo teorema dos limites enquadrados obtemos e y 1 lim = 1 y 0 y Finalmente temos o seno. Seja θ [ ] 0, π 2, e sejam A,B,C,D R 2 os pontos A = (cosθ,senθ), B = (1,0), C = (1,tanθ), D = (cosθ,0) representados na figura 1: A C θ D B Figura 1. Demonstração do teorema 1 1 Assumimos aqui que 0 é um ponto de acumulação do domínio do seno e da exponencial.
2 2 θ é igual ao comprimento do arco AB, que é menor que o comprimento do segmento tangente BC = tanθ e maior que AB. Mas senθ = AD AB logo senθ θ tanθ = senθ para θ [ ] 0, π cosθ 2. Dividindo tudo por sen θ, 1 θ senθ 1 cosθ o que é equivalente a 1 senθ cosθ θ Como as funções senθ θ e cosθ são pares, esta desigualdade é também válida para θ < 0. Pelo teorema dos limites enquadrados, como cosθ 1 obtemos 2. Limites e composição senθ lim = 1 θ 0 θ Vamos supor que queremos calcular lim x a f ( g(x) ). Seja u = g(x). Se soubermos que ou seja, que u b quando x a, e (1) lim x a g(x) = b (2) lim f(u) = c u b é natural esperar que lim f( g(x) ) = lim f(u) = c x a u b De facto, se f for contínua, (2) diz-nos que f(b) = c e lim f( g(x) ) = f ( lim g(x) ) = f(b) = c x a x a Em geral no entanto, não é verdade que lim x a f ( g(x) ) = c, como podemos ver no próximo exemplo! Exemplo 1. Seja g(x) = 1 a função constante igual a 1 e seja 2 u 1 f(u) = 3 u = 1 Então lim g(x) = 1 e lim f(u) = 2 x 0 u 1 Mas o limite lim f(g(x)) não é dois! De facto f g é constante: f(g(x)) = f(1) = 3 x 0 logo lim f(g(x)) = 3. x 0 O problema no exemplo anterior é que o facto de lim u b f(u) = c não nos diz nada sobre o que acontece para u = b. Se f(b) c podemos ter problemas. Para evitar esta situação supomos que g(x) b para x a:
3 Aula 13: Cálculo de limites. Derivadas. 3 Teorema 2: Seja a um ponto aderente ao domínio de f g tal que (1) lim x a g(x) = b; (2) lim u b f(u) = c; (3) g(x) b para x a. Então lim f( g(x) ) = lim f(u) = c x a u b Demonstração. Definimos a função f(u) u b f(u) = c u = b Então f é contínua em b e f(u) = f(u) para u b logo lim f( g(x) ) ) = lim f( g(x) (pois g(x) b para x a) x a x a = f ( lim x a g(x) ) (pois f é contínua) = f(b) = c Exemplo 2. O limite ln(x 2 3) lim x 2 x 2 4 conduz a uma indeterminação 0 0. Para o calcular vamos usar o limite notável do logaritmo. Fazendo a substituição u = x 2 3 obtemos ln(x 2 3) x 2 4 Quando x 2, u = x logo = lnu u 1 (u = x 2 3) ln(x 2 3) lnu lim x 2 x 2 = lim 4 u 1 u 1 = 1 e 4x 1 Exemplo 3. Para calcular lim, observamos que: x 0 x e 4x 1 x Quando x 0, u 0 logo = 4 e4x 1 4x = 4 eu 1 u com u = 4x e 4x 1 lim = lim 4 eu 1 = 4. x 0 x u 0 u
4 4 sen(x 2 ) Exemplo 4. Para calcular lim, observamos que x 0 x senx 2 = x senx2 x x 2 logo sen(x 2 ) senx 2 lim = lim x lim x 0 x x 0 x 0 x 2 senu = lim x lim (u = x 2 ) x 0 u 0 u = 0 1 = 0 Observação: O teorema só se aplica se os limites de f e g existirem. Se estes limites não existerem, o limite de f g pode ou não existir. Exemplo 5. Seja H a função de Heaviside e seja g(x) = x 2. Então H g(x) = H(x 2 ) é constante igual a um portanto tem limite em x = 0 apesar do limite de H não existir em g(0) = Interpretação geométrica dos limites notáveis Vamos agora ver como interpretar geometricamente os limites notáveis do seno e do logaritmo. Começamos com o limite do seno: Observemos a figura 2: senθ lim = 1 θ 0 θ D θ A B C Figura 2. Comparação entre 2θ e 2senθ para θ = π/6 senθ é o comprimento AD do segmento entre A e D e θ é o comprimento BD do arco unindo B a D. Assim, senθ 2senθ = CD e 2θ = CD logo = CD CD θ Estamos assim a comparar os comprimentos do segmento e do arco unindo os pontos C e D. Queremos agora tomar o limite quando θ tende para zero. Na próxima
5 Aula 13: Cálculo de limites. Derivadas. 5 figura tomamos θ = π/48. Para ver melhor o que se está a passar ampliamos a imagem: Ampliação 8 D θ = π/48 C Figura 3. Ampliação por um factor 8 para o ângulo θ = π/48. Ao ampliar uma imagem por um factor k, todos os comprimentos são multiplicados por k. Assim, o quociente CD/ CD não muda pois o numerador e o denominador são ambos multiplicados por k, pelo que a fórmula senθ = CD CD θ permanece válida após ampliação. Comparando o segmento e o arco entre C e D é geometricamente claro que o quociente converge para um quando θ tende para zero, que é precisamente o que nos diz o limite notável. Vamos agora estudar o limite notável do logaritmo: Observemos a figura 4: lim x 1 lnx x 1 = 1 y = 1/x Figura 4. Comparação dos valores de ln(x 1) e de x 1 para x = 1.5 Para x > 1, lnx é a área da região por baixo da hipérbole y = 1/x e por cima do intervalo [1,x] (zona sombreada), ao passo que x 1 é a área do rectângulo de altura um com base no intervalo [1,x]. Queremos tomar o limite quando x tende para um. Para ver melhor o que se está a passar vamos de novo ampliar a figura, mas desta vez apenas na direcção x.
6 6 Ampliação: 10 Figura 5. Comparação entre ln(x 1) e x 1 para x = 1.05 Se esticarmos uma figura na direcção do eixo dos xx por um factor k, as áreas são multiplicadas por k. Assim o quociente lnx x 1 não é alterado pois o numerador e o denominador são ambos multiplicados por k. É agora geometricamente claro que o quociente das áreas vai convergir para um quando x tende para um, que é precisamente o que nos diz o limite notável. Estes dois exemplos ilustram dois princípios fundamentais que estão na base do cálculo integral e do cálculo diferencial. São eles: Seja f uma função contínua e positiva, definida numa vizinhança de a. Para x próximo de a, a região por baixo do gráfico de f e por cima do intervalo [a,x] é aproximadamente um rectângulo de área f(a)(x a); À medida que vamos ampliando uma circunferência, esta vai-se aproximando cada vez mais duma linha recta. De facto o mesmo acontece com o gráfico de certas funções, ditas diferenciáveis. O estudo destas funç oes é o nosso próximo objectivo. 4. Taxa de variação A noção de derivada de uma função é uma das mais fundamentais do Cálculo, e é uma das principais razões para a introdução da noção de limite. Tem múltiplas aplicações noutras áreas científicas e tecnológicas, onde é rotinamente utilizada para a definição de conceitos básicos, como os de velocidade e aceleração. Apesar da variedade de aplicações, todas elas nos conduzem ao cálculo do mesmo tipo de limite. Este limite aparece naturalmente no estudo de rectas tangentes ao gráfico duma função. Aparece também naturalmente sempre que consideramos problemas envolvendo taxas de variação. A variação duma função f : D R num intervalo [a,b] D é f = f(b) f(a) Representando a variação da variável x por x = b a temos a Definição 3: Chamamos taxa de variação média de f em [a,b] ao quociente f x = f(b) f(a) b a
7 Aula 13: Cálculo de limites. Derivadas. 7 Exemplo 6. Se v(t) representa a velocidade duma partícula então a velocidade média entre t = a e t = b é dada por v m = v t = v(b) v(a) b a Exemplo 7. Seja f(x) = mx+b. Então a taxa de variação de f é igual ao declive m, independentemente do intervalo considerado: f x = f(b) f(a) = mx 1 +b mx 2 b = m b a x 1 x 2 Geometricamente, a taxa de variação é o declive da recta que passa pelos pontos ( a,f(a) ) e ( b,f(b) ) do gráfico de f. Algumas observações: A taxa de variação é positiva se f(b) > f(a) e negativa se f(b) < f(a); Se f é decrescente, a taxa de variação é negativa, sendo o valor absoluto f x tanto maior quanto mais depressa a função decrescer. Analogamente, a taxa de variação é positiva para funções crescentes, sendo o seu valor uma medida do crescimento de f; A definição faz sentido também para b < a. De facto f(b) f(a) b a = f(a) f(b) a b Queremos agora definir a chamada taxa de variação instantânea de f em cada ponto a D. Duma forma pouco rigorosa, consideramos uma variação infinitamente pequena da variável x, que representamos por dx. Tomamos então a correspondente variação de f, df = f(a+dx) f(a) e formamos o quociente df/dx. Usando limites podemos tornar estas ideias rigorosas. Definimos df dx = lim f(a+ x) f(a) x 0 x se o limite existir. É muitas vezes conveniente escrever este limite doutra forma, usando a substituição x = a+ x. Quando x 0, x a e obtemos df dx = lim f(x) f(a) x a x a Portanto tomamos a taxa de variação média f/ x sobre intervalos [a,x] (ou [x,a] se x < a) cada vez mais pequenos, e tomamos o limite quando x a. É importante notar que df/dx não representa o quociente de duas quantidades df e dx pois df e dx não foram definidos. 2 Exemplo 8. A velocidade instantânea duma partícula num instante t = a é dada por dv dt = lim v(t) v(a) t a t a 2 Ver no entanto a secção 11.
8 8 Chegamos assim à noção de derivada, que não é mais que a taxa de varição instantânea da função: Definição 4 (Derivada): Seja f : D R uma função e a D um ponto de acumulação de D. Dizemos que f é diferenciável no ponto a D se existir em R o limite df dx = lim f(a+ x) f(a) f(x) f(a) = lim. x 0 x x a x a Chamamos a este limite a derivada de f em a. Há várias notações frequentemente usadas para representar a derivada duma função. As mais frequentes são df dx (a), df d dx, x=a dx f(a), f (a) Exemplo 9. Se f(x) = mx+b, a taxa de variação média de f é igual ao declive m, independente do intervalo considerado. Assim, em qualquer ponto a temos df dx = lim f x a x = lim m = m x a Exemplo 10. Seja f(x) = x 2. Então a derivada de f no ponto a = 2 é o limite f x (2) = lim x 2 x 2 = lim(x+2) = 4 x 2 Exemplo 11. Os limites notáveis podem ser vistos como derivadas. A derivada do seno em a = 0 é senx sen0 senx lim = lim = 1 x 0 x 0 x 0 x A derivada da exponencial em a = 0 é e x e 0 lim x 0 x 0 = lim x 0 e x 1 x = 1 A derivada do logaritmo em a = 1 é lnx ln1 lnx lim = lim x 1 x 1 x 1 x 1 = 1
9 Aula 14: Derivadas 9 Aula 14: Derivadas 5. Recta tangente Consideremos agora o problema de determinar a recta tangente ao gráfico duma função f num ponto P = (a,f(a)). Já abordámos esta questão quando falámos de limites, no caso particular da parábola y = x 2. Retomemos essa discussão. A equação da recta tangente, se não for vertical, é certamente da forma y f(a) = m(x a), e portanto o problema reduz-se ao cálculo do declive m da recta. A ideia, consiste em aproximar a recta tangente tomando pontos Q sobre o gráfico de f próximos de P, calculando o declive da recta que passa por P e por Q e tomando o limite quando Q tende para P (ver figura 6): (1) Tomamos um ponto Q = (x,f(x)) sobre o gráfico próximo de P = (a,f(a)); (2) Calculamos o declive da recta que passa pelos pontos P e Q, que é dado por m x = f(x) f(a) x a (Repare que m x é a taxa de variação de f no intervalo [a,x].) (3) Determinamos o limite do declive desta recta quando o ponto Q tende para P, ou seja, quando x a. É este limite, quando existe, que é o declive da recta tangente: f(x) f(a) m = lim x a x a Reconhecemos de imediato que m é a derivada f (a) de f em x = a. f P a x 3 x 2 x 1 Figura 6. A recta tangente Considerações geométricas conduziram-nos à fórmula m = f (a) para o declive da recta tangente ao gráfico de f em (a,f(a)). A derivada é na verdade utilizada para definir a própria noção de recta tangente. Por outras palavras,
10 10 Definição 5 (Recta tangente): Seja f : D R R uma função diferenciável num ponto a D. A recta tangente ao gráfico de f no ponto (a,f(a)) é a recta com equação y f(a) = f (a) (x a). Exemplo 12. Seja f(x) = x 2 3. Para calcular a equação da recta tangente a f em x = 2 calculamos a derivada ( x 2 3 ) (2 2 3 ) Assim, a equação da recta tangente é Escrito doutra forma, y = 4x 7. f (2) = lim x 2 x 2 x = lim x 2 x 2 = lim(x+2) = 4 x 2 y = f(2)+f (2)(x 2) = 1+4(x 2) 6. Diferenciabilidade e derivadas laterais Recorde que uma função é diferenciável num ponto a se a sua derivada existir nesse ponto. Teorema 6: Se f : D R é diferenciável em a D então f é contínua em a. Demonstração. Basta observar que ( ) lim f(x) f(a) = lim x a = Å f(x) f(a) x a x a Å f(x) f(a) lim x a x a = f (a) 0 = 0 ã (x a) ã ( ) lim (x a) x a logo lim x a f(x) = f(a) pelo que f é contínua em a. É importante notar que uma função pode ser contínua num ponto sem ser diferenciável nesse ponto. Os próximos três exemplos ilustram esse facto. Exemplo 13. A função f(x) = 3 x é contínua mas não é diferenciável em x = 0 pois 3 x lim = lim x 0 x 0 x 0 3 = + x 2
11 Aula 14: Derivadas 11 Exemplo 14. Seja ( xsen 1 ) f(x) = x x 0 0 x = 0 f é o prolongamento por continuidade de xsen ( 1 x) a x = 0. Em particular f é contínua em x = 0. Para x 0, f(x) f(0) x 0 = xsen( ) 1 x x = sen ( ) 1 x Portanto o limite f(x) f(0) lim x 0 x 0 não existe. Concluimos que f não é diferenciável em x = 0. Exemplo 15. Seja f(x) = x = x, se x < 0, x, se x 0, O gráfico de f está representado na figura 7. Para x = 0 temos f(x) f(0) x 0 lim = lim = 1 e x 0 x 0 x 0 x f(x) f(0) x 0 lim = lim = 1. x 0 + x 0 x 0 + x Logo, apesar de ser contínua, a função módulo não é diferenciável em x = O exemplo 15 conduz-nos à Figura 7. Gráfico da função módulo. Definição 7 (Derivadas laterais): Chamamos derivada à direita e derivada à esquerda de f em x = a aos limites f d(a) = lim x a + f(x) f(a) x a e f e(a) = lim x a f(x) f(a) x a Exemplo 16. Como vimos no exemplo 15, as derivadas à direita e à esquerda de x em x = 0 são respectivamente 1 e 1. Resumindo, quando é que uma função não é diferenciável num ponto?
12 12 (1) O teorema 6 mostra que se f não é contínua em a então f também não é diferenciável em a. (2) O exemplo 13 ilustra outra situação: a função f(x) = 3 x é contínua em x = 0 mas tem derivada infinita na origem, indicando que o declive da recta tangente é infinito, ou seja, a recta tangente é vertical em x = 0. (3) O exemplo 15 ilustra outra situação: se f for contínua em a e as derivadas à esquerda e à direita existirem mas forem diferentes, então o limite lim f x não existe logo f não é diferenciável em x = a. Podemos pensar no gráfico de f como tendo duas semirectas tangentes, uma à esquerda e outra à direita, formando um bico em x = a. (4) Finalmente temos o caso em que as derivadas à direita ou à esquerda não existem em R. Estas derivadas são limites laterias, que só não existem se a taxa de variação f(x) f(a) x a oscilar muito numa vizinhança de a. O exemplo 14 ilustra essa situação. Figura 8. Funções não diferenciáveis 7. A função derivada O cálculo da derivada de f produz uma nova função, a que chamamos a função derivada, ou simplesmente a derivada de f. O seu domínio é o conjunto dos pontos em que f é diferenciável. Exemplo 17. Se f(x) = mx+b, a derivada de f é m em qualquer ponto a. Assim a derivada é a função constante f (x) = m. Exemplo 18. Seja f(x) = x. Então, para a > 0 Para a = 0 x a f ( x a)( x+ a) (a) = lim = lim x a x a x a (x a)( x+ a) = lim x a = 1 2 a x a (x a)( x+ a) = lim x a x 0 1 lim = lim x = + x 0 x 0 x 0 1 x+ a
13 Aula 14: Derivadas 13 portanto x não é diferenciável em x = 0. Assim, a derivada de f é a função f : ]0,+ [ R dada por f (x) = 1 2 x. Exemplo 19. Para diferenciar a função exponencial, observamos que ( e x ) e x+h e x = lim h 0 h e x (e h 1) = lim h 0 h = e x e h 1 lim h 0 h = e x A função exponencial tem assim a propriedade muito especial de ser igual à sua própria derivada. A derivada de f é uma função f, que podemos também derivar. A esta derivada chamamos a segunda derivada de f e escrevemos f = (f ). Exemplo 20. A derivada de f(x) = mx+b é f (x) = m. A segunda derivada é a derivada duma constante logo f (x) = 0. Exemplo 21. Como vimos, a derivada de f(x) = e x é f (x) = e x. Assim, a segunda derivada é de novo f (x) = e x. Podemos continuar indefinidamente derivando uma função, desde que as derivadas existam, obtendo a terceira derivada, quarta derivada, e assim sucessivamente, chamadas de derivadas de ordem superior. Voltaremos a este assunto posteriormente. 8. Regras de Derivação Teorema 8: (1) (mx+b) = m (2) (x n ) = nx n 1 (3) ( x) = 1 2 x (4) (lnx) = 1 x (5) (e x ) = e x Demonstração. Já provámos (1), (3) e (5) nos exemplos da secção 4. A derivada de x n no ponto a é dada por x n a n lim x a x a x = a é uma raiz do polinómio x n a n pelo que, usando a regra de Rufini chegamos facilmente a x n a n = (x a)(x n 1 +a x n 2 +a 2 x n 3 + +a n 2 x+a n 1 ) igualdade que se verifica também facilmente multiplicando os factores. Assim, x n a n lim x a x a = lim ( x n 1 +a x n 2 +a 2 x n 3 + +a n 2 x+a n 1) = na n 1 x a
14 14 Para provar (4) temos que calcular lnx lna ln(x/a) lim = lim x a x a x a x a Fazendo a substituição u = x/a, quando x a, u 1 logo lnx lna lnu lim = lim x a x a u 1 ua a = 1 a lim lnu u 1 u 1 = 1 a Exemplo 22. Tomando m = 0 em (1) vemos que a derivada duma constante é zero. Exemplo 23. A derivada de x n inclui como casos particulares n = 0 : A derivada de x 0 = 1 é zero. Como já referimos, a derivada de qualquer constante é zero. n = 1 : A derivada de x 1 = x é um que é o declive da recta. n = 2 : A derivada de x 2 é (x 2 ) = 2x. n = 3 : A derivada de x 3 é (x 3 ) = 3x Derivadas e operações algébricas As seguintes regras de derivação são de utilização constante: Teorema 9: Sejam f, g funções diferenciáveis num ponto a de acumulação de D f D g e seja c uma constante. Então, as funções f ±g, cf, f g e f/g (se g(a) 0) são também diferenciáveis em a com derivada dada por (1) (f ±g) = f ±g (2) (cf) = cf (3) ( f g ) = f g +f g (Regra de Leibniz) Å ã 1 (4) = g g g 2 Å ã f (5) = f g f g g g 2
15 Aula 14: Derivadas 15 Demonstração. (1) fica como exercício. Começamos por provar (3). (f g) (a) é dado por: (f g) (a) = lim x a f(x) g(x) f(a) g(a) x a f(x) g(x) f(a) g(x)+f(a) g(x) f(a) g(a) = lim x a x a Å = lim g(x) f(x) f(a) +f(a) g(x) g(a) ã x a x a x a f(x) f(a) g(x) g(a) = lim g(x) lim +f(a) lim x a x a x a x a x a = g(a) f (a)+f(a) g (a) onde na última igualdade se usou o facto de f e g serem diferenciáveis em a, bem como o facto de g ser também contínua em a. (2) é um caso particular da regra de Leibnitz quando g é uma constante. Provamos agora (4): Å ã 1 1 g(x) (a) = lim 1 g(a) g x a x a Å ã g(x) g(a) 1 = lim x a x a g(a) g(x) g(x) g(a) 1 = lim lim x a x a x a g(x) g(a) = g (a) g(a) 2 Usando a regra de Leibnitz obtemos (5): Å ã f =Å f 1 ã = f 1 g g g +f = f g f g g 2 = f g f g g 2 Å g Exemplo 24. Recorde que o logaritmo de base a é dado por log a x = lnx lna. Pela propriedade (2), ( loga (x) ) 1 ( ) 1 = lnx = lna xlna Exemplo 25. Podemos facilmente derivar um polinómio: ( 3x 4 +5x 2 +7x ) = ( 3x 4 ) + ( 5x 2 ) +(7x) g 2 ã por (1) = 3 ( x 4) +5 ( x 2 ) +7 por (2) = 3 4x x+7 Exemplo 26. Seja f(x) = lnx+ x xe x
16 16 Então, usando (5) obtemos ( ) xe lnx+ x (i) f x ( lnx+ x )( xe x) (x) = ( ) xe x 2 Usando (1) obtemos e usando (3) obtemos (ii) ( lnx+ x ) = ( lnx ) + ( x ) = 1 x x (iii) ( xe x) = (x) e x +x ( e x) = 1e x +xe x Substituindo (ii) e (iii) em (i) obtemos Ä 1 f x (x) = + ä 1 2 x xe x ( lnx+ x )( e x +xe x) x 2 e 2x 10. Derivadas das funções trigonométricas Vamos agora calcular as derivadas do seno e do coseno. Vamos primeiro motivar o resultado geometricamente, tomando para tal um ângulo θ 0 no primeiro quadrante e uma variação θ positiva. Observemos a figura: sen(θ 0 + θ) P R senθ 0 P 0 θ θ 0 O cos(θ 0 + θ) cosθ 0 Figura 9. Derivadas do seno e do coseno ConsideremosotriângulorectângulocomvérticesP,P 0,Resejaαoângulo PP 0 R. Então sen = P 0 R = P 0 P cosα e cos = PR = P 0 P senα
17 Aula 14: Derivadas 17 θ é o comprimento P 0 P do arco unindo os pontos P 0 e P logo (2) sen θ = P 0P P 0 P cosα e cos θ = P 0P P 0 P senα Tomamos agora o limite quando θ tende para zero. Então o quociente P 0 P/ P 0 P converge para um. O ângulo α é o ângulo entre a recta vertical passando por P 0 e a recta passando por P e por P 0. À medida que P se aproxima de P 0, a recta passando por P e por P 0 converge para a recta tangente à circunferência em P 0. θ 0 θ 0 Figura 10. Quando θ 0, α θ 0 Assim, o ângulo α converge para θ 0 quando θ tende para zero (ver figura 10) e portanto cosα cosθ 0 e senα senθ 0. Assim, dsen dθ = lim θ 0 P 0 P P 0 P cosα = cosθ 0 e dcos dθ = lim θ 0 Para tornar este argumento rigoroso começamos por provar o P 0 P P 0 P senα = senθ 0 Teorema 10: Para cada θ R seja P θ = (cosθ,senθ) R 2 o ponto correspondente sobre o círculo trigonométrico. Então P θ0 P θ lim θ θ 0 θ = lim θ θ 0 P θ0 P θ Ṗ θ0 P θ = 1 Demonstração. Faremos uma demonstração geométrica. Traçamos a bissectriz do ângulo θ e tomamos φ = θ/2. Então (ver figura 11) P θ0 P θ = 2senφ e Ṗ θ0 P θ = 2φ pelo que basta aplicar o limite notável senφ/φ 1. P θ φ P θ0 θ
18 18 Podemos agora provar o Figura 11. Demonstração do teorema 10 Teorema 11: As funções seno e coseno são diferenciáveis com derivadas (senθ) = cosθ e (cosθ) = senθ Demonstração. Vamos apenas calcular a derivada do seno pois o cálculo para o coseno é completamente análogo. Vamos primeiro calcular o limite de sen θ. Tomando os pontos P = (cosθ,senθ) e P 0 = (cosθ 0,senθ 0 ) temos lim sen θ θ 0 θ = lim sen PP 0 θ θ 0 PP 0 θ = lim sen PP 0 pois θ θ 0 PP 0 θ 1 Agora: 3 pelo que» PP 0 = (cosθ cosθ 0 ) 2 +(senθ senθ 0 ) 2 Åcosθ ã 2 cosθ0 = senθ senθ 0 +1 senθ senθ 0 sen lim = lim θ θ 0 PP 0 Para calcular este limite usamos a igualdade 1 θ θ Äcosθ cosθ0 0 senθ senθ 0 ä 2 +1 cosθ cosθ 0 = senθ +senθ 0 senθ senθ 0 cosθ +cosθ 0 cuja demonstração deixamos ao cuidado do leitor. Então, para cosθ 0 0 temos Å Å cosθ cosθ0 senθ0 lim θ θ 0 senθ senθ 0 ã 2 = cosθ 0 ã 2 = tan 2 θ 0 e para cosθ 0 = 0 o limite é 1/0 + = +. Verificamos então facilmente que 1 1 lim θ θ Äcosθ cosθ0 0 ä = 2 tan 2 θ senθ senθ = 1 = cosθ 0 sec2 θ 0 Repare que esta identidade permanece válida para cosθ 0 = 0, pois nesse caso o limite é 1/ = 0, igual a cosθ 0. Assim, provámos que (3) lim sen θ θ 0 θ = cosθ 0 Para tirar os módulos temos que estudar os sinais de sen θ e de cosθ 0. Vamos apenas ver o que se passa para θ 0 [ π 2, ] 3π 2. Como o seno e o coseno são periódicos de período 2π, os mesmos argumentos funcionam para qualquer θ 0 R. 3 Assumimos aqui que senθ senθ0. O leitor pode verificar que qualquer θ 0 R tem uma vizinhança na qual senθ senθ 0 desde que θ θ 0
19 Aula 14: Derivadas 19 No intervalo ] π 2, 2[ π o seno é crescente logo sen θ > 0. O coseno também é positivo neste intervalo logo sen θ = sen θ donde tiramos de imediato que e cosθ = cosθ sen lim = cosθ 0 θ θ 0 θ No intervalo ] π 2, [ 3π 2 o seno é decrescente logo sen θ < 0. O coseno também é negativo neste intervalo logo sen θ = sen e cosθ = cosθ θ donde tiramos de imediato que sen lim = cosθ 0 θ θ 0 θ Para θ 0 = π 2, π 2, 3π 2, cosθ 0 = 0 logo sen θ 0. Mas então sen θ 0 logo (sen) (θ 0 ) = 0 = cosθ 0 Provámos assim que (sen) (θ 0 ) = cos(θ 0 ) para qualquer θ 0 R. Podemos agora facilmente calcular as derivadas das outras funções trigonométricas: Teorema 12: As funções tangente e secante são diferenciáveis com derivadas (tanθ) = sec 2 θ e (secθ) = secθ tanθ Demonstração. Como tanθ = senθ cosθ, e as funções seno e coseno são diferenciáveis em R, a tangente é também diferenciável no seu domínio, e Como secθ = 1 domínio, e Resumindo temos (tanθ) = (senθ) cosθ senθ(cosθ) cos 2 θ cosθ = cos2 θ +sen 2 θ cos 2 θ = sec 2 θ e o coseno é diferenciável, a secante é diferenciável no seu (secθ) = (cosθ) cos 2 θ = senθ cos 2 θ = tanθsecθ Derivadas das funções trigonométricas: (senθ) = cosθ (cosθ) = senθ (tanθ) = sec 2 θ (secθ) = secθ tanθ
20 Aproximações lineares e diferenciais É geometricamente claro que a recta tangente ao gráfico de f num ponto x = a é uma aproximação muito boa do gráfico para valores de x próximos de a. Assim, podemos calcular aproximadamente f(x) para x a substituindo f pela sua recta tangente. Recordemos que a equação da recta tangente é e o gráfico de f é dado por Chamamos à aproximação y = f(a)+f (a)(x a) y = f(x) f(x) f(a)+f (a)(x a) aproximação linear de f em x = a. A ideia é que por vezes é fácil calcular f(a) e f (a) mas difícil calcular f(x) para outros valores de x próximos de a. Antes de tornarmos mais preciso o que se entende pela expressão boa aproximação para x próximo de a, vamos ver alguns exemplos. Exemplo 27. Para calcular aproximadamente 50 notamos que 50 está próximo de 49 = 7 2. Assim, tomando f(x) = x e a = 49 podemos aproximar 50 = f(50) por f(50) f(49)+f (49)(50 49) f (x) = 1 2 x logo, substituindo os valores, (50 49) = = = Podemosaproveitarestaaproximaçãoparaaproximartambém 2: como50 = 2 25, 50 = 5 2: logo = Exemplo 28. Em física a aproximação linear sen x x (válida para x 0) é frequentemente usada. Por exemplo, a equação dum pêndulo de comprimento L diz-nos que θ = g L senθ, em que g é a aceleração da gravidade. Para oscilações pequenas esta equação é aproximada por θ = g Lθ. Uma solução desta última equação é θ = sen (» g L θ) O que queremos dizer quando afirmamos que a recta tangente é uma boa aproximação do gráfico de f para x próximo de a? Vamos ver posteriormente como estimar o erro cometido ao aproximar o valor duma função pela recta tangente. Para já vamos interpretar a aproximação geometricamente. Para tal vamos ampliar o gráfico de f ao pé de (a,f(a)). Observemos a figura 12:
21 Aula 14: Derivadas 21 f Ampliação 10 Ampliação 100 Figura 12. Comparação entre o gráfico e a recta tangente (a tracejado) Olhando para o gráfico ao microscópio, quanto maior a ampliação mais o gráfico e a recta tangente se aproximam. No limite, a função e a sua recta tangente coincidem. Para tornarmos esta ideia precisa começamos por notar que o gráfico e a recta tangente são os pontos no plano da forma ( ) ( x,f(x) e x,f(a)+f (a)(x a) ) Vamos ver como ampliar o gráfico. Começamos por fazer uma translacção para colocar o ponto ( a,f(a) ) na origem: ( x a, f(x) f(a) ) ( x a, f (a)(x a) ) Uma ampliação por um factor k consiste em multiplicar ambas as coordenadas por k. Obtemos portanto ( k(x a), k(f(x) f(a)) ) ( k(x a), kf (a)(x a) ) Fazemos agora a substituição u = k(x a). Então x = a+u/k e temos ( u, k(f(a+u/k) f(a)) ) ( u, f (a)u ) que são os gráficos das funções f k (u) = k(f(a+u/k) f(a)) e T k (u) = f (a)u Como seria de esperar, a ampliação da recta tangente é também uma recta com o mesmo declive. Podemos agora tornar precisas as ideias acima referidas. Queremos tomar k cada vez maior. Para tal fazemos h = 1/k. e tomamos o limite quando h 0: Teorema: Para cada u temos lim h 0 f 1/h (u) = T 1/h (u). Demonstração: Fazendo a substituição y = hu, se h 0 então y 0 logo lim f f(a+hu) f(a) f(a+y) f(a) 1/h(u) = lim = lim u = f (a)u h 0 h 0 h y 0 y portanto f 1/h (u) T 1/h (u). 12. Infinitamente pequenos A noção de limite foi introduzida apenas no início do século XIX. Nos 150 anos precedentes o Cálculo foi desenvolvido com base na noção pouco precisa de números infinitamente pequenos. Esta maneira de pensar, embora não rigorosa, 4 pode ser uma grande ajuda à intuição. 4 É possível tornar estas ideias rigorosas mas tal involve matemática sofisticada
22 22 Já referimos brevemente variações infinitamente pequenas ao introduzir a noção de derivada: df/dx seria o quociente dos infinitamente pequenos df e dx. Retomemos essa discussão. Recorde que a taxa de variação f/ x duma função f num intervalo [a,x] é o declive da recta passando por (a,f(a)) e por (x,f(x)). A figura 13 representa a taxa de variação da função f(x) = e x 2x no intervalo [1, 1.5]. 1.5 f 1 f x Figura 13. Taxa de variação de f. Para variações x mais pequenas é conveniente ampliar a imagem. Uma ampliação porumfactork multiplicatodososcomprimentospork. Assim,oquociente f/ x permanece inalterado após uma ampliação pois o numerador e o denominador são ambos multiplicados por k. Ampliação: 5 x = 0.2 Ampliação: 10 x = 0.1 Ampliação: 20 x = f f f x x x Figura 14. Ampliações sucessivas. Na última secção vimos que ao ampliar sucessivamente o gráfico duma função diferenciável f ao pé dum ponto (a,f(a)), este converge para a sua recta tangente em a. Se prosseguirmos tomando variações x cada vez mais pequenas e ampliações cada vez maiores, no limite o gráfico de f converge para a sua recta tangente, como vimos na última secção. Assim, tomando uma variação infinitamente pequena dx e a correspondente variação df = f(a+dx) f(a) obtemos um triângulo:
23 Aula 14: Derivadas 23 Ampliação: df dx Figura 15. Variação infinitesimal dx. Como aplicação destas ideias vamos interpretar geometricamente as fórmulas das derivadas da tangente e da secante. Começamos por observar a figura: θ P R P 0 θ 0 1 secθ 0 Figura 16. Derivadas da secante e da tangente O círculo tem raio secθ 0 logo P 0 P = secθ 0 θ. Por outro lado, tan = P 0 R e sec = PR e assim (4) tan θ = secθ 0 P 0 R P 0 P e sec θ = secθ 0 PR P 0 P Tomando uma variação infinitamente pequena dθ obtemos a figura: P θ 0 R dθ P 0 π 2 θ 0 É então claro que Figura 17. Variação infinitesimal dθ P 0 R P 0 P = secθ 0 e PR P 0 P = tanθ 0 Substituindo em (4) obtemos (tanθ) = sec 2 θ e (secθ) = secθ tanθ.
24 Diferenciais Vamos agora ver como interpretar rigorosamente a variação infinitesimal df. A ideia é definir df não só para variações infinitamente pequenas dx da variável x, mas também para qualquer variação x de x. Definição 13: Chamamos à função o diferencial de f em x = a df = f (a) x Exemplo 29. O diferencial de f(x) = x em x = 49 é dado por df( x) = f (49) x = 1 14 x dx é então interpretado como o diferencial da função identidade I(x) = x: dx = I (a) x = x Podemos então interpretar df/dx como um quociente de funções: df = f (a)dx e df dx = f (a) f df x a a+ x Figura 18. Aproximação de f por df
25 Aula 15: Derivadas 25 Aula 15: Derivadas 14. Derivada de funções compostas e de funções inversas Continuamos com o nosso estudo de técnicas para o cálculo de derivadas, estudando a diferenciação de uma função composta, a que corresponde uma regra de derivação frequentemente chamada regra da cadeia. Teorema 14 (Regra da Cadeia): Sejam f,g funções, a D g um ponto de acumulação de f g, tal que g é diferenciável em a D g ; f é diferenciável em b = g(a) D f. Então (f g) é diferenciável em a e (f g) (a) = f (b) g (a) = f (g(a)) g (a). A notação de Leibnitz é particularmente adequada para cálculos desta natureza pois, se escrevermos y = f(u) e u = g(x), a regra da cadeia diz-nos que: 5 dy dx = dy du du dx Passemos à demonstração da regra da cadeia: Demonstração. A ideia da demonstração é simples: escrevendo u = g(x), f x = f u u x e tomando limites obtemos df dx = df du du dx. Mas há um problema com este raciocínio: u = g(x) g(a) pode ser zero para x a e nesse caso não podemos dividir por g(x) g(a). Para resolver esse problema note que, para g(x) g(a) temos (5) f x = f(g(x)) f(g(a)) = f(g(x)) f(g(a)) g(x) g(a) x a g(x) g(a) x a e fazendo a substituição u = g(x), Definimos f(g(x)) f(g(a)) f(u) f(g(a)) lim = lim = f (g(a)) x a g(x) g(a) u g(a) u g(a) T(u) = f(u) f(g(a)) u g(a) f (g(a)) se u g(a) se u = g(a) Repare que T é contínua. Podemos então reescrever a equação (5) como f(g(x)) f(g(a)) x a = T(g(x)) g(x) g(a) x a ( g(x) g(a) ) 5 Claro que cometemos aqui alguns abusos da notação: por exemplo, y representa ambas as funções f(u) e f(g(x))
26 26 Verificamos então facilmente que esta igualdade permanece válida quando g(x) = g(a) (desde que x a). Então f(g(x)) f(g(a)) g(x) g(a) lim = lim T(g(x)) lim = f (g(a))g (a) x a x a x a x a x a Exemplo 30. Queremos diferenciar y = sen(x 2 +1), que é a composição x x 2 +1 sen(x 2 +1) Escrevendo u = x 2 +1 temos y = senu logo dy dx = dy du dudx = cos(u) 2x = cos(x2 +1) 2x Exemplo 31. Vamos calcular a derivada de y = sen 5 (x). Para tal escrevemos u = senx. Então y = u 5 logo dy dx = dy du du dx = 5u4 cos(x) = 5sen 4 (x)cos(x). Exemplo 32. a x = exp(xlna) é a composição x xlna exp(xlna) Assim, escrevendo u = xlna temos a x = e u e da x dx = deu du du dx = eu lna = a x lna Exemplo 33. Já vimos que ( x n) = nx n 1 para n N. Podemos generalizar agora esta fórmula. Para a R e x > 0 temos x a = exp(alnx). Pondo u = a lnx, x a = e u logo dx a dx = deu du du dx = eu a x = axa x = axa 1 A fórmula obtida no último exemplo é importante: Teorema 15: Para qualquer a R e x > 0 temos d dx xa = ax a Derivada de funções inversas Vamos agora ver como diferenciar a inversa duma função. Seja f uma função injectiva diferenciável em a e seja b = f(a). Então - O gráfico de f 1 é a reflexão no eixo y = x do gráfico de f logo - A recta tangente ao gráfico de f 1 em b é a reflexão no eixo y = x da recta tangente ao gráfico de f em a. Teorema 16: A reflexão na diagonal y = x duma recta de declive m tem declive 1/m. Se m = 0 a reflexão é uma recta vertical.
27 Aula 15: Derivadas 27 Demonstração. Se y = mx + b, a reflexão em y = x é o gráfico da inversa. Resolvendo em ordem a x obtemos x = y/m b/m que é uma recta de declive 1/m. Daqui tiramos que - Se f (a) 0, a recta tangente ao gráfico de f 1 em b tem declive 1/f (a). - Se f (a) = 0 a recta tangente ao gráfico de f 1 em b é vertical. É este o conteudo do próximo teorema: Teorema 17: Seja f : I R uma função contínua e injectiva num intervalo I, e seja f 1 a sua inversa. Se f é diferenciável num ponto a I e f (a) 0, então f 1 é diferenciável no ponto b = f(a) e ( f 1 ) (b) = 1 f (a) = 1 f ( f 1 (b) ) Observação: f estar definida num intervalo garante que f 1 é contínua e que b é um ponto de acumulação de f(i) = D f 1. Demonstração. Queremos calcular ( f 1 ) (b) = lim y b f 1 (y) f 1 (b) y b Para tal fazemos a substituição x = f 1 (y). Como f 1 é contínua, se y b então x f 1 (b) = a. Como b = f(a) obtemos ( f 1 ) f 1 (y) f 1 (b) x a (b) = lim = lim y b y b x a f(x) f(a) = 1 f (a) Observação: EmnotaçãodeLeibnitz, sey = f 1 (x)ex = f(y)oteoremadiz-nos que dy dx = 1. dx dy Exemplo 34. A exponencial y = e x e o logaritmo x = lny são inversas uma da outra. Sabendo a derivada do logaritmo podemos deduzir a derivada da exponencial: (e x ) = 1 (lny) = 1 1/y = y Como y = e x recuperamos a fórmula (e x ) = e x. Analogamente, sabendo a derivada da exponencial, podemos deduzir a derivada do logaritmo: (lny) = 1 (e x ) = 1 e x Como e x = y recuperamos a fórmula (lny) = 1 y. Exemplo 35. (Derivada da raíz-n): Já sabemos que a derivada de n x = x 1 n é 1 n x 1 n 1. Vamos confirmar este resultado usando a fórmula da derivada da inversa.
28 28 Neste caso f 1 (x) é a função y = n x logo f(y) é a função x = y n, restringida a [0,+ [ se n for par. A derivada de f é dada por f (y) = ny n 1, que só se anula em y = 0, que corresponde a x = f(0) = 0. Portanto a função inversa f 1 (x) é diferenciável para x 0, e temos (f 1 ) (x) = 1 f (y) = 1 ny n 1 = 1 n y1 n Falta apenas escrever 1 n y1 n em função de x. Como y = x 1/n obtemos (f 1 ) (x) = 1 n ( x 1 n) 1 n = 1 n x 1 n (1 n) = 1 n x 1 n 1 Nos dois últimos exemplos já sabíamos à partida qual a derivada de f 1. Vamos ver agora como diferenciar as funções trigonométricas inversas: Exemplo 36. (Derivada do arco-tangente): Neste caso, f 1 (x) é a função θ = arctanx logo f(θ) é a restrição da função x = tanθ ao intervalo ] π/2,π/2[. A derivada de f é f (θ) = sec 2 θ = 1/cos 2 θ que nunca se anula. Portanto a função arctanx é diferenciável em R com derivada (arctan) (x) = 1 f (θ) = 1 sec 2 θ = 1 sec 2 (arctanx) Podemos simplificar sec 2 θ = sec 2 (arctanx): basta notar que sec 2 θ = 1+tan 2 θ = 1+x 2 logo (arctan) (x) = 1 sec 2 θ = 1 1+x 2 Exemplo 37. (Derivada do arco-seno): Neste caso, f 1 : [ 1,1] R é a função θ = arcsenxlogof(θ)éarestriçãodafunçãox = senθ aointervalo [ π 2, ] π 2. Neste intervalo a derivada f (θ) = cosθ só se anula nos pontos a = ± π 2, que correspondem a b = ±1. Portanto a função arcsen é diferenciável em ] 1,1[, com derivada (arcsen) (x) = 1 f (θ) = 1 cos(θ) Para simplificar cos(θ) = cos(arcsen x), observamos que cos 2 (θ) = 1 sen 2 (θ) = 1 x 2 logo cos(θ) = ± 1 x 2. No intervalo [ π 2, ] π 2, cos(θ) > 0, e portanto (arcsen) (x) = 1 cos(θ) = 1 1 x 2. Resumindo: Teorema 18: A função arctan é diferenciável em R e as funções arcsen e arccos são diferenciáveis em ] 1, 1[ com derivadas (arctan) (x) = x 2, (arcsen) (x) = e (arccos) 1 (x) = 1 x 2 1 x 2
29 Aula 15: Derivadas 29 Demonstração. Já calculámos as derivadas do arctan e do arcsen. Para calcular a derivada do arco-coseno basta recordar que arcsenx + arccosx = π logo (arccos) (x) = (arcsen) (x). 16. Diferenciação logarítmica Ao derivar certas funções, o logaritmo pode ser usado para simplificar as contas. Começamos por observar que a derivada de y = lnf(x) é f (x)/f(x). Porque y = lnu com u = f(x) e Assim, o método consiste em: dy dx = dy du du dx = 1 u f = f f (1) Tomar y(x) = lnf(x) e usar as propriedades do logaritmo para simplificar y. (2) Calcular a derivada y (x) (3) A derivada de f pode ser obtida a partir de y : y = f /f logo f = f y. Exemplo 38. Queremos derivar f(x) = (senx) cosx, x ]0,π[. Usando as propriedades do logaritmo obtemos lnf(x) = ln ( senx cosx) = cos(x)ln(senx) Derivando obtemos f (x) f(x) = sen(x)ln(senx)+cos(x)cos(x) sen(x) Multiplicando tudo por f(x) = (senx) cosx obtemos Å ã f (x) = (senx) cosx senxln(senx)+ cos2 x senx Exemplo 39. Queremos calcular a derivada de f(x) = x4 3 1 x 2 4 2x+3 Aplicando logaritmos lnf(x) = 4 3 lnx+ 1 2 ln(1 x2 ) 1 4 ln(2x+3) Derivando Logo f (x) f(x) = 4 3x + 2x 2(1 x 2 ) 2 4(2x+3) Å f (x) = x4 3 1 x x+3 3x x 1 x 2 1 ã 4x+6
30 O teorema de Lagrange O Teorema de Weierstrass garante a existência de máximo e mínimo de uma função contínua num intervalo [a,b]. A grande importância deste teorema reside na seguinte observação (ver figura 19): Se f(c) é o valor máximo de f, a recta tangente ao gráfico de f em c é horizontal Mais precisamente: Teorema 19 (Fermat): Seja f uma função definida num intervalo aberto ]a, b[. Se f atinge seu valor máximo ou mínimo num ponto c ]a,b[ e f é diferenciável em c, então f (c) = 0. Demonstração. Supomos que f tem um máximo no ponto c ]a,b[ e é diferenciável nesse ponto (a demonstração é inteiramente análoga para o caso do mínimo). Sabemos então que f(x) f(c) para qualquer x. Então, como f é diferenciável no ponto c, f (c) = f e(c) f(x) f(c) = lim 0. x c x c pois x c < 0 e f(x) f(c) 0. Analogamente, f (c) = f d(c) f(x) f(c) = lim 0. x c + x c pois x c > 0 e f(x) f(c) 0. Concluimos que f (c) = 0. Assim, se garantirmos que o máximo e o mínimo de f não podem ambos ocorrer nos extremos do intervalo, podemos concluir que f se anula pelo menos uma vez no intervalo em questão. O Teorema de Rolle formaliza esta ideia: Teorema 20 (Teorema de Rolle): Seja f uma função contínua num intervalo limitado e fechado [a,b], e diferenciável em ]a,b[. Se f(a) = f(b) então existe um c ]a,b[ tal que f (c) = 0. Demonstração. Como f está nas condições do Teorema de Weierstrass, sabemos que f tem máximo e mínimo em [a,b]: M = max [a,b] f e m = min [a,b] f. Se M = m, então f é uma função constante em [a,b] pelo que f (c) = 0 para qualquer c ]a,b[. Se M > m, então a hipótese f(a) = f(b) implica que pelo menos um dos valores M ou m seja assumido por f num ponto c ]a,b[. Temos então que f tem um máximo ou um mínimo nesse ponto c. Como f é por hipótese diferenciável, f (c) = 0.
31 Aula 15: Derivadas 31 a c b Figura 19. Interpretação geométrica do Teorema de Rolle. O Teorema de Rolle especializa-se por vezes ao caso em que f(a) = f(b) = 0, de que resulta a seguinte observação: Teorema 21: Entre dois zeros de uma função diferenciável, existe sempre pelo menos um zero da sua derivada Exemplo 40. Vamos ver que para quaisquer valores de a e b, a equação e x = ax+b tem no máximo duas soluções. Para tal tomamos a função f(x) = e x ax b. Os zeros de f são as soluções da equação. Se f tivesse três zeros x 1 < x 2 < x 3, f teria pelo menos dois zeros, um entre x 1 e x 2 e outro entre x 2 e x 3. Mas f (x) = e x a tem no máximo um zero pois e x é injectiva. Concluimos que f tem no máximo dois zeros. O teorema de Lagrange generaliza o teorema de Rolle para o caso em que f(a) f(b). Este teorema garante que existe uma recta tangente ao gráfico paralela à recta que passa pelos pontos P a = (a,f(a)) e P b = (b,f(b)) do gráfico (ver figura 20). A recta que passa por P a e P b tem declive f(b) f(a) b a portanto Teorema 22 (Teorema de Lagrange): Seja f uma função definida e contínua num intervalo limitado e fechado [a, b], e diferenciável em ]a, b[. Então, existe pelo menos um ponto c ]a,b[ tal que f (c) = f(b) f(a) b a. É difícil subestimar a relevância do Teorema de Lagrange para o cálculo, porque é efectivamente um dos seus resultados mais centrais. Muitos dos resultados que iremos encontrar daqui em diante são uma consequência mais ou menos directa do teorema de Lagrange.
32 32 a c b Figura 20. Interpretação geométrica do Teorema de Lagrange. Demonstração. Seja g a recta que passa pelos pontos ( a,f(a) ) e por ( b,f(b) ), ou seja, g(x) = f(a)+m(x a) em que m = f(b) f(a) b a Então f e g coincidem para x = a,b, portanto a função f g anula-se em a e em b. Assim, pelo teorema de Rolle, a derivada (f g) = f g possui um zero em ]a,b[, ou seja, existe um c ]a,b[ tal que f (c) = g (c) = m = f(b) f(a) b a Observação: O quociente f(b) f(a) b a é a taxa de variação média de f no intervalo [a,b]. Assim, o teorema de Lagrange diz-nos que existe um ponto c tal que a taxa de variação instantânea em c, f (c), é igual à taxa de variação média de f em [a,b].
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