TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Transcrição

1 (o TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO ACÓRDÃO/DECISÃO MONOCRATICA ACÓRDÃO Processo - Suspensão - Execução de título extrajudicial - Pessoa jurídica em recuperação judicial - Hipótese legal de novação condicional - Plano de recuperação a ser cumprido em 2 anos - Interpretação sistemática dos arts , "caput", l e 2, e 62 da Lei n /05 - Biênio da supervisão judicial esgotado Prosseguimento da execução singular se provado o descumprimento do plano, sob o crivo do juízo da recuperação - Condição resolutiva não provada - Prosseguimento vedado - Recurso provido. Vistos, relatados e discutidos estes autos de AGRAVO DE INSTRUMENTO N , da Comarca de São Paulo, sendo agravante Grupo de Comunicações Três S/A. (em recuperação judicial) e agravada Norske Skog Parengo B.V.. ACORDAM, em Décima Segunda Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça, por votação unânime, dar provimento ao recurso. Ajuizada ação de execução de título extrajudicial pela agravada contra a agravante e depois de transcorrido lapso para a recuperação judicial previsto no art. 61 da Lei n /05, requereu a agravada o

2 prosseguimento do feito, deferido pelo juízo de primeiro grau que facultou a indicação de bens à penhora, sob entendimento de que concedida a recuperação judicial há mais de dois anos, não se justifica a suspensão requerida pela agravante. Inconformada, a agravante se insurge, expondo que nos autos da recuperação judicial foi aprovado plano de recuperação, homologado judicialmente, de forma que a dívida objeto da execução deve ser paga no processo de recuperação. Acrescenta que a credora se habilitou naqueles autos e recebeu uma parcela, agindo de má-fé ao pretender receber a totalidade do crédito, sem se submeter ao plano homologado. Sustenta que a r. decisão viola os artigos 6 o, 47, 49, 51, 52 e 59 da Lei n /05, pois é vedado à empresa em recuperação judicial fazer pagamentos de créditos fora do processo, sob pena de decretação da falência e configuração de crime falimentar. Pretende a suspensão da execução, uma vez que a dívida está sujeita ao plano de recuperação. agravada contraminutou. Deferido efeito suspensivo ao recurso, a É o relatório. Assiste razão à agravante. AGRV.N São Paulo - VOTO EM

3 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO Oi SÃO PAULO 3 O art. 59 da Lei n /05 estatui que: "O plano de recuperação judicial implica novaçao dos créditos anteriores ao pedido, e obriga o devedor e todos os credores a ele sujeitos, sem prejuízo das garantias, observado o disposto no 1 do art. 50 desta Lei". Uma interpretação literal conduziria à extinção do processo de execução, visto que a novaçao opera a extinção da obrigação primitiva e dá nascimento a uma outra, gerando, também, a extinção dos acessórios e das garantias. Todavia, a interpretação sistemática da Lei n /05 repele essa conclusão. O art. 61, 2, da lei preconiza a decretação da falência, em virtude do descobrimento de qualquer obrigação prevista no plano de recuperação judicial, e reconstitui aos credores os seus direitos e as garantias nas condições originalmente contratadas, deduzidos os valores eventualmente pagos. condicional. A novaçao na espécie, por conseguinte, é Fábio Ulhoa Coelho pondera nesse sentido: "As novações, alterações e renegociações realizadas no âmbito da recuperação judicial são sempre condicionais. Quer dizer, valem e são eficazes unicamente na hipótese de o plano de AGRV.N São Paulo - VOTO EM

4 4 recuperação ser implementado e ter sucesso. Caso se verifique a convolaçao da recuperação judicial em falência, os credores retornam, com todos os seus direitos, ao ^status quo ante'" ("Comentários à Nova Lei de Falências e de Recuperação de Empresas", Ed. Saraiva, 2005, 2 a ed., pãg. 169). A novação, "in casu", é similar a do Código Civil, mas tem conseqüências diferentes na medida em que não extingue a obrigação primitiva, sujeitando a extinção a uma condição resolutiva, que vem a ser o cumprimento do plano no prazo de até 2 anos a contar da concessão do favor legal (art. 61, "caput"). Portanto, a novação prevista na lei de recuperação judicial só acarreta a extinção da obrigação do devedor em recuperação se for cumprido o plano no biênio de supervisão judicial. O biênio posterior à concessão da recuperação judicial opera como condição resolutiva, em virtude da qual, descumprida qualquer obrigação prevista no plano, a nova obrigação resolve-se. Descumprido o plano durante o biênio, prevê o I o do art. 61, a conseqüência será a convolaçao da recuperação em falência nos termos do art. 73. AGRV.N São Paulo - VOTO EM

5 Descumprido o plano após o biênio, prevê o art. 62, é facultado a qualquer credor requerer a execução específica ou a falência com base no art. 94. De tal sorte, escoado o biênio da supervisão judicial, a se considerar que a recuperação da agravante foi concedida através de homologação do plano decidida em julho de 2008 (fls. 226), o prosseguimento da execução singular suspensa está sujeito à condição resolutiva, isto é, ao descumprimento do plano de recuperação pela devedora. O exame dessa condição, evidentemente, não está sob o crivo do juízo da execução, mas sob o crivo do juízo da recuperação judicial. O só decurso do biênio não é motivo, "tout courfc", para o prosseguimento da ação de execução, sendo imprescindível a verificação do descumprimento do plano. Afinal, no contexto do art. 59 da lei, o plano de recuperação gera vinculação ao devedor e a todos os credores anteriores nele abrangidos. Sendo assim, sem decisão acerca do descumprimento do plano, não pode a agravada prosseguir na execução singular. AGRV.N São Paulo - VOTO EM

6 iífel TRIBUNAL DE JUSTIÇA DQ ESTADO DE SÃO PAULO Diante do exposto, dá-se provimento ao recurso, para revogar a decisão que admite o prosseguimento da execução. Presidiu o julgamento, com voto, o Desembargador JACOB VALENTE, e dele participou o Desembargador TASSO DUARTE DE MELO. São Paulo, 30 de novembro de 2011, CERQUEJ lelatór AGRV.N" São Paulo - VOTO EM