ACÓRDÃO. Rio de Janeiro, / /2012. Des. Cristina Tereza Gaulia. Relator

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1 ESTADO DO RIO DE JANEIRO TRIBUNAL DE JUSTIÇA 5ª CÂMARA CÍVEL Apelação Cível n. : Apelante: Julio Cezar Silva de Menezes Apelado: Departamento de Trânsito do ERJ - DETRAN Juiz: Dr.ª Beatriz Prestes Pantoja Relator: Des. Cristina Tereza Gaulia Ementa: Apelação cível. Administrativo. Ação anulatória de multas de trânsito c/c obrigação de fazer e indenizatória por danos morais. Pretensão que se funda em clonagem do veículo do autor. Extinção do processo sem resolução do mérito pelo juízo de 1º grau pelo reconhecimento da ilegitimidade passiva do DETRAN. Autarquia titular do cadastro geral de veículos e com atribuição para o registro e cancelamento de infrações de trânsito. Legitimidade passiva que se apresenta. Reforma. Causa madura. Aplicação do 3º do art. 515 do CPC. Multas de trânsito. Atos administrativos com presunção relativa de legitimidade. Clonagem do veículo e prática das infrações por veículo irregular comprovadas. Anulação das multas e da pontuação negativa incidente na espécie. Substituição das placas alfanuméricas. Conduta necessária ao restabelecimento da segurança tanto do proprietário, quanto da coletividade, restabelecendo-se a individualidade do veículo. Inteligência do 1º do art. 115 do CTB. Dano moral. Transtornos não imputáveis à autarquia-ré. Inexistência de obrigação de indenizar. Provimento parcial do recurso. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os argumentos da apelação cível referida, em que são partes as acima indicadas, ACORDAM os Desembargadores da Quinta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, por, em DAR PARCIAL PROVIMENTO ao recurso, na forma do voto do Relator. Rio de Janeiro, / /2012. Des. Cristina Tereza Gaulia Relator

2 RELATÓRIO Trata-se de apelação cível interposta por Julio Cezar Silva de Menezes à sentença da 8ª Vara Cível de Niterói que, nos autos da ação anulatória c/c indenizatória movida em face do Departamento de Trânsito do Estado do Rio de Janeiro DETRAN/RJ, reconheceu a ilegitimidade passiva e extinguiu o processo sem resolução do mérito, na forma do art. 267, VI do CPC. Fundamentou o juízo de 1º grau que, tratando-se pretensão anulatória de multa de trânsito, deveria figurar no polo passivo a pessoa jurídica q que está vinculada o órgão autuador, tendo em vista que DETRAN funciona apenas como banco de dados, registrando as infrações que lhe são passadas pelos entes autuadores. Em razões de apelação, às fls. 119/151, o autor sustenta que, configurada a clonagem da placa de seu veículo, compete ao órgão de trânsito estadual o cancelamento das multas aplicadas e suas decorrências, conforme o art. 7º, III e 22, III a VI da Lei nº 9.503/97 (CTB). Registra, ainda, que, de acordo com os arts. 37, 6º da CF; 43, 186 e 927 do CC; e 1º, 3º do CTB, o órgão de trânsito possui responsabilidade objetiva pelos danos, inclusive morais, decorrentes de sua atuação ou inação. Ao final, requer o provimento do recurso, reformando-se a sentença para julgar procedente a pretensão autoral e anular as multas impostas a seu veículo, bem como cancelar a pontuação delas decorrente, e condenar a autarquiaré ao pagamento de indenização por danos morais em valor a ser arbitrado, além das despesas sucumbenciais. Contrarrazões, às fls. 154/157. A Procuradoria de Justiça, às fls. 161/166, opina pelo provimento do recurso. É o relatório. VOTO Atendidos os requisitos legais de admissibilidade, é caso de conhecimento do presente recurso. Cinge-se a controvérsia recursal ao exame da legitimidade do DETRAN/RJ para figurar no polo passivo da presente demanda, em que se pleiteia a anulação de multas por infrações de trânsito; e, em caso

3 positivo, da aferição quanto a encontrar-se a causa madura ou não para julgamento. A legitimidade passiva do DETRAN para ações em que se pleiteia a anulação de multas por infrações de trânsito já foi afirmada por esta Corte, tendo como base o argumento de que a citada autarquia, em decorrência da titularidade do cadastro geral de veículos, possui a atribuição para o registro e cancelamento de infrações de trânsito. Refirase: REsp /RS PRIMEIRA TURMA Rel. Min. LUIZ FUX Rel. p/acórdão Min. TEORI ALBINO ZAVASCKI Julgamento: 14/06/2011 Publicação: DJe 30/06/2011 PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. DEMANDA OBJETIVANDO A ANULAÇÃO DE PENALIDADES POR INFRAÇÃO DE TRÂNSITO. LEGITIMIDADE PASSIVA DO DETRAN/RS. MATÉRIA FÁTICA. REEXAME. INVIABILIDADE. SÚMULA 07/STJ. RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO, DIVERGINDO DO RELATOR APELAÇÃO QUINTA CÂMARA CÍVEL DES. ANTONIO SALDANHA PALHEIRO Julgamento: 14/02/2012 APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO ADMINISTRATIVO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE AUTO DE INFRAÇÃO CUMULADO COM PEDIDO DE DANOS MORAIS. RECURSO INTERPOSTO UNICAMENTE PELO DETRAN PUGNANDO PELA ILEGITIMIDADE DO ÓRGÃO PARA PROCEDER AOS CANCELAMENTOS DAS MULTAS DE TRÂNSITO DO PERÍODO DE A DIANTE DA NÃO COMPROVAÇÃO DA NOTIFICAÇÃO DA AUTUAÇÃO. A LEGITIMIDADE PASSIVA TRADUZ-SE NA PERTINÊNCIA SUBJETIVA DA AÇÃO QUE, NO POLO PASSIVO, SE CONFIGURA NO INTERESSE DA PARTE EM DEFENDER-SE DOS EFEITOS DA TUTELA JURISDICIONAL CONTRA ELA INVOCADA. ASSIM, TEM LEGITIMIDADE PASSIVA O DETRAN A QUEM É ATRIBUÍDO O PEDIDO DE CANCELAMENTO DAS MULTAS. DECISÃO, NA FORMA DO ARTIGO 557 DO CPC, NEGANDO SEGUIMENTO AO RECURSO. AGRAVO INTERNO. NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO APELAÇÃO NONA CÂMARA CÍVEL DES. ROGERIO DE OLIVEIRA SOUZA Julgamento: 18/07/2011 APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO ADMINISTRATIVO. MULTA DE TRÂNSITO. CLONAGEM DE PLACA DE VEÍCULO. CANCELAMENTO DAS EXAÇÕES. REALIZAÇÃO DE VISTORIA. DANOS MORAIS. LEGITIMIDADE PASSIVA DO

4 DETRAN. O DETRAN/RJ, órgão de trânsito do Estado do Rio de Janeiro, é responsável pela coordenação do cadastro de motoristas e veículos (CTB, art. 7º, III), devendo, pois, figurar no polo passivo em demanda que visa a atualização do prontuário dos condutores de veículos automotores, porquanto tem atribuição para o cancelamento de multas. (...) Conhecimento dos recursos para negar seguimento ao 1º e dar provimento ao 2º. Destarte, inafastável a anulação da sentença, devendo ser apreciado o meritum causae, o que, fundado no art º do CPC 1 e sem risco de supressão de instância, deve ser procedido nesta segunda instância. A aplicação de multas de trânsito se dá através de atos administrativos que, por natureza, ostentam presunção de legitimidade. Neste contexto, na forma do art. 333, I do CPC 2, cabe ao autor comprovar a clonagem da placa de seu veículo bem como a prática das infrações pelo veículo clonador, argumentos no qual funda sua alegação de não cometimento das infrações que lhe são imputadas, sob pena de não afastamento da presunção de legitimidade do ato emanado do ente público. No caso em tela, a clonagem e a prática das infrações pelo veículo clonador encontram-se comprovadas pelo cotejo das fotos de seu veículo (fls. 23, 28, 30, 32) com as constantes dos autos de infração (fls. 24/27, 29, 31 e 33), bem como pelos registros de ocorrência de fls. 34/35 e 69/74, e pelo laudo de exame acostado à fl. 36. Confirmada a clonagem, inafastável o direito da autora à anulação dos autos de infração elencados na inicial (fl. 03), afastando-se as multas e pontuação negativa em desfavor do autor deles decorrentes. Acerca da substituição da placa, registre-se que, de acordo com o 1º do art. 115 do CTB 3, os caracteres alfanuméricos dela constantes individualizam o veículo, de modo que a confirmação da clonagem é motivo suficiente para o reconhecimento de que os caracteres da placa original já não mais representam sua individualidade. Destarte, apresenta-se razoável, tanto para a segurança do proprietário, quanto da 1 Art. 515 (...) 3 o Nos casos de extinção do processo sem julgamento do mérito (art. 267), o tribunal pode julgar desde logo a lide, se a causa versar questão exclusivamente de direito e estiver em condições de imediato julgamento. 2 Art O ônus da prova incumbe: I - ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito; 3 Art O veículo será identificado externamente por meio de placas dianteira e traseira, sendo esta lacrada em sua estrutura, obedecidas as especificações e modelos estabelecidos pelo CONTRAN. 1º Os caracteres das placas serão individualizados para cada veículo e o acompanharão até a baixa do registro, sendo vedado seu reaproveitamento.

5 coletividade, o temperamento daquela regra, admitindo-se a substituição da referência alfanumérica original. Neste sentido, refira-se a jurisprudência: APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO VIGÉSIMA CÂMARA CÍVEL DES. LETÍCIA SARDAS Julgamento: 03/08/2010 "APELAÇÃO E REEXAME NECESSÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. ANULAÇÃO DE ATO ADMINISTRATIVO. MULTA. PEDIDO DE TROCA DE PLACA. VEÍCULO CLONADO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA PARCIAL. (...) 3. Apesar do art. 115, 1 do Código Nacional de Trânsito prever que o numerário da placa identificativa deverá acompanhar o veículo até a data de sua baixa, a clonagem é motivo grave o suficiente para permitir o afastamento desta regra e autorizar a entrega de outro numerário à impetrante (...) 5. Desprovimento do recurso e manutenção da sentença em reexame necessário, por ato do relator." Por fim, no que concerne à pretensão indenizatória por danos morais, não há como acolhê-la, pois, ainda que evidentes os transtornos graves sofridos pelo autor em decorrência da clonagem, não há como associá-la a qualquer ação ou omissão da autarquia-ré, tendo em vista que, a despeito de responsável pela fiscalização do emplacamento de veículos (art. 22, III, CTB 4 ), revela-se impossível seu cumprimento nas vias de circulação, o que exigiria verdadeira onipresença, e, além disto, as autuações por meio eletrônico foram, num primeiro momento, regulares. Inexiste, pois, o nexo causal, elemento necessário à configuração da obrigação indenizatória. Neste sentido, refira-se: ( ) APELAÇÃO SEGUNDA CÂMARA CÍVEL DES. JESSÉ TORRES Julgamento: 19/07/2006 APELAÇÃO. Dano moral. Erro de atuação de polícia administrativa, na imposição de multa de trânsito que se vem a mostrar indevida, não lesiona direitos da personalidade. Insere-se no círculo do mero aborrecimento, a que os cidadãos estão sujeitos em face de eventual falha nos controles sobre o complexo trânsito dos centros urbanos. Ademais, a clonagem do veículo, que trafegava com licença vencida, segundo narra o próprio autor, 4 Art. 22. Compete aos órgãos ou entidades executivos de trânsito dos Estados e do Distrito Federal, no âmbito de sua circunscrição: (..) III - vistoriar, inspecionar quanto às condições de segurança veicular, registrar, emplacar, selar a placa, e licenciar veículos, expedindo o Certificado de Registro e o Licenciamento Anual, mediante delegação do órgão federal competente; (...)

6 rompe o nexo de causalidade. Improcedência do pleito reparatório. Recurso a que se nega provimento. Isso posto, voto no sentido do PROVIMENTO PARCIAL do recurso para reformar a sentença e, com base no 3º do art. 515 do CPC, julgo procedente em parte a pretensão autoral para anular os autos de infração elencados na inicial (fl. 03), bem como multas e pontuação negativa em desfavor do autor daqueles decorrentes, o que deve ser feito no prazo de 30 (trinta) dias, pena de multa diária de R$ 50,00 (cinquenta reais), bem como determinar que, no mesmo prazo de 30 (trinta) dias, a autarquia-ré substitua a placa de identificação e a documentação do veículo Ford Ecosport XLT 1.6, de propriedade do autor, sob pena de multa diária de R$ 100,00 (cem reais), julgando-se improcedente a pretensão aos danos morais, com sucumbência recíproca, reconhecida a isenção da autarquia quanto aos pagamento das custas e da taxa judiciária. Des. Cristina Tereza Gaulia Relator