As práticas de letramento digital na formação de professores
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- João Henrique Caiado Carvalhal
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1 As práticas de letramento digital na formação de professores Nádie Christina Machado Spence 1 1 Programa de Pós-Graduação em Informática na Educação Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Porto Alegre (RS) Brasil nadiechristina@gmail.com Resumo. Este artigo apresenta resultados da fase exploratória de uma pesquisa sobre práticas de letramento digital durante a formação inicial de professores. A pesquisa tem como objetivos identificar como e em que medida as disciplinas ofertadas para as licenciaturas promovem o letramento digital e, consequentemente, habilitam os professores à promoção da inclusão digital. A metodologia fundamenta-se em análise de narrativas sobre práticas de letramento digital entre alunos de licenciaturas em uma universidade pública. Os dados permitem identificar tanto as resistências iniciais quanto a descoberta de possibilidades pedagógicas associadas ao uso de tecnologias digitais. 1. Introdução Os dados apresentados aqui compõem a fase inicial de uma pesquisa de pós-doutorado sobre o letramento digital entre alunos de cursos de licenciatura numa universidade pública. A pesquisa deverá se estender durante 2012 e incluir grupos focais e entrevistas como técnicas para a coleta de dados. O plano inicial da pesquisa procurava verificar as práticas de letramento de alunos do curso de Pedagogia em comparação com as práticas de letramento observadas em alunos do mesmo curso na modalidade a distância. Este foco foi ampliado e atualmente envolve as práticas de letramento de alunos das Licenciaturas presenciais em comparação com os letramentos de alunos da Licenciatura 1 a distância, verificando as implicações e desdobramentos destas práticas nas atividades docentes realizadas pelos alunos durante o estágio. Sabemos que os alunos na modalidade a distância utilizam intensamente as tecnologias de informação e comunicação, atribuindo sentido à estas práticas e buscamos identificar se os alunos de cursos presenciais, através das disciplinas oferecidas, também conseguem atribuir sentidos e incorporá-las ao seu fazer docente. Para mapear as trajetórias de letramento dos alunos presenciais a pesquisa analisa as narrativas destes alunos em vários momentos e de diferentes formas: observação dos alunos em eventos de letramento, registros das aprendizagens, grupos focais e entrevistas. Os resultados visam contribuir para uma reflexão acerca do currículo das licenciaturas e da construção de saberes docentes voltados para o desenvolvimento do letramento digital. Apesar do estudo envolver um contexto específico, o projeto deverá tornar público seus resultados e assim promover a reflexão em instituições que atuem na formação de professores acerca das possibilidades e limites das modalidades presencial e a distância para o desenvolvimento do(s) 1 Aqui nos referimos exclusivamente a alunos/as do curso de Pedagogia, cujos dados coletamos durante a realização da tese de doutorado, realizada com bolsas da CAPES e CNPq e intitulada: Estudo das Trajetórias de Letramento em Curso de Educação a Distância: o texto, o papel e a tela do computador. Disponível em:
2 letramento(s) como um processo contínuo e de essencial importância entre aqueles que irão atuar na educação básica. Nesta perspectiva o problema de pesquisa se organiza da seguinte maneira: De que modo ou em que medida o letramento digital é promovido entre alunos de Licenciaturas na modalidade presencial? O estudo exploratório, aqui apresentado, buscou estabelecer relações entre as trajetórias de letramento dos alunos e as práticas de letramento digital que realizam. 2. Fundamentação teórica 2.1. Letramentos Segundo Magda Soares (1998 e 2002, p.145) letramento é o estado ou condição de indivíduos ou de grupos sociais de sociedades letradas que exercem efetivamente as práticas sociais de leitura e de escrita, participam competentemente de eventos de letramento. Este conceito se amplia quando Soares (2002) discute o letramento na cibercultura, justificando a utilização do termo no plural para [...] enfatizar a idéia de que diferentes tecnologias de escrita geram diferentes estados ou condições naqueles que fazem uso dessas tecnologias, em suas práticas de leitura e de escrita: diferentes espaços de escrita e diferentes mecanismos de produção, reprodução e difusão da escrita resultam em diferentes letramentos. Bolter (1991, p.11) define de espaço de escrita como [...] o campo físico e visual definido por uma determinada tecnologia de escrita [...]todas as formas de escrita são espaciais [...] sendo que só podemos ver e compreender os sinais de escrita estendidos em pelo menos duas dimensões. Cada tecnologia nos dá um espaço diferente. Assim, a tela como novo espaço de escrita produz [...] significativas mudanças nas formas de interação entre o escritor e leitor, entre escritor e texto, entre leitor e texto, e até mesmo, mais amplamente, entre o ser humano e o conhecimento (SOARES, 2002, p.151). Seria esperado que ao longo da formação universitária houvesse a promoção destas práticas e, consequentemente, a mudança no estado ou condição de letramento dos professores em formação, habilitando-os para o uso de diferentes suportes e assim multiplicando essas práticas sociais O papel da universidade na promoção dos letramentos O uso das tecnologias de informação e comunicação na educação é demasiado recente e, mesmo entre quem está concluindo o ensino médio, hoje ainda há predomínio de atividades de leitura e escrita no suporte do papel. A introdução de novas práticas na Universidade necessita de estudos que acompanhem o movimento de transição e a apropriação do novo suporte, respaldando os docentes no Ensino Superior a pensarem sobre seus planejamentos de forma a contribuir com o desenvolvimento dos letramentos dos alunos. Teixeira (2010, p. 66) considera que 2 Mesmo sabendo da importância da educação continuada e permanente do professor, este profissional deveria poder se apropriar autônoma e coletivamente dos avanços e dos recursos disponíveis à sociedade em suas práticas pedagógicas, o que expõe a importância de que os cursos de licenciatura atentem para esse aspecto de forma veemente.
3 O autor ainda enfatiza que um dos problemas que geralmente ocorrem na formação universitária reside na reprodução de modelos que acentuam o distanciamento entre as Tecnologias de Rede (TRs) e o processo de formação, mediante o oferecimento de disciplinas optativas, com carga horária insuficiente, acomodadas na estrutura curricular, a qual formata as características das TRs à lógica tradicional, e no distanciamento das tecnologias das demais disciplinas e atividades acadêmicas, numa dinâmica que pouco contribui para a tarefa de fomentar o desenvolvimento de uma cultura de rede (Teixeira, op. cit., p.67). Partindo do pressuposto, já sinalizado anteriormente, que os alunos na modalidade a distância (ou semi-presencial) são muito mais exigidos em termos de fluência no uso das tecnologias de rede, utilizando cotidianamente ferramentas de escrita colaborativa, chats e fóruns e atribuindo sentido a estas práticas. Ainda no caso de polos distantes da sede onde a biblioteca dispõe de um número limitado de livros, as pesquisas realizadas são predominantemente online, o que estimula a leitura na tela, mesmo que seja para uma pré-seleção de textos que posteriormente serão impressos. Por outro lado, os alunos presenciais desenvolvem mais a sua habilidade de expressão oral e teriam mais acesso à biblioteca da universidade, podendo assim realizar mais intensamente a leitura no suporte de papel. Ambos estão se qualificando para enfrentar realidades similares em escolas públicas ou privadas, muitas das quais ainda tem acesso restrito ao uso das Tecnologias de Informação e Comunicação. 3. Os sujeitos da pesquisa A seleção dos alunos participantes nesta fase exploratória; realizada entre agosto e dezembro de 2011 com uma turma de uma disciplina optativa para o curso de Pedagogia e obrigatória para as demais licenciaturas; considerou o instrumento de avaliação aplicado ao final do semestre, onde os alunos autorizavam o uso dos registros para fins de pesquisa. Este instrumento foi respondido por 22 alunos (dos 48 alunos matriculados) que autorizaram o uso dos registros. A amostra caracterizou-se por ter alunos do 1 ao 9 semestre. Mais da metade dos participantes era do sexo masculino (52,17%) e a distribuição por cursos contemplou diversas áreas de formação: Química, Física, Biologia, Ciências Sociais, Artes Visuais, Teatro, Enfermagem, Educação Física, Pedagogia, Geografia e Letras. Os dados obtidos através do questionário foram cruzados com os registros nos Portfólios de Aprendizagem (blogs) realizados ao longo do semestre Coleta e tratamento dos dados Os dados foram obtidos de duas formas: a) registros das atividades realizadas pelos alunos, de agosto a dezembro, nos seus Portfólios Educacionais (blogs); e, b) questionário online (survey) para avaliação final da disciplina. Da primeira fonte selecionamos as postagens que remetiam à trajetória de letramento e à reflexão sobre o uso das tecnologias na escola. Da segunda fonte selecionamos as questões abertas que destacavam descobertas/aprendizagens mais significativas do semestre e desdobramentos das atividades. Para a análise qualitativa dos dados foi utilizado o software Nvivo 9.2, que permite realizar análise de conteúdo, conforme especificado por Bardin (1977), no que concerne ao processo de codificação, e por Flores (1994), no que concerne à categorização das informações Resultados parciais
4 4 O survey solicitava aos alunos que destacassem os aspectos que consideraram mais significativos ao longo do semestre. As atividades no blog, por sua vez, solicitaram mais especificamente que os alunos refletissem sobre tecnologia e ensino em sala de aula. Foi interessante observar que o uso das tecnologias e as discussões decorrentes deste receberam destaque por boa parte dos respondentes como é possível observar nos excertos abaixo: As diferentes formas de inserirmos tecnologia no ambiente de aprendizado foi um ponto positivo. Mas o que realmente importa é a forma como a professora conduz as discussões salientando pontos importantes e questionando posições acomodadas por parte dos alunos. A experiência da disciplina vem da relação entre os diferentes ouvintes, mas que para isso, é necessário ter-se um bom mediador. Neste caso o professor. (Aluno 1, Química, 1 semestre) Aprendi sobre a necessidade de utilizar diferentes tecnologias em aula, sempre tendo como principal objetivo o aprendizado dos alunos. Aprendi a realizar um plano de aula explicitando objetivos gerais e específicos de cada atividade. (Aluna 3, Teatro, 4 semestre) Sobre o uso de tecnologias, talvez uma assistência maior, mas não comprometeu, é que a tecnologia tem lá os seus problemas... (Aluno 4, Artes Visuais, 6 semestre) Eu aprendi que o professor deve ser didático e claro nas suas explicações e se apropriar das tecnologias para que a aula seja mais interessante. (Aluna 17, Enfermagem, 6 semestre) Quando questionada sobre Qual é o conteúdo mais significativo e que você recomenda à professora reapresentar aos novos alunos? a mesma aluna responde... A tecnologia na educação. Todavia o contato com as tecnologias, conforme mencionado por Teixeira (2010), nem sempre acontece no espaço acadêmico e, quando ocorre, nem sempre causam o impacto desejado Achei muito interessante o ponto da tecnologia em sala de aula. Já fiz várias cadeiras da educação e poucas foram as que realmente abordaram bem esse tema. [...] Achei muito interessante termos esse contato maior com tecnologias, apesar de que eu já estou bem acostumado com tecnologia porque desde os 7 anos tenho contato com computadores, porém achei muito legal isso na faculdade pois nem todos tinham esse contato com esse tipo de instrumento. (Aluno 6, Biologia, 1 semestre) O uso das tecnologias, como o moodle e os blogs. Foi a primeira vez em toda a minha trajetória na universidade que foi utilizada essa ferramenta. Mesmo eu não tendo um bom desempenho com esse conteúdo, eu penso que deveria ter também nas outras disciplinas, principalmente na Faced, pois pouco é possível se fazer com apenas a aula de 2 créditos. É preciso que se possa continuar trabalhando a disciplina para que os conhecimentos sejam de fato assimilados e compreendidos. (Aluno 10, Ciências Sociais, 4 semestre) A familiaridade do aluno 6 com o uso de computador e internet é anterior ao ingresso na universidade. Ele se considera acostumado. Todavia isso não indica uso competente destes recursos nas práticas sociais de oralidade, leitura e escrita, muito menos nas práticas docentes.
5 No caso do Aluno 10 o primeiro contato com ferramentas como Ambientes Virtuais de Aprendizagem e os blogs só ocorreu no 4 semestre, praticamente na metade do curso. Isso reforça nossa hipótese inicial de que os alunos presenciais são menos expostos e exigidos quanto ao uso de tecnologias e as disciplinas oferecidas com pouca carga horária contribuem timidamente para as mudanças no seu estado ou condição. Mesmo entre os nativos a proposta da disciplina causou impacto A tecnologia. No início, a maneira que a professora abordou o assunto fiquei perdida (eu, com 19 anos, que nasci no meio de tudo isso). Imagina quem é mais velho, como se sentiu? Foi a primeira disciplina que trabalhou com algo de hoje, algo novo. Achei muito bom! (Aluna 15, Educação Física, 4 semestre, Blog) O registro se reforça com a resposta ao survey, quando a aluna declara que Nesta disciplina a professora [...] conseguiu mostrar alguns aspectos importantes para a docência. [...] Um que a prof [...]pediu que foi a primeira vez em 2 anos, foi o blog. Achei interessantíssimo, pois além de obrigar alguns determinados alunos que não falam nada em sala de aula a se expressar, é um registro pra vida toda! (Aluna 15, Educação Física, 4 semestre) A aluna 15 destaca a experiência inovadora com o uso de blogs e o papel que isso desempenhou na dinâmica do grupo e na formação de redes de aprendizagem. As ideias de alguns alunos só se materializaram nos blogs, onde o texto adquire forma e o contexto se constrói coletivamente. As interações nos blogs foram mapeadas em dois momentos (setembro e dezembro de 2011) com o uso do software UCINET 6.0 e revelaram uma considerável ampliação na rede. Aqueles que num primeiro momento se mostravam isolados, num segundo olhar haviam conquistado seguidores e suas idéias se materializaram, ou melhor, se transformaram num registro para a vida toda! 4. Considerações finais A fase exploratória da pesquisa contribuiu para reforçar nossas hipóteses iniciais e os resultados sinalizam caminhos a serem seguidos nas próximas etapas. De certo modo surpreende que os alunos tenham tido o primeiro contato com as tecnologias numa disciplina que nem tinha estas como tema central, outrossim, as utilizou como um meio de promover as interações e criar redes de aprendizagem, potencializando a realização de atividades colaborativas e cooperativas. Os aspectos mais preocupantes desta análise residem no fato das atividades terem sido insuficientes para consolidar conhecimentos ou saberes como definem Freire (1996), Tardif & Raymond (2001), assim como para produzir mudanças significativas no estado ou condição de letramento digital destes professores em formação. Referências Bardin, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, Flores, G. J. Análisis de datos cualitativos. Aplicaciones a la investigación educativa. Barcelona: PPU, Freire, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 26 ed., Soares, Magda. Novas práticas de leitura e escrita: letramento na cibercultura. Educ. Soc., Campinas, v. 23, n. 81, Dec Available from <
6 6 script=sci_arttext&pid=s &lng=en&nrm=iso>. access on 03 June doi: /S Alfabetização e Letramento. São Paulo: Contexto, 2003a.. Letramento e Escolarização. In: RIBEIRO, Vera M. et al.(org.) Letramento no Brasil: reflexões a partir do INAF São Paulo: Global, p , 2003b.. Letramento: um tema em três gêneros. Belo Horizonte: Autêntica, 2003c. Tardif, Maurice; Raymond, Danielle. Saberes, tempo e aprendizagem do trabalho no magistério. Educ. Soc., Campinas, v. 21, n. 73, Dec Available from < access on 22 July doi: /S Teixeira, Adriano C. Inclusão digital:novas perspectivas para a informática educativa. Ijuí: Ed. Unijuí, 2010, 152 p.. (Org.) ; MARCON, K. (Org.). Inclusão digital: experiências,desafios e perspectivas. 1. ed. Passo Fundo/RS: Editora UPF, v p.
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