ELO 17. Auto avaliaçao das Escolas e Processos de Auto monitorização



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Transcrição:

ELO 17 Auto avaliaçao das Escolas e Processos de Auto monitorização 1

Revista do Centro de Formação Francisco de Holanda Centro de Formação Francisco de Holanda Escola Secundária Francisco de Holanda Alameda Dr. Alfredo Pimenta 4814 528 Guimarães cfaecffh@gmail.com www.cffh.pt 253 513 073 2

FICHA TÉCNICA Director Coordenadores Conselho Científico Conselho Redactorial Capa Maquetagem Propriedade e edição Jorge do Nascimento Pereira da Silva Francisco Teixeira Jorge do Nascimento Almerindo Janela Afonso Universidade do Minho Carlinda leite Universidade do Porto Fernando Ribeiro Gonçalves Universidade do Algarve José Augusto Pacheco Universidade do Minho Maria Lucinda Palhares da Cunha Bessa Manuela Esteves Universidade de Lisboa Jorge do Nascimento Pereira da Silva Agostinho Ferreira António Oliveira Sousa Francisco Teixeira Helena Gonçalves Luísa San Roman Pedro Almeida Francisco Teixeira Centro de Formação Francisco de Holanda Escola Secundária Francisco de Holanda Alameda Dr. Alfredo Pimenta 4814 528 Guimarães cfaecff@gmail.com www.cffh.pt 253 513 073 ISBN 972 96465 Impressão Gráfica Covense, Ldª Polvoreira Guimarães Número Revista ELO 17 Setembro de 2010 Tiragem Apoios 500 Exemplares ME 3

4

ÍNDICE NOTA DE ABERTURA Jorge do Nascimento Director do CFFH 9 TEÓRICOS 11 NOTAS SOBRE AUTO AVALIAÇÃO DA ESCOLA PÚBLICA COMO ORGANIZAÇÃO EDUCATIVA COMPLEXA Almerindo Janela Afonso Instituto de Educação, UM AUTO AVALIAÇÃO DE ESCOLA: QUE LÓGICA (S) DE REGULAÇÃO? Eusébio André Machado Universidade Portucalense AVALIAR AS ESCOLAS: PARA QUÊ E PORQUÊ? Ariana Cosme, Rui Trindade Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação, UP ESCOLA, AUTO AVALIAÇÃO E DESENVOLVIMENTO ORGANIZACIONAL João Formosinho, Joaquim Machado Instituto de Educação, UM O ESTADO AVALIADOR E AS FORMAS DE APOIO EXTERNO ÀS ESCOLAS: ENSINAR E CONTROLAR AS ESCOLAS OU ESCUTAR E APRENDER COM ELAS? Fernando Ilídio Ferreira Instituto de Educação, UM A AUTO AVALIAÇÃO DAS ESCOLAS NO SISTEMA EDUCATIVO PORTUGUÊS: DO DISCURSO LEGAL AOS SENTIDOS DOS PROCESSOS EM CURSO Carlinda Leite, Preciosa Fernandes Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação, UP AUTO AVALIAÇÃO E AVALIAÇÃO EXTERNA DAS ESCOLAS Adelina Paula Mendes Pinto Coordenadora Interconcelhia das Bibliotecas Escolares de Guimarães 13 23 33 41 51 59 71 5

AVALIAÇÃO DE ESCOLAS O LUGAR DA AUTO AVALIAÇÃO José Augusto Pacheco Instituto de Educação, UM DA CONSTRUÇÃO À AUTO MONITORIZAÇÃO E AVALIAÇÃO DE PARCERIAS: UM CONTRIBUTO PRÁTICO Isabel Cruz Escola Básica 2/3 Napoleão Sousa Marques A AVALIAÇÃO INTERNA DA ESCOLA: ENTRE O INDIVIDUAL E O COLECTIVO Maria Isabel Candeias Agrupamento de Escolas Dr. Francisco Sanches/CiEdUMinho UM PERCURSO DE REFERENCIALIZAÇÃO NA AUTO AVALIAÇÃO DE ESCOLA Maria João Vieira de Freitas Escola Secundária Diogo de Macedo/CiEdUMinho PODERÁ A AVALIAÇÃO DA ESCOLA SER UM INSTRUMENTO DECISIVO DE PROCESSOS DE MELHORIA? Helena leite Agrupamento de Escolas João de Meira AUTO AVALIAÇÃO DE ESCOLA: REFLECTIR PRÁTICAS E RECONSTRUIR CONTEXTOS NUMA ESCOLA DE TODOS PARA TODOS António Joaquim Abreu da Silva Escola Secundária de Monserrate/CiEdUMinho AVALIAÇÃO EXTERNA E AUTO AVALIAÇÃO DAS ESCOLAS: UM CONTRIBUTO DA INSPECÇÃO GERAL DA EDUCAÇÃO Valdemar Castro Almeida Delegado Regional do Norte da IGE AVALIAR PARA GERIR E INTERVIR: DO CONHECIMENTO À DECISÃO, DA DECISÃO AO SUCESSO Fátima Braga Escola Secundária/3 Henrique Medina A AUTO AVALIAÇÃO NA ESCOLA: UMA VISÃO SOBRE AS QUESTÕES DA INDISCIPLINA Emídio Ferro Escola Secundária de Estarreja 79 85 101 123 131 145 157 163 179 6

AUTO AVALIAÇÃO NORMATIVA OU REGULADORA? Olinda Alves Escola básica 2/3 Fernando Távora A CAF UM PERCURSO PARA A IMPLEMENTAÇÃO DA AUTO AVALIAÇÃO NUMA ESCOLA? Maria da Glória F. M. Macedo Escola EB 2,3 da Cruz de Pau AUTO AVALIAÇÃO DE ESCOLA: A CONSTRUÇÃO DE REFERENCIAIS Serafim Correia Agrupamento de Escolas Adriano Correia de Oliveira 193 207 223 PRÁTICOS 233 O CASO DA ESCOLA SECUNDÁRIA FRANCISCO DE HOLANDA Olívia Canedo, Rosalina Pinheiro Escola Secundária Francisco de Holanda AUTO AVALIAÇÃO NO AGRUPAMENTO DE ESCOLAS DAS TAIPAS: UM PROJECTO EM CONSTRUÇÃO José Fonseca Coordenador do Observatório da Qualidade do Agrupamento de Escolas das Taipas A AUTO AVALIAÇÃO DAS ESCOLAS: PERSPECTIVA PARA UM OPTIMISMO DO SISTEMA Equipa auto avaliação Agrupamento de Escolas Santos Simões CONSTRUINDO UM PROJECTO DE AUTO AVALIAÇÃO NO AGUPAMENTO DE ESCOLAS PROFESSOR CARLOS TEIXEIRA O Coordenador da Equipa de Auto Avaliação RELATO DA EXPERIÊNCIA DO AGRUPAMENTO DE ESCOLAS DE PEVIDÉM O grupo de auto avaliação do Agrupamento de Escolas de Pevidém AVALIAÇÃO INTERNA UM EXERCÍCIO COLABORATIVO Ana Paula Pires, Cristina Ribeiro Agrupamento de Escolas de Montelongo 235 243 255 257 259 263 7

PLANIFICAÇÃO DO PROCESSO DE AVALIAÇÃO DO PROJECTO EDUCATIVO: APLICAÇÃO AO CASO CONCRETO DO AGRUPAMENTO DE ESCOLAS ARQUEÓLOGO MÁRIO CARDOSO Direcção do Agrupamento de Escolas Arqueólogo Mário Cardoso IMPLEMENTAÇÃO DO PROCESSO DE AUTO AVALIAÇÃO E AUTO MONITORIZAÇÃO DO AGRUPAMENTO DE ESCOLAS PROFESSOR ABEL SALAZAR Comissão de Monitorização e Avaliação Interna Agrupamento de Escolas Professor Abel Salazar AUTO AVALIAÇÃO DE ESCOLA UM PROJECTO João Furtado, Fátima Braga, Manuela Ferreira, Margarida Santos, Paula Campos, Paulo Dias, Teresa Ferreira Escola Secundária/3 Henrique Medina A AUTO AVALIAÇÃO UM INSTRUMENTO DE MELHORIA DA QUALIDADE NO AGRUPAMENTO DE ESCOLAS DE COLMEIAS (LEIRIA) Fernando Elias Director do Agrupamento de Escolas de Colmeias Leiria AUTO AVALIAÇÃO DE ESCOLAS E PROCESSOS DE AUTO MONITORIZAÇÃO NO AGRUPAMENTO DE ESCOLAS DE ALGOZ Hugo Almeida, Ivana Freitas Agrupamento de Escolas de Algoz CONSTRUINDO UM MODELO DE AUTO AVALIAÇÃO DE ESCOLA RELATOS DE UMA EXPERIÊNCIA NO AGRUPAMENTO DE ESCOLAS DO PICO DE REGALADOS Graça Pereira, Manuel Flores, André Fernandes, António Rodrigues Agrupamento de Escolas do Pico de Regalados (AUTO) AVALIAÇÃO DE ESCOLAS: COMO NOS VEMOS AO ESPELHO? O CASO DO AGRUPAMENTO DE ESCOLAS DE CONSTÂNCIA Susana Neves, Anabela Grácio Agrupamento de Escolas de Constância 269 275 287 309 325 331 341 8

NOTA DE ABERTURA Jorge do Nascimento Director do CFFH Mais uma vez temos entre nós a revista Elo, desta vez o número 17, correspondendo a 17 anos de actividade intensa do Centro de Formação de Francisco de Holanda, 17 anos de edições e de trabalho em prol da formação em particular e da educação em geral. Na educação, todos os anos são difíceis. Mas não há como não reconhecer que os últimos anos foram dos mais difíceis da história da educação em Portugal, mercê de sucessivas reformas estruturais, acertos, mudanças e recuos ou confirmações. Entre todas as mudanças e reformas feitas e a fazer, o advento da avaliação tem vindo a ter um papel fundamental. A avaliação dos alunos, dos professores, das escolas, dos directores, etc., parece advir de uma nova obsessão contemporânea pelo controlo, pela performance ou, numa retórica mais suave, pela responsabilização. Ora, não há como fugir das obsessões e, portanto, cá estamos a dar lhe atenção. Se no ano passado tratámos, num volume pioneiro e arriscado, a avaliação dos professores, reunindo contributos de especialistas e escolas, neste ano, dedicamos à avaliação das escolas a atenção necessária, centrando nos na organização decisiva e central do sistema educativo. Esta centralidade da escola tem, bem entendido, uma dupla face: a face da centralidade política e a face da responsabilidade. A face do trabalho assumido e profissional dos professores e líderes escolares e a face da prestação de contas. Como se verá nas páginas seguintes, os dois versos da medalha estão aqui amplamente tratados, quer pelo lado da teoria, quer pelo lado das múltiplas experiências de múltiplas escolas, que interpretam, a seu modo, o mandato público da auto avaliação organizativa, de acordo com as suas concepções, ainda que no contexto das injunções normativas. A nossa vontade, como noutros números, é que também este sirva como recurso de investigação, acção e pensamento para os professores e para as suas comunidades respectivas, promovendo, deste modo, um amplo debate de ideias e práticas sobre os modos de as escolas se auto avaliarem e auto construírem, já 9

que, não há como evitá lo, todo o processo auto avaliativo produz sobre si mesmo e em si mesmo uma autoimagem que é a construção que a escola faz de si mesma para os outros, particularmente para a sua comunidade mais alargada e para a administração. Por último, algumas palavras, breves, sobre a actividade do CFFH no ano lectivo 2009/2010. Este ano, como sempre, a nossa tarefa foi a de tentar responder positivamente aos professores e às escolas nas suas tarefas contínuas de promoção da educação das crianças e jovens. E fazemo lo apoiando os educadores, professores, demais actores educativos e as escolas, enquanto colectivos, nas suas necessidades formativas, num momento de transformação permanente daquilo que é o conhecimento e as práticas pedagógicas e em que, portanto, a formação é mais urgente para todos. Há, no entanto, e como se sabe, um quadro normativo, orientações globais de política educativa e formativa que não podemos senão, globalmente, seguir, desde logo porque essas orientações definem os recursos financeiros a que temos, ou não temos, acesso e que, portanto, definem, também, até onde podemos ir no nosso plano de acção. Ainda assim, cá estamos, como sempre, inventando recursos financeiros e humanos para satisfazer as vontades e as necessidades formativas das escolas e de quem nelas trabalha. Continuaremos sempre ao dispor de todos, na convicção de que o nosso trabalho é (re)conhecido e de que o futuro não acaba nem começa amanhã. 10

TEÓRICOS 11

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NOTAS SOBRE AUTO AVALIAÇÃO DA ESCOLA PÚBLICA COMO ORGANIZAÇÃO EDUCATIVA COMPLEXA Almerindo Janela Afonso Instituto de Educação, UM A Escola, enquanto instituição educativa, é uma criação histórica com características e missões peculiares, que resultam, entre outros factores, de longos e contraditórios processos sociais, políticos, culturais e pedagógicos. As escolas concretas, por sua vez, reconstroem se e reactualizam se quotidianamente pela acção pedagógica e organizacional, quer na forma como incorporam, referenciam ou resistem a certas heranças simbólicas, representações sociais e sedimentos culturais 1, quer na forma como encaram, com maior ou menor capacidade de iniciativa e criatividade, os constrangimentos, dilemas e oportunidades, ou como assumem e concretizam novas missões e objectivos. No contexto actual, esta acção quotidiana é marcada, entre muitos outros factores, pela crescente presença e diversidade de actores (internos e externos) e pela contraditória heterogeneidade de expectativas e exigências que expressam, isto é, pela sobreposição (e transbordamento) de mandatos educativos, bem como pela alteração nos processos de governança e regulação, em meio a uma previsível tendência para acentuação dos défices de financiamento e outros constrangimentos similares, que se cruzam ou interagem com uma maior pressão, sobretudo ideológica, para a redefinição do papel do Estado e ressignificação do conceito de educação pública. Não é por acaso que florescem as parcerias e se diversificam os projectos e protocolos, os quais constituem, não apenas uma forma de ampliação da comunidade educativa (em termos reais e simbólicos), 1 A este propósito, uma autora escreve: [ ] propusemos a ideia de sedimentos culturais para dar conta de um património cultural e simbólico historicamente depositado na memória colectiva da instituição e que resultou do labor antropológico de apropriação das várias possibilidades da estrutura, nos vários espaços tempo educativos da escola. Compreendeu se que, mesmo em quadros de elevado constrangimento estrutural, a organização escolar conseguia gerar novas camadas sedimentares e realimentar o seu património cultural comum (Torres, 2008, p. 64). 13

mas, também, uma formalização de colaborações e busca de soluções, mais ou menos especializadas, que a escola necessita e que não consegue, por si mesma, suprir adequadamente 2. Em meio a estas variáveis, e mais importante do que tudo, está o facto de as escolas públicas se sentirem, nos dias que correm, particularmente submetidas a fortes pressões externas, quer da parte do Estado, quer da parte da sociedade em geral, com contornos que parecem traduzir se na compatibilização provisória de duas dimensões aparentemente paradoxais: por um lado, a tendência para uma crescente elitização em termos de performances e padrões académicos (supostamente) desejáveis; por outro, o reconhecimento empírico da permanência das desigualdades escolares, que tende a ser retoricamente convocado como justificação para a existência (ou inevitabilidade) de uma maior oferta de percursos escolares e formativos alternativos, em função de uma dada população escolar e de uma procura que não é indiferente às classes e grupos sociais. No primeiro caso, trata se de introduzir maior selectividade e competição através da produção e melhoria de resultados mensuráveis objectivo facilmente perceptível nos discursos e orientações dominantes que traduzem uma clara obsessão avaliativa de cariz quantitativista e comparativista (cf., Afonso, 2007; 2009). No segundo caso, trata se da gestão, pretensamente mais eficaz e eficiente, das diversidades escolares (que não sendo sempre reconhecidas como tal, são também, e sobretudo, desigualdades sociais, raciais, de género ). Ao nível da escola pública isto expressa bem a tensão (mais ou menos eficazmente dissimulada) entre, por um lado, a construção da ideia de excelência que alimenta certos percursos de escolarização destinados aos herdeiros e, por outro, a massificação (ou igualização por baixo) legitimada no princípio da igualdade formal de oportunidades, ou tendo como pressuposto o direito democrático de todos(as) a um mínimo cultural comum 3. 2 A proliferação de projectos de educação formal e não formal no âmbito da escola, referenciáveis a distintos objectivos, dimensões e tipologias, distancia se, neste caso, da projectocracia que alguns autores têm vindo a questionar (ver, por todos, Caramelo, 2009). A situação também parece diferente daquela que Andy Hargreaves descreve quando refere que há sistemas dotados de pouca capacidade instalada [ ] onde muitos dirigentes se vêem mais como gestores do que como líderes no âmbito do ensino e da aprendizagem e nos quais os recursos são escassos, ou se distribuem de forma demasiado dispersa entre diversas iniciativas aquilo a que chamo a praga da projectite (Hargreaves, 2003, p. 250). No caso português, parece, pelo contrário, que a disseminação de projectos, muitos dos quais financiados externamente, pode ser uma oportunidade significativa para captar recursos suplementares para as escolas. 3 Esta última expressão está inserta no já célebre relatório Propositions pour l enseignement de l avenir elaborado pelo Collège de France e redigido por Pierre Bourdieu em 1985. Ver referência em português na bibliografia deste texto. 14

As escolas públicas constituem, por isso, lugares de explicitação de exigências e expectativas divergentes e plurais, em permanente reactualização, nunca indiferentes ao facto de serem quotidianamente habitadas por professores e alunos, em tempos e espaços organizacionalmente estáveis, mas, nem por isso, impermeáveis à crescente incerteza, imprevisibilidade e risco. Se há, de facto, da parte dos professores, disponibilidades profissionais, relacionais e cognitivas diferentes, e investimentos emocionais não desvinculáveis de ciclos de vida profissional e de condições de trabalho, há também, da parte dos alunos, constrangimentos sócio familiares vários, expectativas e necessidades ambivalentes, ao mesmo tempo em todos eles vão construindo percursos de vida e biografias com expectativas, possibilidades, realizações, sucessos e insucessos de natureza diversa e idiossincrática. De igual modo, tal como ocorre com outros actores educativos, os directores (enquanto gestores) têm diferentes visões educacionais e políticas, e distintas qualificações, experiências, empenhos, motivações e capacidades de potenciar ou mobilizar os graus de autonomia relativa (ainda) disponíveis. As escolas públicas são, por isso, instituições educativas de enorme complexidade. Além disso, o Estado central e os municípios são agentes e actores interessados na vida das escolas, porque as criam, apoiam, apetrecham ou financiam, e porque esperam (tal como a sociedade no seu todo, e a comunidade, em particular) que elas sejam espaços e tempos fundamentais para a prossecução de determinadas funções sociais e educacionais. Por estas e outras razões, não é uma qualquer forma ou modalidade de avaliação institucional (e de auto avaliação) que pode dar conta, com a objectividade e justiça possíveis, da multidimensionalidade e complexidade das escolas públicas enquanto organizações (e instituições) educativas específicas. A auto avaliação no âmbito da avaliação institucional Como em qualquer outra modalidade de avaliação, também a avaliação de uma organização educativa, nomeadamente quando se trata de uma organização pública, deve guiar se por valores e princípios fundamentais, entre os quais, a participação, o diálogo, a transparência, a justiça, e o rigor metodológico e ético, visando o conhecimento, o mais objectivo possível, das orientações e meso políticas definidas e a 15

compreensão dos processos pedagógicos, científicos, administrativos, relacionais, ou quaisquer outros, que estejam, directa ou indirectamente, relacionados com a educação. Como escrevi noutra ocasião, sendo a escola pública um espaço onde se actualizam relações de poder, conflito e negociação, e um lugar onde se expressam interesses e perspectivas divergentes, e objectivos frequentemente não consensuais, não é fácil construir formas de auto avaliação autónomas que sejam estruturadas tendo essencialmente como base processos de reflexividade, ainda que estes processos favoreçam o envolvimento crítico e criativo dos professores, educadores e outros actores educativos. Dito de outro modo, a auto avaliação deve ser um processo complexo e denso, desenvolvido essencialmente sob controlo directo e imediato dos sujeitos envolvidos nos processos educativos. No entanto, a ilusão da (suposta) transparência de algo que é familiar aos sujeitos pode ser, também aqui, um obstáculo à compreensão da realidade educacional e organizacional e, nesse sentido, um factor a ter em conta no desenvolvimento da própria auto avaliação. Entretanto, se era possível afirmar, há uma década atrás, que não havia em Portugal qualquer tradição de auto avaliação das escolas do ensino básico e secundário, hoje, felizmente, alguma coisa mudou porque as escolas já desenvolvem dispositivos, instrumentos e processos diversos de auto avaliação, ainda que em graus muito heterogéneos, nomeadamente em termos de fundamentação e consistência teórico metodológica. Neste sentido, algumas escolas tentam operacionalizar modelos disponíveis no mercado 4 ou na literatura 4 Não é de todo irrealista falar de um emergente e ainda incipiente mercado (e/ou quase mercado) direccionado para a avaliação institucional e, mais especificamente, para a auto avaliação. Trata se de uma oferta e procura impulsionadas, quer pelas necessidades decorrentes da legislação actual, quer pelas dificuldades inerentes da ausência de uma prática consolidada de auto avaliação, quer pela escassa formação dos actores educativos nestas e noutras áreas da avaliação. A título de exemplo, uma das ofertas mais recentes neste domínio, que aproveita a procura potencial existente, tem vindo do Projecto de Avaliação em Rede (PAR). Segundo os seus proponentes, O Projecto de Avaliação em Rede (PAR) nasceu com a finalidade de habilitar as escolas a desenvolver dispositivos de auto avaliação, úteis ao desenvolvimento da construção de uma escola de qualidade. Assente numa lógica que habilite os actores das escolas a fazer o que deve ser feito, em vez de lhes dizer o que devem fazer, o PAR é constituído por uma rede de escolas / agrupamentos de escolas que se assumem como uma comunidade de aprendentes que desenvolvem e partilham experiências no âmbito da Auto avaliação de Escola. Para mais detalhes, ver http://sites.google.com/site/projdeavaliacaoemrede/. Um outro projecto, neste caso desenvolvido na Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto o Projecto ARQME (Auto avaliação em Agrupamentos: Relação com Qualidade e Melhoria da Educação) visa, entre outros, os seguintes objectivos: Aprofundamento e renovação do conhecimento relativamente à problemática da auto avaliação em Agrupamentos de Escolas e sua articulação com a melhoria da qualidade das escolas e da educação; concepção de dispositivos metodológicos pertinentes para a produção de avaliação e acompanhamento, em contexto de Agrupamento; reflexão sobre os efeitos produzidos pela auto avaliação e sua articulação com as transformações nas identidades 16

especializada, ou importam mimeticamente experiências realizadas noutros contextos; outras recriam ou adaptam modelos, eixos estruturantes ou apenas linhas orientadoras; outras, ainda, assumem que estão numa fase de exploração e desenvolvimento de percursos formativos autónomos tendo como objectivo o domínio de saberes e metodologias da auto avaliação congruentes com as respectivas culturas organizacionais ou com um determinado ethos escolar. Se hoje já é possível verificar empiricamente que formas de auto avaliação existem ou são praticadas, também já podemos conhecer melhor as motivações (ou induções) que impulsionam os actores escolares, e as leituras e convicções que os mesmos desenvolvem a partir desta experiência 5. Do meu ponto de vista, a auto avaliação das escolas deve ser um processo construído no respeito pela autonomia dos profissionais e das comunidades educativas, desejado e assumido por estes como uma necessidade de conhecimento profundo, sistemático e crítico da respectiva realidade social, organizacional e educacional, sem imposições administrativas ou quaisquer consequências susceptíveis de ser interpretadas ou representadas como sanções negativas, ou seja, um processo comprometido com determinados valores, de natureza essencialmente formativa e conducente a uma melhoria global e sustentada de todos os dispositivos, estratégias e práticas que visem uma educação de qualidade em termos científicos, pedagógicos e democráticos. Sendo a auto avaliação uma dimensão estruturante da avaliação institucional, ela deve poder ser confrontada dialógica e criticamente com formas (complementares) de avaliação externa, apoiadas, neste caso, por equipas interdisciplinares, com grande autonomia relativa, e com valências e conhecimentos amplos e sólidos em termos metodológicos, científicos e pedagógicos. Estas equipas deverão, do mesmo modo, ser alheias ou indiferentes a objectivos ou intenções que visem a comparação ou competição entre escolas, estando, antes, exclusivamente preocupadas com a compreensão dos processos e o conhecimento das profissionais dos professores; reflexão sobre a relação entre a auto avaliação em Agrupamentos e as dinâmicas dos respectivos ciclos de vida organizacionais (cf. http://paginas.fe.up.pt/~gei05010/arqme/projecto.php ). 5 Foi justamente a este propósito que escrevi, há uma década atrás, que não há em Portugal qualquer tradição de auto avaliação das escolas do ensino básico e secundário que possa servir de referência aos actores educativos que se mostrem interessados em constituíla, quer como antídoto à avaliação externa, quer como forma de resistência, quer, ainda, como forma de avaliação complementar ou compensatória (cf. Afonso, 2001, p. 24). Certamente que estas não são as únicas nem talvez as verdadeiras motivações que justificam, no contexto actual, a auto avaliação das escolas. Neste sentido, o conhecimento mais sustentado dos processos em curso, 17

especificidades, numa atitude essencialmente direccionada para ajudar a desenvolver, ao máximo, as possibilidades e potencialidades educativas de uma determinada escola (ou agrupamento de escolas) 6. Há, no entanto, que ter em conta que a auto avaliação não pode deixar de dar um contributo crítico para o melhor conhecimento dos factores que podem explicar o valor acrescentado que o trabalho pedagógico de uma determinada escola (ou agrupamento de escolas) deve necessariamente prosseguir ou alcançar. Outras reflexões avulsas sobre o actual modelo de avaliação institucional O actual modelo de avaliação institucional das escolas e agrupamento de escolas dos ensinos básicos e secundário, designado (impropriamente) de avaliação externa das escolas, conjuga uma componente de avaliação externa e uma componente de auto avaliação. A componente de auto avaliação, da responsabilidade dos agrupamentos ou das escolas não agrupadas, tem sido desenvolvida, como já atrás referi, de formas muito distintas em termos de centralidade no processo global da avaliação das escolas, envolvimentos dos actores, sequencialidade e consistência metodológica (incluindo neste caso a reflexão sobre as potencialidades e limites dos próprios procedimentos adoptados). A este propósito, por exemplo, um dos últimos relatórios da Inspecção Geral da Educação refere que as apreciações produzidas e as classificações atribuídas no domínio 5 (capacidade de auto regulação e melhoria da escola/agrupamento), em sede de avaliação externa, evidenciam a fragilidade e a falta de continuidade nas práticas de auto avaliação de muitas escolas (IGE, 2010, p. 70). Neste sentido, a própria IGE, explicita que não pretende induzir qualquer modelo de auto avaliação (idem), mas disponibiliza diversas informações pertinentes sobre este domínio que podem ser úteis aos agrupamentos e escolas (ver o sítio da IGE onde se podem encontrar instrumentos de apoio à auto avaliação das escolas ). nomeadamente em termos de pesquisa teórica e metodologicamente orientada, pode revelar se muito pertinente para o conhecimento e compreensão desta nova realidade da vida das escolas. 6 Por considerar que a comparação entre escolas é um dos aspectos que acabam por ocorrer (com maior ou menor indução) na operacionalização do actual modelo de avaliação externa das escolas e que essa mesma comparação norteia, pelo menos em parte, de forma mais ou menos explícita, a elaboração e apreciação dos relatórios subsequentes daí resultantes, podendo levar aos obscurecimento da procura das especificidades de cada escola ou agrupamento e à diminuição da autonomia relativa das equipas de avaliação, discordo da parte que se refere a esta questão e que está incluída no último parecer do Conselho Nacional de Educação quando se recomenda que Devem ser melhoradas a produção e a disponibilização de informação que contribua para aperfeiçoar a aferição do contexto em que se inserem as escolas, o seu desempenho e valor acrescentado, a equidade dos resultados alcançados e a 18

Isto significa que há uma abertura louvável para que as escolas utilizem diferentes modelos, sendo que, do ponto de vista da IGE, o que parece mais importante é que a prática da auto avaliação se concretize e consolide. Neste sentido, a IGE desenvolveu, entre 2005 e 2007, uma actividade designada Efectividade da auto avaliação das escolas que foi concebida como estratégia de induzir uma regulação interna apoiada em processos de auto avaliação e de uma maior autonomia das escolas, com vista à melhoria da prestação do serviço educativo. A este propósito, refere se ainda que a maioria das escolas observadas tinha processos não sistematizados de auto avaliação, muitas vezes sem a percepção do valor do trabalho desenvolvido, notando se também, entre outros aspectos, fragilidades que se prendiam com a inexistência de referenciais, falta de planeamento e de sistematização das actividades de avaliação (IGE, 2009, p. 5). Todavia, na minha perspectiva, se a auto avaliação for meramente decorrente de exigências legais e não corresponder a uma prática consistente, crítica, consolidada e autónoma de cada escola ou agrupamento, os actores educativos, com o passar do tempo, tenderão a naturalizar e ritualizar (ou mesmo a subverter) os procedimentos daí decorrentes. Por isso, há que caminhar no sentido de uma escola mais autónoma e, ao mesmo tempo, procurar que a avaliação institucional desta mesma escola possa articular se com formas mais amplas de prestação de contas e de responsabilização. Não necessariamente enquadrada no âmbito mais pragmático dos desafios decorrentes de algumas agendas políticas e educacionais recentes, a formação em avaliação é absolutamente central e estruturante, não apenas aquela que, há longo tempo, diz respeito à avaliação das aprendizagens, enquanto actividade quotidiana e sistemática dos educadores e professores, mas também a que, mais recentemente, visa a avaliação dos e pelos pares e, ainda, a avaliação institucional das escolas (sobretudo na componente da autoavaliação). A este propósito, em diversos momentos tenho afirmado que uma ampla formação dos professores e de outros actores educativos na problemática da avaliação educacional, em sentido lato, se torna cada vez mais urgente e necessária. Sem essa competência, a acrescentar a todas as outras que são constitutivas de uma concepção profissional de professor (com ou sem responsabilidades de direcção e gestão), será plausível eficiência na utilização dos recursos que permitam, de uma forma justa e enquadrada, a comparação entre escolas (CNE, 2010, itálico meu). 19

esperar que os sistemas de avaliação acabem por justificar a expansão (e eventual burocratização) de outras estruturas especializadas para a sua implementação e/ou induzam a criação de estruturas de meta avaliação mais adequadas ao exercício do poder dos especialistas, recrutados por organizações específicas, eventualmente com grande autonomia em relação ao Estado, mas, possivelmente, radicalmente afastados dos interesses dos actores educativos e dos seus contextos locais e institucionais. Também por isso, há certamente, no campo da avaliação, um papel cada vez mais importante a desempenhar pelos Centros de Formação. BIBLIOGRAFIA AFONSO, Almerindo J. (2001). As escolas em avaliação: avaliabilidade e responsabilização. Administração Educacional, nº 1, pp. 22 26. AFONSO, Almerindo J. (2002). Políticas educativas e avaliação das escolas: por uma prática avaliativa menos regulatória. In J. Adelino; A. Neto Mendes & A. Ventura (orgs.) Avaliação de Organizações Educativas. Aveiro: Universidade de Aveiro, pp.31 37. AFONSO, Almerindo J. (2007). Estado, políticas educacionais e obsessão avaliativa. Contrapontos, vol. nº 7, nº 1, pp. 11 22. AFONSO, Almerindo J. (2009). Nem tudo o que conta é mensurável ou comparável. Crítica à accountability baseada em testes estandardizados e rankings escolares. Revista Lusófona de Educação, vol. 13, nº1, pp. 13 29. CARAMELO, João (2009). Educação e Desenvolvimento Comunitário num Processo de Transição Autogestionário. Porto: FPCE (tese de doutoramento, polic.). COLLÈGE de FRANCE/Pierre Bourdieu /1987). Propostas para o ensino do futuro. Cadernos de Ciências Sociais, nº5, pp. 101 120. CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO (2010). Parecer sobre Avaliação Externa das Escolas (2007 2009). Lisboa: CNE. HARGREAVES, Andy (2003). O Ensino na Sociedade do Conhecimento. Porto: Porto Editora. 20

INSPECÇÃO GERAL DA EDUCAÇÃO (2010). Avaliação Externa das Escolas 2008 2009 Relatório. Lisboa: IGE. INSPECÇÃO GERAL DA EDUCAÇÃO (2009). Efectividade da Auto Avaliação das Escolas 2004 2007 Relatório. Lisboa: IGE. TORRES, Leonor (2008). A escola como entreposto cultural: o cultural e o simbólico no desenvolvimento democrático da escola. Revista Portuguesa de Educação, vol. 21, nº 1, pp. 59 81. 21

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A AUTO AVALIAÇÃO DE ESCOLA: QUE LÓGICA (S) DE REGULAÇÃO? Eusébio André Machado Universidade Portucalense 1. A escola sob um regime de omni avaliação É do domínio das evidências que, sobretudo a partir do fim da II Guerra Mundial, houve uma mudança paradigmática no campo da educação. Um dos primeiros autores a sinalizar esta mudança foi Lyotard: na sua conhecidíssima obra A Condição Pós Moderna (1979). Este autor mostrou que o processo de informatização em curso provocou uma mudança do estatuto do saber, das instituições e dos agentes responsáveis pela sua transmissão. Com efeito, a modernidade instituiu um processo de legitimação da educação assente no valor intrínseco do saber, segundo uma narrativa humanista e emancipatória: mais saber seria sinónimo de mais emancipação e, nesse sentido, a educação cumpria um propósito elevado, incomensurável e sem uma indexação económica imediata. Ora, a partir da segunda metade do século passado, perante uma aceleração dos processos de competição ideológica (neste caso, até à queda do Muro de Berlim) e económica, num contexto designado por globalização, a educação perde rapidamente o seu valor intrínseco e passa a ser considerada pelo seu valor de uso. Segundo Lyotard, a narrativa humanista é, assim, substituída pela narrativa da performatividade: a educação passa a valer pelos resultados obtidos e pelo aumento da capacidade performativa, ficando, assim, directamente indexada às ambições de competitividade generalizada e às retóricas de desenvolvimento social e económico dos Estados. Esta mudança de paradigma traduziu se na construção de um regime de omni avaliação que, paulatina e consistentemente, colocou a escola, como lugar de efectivação das políticas educativas, sob uma espécie de vigilância pan óptica que visa uma transparência absoluta. As consequências começam a tornar se cada vez mais evidentes no quotidiano escolar, ao ponto da avaliação surgir como um processo de tal modo naturalizado e intrinsecamente bondoso que os seus propósitos não são objecto de qualquer questionamento axiológico, filosófico ou político. Deste ponto de vista, nos últimos anos, a injunção ideológica mais avaliação = mais qualidade foi objecto de um unanimismo desconcertante, alimentando e consolidando a afirmação do 23

regime de omni avaliação, através do qual nada é deixado sem avaliação: primeiro os alunos, depois as escolas e, finalmente, os professores. Por absurda que pareça quando a verbalizamos, a situação actual é esta: os alunos são avaliados por professores que ao mesmo tempo são avaliados por outros professores, sendo, finalmente, todos avaliados como elementos da escola. Ora, neste contexto, a primeira questão que, no nosso entender, deve ser colocada é a seguinte: ao serviço de que lógica de regulação está a avaliação em geral e a auto avaliação de escola em particular? Com efeito, a constituição progressiva do regime de omni avaliação é concomitante com uma reconfiguração das lógicas de regulação da educação, na qual Barroso (2005) identifica três tendências: em primeiro lugar, um aumento da regulação transnacional, quer por via dos fora de decisão internacional, quer por via das estruturas supra nacionais, como a União Europeia, dando origem a uma regulação de fora para dentro, aparentemente sem ideologia, que se impõe como uma obrigação que contamina todos os sistemas educativos, em termos de conceitos, políticas, medidas e programas; em segundo lugar, o hibridismo da regulação nacional, no qual é possível constatar a existência, em regime de sobreposição e de mestiçagem, diferentes lógicas de regulação: no caso de Portugal, por exemplo, regista se a convivência de lógicas de regulação centralizada e burocrática com lógicas de regulação descentralizadas e comunitárias, pondo em causa o uso das dicotomias tradicionais de análise: centro periferia, heteronomia autonomia, público privado, etc. em terceiro lugar, a fragmentação da micro regulação local resultante do modo como se realiza localmente a transposição das normas nacionais e transnacionais, tendo em conta uma complexificação crescente, não só pela entrada em jogo de mais e diferentes actores, mas também pelo acréscimo de conflitualidade de interesses, estratégias e motivações ( efeito de mosaico ) que tende a acentuar as tensões entre equidade e diferença no interior do próprio sistema educativo nacional. Ora, neste contexto, convirá notar que o aumento da regulação transnacional, ao mesmo tempo que se regista um hibridismo da regulação nacional e uma fragmentação da regulação local, provocou um efeito poderoso de despolitização da decisão educativa. Não só porque, de facto, não há mecanismos de participação e de decisão democrática nas agendas definidas a nível transnacional, mas também porque a gestão 24

tecnocrática, axiologicamente pura e pragmaticamente eficaz, se sobrepôs aos processos políticos, dialógicos e comunitários de participação e acção colectiva. Por isso, a instauração do regime de omni avaliação nas escolas e nos sistemas educativos aparece ao serviço, no sector público e para público, de uma nova ideologia de gestão (Saint Germain, 2001) cada vez mais despolitizada, neutra e tecnocrática, na qual está mais em causa a necessidade de uma resposta às ambições de performatividade do que o incremento de processos emancipatórios, mesmo que, no limite, não consideremos a eficácia e a justiça como valores antagónicos. Nada mais perverso, portanto, quando se trata de auto avaliação de escola, do que inseri la nesta gestão tecnocrática e tecnicista da educação, através da qual são os próprios actores que, na busca da construção de alegados processos de emancipação e de auto regulação, contribuem para uma lógica de mercado, criando o monstro que os há de devorar. Concluindo: sendo óbvio que a AAE é um procedimento técnico e científico (o que não é sinónimo de positivismo ), é fundamental, do nosso ponto de vista, que se assuma, em primeiro lugar, como um processo político e dialógico, no sentido em que, através dos mecanismos formais e informais definidos, deve ser o resultado da tomada de decisões nas quais está intrinsecamente implicada uma axiologia sobre o que é melhor para uma determinada comunidade. Por outras palavras, concebemos a AAE como um processo decisional ao serviço do governo da escola e num quadro de autonomia assente em procedimentos transversais de reflexão, participação e legitimação. A enfatização da dimensão política tem, pois, um claro propósito emancipatório e comunitário, se não quisermos que ela, enviesadamente, entre no jogo de uma regulação tecnocrática da educação: o focus da auto avaliação é, antes de mais, o auto, isto é, a possibilidade de um sujeito (neste caso, individual e colectivo) tomar um conjunto de decisões, em função de um quadro axiológico próprio e num propósito de auto regulação que ajude a prestar um serviço social e formalmente conferido à escola. Neste aspecto, concordamos com Simons quando afirma que se considerarmos a avaliação como uma actividade política, então a metodologia da avaliação encontra se balizada por considerações políticas. Neste sentido, a metodologia da avaliação tem de ser coerente com os projectos e as intenções educacionais. Creio que a educação e a política são mutuamente constitutivas. (1992, p. 142) 25

2. A avaliação como um processo político A tematização da natureza da actividade avaliativa tem sido marcada, constitutivamente, por esta dicotomia técnica versus política, a qual, de resto, determinou, em larga medida, a diferença entre duas importantes tradições e culturas de avaliação: a cultura norte americana e a cultura do Reino Unido. Embora esta tipologia subsuma perspectivas e autores muito diversos, o que deu origem a uma produção teórica complexa, é possível, no entanto, num esforço de síntese, apontar a existência de um diferendo que, segundo Simons (1987, p. 31), se organiza em torno das seguintes questões políticas colocadas ao processo de avaliação: Quem deve avaliar? Quem deve julgar o valor do desempenho da escola? Quem deve ter acesso aos resultados da avaliação? No âmbito da cultura norte americana (onde se inclui, sobretudo, a geração fundacional da avaliação da década de sessenta: Scriven, Tyler, Cronbach, Stufflebeam, etc.), um dos pressupostos fundamentais e consensuais é o de que deve ser um perito ou um especialista o responsável pela condução dos processos de avaliação, uma vez que possui o conhecimento, as competências e o distanciamento que são exigidos por uma determinada concepção de ciência ( o positivismo ) e por uma perspectiva de regulação da educação ( a regulação pelo mercado ). Quanto à segunda questão, há várias respostas relativamente a quem deve assumir o papel de juiz do desempenho da escola, mas, seja o especialista (Scriven e Eisner), sejam os administradores (Stufflebeam), sejam os stakeholders, tratar se á sempre de um elemento externo à realidade avaliada. Por último, segundo a maior parte dos teóricos americanos, os resultados da avaliação devem ter como destinatários os peritos, os patrocinadores ou mecenas e os responsáveis pela administração da escola, segundo uma lógica de decisão racional e tecnocrática. Em suma, ressalta do contributo destes autores a configuração da avaliação como um processo eminentemente técnico e especializado, o que em muito reforçou a emergência e a constituição da profissionalidade do avaliador, mas escamoteou a dimensão 26

política na qual intrinsecamente deverá assentar a regulação da educação nas sociedades democráticas e plurais. Por seu turno, surgida num contexto substancialmente diferente e muito marcado pela prática, a cultura de avaliação do Reino Unido, sobretudo a partir dos anos setenta, apresenta uma visão crítica das perspectivas teóricas defendidas pelos autores norte americanos, designadamente no que respeita ao modelo behaviorista dos objectivos pré definidos da avaliação curricular. Colocando a ênfase mais na avaliação da escola do que na avaliação dos programas, os teóricos ingleses (Parlett, Hamilton, Harlen, Eraut, Elliott e, sobretudo, MacDonald) acentuam a dimensão política do processo avaliativo. Neste sentido, embora reconheçam que deve ser o avaliador profissional ou o perito a conduzir a avaliação, estes autores salientam a necessidade de uma lógica mais democrática e pluralista, através da qual a informação seja partilhada pelo maior número de pessoas possível, a começar pelos práticos. O avaliador profissional não pode, assim, assumir um estatuto privilegiado, nem impor os seus valores; quando muito, competir lhe á desempenhar o papel de um distribuidor imparcial do jogo (a broker ), fornecendo a informação à comunidade e suscitando o debate assente no reconhecimento do pluralismo e da diferença de interesses. Sintetizando, e apesar das diferenças entre os vários autores que não devem ser escamoteadas, esta cultura reforça uma perspectiva de avaliação na qual o pluralismo democrático reclama uma maior participação da comunidade, dos práticos e dos professores na condução, na produção de juízos e na recepção crítica da informação. Como refere MacDonald, a avaliação democrática é uma informação ao serviço da comunidade sobre as características de um determinado programa educacional. Reconhece o valor do pluralismo e procura representar uma variedade de interesses na sua formulação do problema. O valor básico é uma cidadania informada e o avaliador actua como um árbitro nas trocas de informação entre os diferentes grupos. (1974, p.8, cit. por Simons, 1987, p. 45) Reiterar actualmente este debate, mesmo que de modo sumário, reveste se de um significativo e não negligenciável valor heurístico para um país como Portugal, onde começam a ser dados os primeiros passos no sentido de uma universalização das práticas de avaliação externa e de AAE. Com efeito, na realidade 27

portuguesa, as duas doenças infantis da AAE são o normativismo e o tecnicismo : a primeira, cujo principal sintoma é o mimetismo da avaliação externa, encara a AAE como uma necessidade reactiva de legitimação das práticas pela conformidade à norma, partindo de uma concepção de escola como agência do estado central, o que, paradoxalmente, é contraditório com o pressuposto de um efeito escola que justifica a própria avaliação; a segunda, cujo principal sintoma é uma obsessão pelas estatísticas, concebe a AAE como um instrumento de gestão e de legitimação, procurando justificar perante os investidores (mesmo que seja o Estado) e os clientes o seu valor, no jogo da oferta e da procura, ditado pela lógica de mercado. Ora, o debate acima resumido reveste se de particular pregnância quando tomamos consciência que estas doenças infantis da AAE têm contribuído, objectiva e subjectivamente, para a prevalência de dispositivos de AAE destituídos da componente dialógica, conduzidos segundo uma lógica de avaliação profissional e de acordo com pressupostos exclusivamente técnicos de natureza neo positivista. Deste ponto de vista, reforçar a dimensão política da AAE (em concomitância com a sua dimensão técnica e metodológica) significa considerar que estamos perante um processo que convoca, antes de mais, uma legitimação que não se esgota na validade epistemológica do dispositivo concebido, mas, mais do que isso, exige um trabalho de negociação e de consensualização em torno da definição dos referenciais de análise, pressupõe a partilha da informação como valor central e aponta para uma actividade de interpretação intersubjectiva e plural da realidade considerada. De resto, no actual contexto de reconfiguração das lógicas de regulação e de omni avaliação, a AAE pode constituir se como meio privilegiado de re politização da escola e do serviço que presta, contribuindo para o aumento da inteligibilidade da acção desenvolvida. A avaliação é, de facto, uma coisa demasiado importante para ser entregue apenas aos especialistas, isto porque, como bem salienta Meirieu, quem quer que seja que avalie revela o seu projecto ou o que lhe impuseram os seus preconceitos, as suas preocupações, a sua instituição. Ao avaliar o que vejo, digo o que procuro e, se não estiver consciente disso, não posso pretender ser aquilo que hoje se chama um actor social e a que antigamente se chamava um homem livre. (1994, p.13) 28

3. Uma perspectiva dialógica da AAE Talvez a melhor forma de explicitar o alcance radical de uma perspectiva dialógica da AAE seja citar um texto relativamente recente do filósofo espanhol Barrio Maestre, em que se incide sobre a ideia aristotélica de cidadania: A linguagem é o elemento constitutivo da amizade política, valor cívico fundamental. Aquilo que é próprio da política é empreender actividades em comum, e sobretudo uma: o diálogo. Os homens partilham as suas vidas na polis comunicando entre si sobre o justo e o conveniente, o bom e o belo. Tais são os argumentos essenciais da conversação humana realmente significativa, a que pode estabelecer laços de amizade. (2006, p.19) Esta citação deixa clara a conexão intrínseca entre a política (polis) e o diálogo (logos) que queremos estabelecer no âmbito da AAE: é através da actividade dialógica que se constrói a vida na cidade. Neste sentido, o propósito de politizar a escola deve fundar se nessa comunicação partilhada sobre o que é justo e conveniente, e concretizar se nessa actividade comum que é a busca de sentidos que a avaliação pode proporcionar. Com efeito, é justamente nesta linha de reforço do político, da comunicação e da axiologia que propomos uma perspectiva dialógica de AAE, segundo três princípios fundamentais: a) o princípio da pluralismo, pressupondo uma concepção da escola que aceita a existência de opiniões divergentes, de olhares antagónicos e de confronto de expectativas; b) o princípio dialógico, conferindo ao diálogo o carácter de instância de participação, de comunicação e de compromisso entre todos os intervenientes em torno das melhores decisões para o bem comum ; c) o princípio hermenêutico, privilegiando uma construção colectiva de sentido (Figari, 2008) que aumente a compreensão e, sobretudo, a melhoria das escolas. 29

Para consubstanciar estes princípios num dispositivo, julgamos essencial desencadear, antes de mais, um processo reflexivo em torno das seguintes questões sobre a AAE: assenta num processo dialógico de construção de referenciais (externos e internos)? pressupõe a participação de actores (externos e internos)? recorre a critérios políticos que resultam da construção da autonomia da escola (opções axiológicas, curriculares, culturais, etc.)? tem em conta as especificidades contextuais na interpretação dos resultados, sem deixar de se confrontar com padrões externos? tem um uso hermenêutico na busca de sentidos para o sentido da avaliação? e permite o reforço da cooperação entre professores, pais e o Estado, no sentido de uma regulação local e autónoma da escola? Face a este percurso reflexivo, não podemos concluir sem explicitarmos assumidamente que esta perspectiva dialógica de AAE se situa numa lógica de regulação que privilegia a instância comunitária e local, embora enquadrada numa lúcida e repolitizada relação de subsidiariedade com a regulação nacional e transnacional, segundo um regime de multi regulação. Talvez a própria AAE se possa constituir, deste modo, como uma estratégia de reflexão crítica, através da qual os diferentes actores consigam encontrar formas de responder ao complexo mandato que impende sobre a escola, tendo em conta as retóricas cada vez mais acentuadas de exigência simultânea de equidade e de capacidade performativa. Tratar se á, pois, de pensar a escola como possibilidade de resistência à erosão da cidadania, da comunicação e da vida em comum, mas, ao mesmo tempo, eficaz perante os desafios da formação de sujeitos poli competentes, criativos e resilientes num mundo feito de mudança. Cremos, por isso, que quanto mais a avaliação se afastar do normativismo e do tecnicismo, opções despolitizadas e pouco promotoras da dialogia, mais próxima estará de se afirmar como um procedimento útil e um processo com sentido. 30

BIBLIOGRAFIA BARRIO MAESTRE, J. M. (2006). Logos y Polis: la Idea Aristotélica de Ciudadanía. In Concepción Naval & Montserrat Herrero (eds.). Educación y Ciudadanía en una Sociedad Democrática. Madrid: Ediciones Encuentro, pp. 19 48. BARROSO, J. (2005). Políticas Educativas e Organização Escolar. Lisboa: Universidade Aberta. FIGARI, G. (2008). Avaliação de Escola: Questões, Tendências e Modelos. In Maria Palmira Alves & Eusébio André Machado. Avaliação com Sentido (s). Contributos e Questionamentos. Santo Tirso: De Facto, pp. 41 72. LYOTARD, J. F. (1979). La Condition Postmoderne. Paris: Les Éditions de Minuit. MEIRIEU, P. (1994). Prefácio. In Charles Hadji. A Avaliação, Regras do Jogo. Das Intenções aos Instrumentos. Porto: Porto Editora, pp. 13 15. SAINT GERMAIN, M. (2001). Préface. In André Gustin. Management des Établissements Scolaires. De l Évalaution Institutionelle à la Gestion Stratégique. Bruxelles: De Boeck Université, pp. 5 8. SIMONS, H. (1987). Getting to Know Schools in a Democracy. The Politics and Process of Evaluation. Londres: The Falmer Press. SIMONS, H. (1992). Avaliação e Reforma das Escolas. In Albano Estrela & António Nóvoa (orgs.). Avaliações em Educação: Novas Perspectivas. Lisboa: Educa, pp. 139 153. 31