Seção Judiciária do Distrito Federal 6ª Vara Federal Cível da SJDF

Transcrição

1 Seção Judiciária do Distrito Federal 6ª Vara Federal Cível da SJDF PROCESSO: CLASSE: MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO (119) IMPETRANTE: ASSOCIACAO NACIONAL DOS DELEGADOS DE POLICIA FEDERAL IMPETRADO: DIRETOR GERAL DO DEPARTAMENTO DE POLICIA FEDERAL DECISÃO O Impetrante pretende obter medida liminar para determinar que a autoridade impetrada abstenha-se de expedir notificações e de efetivar qualquer desconto na folha de pagamento de seus filiados, com o objetivo de reaver valores pagos a título do reajuste de 84,32% em razão da decisão proferida nos autos da ação cautelar nº , devendo, ainda, suspender os procedimentos de notificação e reposição em andamento. Narra que, nos autos da ação cautelar nº , ajuizada por Ana Júlia Ramos Vilela perante a 3ª Vara da Seção Judiciária de Goiás, o pedido liminar foi deferido para determinar à União o pagamento do percentual 84,32%, relativo ao IPC de março de Informa que, após ingresso da Federação Nacional dos Policiais Federais FENAPEF no referido processo, na condição de litisconsorte ativa, o Departamento de Polícia Federal DPF estendeu, administrativamente, a decisão a todos os servidores da Polícia Federal, inclusive aos delegados de Polícia Federal filiados à Impetrante. Afirma que o Tribunal Regional Federal da 1ª Região, nos autos do agravo de instrumento nº , suspendeu a liminar aludida, de modo que o último pagamento feito aos servidores da Polícia Federal se deu em agosto de Em , a sentença julgou improcedente o pedido, determinando a devolução dos valores recebidos pelos servidores. Em outro processo (autos nº ), ajuizado pelo Sindicato dos Policiais Federais do Estado de Goiás SINPEFGO, deferiu-se o mesmo pedido liminar para conceder aos respectivos filiados o direito reconhecido na primeira ação, mas a decisão, em 1994, também veio a ser reformada. Noticia que, apesar das tentativas da União de restituição dos valores pagos aos servidores por força as decisões judiciais revogadas, as cobranças tiveram início apenas em 2011.

2 Em face da prescrição quanto à cobrança desses valores, o SINPEFGO impetrou o mandado de segurança coletivo nº , cuja segurança foi concedida, declarando a impossibilidade de restituição dos valores recebidos pelos filiados ao Sindicato em virtude das referidas ações. Semelhante ação foi proposta pela FENAPEF (mandado de segurança nº ), cuja liminar foi deferida pelo juízo da 1ª Vara da Seção Judiciária do Distrito Federal. Aduz que, como as últimas decisões referem-se somente aos servidores que eram filiados às entidades coletivas que ajuizaram as ações na década de 1990, os delegados de Polícia Federal beneficiados administrativamente a partir de determinação do DPF estão na iminência de sofrer descontos em seus contracheques, o que reputa indevido, visto que: a) operou-se a prescrição, a teor do art. 1º do Decreto nº / o último pagamento aos substituídos ocorreu em agosto de 1996; b) as verbas recebidas de boa-fé e possuem caráter alimentar. Instruiu a inicial com documentos. Custas recolhidas. Afastada a hipótese de conexão com o mandado de segurança nº , determinou-se a oitiva da pessoa jurídica interessada para se manifestar no prazo de 72 (setenta e duas) horas. Em sua manifestação, a União argumentou que as verbas indevidas foram recebidas de modo precário pelos servidores, hipótese em que se admite a restituição ao erário, tal como permitido pelo art. 46 da Lei nº 8.112/1990 e pela jurisprudência pátria. DECIDO. A concessão da medida liminar pressupõe os seguintes requisitos previstos no art. 7º, III, da Lei nº /2009: fundamento relevante (fumus boni iuris) e risco de ineficácia da medida (periculum in mora). Em exame de cognição sumária, vislumbro a presença de ambos os requisitos. Recentemente, o Supremo Tribunal Federal interpretou a disposição contida no art. 37, 5º, da Constituição e fixou o entendimento, em sede de repercussão geral, de que é prescritível a ação de reparação de danos à Fazenda Pública decorrente de ilícito civil (Tribunal Pleno, RE , Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em , DJ ). Por isso, salvo nos casos de improbidade administrativa, em que a pretensão é imprescritível, o poder público deve ajuizar a ação de ressarcimento ao erário dentro do prazo prescricional previsto em lei.

3 Embora exista alguma controvérsia, sobretudo na doutrina, o Superior Tribunal de Justiça vem entendendo que o prazo prescricional aplicável à pretensão da Fazenda Pública é quinquenal, nos termos do art. 1º do Decreto nº /1932, tendo por base o princípio da isonomia. Confira-se, a propósito, o seguinte julgado (grifou-se): PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE. SÚMULA 284/STF. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211/STJ. RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DE VEÍCULO. REPARAÇÃO CIVIL. PRESCRIÇÃO. DECRETO /32. QUINQUENAL. INAPLICABILIDADE DO CÓDIGO CIVIL. DEVER DE INDENIZAR E NEXO CAUSAL. SÚMULA 7/STJ. JUROS MORATÓRIOS. TERMO INICIAL. EVENTO DANOSO. PRECEDENTES. 1. Cuida-se originalmente de ação ressarcitória, proposta pelo Distrito Federal, com o intuito de ser ressarcido na quantia de R$ ,66, decorrentes de acidente de trânsito, envolvendo veículo oficial e ônibus da parte agravante. 2. Não prospera a alegada violação do art. 535 do Código de Processo Civil, uma vez que deficiente sua fundamentação. Incidência, por analogia, o disposto na Súmula 284/STF. 3. Verifica-se que a Corte de origem não se pronunciou, ainda que implicitamente, acerca dos arts. 467 ao 469, 471, I e II, e 472 do Código de Processo Civil. Desse modo, impõe-se o não conhecimento do recurso especial por ausência de prequestionamento, entendido como o indispensável exame da questão pela decisão atacada, apto a viabilizar a pretensão recursal. Assim, incide no caso o enunciado da Súmula 211 do Superior Tribunal de Justiça. 4. A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que a prescrição contra a Fazenda Pública é quinquenal, mesmo em ações indenizatórias, uma vez que é regida pelo Decreto /32, norma especial que prevalece sobre lei geral. De fato, a Primeira Seção desta Corte de Justiça, na assentada do dia 12/12/2012, no julgamento do REsp /PR (Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe 19/12/2012), submetido à sistemática dos recursos repetitivos, art. 543-C do CPC, consolidou o entendimento segundo o qual é quinquenal o prazo prescricional para propositura de ação de cobrança contra a Fazenda Pública, nos termos do art. 1º do Decreto /32, afastada a aplicação do Código Civil. 5. O STJ tem entendimento jurisprudencial no sentido de que o prazo prescricional da Fazenda Pública deve ser o mesmo prazo previsto no Decreto /32, em razão do princípio da isonomia. Precedentes. 6. O Tribunal de origem, soberano na análise das matérias fáticas-probatórias, concluiu que ficou demonstrado o nexo de causalidade e o dever de indenizar. Portanto, modificar o acórdão recorrido, como pretende o recorrente, no sentido de afastar a responsabilidade e o nexo de causalidade, caracterizado pelo

4 Tribunal a quo, demandaria o reexame de todo o contexto fático-probatório dos autos, o que é defeso a esta Corte em vista do óbice da Súmula 7/STJ. 7. De acordo com jurisprudência desta Corte, os juros moratórios, em caso de responsabilidade extracontratual, devem incidir a partir da data do evento danoso, nos termos da Súmula 54/STJ. Precedentes. Agravo regimental improvido. (STJ, 2ª Turma, AgRg no AREsp /DF, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, DJ ) No caso vertente, os documentos constantes dos autos demonstram que, nos autos da ação cautelar nº , em que o pedido liminar foi deferido para determinar o pagamento do percentual de 84,32% à servidora autora, tal decisão foi estendida pela administração pública a todos os servidores, inclusive aos não sindicalizados, em que se incluem os delegados de Polícia Federal. Posteriormente, a decisão foi revogada e a sentença proferida nos autos julgou improcedente o pedido, tendo havido o trânsito em julgado no dia Conforme afirmado no âmbito do processo nº (ajuizado pelo SINPEFGO contra a determinação combatida nos presentes autos), no curso da cautelar revogaram-se as determinações no sentido de se processar a liquidação de sentença por artigos, impondo à União que procedesse ao desconto dos valores recebidos por força da decisão, na via administrativa, observada a ampla defesa e o contraditório. Assim sendo, verifica-se a nítida ocorrência da prescrição, na medida em que desde o trânsito em julgado da sentença proferida na ação cautelar nº os valores recebidos poderiam ser cobrados. O trânsito em julgado se deu no ano de 1996 e o prazo quinquenal contado a partir de tal data transcorreu sem que as cobranças fossem efetivas - as notificações coligidas aos autos foram emitidas em Por isso, impõe-se o reconhecimento da prescrição da pretensão do poder público. Tais fundamentos justificam o acolhimento da pretensão autoral, independentemente da existência ou não de boa-fé dos filiados da Impetrante. O risco de perecimento de direito existe porque as notificações impugnadas nos presentes autos já foram expedidas, de modo que a qualquer momento poderão ocorrer descontos nas folhas de pagamento dos filiados da Impetrante.

5 Pelo exposto, DEFIRO o pedido liminar para determinar que a autoridade impetrada: a) abstenha-se de efetivar qualquer desconto (e suspensa eventual desconto em curso) na folha de pagamento dos filiados da Impetrante, objetivando reaver valores pagos a título do reajuste de 84,32% em razão da decisão proferida nos autos da ação cautelar nº ; b) suspenda os procedimentos de notificação e reposição em andamento, abstendo-se de expedir novas notificações até o julgamento final desta demanda. Intime-se para cumprimento imediato. Ao Ministério Público Federal, para os fins do art. 12 da Lei nº /09. Oportunamente, voltem os autos conclusos para sentença. Brasília, 07 de julho de (assinatura digital) IVANI SILVA DA LUZ Juíza Federal Titular da 6ª Vara/DF