MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

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1 Nº /CS HABEAS CORPUS N MINAS GERAIS IMPETRANTE: DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO PACIENTE: CLAUDETE ROZA DE LIMA IMPETRADO: SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA RELATOR: MINISTRO LUIZ FUX PENAL. HABEAS CORPUS. TENTATIVA DE FURTO QUALIFICADO. PLEITO DE ABSOLVIÇÃO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. NÃO CONHECIMENTO. INADMISSIBILIDADE DE HC SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. MÉRITO. IMPROCEDÊNCIA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. VALOR DO BEM. INAPLICABILIDADE. OUTROS ELEMENTOS A SEREM SOPESADOS. PACIENTE CONTUMAZ NA PRÁTICA DE CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO. REITERAÇÃO CRIMINOSA QUE AFASTA A INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. PARECER PELO NÃO CONHECIMENTO DO MANDAMUS E, SE CONHECIDO, PELA DENEGAÇÃO DA ORDEM. 1. Trata-se de habeas corpus impetrado em favor de CLAUDETE ROZA DE LIMA contra decisão da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, que negou seguimento provimento ao Agravo Regimental no Habeas Corpus nº /MG. 2. A paciente foi condenada em primeira instância à pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de reclusão, em regime fechado, além do pagamento de 25 (vinte e cinco) dias-multa, pela prática do crime de furto, tipificado no art. 155, caput, c/c artigo 61, inciso I, ambos do Código Penal, por ter subtraído um aparelho celular avaliado em R$ 119,00 (cento e dezenove reais).

2 MPF/PGR Nº /CS 2 3. Interposta apelação pelas partes, o Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais negou provimento ao apelo defensivo e deu provimento ao recurso ministerial, para reconhecer a qualificadora do furto referente à escalada (art. 155, 4º, II do CP), redimensionando a pena da paciente para 2 (dois) anos, 6 (seis) meses e 10 (dez) dias de reclusão, além do pagamento de 15 (quinze) dias-multa. 4. Contra essa decisão, a defesa impetrou habeas corpus substitutivo de recurso especial perante o Superior Tribunal de Justiça, buscando a absolvição da paciente, com fundamento no princípio da insignificância. 5. Por meio de decisão monocrática, o Ministro Sebastião Reis Júnior não conheceu do habeas corpus, o que ensejou a interposição de agravo regimental pela defesa. A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça negou provimento ao recurso em acórdão assim ementado: AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO. NÃO CABIMENTO. LIMITES DA IMPETRAÇÃO. CONHECIMENTO. IMPOSSIBILIDADE. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. IMPOSSIBILIDADE. CRIME PRATICADO MEDIANTE ESCALADA. PERICULOSIDADE SOCIAL E REPROVABILIDADE DA CONDUTA EXISTENTES. AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. NÃO APRESENTAÇÃO DE ARGUMENTOS NOVOS PELO AGRAVANTE PARA INVALIDAR A DECISÃO AGRAVADA. MANUTENÇÃO POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. 1. Com base nos arts. 38 da Lei n /1990, 557, caput, do Código de Processo Civil e 34, XVIII, do RISTJ, pode o relator negar seguimento a recurso ordinário em habeas corpus manifestamente inadmissível, em razão de a tese nele defendida não encontrar amparo nos precedentes da Corte. Inexiste ofensa ao princípio da colegialidade, pois o acesso ao Colegiado é sempre facultado, por meio de agravo regimental. 2. É inadmissível o emprego do habeas corpus em substituição a recurso especialmente previsto no texto constitucional ou a revisão criminal (precedentes do STJ e do STF). 3. A agravante não apresentou argumentos novos capazes de infirmar os fundamentos que alicerçaram a decisão agravada, razão que enseja a negativa de provimento ao agravo regimental. 4. Agravo regimental improvido.

3 MPF/PGR Nº /CS 3 6. Daí a impetração do presente habeas corpus, por meio do qual a defesa insiste na absolvição da paciente em razão da atipicidade da conduta, dada a insignificância do fato furto de um aparelho celular avaliado em R$ 119,00 (cento e dezenove reais). 7. O parecer é pelo não conhecimento do mandamus. 8. Contra a decisão que ratifica o não conhecimento de habeas corpus, é cabível o recurso ordinário, nos termos do art. 102, II, alínea a, da Constituição Federal e não a impetração de novo writ, como na hipótese vertente. 9. A jurisprudência dessa Suprema Corte não vem admitindo a impetração de habeas corpus substitutivo de recurso ordinário, assinalando que o remédio constitucional não pode ser utilizado indistintamente, sob pena de banalizar o seu precípuo objetivo e desordenar a lógica recursal. A propósito: HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS.DESCABIMENTO. INEXISTÊNCIA DE ILEGALIDADE FLAGRANTE. WRIT NÃO CONHECIDO. 1. A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal consolidou o entendimento no sentido da inadmissibilidade do uso da ação de habeas corpus em substituição ao recurso ordinário previsto na Constituição Federal. 2. Estando a medida socioeducativa fundamentada no descumprimento de outra medida menos gravosa e na reiteração delitiva do ora paciente, inexiste ilegalidade flagrante capaz de justificar a concessão da ordem de ofício. 3. Writ não conhecido. (HC , Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, DJ-e de ) 10. Esse entendimento aplica-se ao presente caso, impondo o não conhecimento do mandamus, já que foi impetrado em substituição ao recurso ordinário. 11. No mérito, não há qualquer ilegalidade a ser sanada, devendo a

4 MPF/PGR Nº /CS 4 decisão impugnada ser mantida pelos seus próprios fundamentos. 12. A aplicação do princípio da insignificância ao crime de furto, em sua forma tentada ou consumada, é tema que tem suscitado divergência. Em princípio, considerando a periculosidade social da ação, há precedentes judiciais afirmando a impossibilidade de sua aplicação, salvo naquelas hipóteses excepcionais do crime famélico. 13. Tem-se entendido que o valor da res furtiva não pode ser o único parâmetro a ser avaliado, devendo o julgador analisar as circunstâncias da fato para decidir se efetivamente enquadra-se no que se tem entendido como crime insignificante. 14. Isso porque a aplicação do citado princípio, por redundar em consequência tão extremada para o Direito Penal a atipicidade de uma conduta, não pode ater-se à análise isolada do valor da vantagem ilicitamente obtida. Mister a análise, sim, de todas as circunstâncias que compõem o fato. 15. Com efeito, aplicando-se o princípio da insignificância ter-se-á uma conduta que, não obstante formalmente típica, será considerada atípica, por sua inexpressividade no seio social. E, por consistir em um instrumento extremo a serviço do intérprete e do aplicador da lei, é necessário que a sua adoção seja feita com observância de certos parâmetros e que, embora aplicado casuisticamente, considere toda a ordem jurídica. 16. Tais são as balizas que regerão sua aplicabilidade, conforme entendimento já afirmado por essa Colenda Corte: a mínima ofensividade da conduta do agente; a ausência total de periculosidade social da ação; o ínfimo grau de reprovabilidade do comportamento; a inexpressividade da

5 MPF/PGR Nº /CS 5 lesão jurídica ocasionada. 17. Atentando-se para as referidas balizas, fica claro que o valor da coisa furtada é um dos aspectos a serem considerados, não sendo, nem de longe, o único. 18. Na hipótese, o furto de um aparelho celular da residência da vítima, mediante escalada, não pode ser tido como irrelevante penal. A insegurança social gerada por fatos como esse é um dos males dos quais padece a sociedade brasileira. Não é o mais grave dos fatos, mas, certamente, é um deles. 19. Embora o valor da avaliação da res furtiva não possa ser considerado expressivo, também não pode ser tido como irrelevante. Ademais, é certo que a reprovabilidade do comportamento da paciente é acentuada, especialmente se considerada a sua reiteração em delitos contra o patrimônio. 20. A folha de antecedentes criminais da paciente (e-stj 235/237) atesta condenações pelo crime de furto qualificado (sentença em 18/03/2008), uso de entorpecentes (sentença em 02/09/2010) e estelionato (sentença proferida em 02/09/2010). Nessas circunstâncias, tem entendido essa Suprema Corte que a conduta tem relevância penal, mesmo que a coisa furtada seja de pequeno valor. No mesmo sentido: HABEAS CORPUS. FURTO. ALEGAÇÃO DE ATIPICIDADE DA CONDUTA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INVIABILIDADE: VALOR DO BEM SUBTRAÍDO; EXISTÊNCIA DE PROCESSOS EM CURSO POR DELITOS DA MESMA NATUREZA; FORMA COMO PRATICADO O CRIME. PROPENSÃO À PRÁTICA DELITIVA. ORDEM DENEGADA. 1. A tipicidade penal não se reduz ao exame da subsunção do fato à norma abstrata. Além da correspondência formal, a configuração da tipicidade demanda análise materialmente valorativa das

6 MPF/PGR Nº /CS 6 circunstâncias do caso concreto, para verificar a ocorrência de alguma lesão grave e penalmente relevante do bem jurídico tutelado. 2. Não se há cogitar da incidência do princípio da insignificância: valor subtraído de R$171,80 representa 36,94% de R$ 465,00, salário mínimo da época dos fatos; assentamento pelas as instâncias ordinárias de que o Paciente, embora não seja tecnicamente reincidente, responde a processos da mesma natureza, demonstrando propensão à prática delitiva. 3. Inaplicabilidade do princípio da insignificância. Emprego de ardil para lograr êxito na prática do delito. 4. Ordem denegada. (HC , Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Segunda Turma, julgado em 06/11/2013, PROCESSO ELETRÔNICO Dje de grifo do M.P.F.) 21. Assim, o fato da paciente ser contumaz na prática de delitos, fazendo do crime o seu meio de vida, desautoriza a incidência do princípio da insignificância, ante o alto grau de reprovabilidade do seu comportamento. No mesmo sentido: Habeas corpus. 2. Furto de fios elétricos praticado mediante concurso de agentes. Condenação. 3. Pedido de aplicação do princípio da insignificância. 4. Ausência de dois dos vetores considerados para a aplicação do princípio da bagatela: a ausência de periculosidade social da ação e o reduzido grau de reprovabilidade da conduta. 5. A prática delituosa é altamente reprovável, pois afeta serviço essencial da sociedade. Os efeitos da interrupção do fornecimento de energia não podem ser quantificados apenas sob o prisma econômico, porque importam em outros danos aos usuários do serviço. 6. Personalidade do agente voltada ao cometimento de delitos patrimoniais (reiteração delitiva). Precedentes do STF no sentido de afastar a aplicação do princípio da insignificância aos acusados reincidentes ou de habitualidade delitiva comprovada. 7. Furto em concurso de pessoas. Maior desvalor da conduta. Precedentes do STF. 8. Ordem denegada. (HC , Relator(a): Min. GILMAR MENDES, 2ª Turma, julgado em 25/02/2014, Dje de ) Habeas Corpus Originário. Crime de Descaminho. Reiteração delitiva. Princípio da Insignificância Penal. Impossibilidade. 1. A reiteração delitiva, comprovada pela certidão de antecedentes criminais do paciente, impossibilita a aplicação do princípio da insignificância. Precedentes. 2. Ordem denegada. (HC , Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 22/04/2014, PROCESSO ELETRÔNICO Dje de ) 22. É de se considerar, ainda, que a aplicação do princípio da

7 MPF/PGR Nº /CS 7 insignificância a crimes como o presente, em que a coisa furtada não serve para o atendimento de necessidades básicas do agente, longe de representar uma decisão socialmente justa, afigura-se como estímulo do Judiciário a esse tipo de prática delituosa. O agente que furta reiteradamente e que recebe da Justiça a resposta de que a sua conduta é insignificante, apenas porque, naquela específica circunstância, furtou uma coisa de pequeno valor, vê-se estimulado a persistir nessa senda, certo de que está apoiado pelo Estado. 23. O furto é indiscutivelmente um fato socialmente danoso, que causa graves malefícios, somente podendo ser aceito naquelas específicas hipóteses em que o agente age por necessidade absoluta de sobrevivência. O furto de um aparelho celular não se qualifica como tal. Para confirmar esta assertiva, basta ver o modo de execução de crime, descrito na denúncia: Consta nos autos que no dia 10 de fevereiro de 2011, por volta das 07h30min, na rua Orfeu Braga, n] 27, bairro Divino Salvador, nesta cidade, a denunciada, tentou subtrair para si um tanquinho de lavar roupas, de propriedade de LUCIENE CAETANO DOS REIS, fato que não se consumou por circunstâncias alheias à sua vontade, bem como, mediante escalada, subtraiu para si 01 (um) telefone celular, marca LG, de cor vermelha e preta, numero de chamada , conforme auto de apreensão de f. 15 e termo de restituição de f. 16, de propriedade de PATRÍCIAS REIS DE PAULA. Segundo apurado, no dia dos fatos, a denunciada foi até a casa da vítima LUCIENE CAETANO DOS REIS, no endereço retro mencionado, escalou o portão que dá acesso à residência, o qual estava trancado e entrou por uma janela que estava aberta, no referido imóvel. Dentro da casa, a denunciada discutiu com LUCIENE, pois tentou subtrair seu tanquinho, a fim de comprar droga (crack), tendo sua pretensão refutada pela vítima que a empurrou, Aproveitando-se do desentendimento ocorrido, a denunciada pegou o aparelho celular da vítima PATRÍCIA e fugiu.

8 MPF/PGR Nº /CS Pelo exposto, manifesta-se o Ministério Público Federal pelo não conhecimento do habeas corpus e, se conhecido, pela denegação da ordem. Brasília, 21 de agosto de 2014 CLÁUDIA SAMPAIO MARQUES Subprocuradora-Geral da República