Imagem da Semana: Ressonância nuclear magnética
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- Heloísa Amaro da Costa
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1 Imagem da Semana: Ressonância nuclear magnética Figura 1: Ressonância nuclear magnética das vias biliares (colangiorressonância) Enunciado Paciente masculino, 39 anos, é atendido na unidade básica de saúde com queixa de tonteira, prurido e astenia há cerca de cinco anos, com episódios de agudização intercalados com melhora dos sintomas. Relata exacerbação do quadro há um mês e meio, associado à icterícia, distensão abdominal, constipação intestinal e colúria. Nega alteração na cor das fezes. Ao exame apresentava icterícia (+/4+), palpação profunda dolorosa de hipocôndrios e epigástrio e fígado palpável a 2,5 cm do rebordo costal direito. Ultrassonografia abdominal do mês anterior sem alterações. Exames laboratoriais com elevação de bilirrubinas, fosfatase alcalina e gama GT. Com base na história clínica e na imagem, qual é o diagnóstico mais provável? a) Doença de Wilson b) Cirrose biliar primária c) Colangite esclerosante primária d) Colangiocarcinoma
2 Análise da Imagem Imagem 2: Ressonância nuclear magnética das vias biliares (colangiorressonância) evidenciando áreas multifocais de estenose (setas azuis) e dilatação (setas verdes) das vias biliares intra e extra-hepáticas: aspecto em contas de rosário. A seta amarela evidencia dilatação do terço proximal do ducto colédoco, que apresenta estenose em seu terço distal (circulado em amarelo). Algumas vias biliares tortuosas são circuladas em vermelho e a vesícula biliar encontra-se dilatada (seta vermelha). Diagnóstico O relato de fadiga, prurido, icterícia, colúria, hiperbilirrubinemia, elevação de fosfatase alcalina e de gama GT por tempo prolongado sugere quadro de colestase crônica. A associação desse quadro aos achados da colangiorressonância, principalmente o clássico aspecto de contas de rosário estabelece o diagnóstico de colangite esclerosante primária (CEP). Em todas as outras alternativas são apresentadas afecções que cursam com sinais e sintomas de colestase crônica, à semelhança da CEP: Na doença de Wilson, há um acúmulo de cobre no fígado e em outros órgãos, provocando hepatite crônica, anormalidades neurológicas, psiquiátricas, endocrinológicas, osteoporose, doença renal, anemia hemolítica e outros. Esse tipo de acometimento extra-hepático leva à essa suspeita diagnóstica, que é complementada pela dosagem de ceruloplasmina e pela biópsia hepática.
3 A cirrose biliar primária apresenta o curso clínico mais semelhante ao da CEP. Entretanto, os ductos biliares de pequeno calibre são os mais afetados, a despeito da CEP, em que principalmente os ductos de médio e grande calibre são comprometidos. Sendo assim, exames de imagem geralmente não apresentam alterações significativas que sugiram o diagnóstico. Altos títulos de anticorpo anti-mitocôndria costumam ser encontrados. No colangiocarcinoma, tipicamente há icterícia obstrutiva indolor devido à estenose biliar hilar ou distal. Os níveis de antígeno carcino-embrionário (CEA) frequentemente estão elevados. A colangiorressonância evidencia área de estenose focal na árvore biliar. Discussão A colangite esclerosante primária (CEP) é uma doença colestática crônica caracterizada por inflamação, esclerose e obliteração progressiva das vias biliares intra e extrahepáticas. É uma doença rara, com incidência anual de aproximadamente 1: , sendo 40 anos a idade média ao diagnóstico. Os homens são mais acometidos do que as mulheres, em uma relação de 2:1. Sua etiologia é ainda desconhecida e provavelmente multifatorial. Acredita-se que resulte de uma associação entre predisposição genética, exposição crônica ou recorrente a vírus e bactérias na circulação portal e resposta auto-imune. A presença de auto-anticorpos, como anticitoplasma de neutrófilos (panca), positivo em 87% dos casos, corrobora a última hipótese. Além disso, cerca de 75% dos casos são acompanhados por doença inflamatória intestinal (87% retocolite ulcerativa e 13% doença de Crohn) que, geralmente, precede a CEP. A maioria dos pacientes é assintomática ao diagnóstico. Por isso, deve-se suspeitar de CEP em indivíduos com doença intestinal inflamatória associada à alteração de enzimas hepáticas, especialmente elevação de fosfatase alcalina. Quando presente, o quadro clínico é caracterizado principalmente por fadiga, icterícia e prurido. Hepatomegalia e esplenomegalia podem ser encontradas no exame físico. Febre, calafrios, sudorese noturna e dor em hipocôndrio direito também são comuns e indicam uma possível colangite bacteriana secundária à obstrução da árvore biliar. Principalmente nesses episódios, ocorre alteração das enzimas hepáticas, sendo que a hiperbilirrubinemia persistente reflete doença em estágio avançado. O diagnóstico, quando fortemente suspeitado pelos achados clínicos e laboratoriais, é firmado pela demonstração de estreitamento e dilatação multifocais de ductos biliares intra e ou extrahepáticos na colangiografia endoscópica ou colangiorressonância magnética. Esta, vantajosa por ser menos invasiva. A ultrassonografia pode evidenciar ductos biliares anormais, mas não define o diagnóstico por constituir achado inespecífico. A biópsia hepática percutânea pode contribuir, porém não é necessária para o diagnóstico. Evidencia hepatopatia fibrosante com ductopenia e fibrose periportal. Uma vez estabelecido o
4 diagnóstico de CEP, constitui propedêutica fundamental para o estadiamento histológico e avaliação prognóstica. Imagem 3: Corte de fígado evidenciando fibrose periportal e perisinusoidal, com atividade necroinflamatória discreta (seta vermelha). Coloração: HE. (Imagem cedida gentilmente pela professora Paula Vieira Teixeira Vidigal Departamento de Anatomia Patológica, UFMG) O prognóstico da CEP é desfavorável, porque, habitualmente, a doença é silenciosa e pode progredir para cirrose, hipertensão portal e insuficiência hepática. Além disso, pacientes com CEP apresentam maior risco de desenvolver colangiocarcinoma, que acomete 10%-15% desses indivíduos. Ainda não foi desenvolvida qualquer terapêutica que retarde o curso da doença. Estudos mostram que o ácido ursodesoxicólico é capaz de melhorar as alterações bioquímicas e reduzir a inflamação hepática, porém ainda não foi comprovada eficácia em aumentar a sobrevida. O transplante hepático é a única medida potencialmente curativa, com taxa de sobrevida aproximada de 83% em 1 ano e de 73% em 3 anos. Aspectos relevantes - A CEP é uma doença colestática crônica que cursa com obliteração progressiva das vias biliares intra e extra-hepáticas. - É uma doença rara que acomete mais homens do que mulheres, com idade média ao diagnóstico de 40 anos. - Possui etiologia ainda desconhecida e multifatorial, com provável componente autoimune. - O quadro clínico é marcado por fadiga, prurido e icterícia, mas a maioria dos pacientes é assintomática ao diagnóstico. - O diagnóstico é realizado pela demonstração de estreitamento e dilatação multifocais de ductos biliares intra e extrahepáticos aspecto em contas de rosário - na colangiorressonância magnética ou colangiografia endoscópica
5 - O prognóstico é desfavorável, sendo o transplante hepático a única medida potencialmente curativa. Referências - Kowdley KV, et al. Clinical manifestations and diagnosis of primary sclerosing cholangitis. In: UpToDate, Basow, DS (Ed), UpToDate, Waltham, MA, Kowdley KV, et al.treatment of primary sclerosing cholangitis. In: UpToDate, Basow, DS (Ed), UpToDate, Waltham, MA, Kowdley KV, et al.epidemiology and pathogenesis of primary sclerosing cholangitis. In: UpToDate, Basow, DS (Ed), UpToDate, Waltham, MA, Chapman R, Fevery J, Kalloo A, Nagorney DM, Boberg KM, Shneider B et al. Diagnosis and management of primary sclerosing cholangitis. Hepatology 2010 Feb; 51(2): Decock, S, McGee P, Hirschfield GM. Autoimmune liver disease for the non-specialist. Clinical Review. BMJ 2009; 339:b3305. Responsáves Juliana da Cunha Pimentel Ulhôa Acadêmica do 11º período de Medicina UFMG. ju_ulhoa[arroba]hotmail.com Rebeca Maciel Bizzotto Acadêmica do 11º período de Medicina UFMG. rebekmaciel[arroba]hotmail.com Orientadores Professora Luciana Diniz Silva, professora adjunta Departamento de Clínica Médica Faculdade de Medicina da UFMG. lucianadinizsilva[arroba]gmail.com Professor Unaí Tupinambás, sub-chefe do Departamento de Clínica Médica Faculdade de Medicina da UFMG; chefe do serviço de doenças infecto-parasitárias HC-UFMG. unaitupi[arroba]gmail.com Revisores Glauber Eliazar, Emília Valle e Profa. Viviane Parisotto - Caso produzido em parceria com a monitoria de Medicina Geral de Adultos II.
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