Conferência "Actuais Desafios para o Mercado de Capitais Português com a Adesão à Euronext"
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- Nathan Rodrigues Galvão
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1 Conferência "Actuais Desafios para o Mercado de Capitais Português com a Adesão à Euronext" Porto, 12 de Abril de 2002 Fundação Engº António de Almeida Minhas Senhoras e Meus Senhores, Estou certo que esta foi uma manhã de trabalho muito profícua. Pela minha parte, pude confirmar que muitos partilham uma ideia que tenho já repetido em várias ocasiões: a existência de um mercado de capitais profundo e eficiente é não só um importante factor de desenvolvimento, como é algo que não tem a ver com a localização do computador que assiste à negociação realizada nos mercados de bolsa. Permitam-me que, mais uma vez, reafirme a importância dos sistemas financeiros e em particular dos mercados de capitais para o desenvolvimento económico e que enfatize o seu impacto nos ciclos conjunturais, no crescimento económico e na criação 1
2 de bem estar. Este é, aliás, um aspecto muitas vezes esquecido na hora da tomada de decisões relevantes. É hoje sabido que não basta que exista poupança para que haja crescimento económico. Do mesmo modo, é um dado adquirido que o crescimento sem um sistema financeiro desenvolvido não coloca os países a salvo de crises conjunturais. Se dúvidas houvesse a este respeito, a crise asiática do final dos anos noventa ilustra esta ideia com o dramatismo que bem recordamos. Para que a poupança se materialize em crescimento e desenvolvimento económico, e para que esse crescimento ocorra sem crises financeiras conjunturais, é necessário não só que, em primeiro lugar, exista poupança e que, portanto, essa poupança seja estimulada como, sobretudo, é necessário que, em segundo lugar, essa poupança aflua ao sistema financeiro. Além disso, é imprescindível que a poupança encaminhada para os mercados financeiros encontre procura por parte de agentes económicos empreendedores e, por último, é indispensável que 2
3 os projectos financiados por esta via sejam eficientes, induzindo um concreto aumento da actividade económica. Em suma, só a poupança que é canalizada para os sistemas financeiros e aí afectada a projectos eficientes do ponto de vista do alargamento efectivo da capacidade produtiva e competitiva do aparelho produtivo nacional é indutora de crescimento económico sustentado e equilibrado. Em que é que isso importa ao tema da sessão de trabalho que aqui se desenrolou?, perguntarão a esta hora alguns dos que pacientemente me ouvem? Em muito. Esta é a raíz dos desafios que se apresentavam ao mercado de capitais português antes da adesão da BVLP ao Euronext, e esses desafios continuam presentes após essa adesão. Deste ponto de vista essencial nada foi significativamente alterado. 3
4 O que o Euronext traz de novo, sintetizando as muito pertinentes e avalizadas intervenções que tivemos oportunidade de ouvir, é um contexto alargado de oportunidades e de desafios. Desde logo, novas oportunidades para os investidores que podem com mais facilidade aceder a novos produtos para a aplicação do seu aforro ou para a gestão do risco, que lhes são oferecidos por intermediários financeiros para quem a nova plataforma transnacional de negociação representa um alargamento do seu espaço de actuação. Novas oportunidades também para as entidades emitentes nacionais. Com o Euronext alarga-se o seu espaço potencial de intervenção abrindo-se por isso a oportunidade de captar novos accionistas e novos financiadores. Também para os intermediários financeiros emergem novas oportunidades as quais brotam, como já referi, do alargamento do seu espectro de actuação, quer em termos geográficos, quer em 4
5 termos da gama de produtos susceptíveis de serem transaccionados. Ora, como é habitual, em conexão com as oportunidades surgem desafios, ou mesmo ameaças. Se é verdade que as empresas nacionais dispõem agora de novos horizontes de financiamento, a sua concretização não só não se faz sem esforço, como também é verdade que os seus financiadores tradicionais também são agora alvo de um apelo mais intenso por parte de empreendedores não nacionais. Donde, se a captação de poupança estrangeira para financiar o crescimento nacional é agora mais franco, mais aberto, não é menos verdade que também é mais fácil a deslocalização de poupança dos agentes económicos residentes para o exterior. Este último aspecto tem aliás sido muito intensivamente concretizado nos últimos anos, bastando por exemplo analisar a evolução da composição geográfica das aplicações dos fundos de investimento mobiliário desde a criação do espaço euro. 5
6 Ficou aqui hoje bem patente - e já tinha também sido para mim muito claro no Conselho Nacional do Mercado de Valores Mobiliários do passado dia 28 de Fevereiro - que o grande desafio nacional é o de conservar em Portugal um mercado de capitais, entendido este não como uma mera plataforma de negociação que é cada vez mais virtual e não se sabe bem onde está, mas sim, a existência de uma oferta, de uma procura de meios financeiros e de intermediários com interesses e com direcção efectiva no nosso país. É por isso importante que todos isto é, as empresas, os investidores, os intermediários financeiros, as autoridades de mercado e o governo contribuam para que este desiderato seja atingido sob pena de nos transformarmos num mero balcão de distribuição de produtos concebidos por outros que não por nós, indutores do crescimento económico de outros, e não do nosso, geradores de muito valor acrescentado e bem estar para outros e pouco para nós. Neste contexto, aos investidores, às famílias e ao governo continua a pedir-se um esforço de poupança. Das empresas e dos empresários continua a desejar-se imaginação e esforço 6
7 empreendedor em ordem a que concebam, desenvolvam e aportem ao mercado, para financiamento, projectos com elevado nível de eficiência. Mas também se lhes pede um esforço de promoção internacional delas próprias e do mercado de capitais português. Quanto maior for a visibilidade e credibilidade internacional da economia portuguesa, das suas empresas e do seu mercado, maior será o sucesso perante o desafio que temos pela nossa frente. Este é um esforço imperioso a que não nos podemos nem devemos furtar. Aos intermediários financeiros aqui incluindo em sentido lato as entidades gestoras dos mercados e dos sistemas conexos pede-se imaginação e modernidade na concepção de produtos que permitam a conjugação dos dois elementos essenciais que se transaccionam entre os agentes económicos em qualquer mercado financeiro: tempo e risco. Pede-se-lhes também sentido estratégico, recusando o caminho fácil da mera integração de uma cadeia de distribuição internacional, apelando à inteligência e à imaginação nacionais em ordem a desenvolver capacidade 7
8 competitiva internacional ao nível da concepção de produtos financeiros complexos. Aos órgãos de comunicação social fica o desafio para que, não abdicando do exercício da sua missão crítica, contribuam positivamente para a promoção de Portugal, da sua economia e do seu mercado de capitais. Muitas das vezes, no passado, temos sido nós portugueses a dizer mal de nós mesmos, exagerada e injustamente, dando legitimidade a que órgãos de comunicação internacionais dêem de Portugal uma imagem que de modo algum favorece os interesses nacionais. Às autoridades de supervisão e, em particular à CMVM, cumpre assegurar a defesa dos investidores, a integridade e transparência do mercado e, consequentemente, contribuir para a sua credibilidade. Mas coloca-se-lhe também um importante desafio, o de evitar que a supervisão, a regulação e a regulamentação sejam factores negativos de competitividade à escala internacional. Não ignoramos, portanto, que também nos cumpre um papel importante na promoção do mercado de 8
9 capitais português e estamos à altura de o assumir. Não tenho dúvida de que o prestígio da CMVM e do mercado de capitais português junto das suas congéneres, tanto à escala europeia, como à escala internacional está, hoje, ao nível dos mais altos padrões mundiais como bem atestam as responsabilidades que lhe foram cometidas em vários fora internacionais. Estou certo de que o mercado português, assim contribuam todos os agentes económicos, também pode e deve merecer permanentemente uma imagem muito positiva junto de quem quotidianamente toma, à escala internacional, decisões de afectação de poupanças. É preciso neste aspecto trabalhar todos os dias empenhadamente, sabendo que a reduzida dimensão internacional do país é um obstáculo a transpor.não nos basta ser como os outros, temos que ser melhores. E para evidenciar este facto basta ter consciência, por exemplo, de que se um caso como o «caso ENRON» tivesse acontecido entre nós, tal acarretaria, no plano internacional, consequências de dimensão negativa infinitas vezes superiores às que se verificaram para o mercado norteamericano. 9
10 Por fim, ao governo compete, igualmente, um papel importante neste âmbito. Desde logo, ao nível da imagem do país. Mas também ao nível da tomada de medidas concretas que muito contribuam para estimular o aforro e induzir a sua canalização para o mercado de capitais. O novo governo, como é sabido, anunciou já como prioridade estimular a poupança. Espera-se que conexamente com as medidas que se venham a tomar para estimular a poupança se tomem medidas que induzam a que essas poupanças sejam canalizadas para o mercado de capitais. Como tive a oportunidade de expor a poupança mesmo a poupança financeira não é um objectivo em si mesmo. É necessário que seja eficientemente canalizada para o investimento produtivo. Também aqui o governo pode dar uma ajuda importante eliminando barreiras existentes no acesso a determinados meios de financiamento, e que constituem factor de distorção e asfixia do nosso mercado. Por exemplo, é necessário reestimular o mercado de obrigações privadas. Recordo, a esse propósito, que a CMVM e a BVLP entregaram ao anterior governo um projecto para a reanimação do segmento obrigacionista do mercado, que ainda não foi implementado, deparando-se com 10
11 obstáculos que urge ultrapassar. De igual modo me parece que ao nível do mercado primário de acções, existem custos de emissão que urge reduzir, não permitindo que interesses de natureza corporativa possam prejudicar o crescimento e o desenvolvimento económico nacional. Temos, pois, todos, muito para fazer. Terminava esta minha intervenção, que já vai longa, agradecendo a presença de todos, e em muito particular a todos os oradores, quer pela disponibilidade manifestada, quer pela excelência das intervenções que nos ofereceram. Muito Obrigado. 11
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