Apelação Cível nº fls.2

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1 APELAÇÃO CÍVEL Nº , DE FORO REGIONAL DE SÃO JOSÉ DOS PINHAIS DA COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE CURITIBA - 1ª VARA CÍVEL APELANTE: MUNICÍPIO DE SÃO JOSÉ DOS PINHAIS APELADOS: MARIA SELMA NAVAIS ALBINO E OUTRO RELATOR: DESEMBARGADOR EDUARDO SARRÃO RELATOR CONVOCADO: JUIZ MARCO ANTONIO ANTONIASSI APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE USUCAPIÃO. IMÓVEL SITUADO EM ÁREA DE INTERESSE AMBIENTAL (BACIA DO RIO ITAQUI). POSTURAS MUNICIPAIS QUE LIMITAM A OCUPAÇÃO ONDE ESTÁ INSERIDO O IMÓVEL. NECESSIDADE DE OBSERVÂNCIA DA LEGISLAÇÃO MUNICIPAL. PREVALÊNCIA DO INTERESSE PÚBLICO. IMPOSSIBILIDADE DA DECLARAÇÃO DO DOMÍNIO DO BEM CUJA METRAGEM É MUITO AQUÉM DA LEGALMENTE PREVISTA. INTERESSE PÚBLICO QUE SE SOBREPÕE AO PARTICULAR. LEGISLAÇÃO QUE VISA A OCUPAÇÃO ORDENADA DOS ESPAÇOS E PRESERVAÇÃO, TANTO QUANTO POSSÍVEL, DO MEIO AMBIENTE. IMPOSSIBILIDADE DA USUCAPIÃO. DECISÃO REFORMADA COM INVERSÃO DO ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. Página 1 de 9

2 Apelação Cível nº fls.2 VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº , de Foro Regional de São José dos Pinhais da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba - 1ª Vara Cível, em que é Apelante MUNICÍPIO DE SÃO JOSÉ DOS PINHAIS e Apelados MARIA SELMA NAVAIS ALBINO E OUTRO. I Trata-se de ação de usucapião promovida por Maria Selma Navais Albino e Valdir Rodrigues cujo pedido foi acolhido para o fim de reconhecer o domínio do imóvel objeto desta. Como interessado no feito o Município de São José dos Pinhais apresentou recurso de apelação. Alega o município estar a área usucapienda inserida em Unidade Territorial de Planejamento criada pelo Estado do Paraná através do Decreto Estadual 1.454/99, portanto, integra área de interesse de proteção de mananciais. A lei Municipal 29/2000 estabeleceu critérios de zoneamento estando o imóvel inserido na Zona de Urbanização Consolidada, a qual previu a manutenção dos padrões atuais de ocupação, sendo permitida uma moradia por lote em loteamentos já aprovados. Que a Lei Complementar 16/2005 que integra o plano diretor prevê a admissão de lotes de no mínimo m2, com testada mínima de 12 metros. O acolhimento do pedido importou em descumprimento da legislação municipal, não observando inclusive a função social da propriedade prevista constitucionalmente. O artigo 182 da Constituição Federal obriga os municípios com mais de habitantes à implantação do Plano Diretor, o qual deve ser observado. O Estatuto das Cidades Página 2 de 9

3 Apelação Cível nº fls.3 também prevê ser o plano diretor instrumento básico da política de desenvolvimento e expansão urbana. O imóvel está em área definida como Unidade Territorial de Planejamento do Itaqui, na bacia do rio Itaqui, portanto, área de relevante interesse público. Como o apelante sequer pode deferir pedido de subdivisão de imóveis sem a metragem adequada, também não pode aceitar a declaração de domínio em área inferior à legalmente estabelecida. Enfim, há de prevalecer o interesse público e o ordenamento municipal de posturas. Por tais razões pugna pelo provimento do apelo. O recurso de apelação foi regularmente recebido e contrarrazoado. A Douta Procuradoria Geral de Justiça emitiu parecer defendendo a manutenção da sentença recorrida. É a breve exposição. II - VOTO E SUA FUNDAMENTAÇÃO: Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação. Volta-se a insurgência do apelante, Município de São José dos Pinhais, em face da declaração do domínio ferir regramento próprio de posturas, já que o bem objeto desta ação está inserida na Zona de Urbanização Consolidada 1 (ZUC-1), referente à bacia do Rio Itaqui. Neste zoneamento é permitido apenas lotes com área mínima de 1.000,00 m2 (um mil metros quadrados), com testada mínima de 12,00 metros e esta exigência visa o ordenamento da ocupação com vista à preservação do meio ambiente, posto que o lote está na bacia do Página 3 de 9

4 Apelação Cível nº fls.4 Rio Itaqui, ou seja, área de manancial. Não há qualquer questionamento a respeito dos fatos acima reproduzidos. Enfim, a prevalecer a declaração do domínio nos moldes da sentença haveria expressa afronta a toda legislação municipal que trata das posturas, desenvolvimento ordenado com reflexos no meio ambiente. Como bem alegado no recurso de apelação a própria Constituição Federal consagra em seu artigo 5º, XXIII que a propriedade atenderá à sua função social e no artigo 182 determina que o ente público municipal deve ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade. Com base neste arcabouço constitucional o Município aprovou o plano diretor municipal. O artigo 27 da Lei Municipal 29/2000 instituiu a Unidade Territorial de Planejamento (UTP) do Itaqui, onde está inserido o imóvel usucapiendo. Nesta UTP, visando preservar a bacia do Rio Itaqui, área de mananciais e de acordo com a Zona de Urbanização Consolidada 1, admite-se apenas lotes com no mínimo 1.000,00 m2, enquanto que a área usucapienda tem apenas 271,00 m2. Em que pesem inúmeras posições diversas, inclusive nesta 18ª CC/TJPR, tenho que o interesse público supera o interesse individual e para a declaração do domínio, além dos requisitos específicos previstos no Código Civil, devem ser observadas as limitações e determinações municipais. Como o município está impedido de desmembrar um lote na área em questão com área aquém de 1.000,00 m2 (testada Página 4 de 9

5 Apelação Cível nº fls.5 mínima de 12,00 m), não é possível a burla, vias transversas, desta proibição via usucapião. Como dito este entendimento não é pacífico, mas encontra boa ressonância na jurisprudência, senão vejamos: STJ ) AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO. RECURSO ESPECIAL. USUCAPIÃO ESPECIAL. LEGISLAÇÃO MUNICIPAL. RECURSO ESPECIAL. NÃO CABIMENTO. PREQUESTIONAMENTO. AUSENTE. SÚMULA 211 DO STJ. USUCAPIÃO. ÁREA MENOR QUE MÓDULO URBANO. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. (AgRg nos EDcl no Agravo de Instrumento nº /RJ (2011/ ), 3ª Turma do STJ, Rel. Paulo de Tarso Sanseverino. j , unânime, DJe ). TJPR ) USUCAPIÃO ESPECIAL URBANO. LOTE QUE FAZ PARTE DE LOTEAMENTO ERIGIDO EM ÁREA DE MANANCIAL HÍDRICO (BACIA DO RIO PEQUENO), À MERCÊ DE AUTORIZAÇÃO E APROVAÇÃO DOS ÓRGÃOS COMPETENTES E ÀS AVESSAS DO QUE DISPÕE O PLANO DIRETOR DO MUNICÍPIO. 1. Área declarada como de interesse e Proteção Especial (Decreto Estadual nº 4267, de , Decreto Estadual nº 1751, de e Lei Federal 6.766, de ) e considerada como de preservação permanente pelo Código Florestal Brasileiro (Lei Federal nº 4.771, de ). Hipótese que desborda, portanto, da simples limitação administrativa para configurar limitação ao próprio direito de propriedade. Inviabilidade de usucapião proposto sobre bem assim considerado. 2. Imóvel imiscuído em loteamento com aproximadamente 270 unidades habitacionais, semelhantes aquela usucapienda. Fracionamento do solo em áreas menores do que a permitida pela Legislação Municipal, de ,00 m². Existência de vício na própria relação jurídica que se pretende modificar com a aquisição definitiva do imóvel. Apelação do Município de São José dos Pinhais, provida Página 5 de 9

6 Apelação Cível nº fls.6 para o efeito de julgar improcedente o pedido inicial. Recurso adesivo do autor prejudicado. (Apelação Cível nº , 17ª Câmara Cível do TJPR, Rel. Lauri Caetano da Silva. j , unânime, DJe ). TJPR ) APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DE USUCAPIÃO DE IMÓVEL URBANO, SITUADO NO JARDIM MODELO, EM SÃO JOSÉ DOS PINHAIS (ART. 14 DO ESTATUTO DA CIDADE). RECURSO DE APELAÇÃO. 1) Alegação de loteamento inexistente. Ocupação desordenada. Inobservância de Lei Municipal (Lei Complementar nº 10/2004) e de legislação estadual (Decreto nº 4.267/2005) que restringem o uso do solo. Zona de ocupação restrita (ZEOR-2). Imóvel com área inferior a m². Área de manancial hídrico de abastecimento público, de interesse e de proteção especial. Bacia do rio pequeno. Colisão de direitos fundamentais (moradia e meio ambiente). Prevalência do direito de titularidade coletiva, em detrimento da busca individual da propriedade (art. 225 da Constituição Federal). Não observação da Lei Federal nº /01 (art. 2º, VI). Qualidade da posse. Lei Municipal que limita a ocupação do solo, determinando uma unidade familiar a cada m². Posse que pode ser exercida, desde que atendida sua função sócio - ambiental, fato que não se verifica nestes autos, e que obsta a declaração de domínio. Improcedência do pedido exordial. Inversão dos ônus sucumbenciais. Art. 20, 4º, do CPC. Recurso de Apelação 2). Argumentação de falta de fixação dos ônus sucumbenciais. Situação modificada. Fixação da sucumbência nesta instância. Recurso prejudicado. Sentença reformada. Recurso de Apelação 1) provido. Recurso de Apelação 2) prejudicado. (Apelação Cível nº , 17ª Câmara Cível do TJPR, Rel. Stewalt Camargo Filho. j , unânime, DJe ). Ainda: Página 6 de 9

7 Apelação Cível nº fls.7 CIVIL - RECURSO ESPECIAL - USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIO - ÁREA INFERIOR AO MÓDULO URBANO - LEI MUNICIPAL - VEDAÇÃO - ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO AOS ARTS. 550 e 552 DO CC/16 - INOCORRÊNCIA. 1 - In casu, como bem ressaltado no acórdão impugnado, o imóvel que se pretende usucapir não atende às normas municipais que estabelecem o módulo mínimo local, para parcelamento do solo urbano. (fls. 168/169), não constituindo o referido imóvel, portanto, objeto legalizável, nos termos da lei municipal. Conforme evidenciado pela Prefeitura Municipal de Socorro, no Ofício de fls. 135, o módulo mínimo para o parcelamento do solo urbano daquele município é de 250m2, e o imóvel em questão possui apenas 126m2. Ora, caso se admitisse o usucapião de tal área, estar-se-ia viabilizando, de forma direta, o registro de área inferior àquela permitida pela lei daquele município. Há, portanto, vício na própria relação jurídica que se pretende modificar com a aquisição definitiva do imóvel. 2 - Destarte, incensurável o v. acórdão recorrido (fls. 169) quando afirmou que "o entendimento do pedido implicaria em ofensa a norma municipal relativa ao parcelamento do solo urbano, pela via reflexa do usucapião. Seria, com isso, legalizado o que a Lei não permite. Anotou, a propósito, o DD. Promotor de Justiça que, na Comarca de Socorro, isso vem ocorrendo "como meio de buscar a legitimação de parcelamento de imóveis realizados irregularmente e clandestinamente. 3 - Recurso não conhecido. (REsp /SP, da 4ª T. do STJ, Rel.º Min.º JORGE SCARTEZZINI, in DJ 06/12/2004). Da fundamentação desta decisão colho o seguinte ensinamento, válido para o caso em comento: In casu, como bem ressaltado no acórdão impugnado, o imóvel que se pretende usucapir não atende às normas municipais que estabelecem o módulo mínimo local, para parcelamento do solo urbano. Página 7 de 9

8 Apelação Cível nº fls.8 (fls. 168/169), não constituindo o referido imóvel, portanto, objeto legalizável, nos termos da lei municipal. Conforme evidenciado pela Prefeitura Municipal de Socorro, no Ofício de fls. 135, o módulo mínimo para o parcelamento do solo urbano daquele município é de 250m2, e o imóvel em questão possui apenas 126m2. Ora, caso se admitisse o usucapião de tal área, estar-se-ia viabilizando, de forma direta, o registro de área inferior àquela permitida pela lei daquele município. Há, portanto, vício na própria relação jurídica que se pretende modificar com a aquisição definitiva do imóvel. Como assevera ORLANDO GOMES, para a aquisição, transferência, modificação ou extinção de um direito, não basta a manifestação da vontade do sujeito de direitos. É preciso ainda que seja intencional e conforme a lei (in "Introdução ao Direito Civil", 7º ed., pág. 231). Enfim, a declaração de usucapião pretendida pelo apelado fere expressos dispositivos legais agora não podem ser ignorados. Diante do exposto, voto no sentido de conhecer e dar provimento ao recurso de apelação para o fim de julgar improcedente o pedido, invertendo o ônus da sucumbência. III - DECISÃO: ACORDAM os Magistrados integrantes da Décima Oitava Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em conhecer do recurso e dar-lhe provimento. Página 8 de 9

9 Apelação Cível nº fls.9 Presidiu o julgamento, sem voto, o Excelentíssimo Senhor Desembargador Luiz Cezar Nicolau, e dele participou o Excelentíssimo Senhor Desembargador Albino Jacomel Guerios e a Excelentíssima Senhora Juíza Denise Antunes. Curitiba, 19 de março de Juiz MARCO ANTONIO ANTONIASSI Relator Página 9 de 9