PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

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1 Certificado digitalmente por: JOECI MACHADO CAMARGO PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA ESTADO DO PARANÁ AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº , DO FORO CENTRAL DA COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE CURITIBA VARA DE REGISTROS PÚBLICOS E CORREGEDORIA DO FORO EXTRAJUDICIAL. Agravante: J. B. V. (sob representação) 1. Relatora: Desª Joeci Machado Camargo. AGRAVO DE INSTRUMENTO AÇÃO DE RETIFICAÇÃO DE REGISTRO CIVIL PROCEDIMENTO DE JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA AUSÊNCIA DE FORMAÇÃO DE COISA JULGADA MATERIAL PEDIDO DE EXCLUSÃO DE NOME DE AVÔ MATERNO BIOLÓGICO CONSECTÁRIO LÓGICO E LEGAL DA SENTENÇA PROFERIDA NOS AUTOS DE ADOÇÃO DE SUA GENITORA EXTINÇÃO DO VÍNCULO DE FILIAÇÃO DESTA COM O PROGENITOR INTELIGÊNCIA DOS ARTIGOS 47 DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE, 1.635, IV, DO CÓDIGO CIVIL E 97 DA LEI 6.015/73 MANUTENÇÃO SOMENTE DO NOME DA ADOTANTE DA SUA GENITORA COMO AVÓ MATERNA EM SEU ASSENTO CIVIL PRINCÍPIO DA VERDADE REAL OBSERVÂNCIA AOS PRECEITOS DA EFETIVIDADE, ECONOMIA E CELERIDADE PROCESSUAL RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1 Nomes protegidos por sigilo

2 Vistos, discutidos e relatados estes autos de agravo de instrumento nº , da Vara de Registros Públicos do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba, em que é agravante J. B. V. (sob representação). 1. Trata-se de agravo por instrumento interposto por J. B. V. (representada por sua genitora V. B. V.) contra os termos da decisão proferida pelo Juízo da Vara de Registros Públicos e Corregedoria do Foro Extrajudicial do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba ao mov. 64.1, a qual rejeitou seus embargos de declaração opostos, indeferindo o pedido de exclusão do nome do avô biológico materno do seu registro de nascimento. Inconformada, narra a requerente em suas razões recursais (fls. 04/12) que propôs a retificação do seu registro civil para que nele passasse a constar, corretamente, os dados de sua genitora. Noticia que sua genitora foi adotada pela Sra. D. B., exclusivamente, passando a constar o nome desta como mãe da adotada, sendo suprimido o nome de seus pais biológicos por força da decisão que deferiu a adoção. Sustenta que a sentença da retificação, ao acolher seu pedido e determinar a modificação do seu assento para adequálo aos dados de sua mãe, determinou implicitamente que todos eles fossem alterados, de modo que seria inconcebível permitir a manutenção, no seu próprio registro, do nome do seu avô materno, o qual foi destituído do poder familiar exercido sobre sua genitora. Aponta que não subsiste o fundamento esposado pelo Juízo para indeferir seu pedido de re-retificação do seu registro civil, pois em procedimentos de jurisdição voluntária não se evidencia 2

3 a coisa julgada material, de modo que seria perfeitamente possível a retificação. Deferido o processamento do recurso (fl. 153/154), o Juízo a quo noticiou a manutenção da decisão agravada (fl. 160). Em seguida, a douta Procuradoria Geral de Justiça emitiu parecer de mérito, manifestando-se pelo conhecimento e provimento do recurso (fls. 163/171). Por fim, vieram-me conclusos. É o relatório. 2. Presentes os requisitos intrínsecos e extrínsecos inerentes à espécie, o recurso merece ser conhecido. Somente a título de esclarecimento, observa-se que a recorrente se insurgiu adequadamente contra os termos da decisão, de manifesta natureza interlocutória, através da interposição do presente agravo de instrumento. Vislumbra-se que após o trânsito em julgado da sentença de procedência de seu pedido de retificação de assento civil, a requerente ajuizou petição (mov. 55.1), com verdadeiro cunho de cumprimento de sentença, postulando pela exclusão do nome de seu avô materno biológico, sob os mesmos fundamentos expostos nas presentes razões recursais. Indeferido o pedido pelo Juízo a quo (mov. 58.1), a requerente opôs embargos de declaração (mov. 61.1), os quais foram rejeitados pela presente decisão agravada. Desta forma, a despeito do posicionamento exposto pela magistrada singular às fls. 160, a agravante elegeu o recurso 3

4 cabível para se insurgir contra a decisão, sendo o agravo de instrumento o instrumento adequado, de acordo com o princípio da unirrecorribilidade, por se tratar a decisão agravada de um pronunciamento judicial interlocutório, com conteúdo decisório, proferida em sede de cumprimento de sentença. Embora não vigente ao tempo da interposição do recurso em exame, nota-se que o novo regramento processual expressamente prevê o cabimento do agravo de instrumento das decisões proferidas em sede de cumprimento de sentença, nos termos de seu dispositivo 1.015, parágrafo único. Estabelecidas essas premissas, passa-se ao exame de mérito da insurgência trazida a lume pela agravante no presente instrumento. Denota-se dos autos que esta ingressou com ação de retificação de registro civil no intuito de adequar seu registro de nascimento aos dados verdadeiros de sua família materna (mov. 1.1). Narra que sua genitora foi adotada pela Sra. D. B., mediante sentença proferida nos autos nº tramitado perante a 2ª Vara de Infância e Juventude desta Capital, nos seguintes termos: Diante do exposto, e o mais que dos autos consta, JULGO PROCEDENTE a peça inicial, para o efeito de CONCEDER a ADOÇÃO de V*** à requerente D***, com fundamento no artigo 39 e seguintes do Estatuto da Criança e do adolescente, e consequentemente, DECLARO EXTINTO o poder familiar supostamente exercido por J*** T***s N***, com escopo no artigo 1635, inciso IV, do Código Civil. 4

5 Expeçam-se os mandados previstos no artigo 47 da Lei nº 8.069/90, observando que a adotanda passará a se chamar V*** B***, tendo como avós maternos P*** e I***. (mov. 1.5) Assevera que antes de proferida a decisão acima, foi concebida e registrada de acordo com os documentos antigos de sua genitora, o que não corresponde com realidade fática, podendo lhe acarretar transtornos futuros, uma vez que seus dados não correspondem com os de sua mãe, a qual teve seu registro alterado em face da sentença de adoção. Para tanto, formulou os seguintes pedidos: b) seja julgado totalmente procedente o pedido de retificação de registro civil, determinando-se a alteração do registro civil da Requerente, para que em sua certidão de nascimento conste: b.1) Nome atual de sua genitora: V*** B*** V***; b.2) Número de RG atual de sua genitora: RG/PR n.º ; b.3) Número de CPF atual de sua genitora: RG/PR n.º ; b.4) Nome dos avós maternos: D*** B***. Regularmente tramitados os autos na origem, proferiu-se a sentença de procedência do pedido inicial nos seguintes termos: Assim, diante da documentação apresentada e do parecer favorável da representante do Ministério Público, consoante verificado no Movimento Projudi nº 32, JULGO PROCEDENTE determinando que se proceda a averbação da presente 5

6 sentença à margem do registro de nascimento de J*** B*** V*** (matrícula nº do 4º Serviço de Registro Civil e 16º Serviço Notarial), para que passe a constar que sua genitora atualmente adota o nome de V*** B*** V*** em razão de adoção (Processo nº ,) e casamento, possuindo o RG nº e CPF nº , consignando-se como avó materna, D*** B***. (mov.38.1) Ocorre que após a expedição do respectivo mandado de averbação (mov. 48.1) e trânsito em julgado da sentença (mov. 47) a requerente ajuizou petição (mov. 55.1), argumentando que o nome de seu avô biológico, J*** T*** N***, foi mantido em seu assento civil, a despeito de inexistir vínculo entre este e sua genitora, em razão da sentença de adoção. O pedido acima restou indeferido nos termos da decisão proferida ao mov. 58.1, a qual fundamentou que deveria a requerente opor embargos de declaração em face da sentença, porém esta transitou em julgado, razão pela qual deve a autora ajuizar nova ação, requerendo o cancelamento do nome de J*** T*** N*** no assento de nascimento de J*** B*** V***. Contra o pronunciamento judicial acima, a ora agravante opôs embargos de declaração (mov. 61.1), os quais foram rejeitados pela decisão agravada (mov. 64.1), nos seguintes termos: Recebo os embargos opostos tempestivamente. Todavia, no mérito, não merecem prosperar, já que a decisão atacada bem fundamentou os motivos do indeferimento do 6

7 pleito autoral, quais sejam, o transito em julgado da sentença proferida e imutabilidade da coisa julgada material. Ademais, como bem destacou a embargante, a sentença atacada foi proferida à luz da lei registral e nos estritos termos de seu pedido, de modo que, se a autora pretende uma alteração que não foi requerida na peça inicial, deve vale-se dos meios cabíveis e não pretender retificar decisão abarcada pela coisa julgada material. Com o devido respeito ao posicionamento adotado pelo Juízo a quo, em primeiro lugar esclarece-se que o pedido de retificação de registro civil trata-se de procedimento de jurisdição voluntária, não havendo que se falar em condição de imutabilidade da sentença em razão da formação de coisa julgada material. Neste sentido é assente o posicionamento da Corte Superior sobre o tema: DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. REGISTROS PÚBLICOS. RETIFICAÇÃO DE REGISTRO CIVIL. NACIONALIDADE PORTUGUESA. NOVO PEDIDO. RETORNO AO STATU QUO ANTE. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE JUSTO MOTIVO. VIOLAÇÃO À SEGURANÇA JURÍDICA. ARTIGOS ANALISADOS: ARTS. 54; 56 E 57 DA LEI 6.015/73. [...] 7. Ainda que a ação de retificação de registro civil se trate de um procedimento de jurisdição voluntária, em que não há lide, partes e formação da coisa julgada material, permitir sucessivas alterações nos registros públicos, de acordo com a conveniência das partes implica grave insegurança. [...] 9. Recurso especial desprovido. (REsp /SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 15/05/2014, DJe 22/05/2014) (destacado) 7

8 Ademais, também é infundado o argumento de que deve a requerente valer-se dos meios cabíveis por pretender uma alteração que não foi requerida na peça inicial. Conforme transcrito acima, postulou a agravante em sua petição inicial a procedência do seu pedido a fim de retificar seu registro civil, passando a constar o atual nome e demais dados de sua genitora V*** B*** V***, assim como o nome de sua avó materna D*** B***. Neste sentido, não se pode falar em ausência do pedido de exclusão do nome do seu avô materno biológico, justamente por não ser necessário, haja vista que esta conclusão é mero consectário lógico e legal da sentença que concedeu a adoção de sua genitora à sua avó materna D*** B*** (mov. 1.5), além de que expressamente formulou pedido expresso para que constasse o nome desta na qualidade acima. O pronunciamento judicial proferido nos autos nº é cristalino ao conceder a adoção da genitora da agravante à senhora D*** B*** e, além disso, declarar extinto o poder familiar exercido por J*** T*** N***, avô biológico da recorrente, nos termos do artigo 1.635, IV, do Código Civil, que preconiza: Art Extingue-se o poder familiar: [...] IV - pela adoção; Nada obstante, nos termos do artigo 47 do Estatuto da Criança e Adolescente, a sentença de adoção tem natureza 8

9 constitutiva, criando vínculos civis, formando uma família até então não constituída daquela forma i, possuindo os seguintes efeitos: Art. 47. O vínculo da adoção constitui-se por sentença judicial, que será inscrita no registro civil mediante mandado do qual não se fornecerá certidão. 1º A inscrição consignará o nome dos adotantes como pais, bem como o nome de seus ascendentes. 2º O mandado judicial, que será arquivado, cancelará o registro original do adotado. [...] 5o A sentença conferirá ao adotado o nome do adotante e, a pedido de qualquer deles, poderá determinar a modificação do prenome. Sobre o artigo acima, leciona a doutrina que Por uma questão lógica, o registro original, relativo ao nascimento da criança ou adolescente, no qual constava o nome dos pais biológicos e seus ascendentes, será cancelado, em face da novel realidade jurídica. ii Frise-se, no mesmo ensejo, que o dispositivo 97 da Lei nº 6.015/73, dispondo acerca do registro da sentença de legitimação adotiva, preconiza: Art. 97. Feito o registro, será cancelado o assento de nascimento original do menor. Neste contexto, pela decisão judicial proferida nos autos de adoção e pelos dispositivos legais supracitados, conclui-se que o vínculo de filiação entre sua genitora e seu avô biológico foi extinto, razão pela qual não há motivo razoável e muito menos legal 9

10 para que nome deste seja mantido no assento civil da agravante, até mesmo porque sua manutenção justamente ofende o princípio da verdade real, inerente ao registro público. A respeito, colhe-se do hígido parecer ministerial emitido pelo representante ministerial em primeiro grau nos autos originários (mov. 81.1): Neste caso, é possível que tal requerimento seja acolhido, uma vez que, apesar do mérito dos autos já ter sido analisado, fica evidente a desconformidade da sentença com a realidade fática atual. Ainda, em observância ao princípio da verdade real, constata-se que D*** B*** adotou a genitora da registrada, V*** B*** V***, constando essa como sua genitora, apenas, sem constar nenhum nome no campo da filiação paterna. Da mesma forma, corroborando o posicionamento adotado neste acórdão, pronunciou-se a douta Procuradoria Geral de Justiça (fls. 163/171): In casu, evidente que, após a adoção de V*** B. V. por Dalva B., seu registro anterior de nascimento, em que constava seu nome como V*** N. e que era filha de M*** I. S. e de J*** T. N., foi cancelado. Desse modo, foi averbado o mandado de inscrição com o patronímico de sua mãe adotiva e de seus avós adotivos, sendo esta sua nova filiação, para todos os fins. [...] Assim, não existindo mais relação de filiação entre J*** T. N. e V*** B. V., ele não pode constar como avô materno de J*** B. V, devendo ser excluído do registro de nascimento da criança. 10

11 Ora, a manutenção do nome do avô materno biológico e da avó materna adotiva, no registro de nascimento da criança J*** B. V., enseja a interpretação de que D*** B. adotou V*** B. V. de forma unilateral, ou seja, de que continua existindo vínculo de filiação com o pai biológico J*** T. N., o que não corresponde à realidade. Por tais razões, não cabe ao Juízo singular criar entraves inexistentes no próprio ordenamento supracitado ao alcance do direito material regularmente postulado pela agravante, revelando-se o indeferimento do pedido pelas razões adotadas na decisão agravada uma verdadeira afronta aos preceitos da economia, efetividade e celeridade processual, sobrepondo-se indevidamente o rigor formal. Inclusive, neste mesmo sentido, pronunciou-se este Egrégio Tribunal de Justiça: AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE RETIFICAÇÃO DE REGISTRO CIVIL COM ALTERAÇÃO DE NOME - SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA JÁ TRANSITADA EM JULGADO - POSTERIOR REQUERIMENTO DO AUTOR PARA QUE O ERRO DE GRAFIA DE SEU NOME FOSSE TAMBÉM CORRIGIDO NOS REGISTROS DE SEU CASAMENTO E DE NASCIMENTO DOS NOVOS FILHOS - INDEFERIMENTO, ANTE A SUPOSTA NECESSIDADE DE NOVO PROCESSO - DECISÃO QUE COMPORTA MODIFICAÇÃO - RIGORISMO FORMAL QUE PODE SER MITIGADO EM PRESTÍGIO AOS PRINCÍPIOS DA EFETIVIDADE, CELERIDADE E ECONOMIA PROCESSUAL - AUSÊNCIA DE PREJUÍZOS A TERCEIROS - RECURSO PROVIDO. (TJPR - 11ª C.Cível - AI

12 Curitiba - Rel.: Antonio Domingos Ramina Junior - Unânime - - J ) Destarte, por todo o exposto, proponho o conhecimento e o provimento do recurso de agravo de instrumento interposto por Julia B*** V*** (representada por sua genitora), a fim de determinar a exclusão de seu registro civil o nome de J*** T. N. no campo avós maternos, mantendo-se nesta qualidade somente o nome de sua avó materna, D*** B***. É como voto. 3. ACORDAM os Desembargadores integrantes da 12ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em dar provimento ao recurso, nos termos do voto da Relatora. Participaram do julgamento as Desembargadoras Ivanise Maria Tratz Martins e Denise Krüger Pereira. Curitiba, 22 de junho de Desª JOECI MACHADO CAMARGO Relatora i NUCCI, Guilherme de Souza. Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado: em busca da Constituição Federal das Crianças e dos Adolescentes. Rio de Janeiro: Forense, p ii Ibid. p