DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL
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- Esther das Neves Monsanto
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1 DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL Laboratório de Ensino, Pesquisa e Extensão Linha de Pesquisa e Contextualização Teórica A linha de pesquisa do LADETER surgiu da necessidade de aprofundar a reflexão teórica e incentivar os estudos empíricos, sobre as estratégias dos atores na mobilização dos territórios e suas instituições para o desenvolvimento local e regional no mundo contemporâneo. Ela deve incentivar o estudo das experiências práticas entre os alunos na elaboração de monografias, dissertações e teses. Os pontos apresentados a seguir procuram fazer uma mediação entre as teorias, as pesquisas acadêmicas e as políticas públicas implementadas pelos diferentes setores da sociedade, na perspectiva de sistematizar algumas noções que ajudem a interpretar a relação entre sociedades, mercados, territórios e desenvolvimentos possíveis. A recomposição territorial As últimas décadas do século XX foram marcadas por uma nova reestruturação das escalas espaciais no planeta, que se apresenta numa recomposição territorial provocada pela rápida evolução dos meios de transporte, de comunicação e de produção de bens e serviços. Esse processo é o resultado de uma reorganização política do mundo, em termos de uma quádrupla hierarquia de relações de governança. A cúpula desta hierarquia se consiste em um regime global emergente feito de organizações supranacionais, de acordos internacionais, de convenções diplomáticas etc. O segundo estágio superior é composto de unidades econômicas-políticas que se consiste nos blocos multi-nações como a União Européia, Nafta, Apec, Mercosul etc. O terceiro nível na hierarquia é constituído pelos Estados soberanos, que se distanciam cada vez mais dos centros de destilação do poder econômico e político no mundo moderno. O quarto e último nível da hierarquia é constituído por um vasto grupo de regiões que formam um
2 mosaico global complexo. Nesse caso, o local ou a região se apresenta hoje como uma configuração espacial descentralizada da territorialidade global, que integra instâncias simultâneas de controle, de poder e de estratégias (BENKO, 1996; SCOTT, 1998; STORPER, 1997). A territorialidade é, portanto, um atributo do território ou dos seus ocupantes? Vive-se o cotidiano no território nacional ou no lugar? Essas perguntas parecem importantes porque estão ligadas ao saber da região ou do local, nutrido pelo cotidiano, que atua em contraposição ao saber do expert de fora (SANTOS, 1999). Nesse caso, o saber local se apresenta como a ponte para a produção de uma política e de uma técnica de desenvolvimento, resultado de saberes e sábios locais. Assim, o local colhe no mundo atributos que o realizam histórica e geograficamente. É o mundo (global) que se dá seletivamente no lugar (local). Portanto, o saber local não é independente do saber global. E a cidade, que abriga a parte esmagadora dos empregos, é cada vez mais um intermediário na política, na produção direta e no processo técnico da produção em relação ao mundo capitalizado (SANTOS, 1999). É nesse quadro de complexas hierarquias e múltiplas combinações espaciais que a questão do desenvolvimento deve ser colocada. O território revisitado A racionalidade no final do século XX chega finalmente ao território, extrapolando a economia, a sociedade e a política. A literatura especializada em geral já vem demonstrando que o próprio território, em certos lugares, acaba por tornar-se mais racional, mais produtivo, o que torna possíveis participações diferentes no processo de integração nacional e na globalização. Portanto, o território tem de ser visto como algo que está em constante processo de mudança, como um campo de forças, como o lugar do exercício, de dialéticas e contradições entre as escalas geográficas, entre o Estado, a sociedade e o mercado, entre o uso econômico e o uso social dos ativos e recursos. A primeira reflexão crítica sobre as origens e os usos dos territórios nas ciências econômicas, sociais e geográficas, nos conduziu até agora para uma concepção
3 abrangente em que o território local e regional deve ser entendido como um espaço geográfico de tamanho variável, geralmente intra-nacional, mas que não se reduz a uma escala de planejamento estatal das políticas públicas locais/regionais, nem tampouco a uma condição de suporte das atividades econômicas. O(s) território(s) local e regional está para além disto, pois se constitui em um produtor de externalidades complexas, uma escala geográfica de proximidades organizacionais, um espaço de coordenação de ações entre os atores sociais (GUILHON et alli, 1997; GILLY;TORRE, 2000). Desta forma, o território é uma escala portadora de uma dimensão institucional que se situa entre o indivíduo, a comunidade e os sistemas produtivos locais/regionais, nacionais e internacionais (COLLETIS; PECQUEUR, 1993). O território é também formado por uma rede de lugares (SANTOS, 1994; VELTZ, 1996) ou por uma rede de empresas (CHESNAIS, 1998; CASTELLS, 1996, VELTZ, 1996), isto é, uma constituição de um espaço abstrato de cooperação entre diferentes atores, dispostos a engendrar os processos de criação dos recursos particulares (sociais, econômicos e virtuais), com o objetivo de implantar projetos, resolver problemas e apontar para soluções inéditas (GILLY & PECQUEUR, 1995; BENKO & PECQUEUR, 2001). A pressão regional desigual é o resultado da diferenciação do uso do território, e se constitui em possibilidade de identificar as políticas e as práticas de desenvolvimento viáveis, destinadas a reforçar as propriedades que favorecem a produtividade das regiões e o bem-estar social nos países em desenvolvimento (SCOTT, 2003). Assistimos assim, nos últimos anos, ao reaparecimento da preocupação com os fatores subjetivos do território, entre os quais, a confiança interpessoal, a solidariedade, a reciprocidade e a tolerância. Os fatores de caráter cultural e histórico foram resgatados pela introdução do conceito de capital social, para auxiliar na compreensão de como as crenças das pessoas podem atuar como elemento tangível na constituição de uma cultura política local e regional mais cívica e participativa (PUTNAM, 1996; CORREA, 2003). Essas abordagens negam o território como um simples espaço delimitado de
4 recursos, e o resgata como o modo de estabelecimento de um grupo, no meio ambiente natural, que na organização das localizações das atividades, instaura e faz prevalecer as condições da comunidade-linguagem e da aprendizagem coletiva (PERRIN, 1992; apud GILLY; PECQUEUR, 1995:304). O território está assim assimilado a um meio complexo que reagrupa em um todo coerente um aparelho produtivo, uma cultura técnica e os atores (MAILLAT; PERRIN, 1992). O território usado é o quadro da vida de todos nós, na sua dimensão global, na sua dimensão nacional, nas suas dimensões intermediárias e na sua dimensão local, que constitui o traço de união entre o passado e o futuro imediatos (SANTOS, 1999:19). Essa reflexão crítica sobre a idéia de território coloca a questão da identidade e da representação simbólica. A construção do território compreende a procura de critérios objetivos e subjetivos de identidade local ou regional, que podem ser objetos das lutas pelo poder de representações mentais, materiais e de manifestações sociais (BOURDIEU, 1989). A construção da identidade coletiva depende em grande medida dos determinantes do conteúdo simbólico dessa identidade, bem como de seu significado para aqueles que com ela se identificam ou dela se excluem (CASTELLS, 1999b). Visto deste horizonte de análise, o território local pode compreender, portanto, um determinado espaço cognitivo um município, rede de municípios, arranjos produtivos, bacias hidrográficas, eixos de integração, vales que atenda aos seguintes condicionantes: (i) possua sinais de identidade coletiva (sociais, culturais, econômicos, políticos, ambientais, históricos, etc); (ii) mantenha ou tenha capacidade de promover uma convergência em termos de expectativas de desenvolvimento; e (iii) promova ou seja passível de uma integração econômica e social, no âmbito local (COCCO & GALVÃO & SILVA, 2003; MONIÉ & SILVA, 2003; SEBRAE, 2003). Portanto, o sentimento de pertencimento a um território e a identidade coletiva em torno de um projeto comum de desenvolvimento, depende muito mais dos efeitos de proximidade organizacional e cognitiva de suas redes do que das divisões geopolíticas e administrativas.
5 Território e desenvolvimento em ação: o desenvolvimento territorial O conceito de desenvolvimento [e subdesenvolvimento] tem uma história, fatores explicativos, conteúdos e objetivos. Nos anos noventa, as teorias do desenvolvimento convergiram para uma concepção mais institucionalista e sistêmica, antípoda das abordagens economicistas, tradicionalmente centradas nas tecnologias, na demografia e nos mercados. A mesma palavra desenvolvimento hoje é carregada de controvérsias, de diversidades de experiências nacionais (América Latina, Ásia, África) e não se refere mais às mesmas definições nem aos mesmos fatores explicativos há meio século atrás. Faz-se necessário reconciliar teoria, observação e prática (BOYER, 2001). Estas controvérsias do desenvolvimento também atingem as teorias e as noções de desenvolvimento territorial, uso cada vez mais freqüente na literatura especializada (STORPER, 1997; PECQUEUR, 2001; BENKO & PECQUEUR, 2001; BOISIER, 2003; MAILLAT, 2002, VEIGA, 2002; RIBAS et al, 2004; PIRES et al, 2006; PIRES, 2006). Tal tendência indica uma revalorização da dimensão espacial-territorial na economia, na sociologia e na geografia, mas também o hábito corrente de se acrescentar adjetivos ao substantivo desenvolvimento. Para nós, a investigação aqui exposta procura avançar proposições sobre a real relevância territorial no processo objetivo de desenvolvimento, que decorre dos debates sobre as escalas, dos papéis dos atores e dos recursos criados. Nas ligações entre territorialidade e desenvolvimento, o desenvolvimento territorial pode ser concebido como um processo de mudança estrutural endógeno, capaz de produzir solidariedade e cidadania, que possa conduzir de forma integrada e permanente a mudança qualitativa e a melhoria do bem-estar da população de uma localidade ou uma região. Esse processo endógeno de mudança econômica e social do território é dinamizado por estratégias e expectativas dos agentes locais/regionais, nas quais as políticas públicas, as instituições, as organizações e as governanças seriam recursos, a um só tempo disponível e a
6 serem criados (inventados e/ou inovados) no local ou região (PIRES, MULLER, VERDI, 2006). Assim sendo, as regiões, ou ainda melhor, os territórios, tornaram-se cada vez mais as fontes específicas de ativos, recursos e vantagens competitivas, mas também de solidariedade no desenvolvimento nacional e internacional. A pressão territorial das regiões provém de aglomeração geográfica de pessoas e atividades econômicas, e se exprime nos aumentos diferenciados da produtividade no território nacional. A constatação da concorrência territorial e da solidariedade territorial é contraditória entre várias regiões, e isto tem contribuído para estimular as novas teorias de crescimento e desenvolvimento territorial. Portanto, a idéia de que o desenvolvimento é localizado e dependente de ativos e recursos próprios a certas regiões ( capital natural, capital humano, capital social ), está na origem de numerosos estudos que trazem novas luzes para entender os mecanismos de indução do desenvolvimento local e regional. Essa idéia de desenvolvimento localizado vai se inserir no cenário de municipalização dos territórios nacionais com a descentralização do Estado no final dos anos 80. No Brasil, essas experiências de desenvolvimento territorial local foram inicialmente estimuladas por três fatores principais: (i) a busca de oportunidades de emprego e renda no âmbito municipal; (ii) a necessidade de atrair investimentos por meios da guerra fiscal entre estados e regiões; (iii) a descentralização constitucional dos serviços públicos (AFFONSO, 2001). Entretanto, outras experiências de indução do desenvolvimento territorial como os Arranjos Produtivos Locais, os Consórcios de Municípios, os Comitês de Bacias e os Eixos de Integração, foram se constituindo no final dos anos 90 em alternativas de governança territorial que parecem alterar a antiga noção do desenvolvimento regional do país. Assim, faz-se necessário o entendimento das identidades e dos novos fatores sócio-espaciais que apresentam alternativas e variedades de possíveis modos de desenvolvimento e de regulação local/regional dos territórios. Partindo deste contexto universal, os estudos sobre o Desenvolvimento
7 Territorial devem ser orientados para responder a quatro questões básicas: Qual a história do local ou da região na divisão espacial do trabalho? Como se constrói a coesão e a identidade de um território local/regional? De que maneira as dinâmicas de proximidade, quanto à forma de uso dos ativos e recursos do território, podem contribuir para os estudos das estratégias de desenvolvimento econômico e social? Quais são os fatores explicativos do desenvolvimento territorial? As Hipóteses As mudanças na competitividade territorial das nações e das regiões na economia global ocorrem sob conflitos entre atores públicos e privados nos processos de integração econômica, que aumentam a instabilidade do território, incapaz de se regular pelo poder único do Estado. A regulação do território, a gestão, a coordenação e a governança territorial ultrapassam as políticas públicas dos governos nacionais, estaduais e locais - e passam cada vez mais a funcionar por formas institucionais e por redes de adesão dos agentes hegemônicos locais (agências, conselhos, fóruns) em articulação com agentes nacionais e transnacionais. Nesse processo, o principal fator de diferenciação dos territórios pode não resultar do preço relativo imediato dos fatores clássicos de produção (matéria prima, capital e trabalho) nem dos custos de transportes (proximidade geográfica), mas da oferta potencial dos ativos e recursos específicos não susceptíveis na concorrência espacial/territorial (matérias primas quase-insubstituíveis, a força de trabalho qualificada, informação programada, cultura local, acumulação de memória e de aprendizagem coletiva cognitiva). Fica cada vez mais evidente a importância do recurso específico imaterial das organizações e das instituições locais como fatores inerentes ao desenvolvimento territorial, isto é, das relações não-mercantis nos processos de desenvolvimento (proximidade organizacional, coordenação de externalidades, cumprimento de normas e regras). As atividades do Laboratório em pesquisa e extensão devem
8 testar estas suposições. Referencias Bibliográficas. *AGHÓN Gabriel, ALBUQUERQUE Francisco, Cortés Patrícia (2001), Desarrollo Económico Local Y Descentralización en América Latina: análisis comparativo, Cepal/Gtz, Santiago de Chile. *BENKO, Georges (1996), A recomposição dos espaços, In Interações. Revista Internacional de Desenvolvimento Local, volume 1, número 2, março 2001, pp *BENKO Georges & PECQUEUR Bernard (2001). Os recursos de territórios e os territórios de recursos. Geosul, Florianópolis, v.16, n.32, p.31-50, jul./dez. BOURDIEU Pierre (1989), A identidade e a representação. Elementos para uma reflexão crítica sobre a idéia de região, In O Poder Simbólico, Ed. Difel, São Paulo, pp *BOYER Robert (2001), L après-consensus de Washington: institutionnaliste et systémique?, In L Année de la régulation, vol. 5. Ed. Association recherche et régulation, Paris. *CASTELLS, Manuel (1999), A Sociedade em Rede, In A Era da Informação: Economia Sociedade e Cultura (vol 1). Ed Paz e Terra, São Paulo, caps. 2,3,4. CASTELLS Manuel (1999b), O Poder da Identidade. In A Era da Informação: Economia Sociedade e Cultura (vol 2). Ed Paz e Terra, São Paulo, caps. 1,5. CHESNAIS, F. (1996), A Mundialização do Capital. São Paulo, Ed. Xamã, cap5. COCCO G. & GALVÃO A.P. & SILVA G. (Orgs.) (2003), Capitalismo Cognitivo: trabalho, redes e inovação. Rio de Janeiro, Ed. DP&A. COLLETIS Gabriel & PECQUEUR Bernard (1993), Integration des espaces et quase integration des firmes: vers de nouvelles rencontres productives?, In Revue d Economie Régionale et Urbaine, n. 3, pp CORREA Sílvio M. de Souza (org) (2003). Capital Social e Desenvolvimento Regional. Santa Cruz do Sul, Edunisc. *GILLY Jean-Pierre & PECQUEUR Bernard (1995) La dimension locale de la régulation, In BOYER R. & SAILLARD Y. (orgs.). Théorie de La Régulation: l état des savoir. La Découverte, Paris. *GILLY Jean-Pierre & TORRE André (2000) Dynamiques de Proximité. L Harmattan, Paris.
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