Superior Tribunal de Justiça

Transcrição

1 RECURSO ESPECIAL Nº MS (2017/ ) RELATOR RECORRENTE RECORRENTE ADVOGADO RECORRIDO : MINISTRO NEFI CORDEIRO : JHONATAN VINICIUS ALVES DA SILVA : MURILO GOMES DA SILVA : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL DECISÃO Trata-se de recurso especial interposto em face de acórdão assim ementado: EMENTA - APELAÇÃO CRIMINAL DEFENSIVA - ROUBO QUALIFICADO E TRÁFICO DE DROGAS - DO PEDIDO ABSOLUTÓRIO EM RELAÇÃO AO DELITO DE TRÁFICO DE DROGAS - ACERVO PROBATÓRIO COMPROVA A AUTORIA DO FATO DELITUOSO - AFASTADO - PEDIDO DE RECONHECIMENTO DA BENESSE DO TRÁFICO PRIVILEGIADO - AUSÊNCIA DE REQUISITO LEGAL - REJEITADO - PEDIDO DE AFASTAMENTO DAS QUALIFICADORAS PERTINENTES AO USO DE ARMA DE FOGO E RESTRIÇÃO DA LIBERDADE DA VÍTIMA - QUALIFICADORAS MANTIDAS - PEDIDO DE REDUÇÃO DAS PENAS-BASE AO MÍNIMO LEGAL - PARCIALMENTE ACOLHIDO - PEDIDO DE ABRANDAMENTO DO REGIME DE CUMPRIMENTO DE PENA - NEGADO - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I - Não há falar em absolvição quando os elementos de convicção coligidos durante a instrução processual se mostram suficientes no tocante à confirmação da materialidade e da autoria do fato delituoso, impondo-se, nessa hipótese, a manutenção da condenação. II - Não estando presentes, de forma cumulativa, os requisitos legais enumerados em âmbito do artigo 33, 4 o, da Lei de Drogas (11.343/2006), torna-se inviável a redução de pena com base a alegação de tráfico privilegiado. No caso, há indícios concretos de que os apelantes eram dedicados a atividades de caráter criminoso. III - A causa de aumento de pena prevista no art. 157, 2 o, V, do CP, restou devidamente comprovada pelo fato de que a execução do delito de roubo de perdurou por um lapso de tempo considerável, consoante se depreende dos autos. IV - Comprovado que o crime de roubo foi praticado com emprego de arma de fogo, ainda que desmuniciada, cabível a incidência da causa de aumento de pena prevista no inciso I do parágrafo 2 o do artigo 157, CP. V - No âmbito dos delitos comuns e do tráfico de drogas, para a fixação da pena-base, deve haver análise das circunstâncias judiciais Documento: Despacho / Decisão - Site certificado - DJe: 12/12/2017 Página 1 de 5

2 enumeradas nos arts. 59 do CP e 42 da Lei n /2006. No caso, as circunstâncias judiciais relativas à "culpabilidade", "natureza e quantidade da droga" encontram-se devidamente fundamentadas, pelo que devem ser mantidas a valoração negativa na dosimetria das penas, nos termos do art. 93, IX da CF. VI - Considerando a pena fixada para ambos os apelantes, as condutas criminosas praticadas em concurso material e a existência de circunstâncias judiciais desabonadoras, nos termos do art. 33, s 2., "a" e 3. do CP, a manutenção do regime fechado é medida que se impõe. Sustentam os recorrentes violação do art. 157, 2º, I, do CP. Buscam a exclusão da majorante do emprego de arma de fogo por se encontrar desmuniciada. Requerem, assim, a reforma o acórdão recorrido, a fim de que decotada a causa de aumento previsto no inciso I do 2º do art. 157 do CP. Contra-arrazoado e admitido na origem, manifestou-se o Ministério Público Federal pelo provimento do recurso. É o relatório. Decido. Consta dos autos que os recorrentes foram condenados pela prática dos crimes previstos no art. 157, 2º, I, II e V, do CP e art. 33, caput, da Lei /06, tendo sido aplicada, para ambos os réus, a reprimenda de 13 anos de reclusão, mais 628 dias-multa, no regime fechado. Interposto recurso de apelação, o Tribunal de Justiça, por maioria, deu parcial provimento ao apelo da defesa, reduzindo a sanção para 10 anos e 6 meses de reclusão, mais 566 dias-multa em relação ao recorrente Jhonatan e fixada a pena de 11 anos e 3 meses de reclusão, no regime fechado, além do pagamento de 570 dias-multa em face do recorrente Murilo. Opostos embargos infringentes, a 2ª Seção Criminal do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul proveu parcialmente para prevalecer o voto minoritário na parte da dosimetria do crime de tráfico de drogas, redimensionando apenas a reprimenda do tipo penal previsto no art. 33 da Lei /06. No tocante à majorante do crime de roubo, o voto proferido nos embargos infringentes assim referiu (fl. 368): I CAUSA DE AUMENTO PREVISTA NO ARTIGO 157, 2º, I, DO CÓDIGO PENAL (VIOLÊNCIA OU AMEAÇA É EXERCIDA COM EMPREGO DE ARMA) Comungo do entendimento de que a arma de fogo sequer precisa ser apreendida ou examinada para que incida a majorante em comento, sendo suficiente a comprovação do seu uso na prática do crime. Documento: Despacho / Decisão - Site certificado - DJe: 12/12/2017 Página 2 de 5

3 E, por coerência, o fato de estar desmuniciada também não obsta a incidência da majorante, porquanto já se revela suficiente para impingir temor, inibindo eventual resistência. Extrai-se do excerto colacionado que o entendimento da Corte Estadual diverge do entendimento do no sentido de que o emprego de arma de fogo desmuniciada tem o condão de configurar a grave ameaça e tipificar o crime de roubo, no entanto não é suficiente para caracterizar a majorante do emprego de arma, pela ausência de potencialidade lesiva no momento da prática do crime (AgRg no REsp /SC, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 15/10/2015, DJe 05/11/2015). A propósito: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ROUBO. USO DE ARMA DESMUNICIADA. AFASTAMENTO DA MAJORANTE PREVISTA NO ART. 157, 2º, I, DO CÓDIGO PENAL. JULGADO DO STF EM SENTIDO CONTRÁRIO. LIVRE CONVENCIMENTO DO JULGADOR. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. 1. De acordo com a jurisprudência desta Corte Superior, a arma de fogo desmuniciada não pode ser considerada para o fim de caracterização da majorante do emprego de arma prevista no art. 157, 2º, I, do Código Penal, porque presume-se ausente a sua potencialidade lesiva. Precedentes. 2. O princípio do livre convencimento do julgador autoriza a escolha de uma vertente jurisprudencial a respeito do tema em questão. A existência de julgado em sentido contrário a precedente desta Corte não é suficiente para a reforma da decisão. 3. Agravo regimental improvido. (AgRg no REsp /SP, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 14/02/2017, DJe 17/02/2017). AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ROUBO ARMA DE FOGO DESMUNICIADA. CAUSA ESPECIAL DE AUMENTO PREVISTA NO 2.º, INC. I DO 2.º DO ART. 157 DO CÓDIGO PENAL. NÃO INCIDÊNCIA. AGRAVO DESPROVIDO. 1. A jurisprudência desta Corte Superior é sedimentada no sentido de que a utilização de arma desmuniciada e sem potencialidade para realização de disparo, como meio de intimidação, serve unicamente à caracterização da elementar grave ameaça, não se admitindo o seu reconhecimento como a causa de aumento de pena em questão. 2. Agravo regimental desprovido. Documento: Despacho / Decisão - Site certificado - DJe: 12/12/2017 Página 3 de 5

4 (AgRg no REsp /RJ, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 25/10/2016, DJe 09/11/2016). Passo, então, ao redimensionamento da pena. Recorrente Jhonatan: Mantendo os critérios adotados no Tribunal de origem, mantenho a pena-base do crime de roubo em 5 anos de reclusão e 20 dias-multa ante a existência de duas circunstâncias judiciais negativas - culpabilidade e motivos do crime. Na segunda fase, foi reduzida em 1/6 diante das atenuantes da confissão espontânea e menoridade relativa, resultando a sanção de 4 anos e 2 meses de reclusão e 12 Na terceira fase, verifica-se ilegalidade flagrante, passível de concessão de habeas corpus, de ofício, porquanto o estabelecimento de fração acima da mínima legal, deu-se, na espécie, tão só pela incidência do número de majorantes, com fundamento apenas no critério matemático, incorrendo em sentido oposto ao entendimento cristalizado na Súmula 443/STJ, motivo pelo qual fixo a causa de aumento do crime de roubo em 1/3, ficando a pena em 5 anos, 6 meses e 20 dias de reclusão e 16 Tratando-se de concurso material com o delito de tráfico de drogas, preservo a cumulação, ficando a pena definitiva em 10 anos e 8 meses de reclusão, mais 516 Contudo, mesmo em se tratando de equívoco na dosagem da pena, mantenho a sanção fixada, no julgamento da apelação ao recorrente Jhonantan, em 10 anos e 6 meses de reclusão, além do pagamento de 516 dias-multa, a fim de evitar, em recurso exclusivo da defesa, a ocorrência de reformatio in pejus, visto que, se mantido o redimensionamento da pena ora implementado, agravaria a situação do réu. Recorrente Murilo: Mantendo os critérios adotados no Tribunal de origem, mantenho a pena-base do crime de roubo em 5 anos de reclusão e 20 dias-multa ante a existência de duas circunstâncias judiciais negativas - culpabilidade e motivos do crime. Na segunda fase, foi reduzida em 1/6 diante das atenuantes da confissão espontânea e menoridade relativa, resultando a sanção de 4 anos de reclusão e 10 Na terceira fase, verifica-se ilegalidade flagrante, passível de concessão de habeas corpus, de ofício, porquanto o estabelecimento de fração acima da mínima legal, deu-se, na espécie, tão só pela incidência do número de majorantes, com Documento: Despacho / Decisão - Site certificado - DJe: 12/12/2017 Página 4 de 5

5 fundamento apenas no critério matemático, incorrendo em sentido oposto ao entendimento cristalizado na Súmula 443/STJ, motivo pelo qual fixo a causa de aumento do crime de roubo em 1/3, ficando a pena em 5 anos e 4 meses de reclusão e 13 Tratando-se de concurso material com o delito de tráfico de drogas, preservo a cumulação, ficando a pena definitiva em 10 anos e 4 meses de reclusão, mais 513 Não obstante a redução ora realizada, permanece inalterado o regime fechado para ambos os réus, porquanto, além do quantum da pena, houve o reconhecimento de circunstância judicial negativa, motivo pelo qual cabível o regime mais severo, nos termos do art. 33, 2º, a, e 3º, do CP. Ante o exposto, nos termos da fundamentação supra, dou provimento ao recurso especial para, afastada a majorante do emprego de arma do crime de roubo, reduzir a pena, nos termos da decisão, e ainda concedo a ordem, de ofício, para reduzir a fração de aumento pelo delito de roubo ao mínimo legal, consoante Súmula 443/STJ. Publique-se. Intimem-se. Brasília (DF), 06 de dezembro de MINISTRO NEFI CORDEIRO Relator Documento: Despacho / Decisão - Site certificado - DJe: 12/12/2017 Página 5 de 5