ANÁLISE COMPARATIVA DOS EFEITOS ALELOPÁTICOS DAS SUBSTÂNCIAS QUÍMICAS TITONINA E TITONINA ACETILADA 1

Documentos relacionados
ATIVIDADE ALELOPÁTICA DE CHALCONA SINTÉTICA, DE SEUS PRECURSORES E DE CETONAS E ALDEÍDOS RELACIONADOS

FOR-106-ATIVIDADE POTENCIALMENTE ALELOPÃTICA EM PLANTAS DE ACAPU (Vouacapoua americana Aublet) I - EFEITOS DE EXTRATOS AQUOSOS DA CASCA

ATIVIDADE ALELOPÁTICA DE SUBSTÂNCIAS QUÍMICAS ISOLADAS DO CAPIM-MARANDU E SUAS VARIAÇÕES EM FUNÇÃO DO PH 1

4 a 8 de maio de ouro preto - MG - Brasil

ATIVIDADE POTENCIALMENTE ALELOPÁTICA DE EXTRATOS BRUTOS E HIDROALCOÓLICOS DE FEIJÃO-DE-PORCO (Canavalia ensiformis) 1

Ciência das Plantas Daninhas. XVIII Congreso de Ia Asociación

ATIVIDADE ALELOPÁTICA EM FOLHAS DE Tachigali myrmecophyla (LEG. PAP.) 1

4002 Síntese de benzil a partir da benzoína

INTERFERÊNCIA POTENCIALMENTE ALELOPÁTICA DO CAPIM-GENGIBRE (Paspalum maritimum) EM ÁREAS DE PASTAGENS CULTIVADAS 1

4001 Transesterificação do óleo de mamona em ricinoleato de metila

4023 Síntese do éster etílico do ácido 2-cicclopentanona carboxílico a partir do éster dietílico do ácido adípico

1024 Eliminação de água do 4-hidroxi-4-metil-2-pentanona

4006 Síntese do éster etílico do ácido 2-(3-oxobutil) ciclopentanona-2-carboxílico

Potencial alelopático do feijão de porco (canavalia ensiformes) no desenvolvimento de alface (Lactuca sativa L.) sob diversas concentrações

25 a 28 de novembro de 2014 Câmpus de Palmas

PADRÃO DE RESPOSTA DE Mimosa pudica E Senna obtusifolia À ATIVIDADE POTENCIALMENTE ALELOPÁTICA DE ESPÉCIES DE POACEAE 1

4014 Separação enantiomérica de (R)- e (S)-2,2'-dihidroxi-1,1'- binaftil ((R)- e (S)-1,1-bi-2-naftol)

4009 Síntese de ácido adípico a partir do ciclohexeno

Óleos essenciais de Alecrim pimenta e Capim citronela na germinação de sementes de beterraba (Early Wonder)

2004 Redução diastereosseletiva de benzoina com boro-hidreto de sódio a 1,2-difenil-1,2-etanodiol

SUBSTÂNCIAS QUÍMICAS COM ATIVIDADES ALELOPÁTICAS PRESENTES

1011 Síntese do 1,4-di-terc-butil benzeno a partir do terc-butil benzeno e cloreto de terc-butila.

4028 Síntese de 1-bromodecano a partir de 1-dodecanol

ALELOQUÍMICO PRODUZIDO PELA GRAMÍNEA FORRAGEIRA Brachiaria humidicola 1

2017 Obtenção da amida do ácido cinâmico através da reação do cloreto do ácido cinâmico com amônia

4010 Síntese de p-metoxiacetofenona a partir do anisol

3033 Síntese do ácido acetilenodicarboxílico a partir de ácido meso dibromosuccínico

4005 Síntese do éster metílico do ácido 9-(5-oxotetra-hidrofuran- 2-ila) nonanóico

1004 Nitração do N-óxido de piridina para N-óxido de 4- nitropiridina

Efeito Alelopático da Parte Aérea de Espécies de Adubos Verdes na Geminação de Sementes de Cenoura.

BIOENSAIOS DE ATIVIDADE ALELOPÁTICA DOS ESTEROIDES ESPINASTEROL, ESPINASTERONA E GLICOPIRANOSIL ESPINASTEROL 1

1023 Isolamento de hesperidina da casca da laranja

3005 Síntese de 7,7-diclorobiciclo [4.1.0] heptano (7,7- dicloronorcarano) a partir de ciclohexeno

DIFERENÇAS NO PADRÃO DA ATIVIDADE ALELOPÁTICA EM ESPÉCIES DA FAMÍLIA LEGUMINOSAE 1

ALUMÍNIO EM SISTEMAS DE CULTURAS NO SISTEMA DE PLANTIO DIRETO. VANDERLISE GIONGO Engenheira Agrônoma - UFPeI

4016 Síntese de (±)-2,2'-dihidroxi-1,1'-binaftil (1,1'-bi-2-naftol)

2029 Reação do trifenilfosfano com o éster metílico do ácido bromoacético originando brometo de (carbometoximetil) trifenilfosfônio

2005 Síntese da acetonida do meso-1,2-difenil-1,2-etanodiol (2,2- dimetil-4,5-difenil-1,3-dioxolana)

AÇÃO FITOTÓXICA DE HIDRAZIDAS DERIVADAS DE ÁCIDO CINÂMICO E TRIMETOXICINÂMICO SOBRE BIOENSAIOS DE ALFACE

ATIVIDADE ALELOPÁTICA DE SUBSTÂNCIAS QUÍMICAS ISOLADAS DA Acacia mangium E SUAS VARIAÇÕES EM FUNÇÃO DO PH 1

3016 Oxidação do ácido ricinoléico a ácido azeláico (a partir de óleo de rícino) com KMnO 4

Química Orgânica Experimental I BAC CRITÉRIOS PARA CORREÇÃO DOS PRÉ-RELATÓRIOS E RELATÓRIOS

5007 Reação do anidrido ftálico com resorcinol para obtenção de fluoresceína

4024 Síntese enantioseletiva do éster etílico do ácido (1R,2S)-cishidroxiciclopentano-carboxílico

5026 Oxidação do antraceno à antraquinona

XVIII Con~reso de Ia Asociación ~2tjn~ameri~~n~ d~ M~!92as. 4a 8 de maio de Ouro preto'" MG - Brasil

Causas de GL IVE TMG PGER IVE TMG PGER

3001 Hidroboração/oxidação de 1-octeno a 1-octanol

¹Universidade Federal do Ceará - Depto. de Fitotecnia - C.P. 6012, CEP , Fortaleza-CE.

4013 Síntese de benzalacetofenona a partir de benzaldeído e acetofenona

POTENCIAL HERBICIDA DA BIOMASSA E DE SUBSTÂNCIAS QUÍMICAS PRODUZIDAS PELO FUNGO ENDOFÍTICO Pestalotiopsis guepinii 1

3003 Síntese de 2-cloro-ciclohexanol a partir de ciclohexeno

4004 Síntese de γ-decalactona a partir de 1-octeno e éster etílico do ácido iodoacético

Extrato de Repolho fermentado na germinação e no desenvolvimento de plantas de picão preto

2008 Esterificação do ácido propiônico com 1-butanol via catálise ácida para a obtenção do éster propanoato de butila

5009 Síntese de ftalocianina de cobre

Produção de Mudas de Pepino e Tomate Utilizando Diferentes Doses de Adubo Foliar Bioplus.

3009 Síntese de ácido-trans-5-norborneno-2-3-dicarboxílico a partir de ácido fumárico e ciclopentadieno

Potencial alelopático do óleo essencial de plantas medicinais sobre sementes e plântulas de picão-preto

Efeito do estresse hídrico e térmico na germinação e crescimento de plântulas de cenoura

Material Suplementar. Quim. Nova, Vol. 33, No. 10, S1-S9, 2010

EFEITO DE DIFERENTES MÉTODOS DE QUEBRA DA DORMÊNCIA EM SEMENTES DE AVENA SATIVA L.

EFEITO DO DIÂMETRO DE SEMENTE NA GERMINAÇÃO E NO DESENVOLVIMENTO DE PLÂNTULAS DE AVEIA BRANCA

FOR-193-GERMINAÇÃO DE SEMENTES DE PUERARIA PHASEOLOIDES: EFEITOS DO ph, DO NITRATO E DA SALlNIDADE

3002 Adição de bromo ao ácido fumárico para formação de ácido meso-dibromo-succínico

POTENCIAL ALELOPÁTICO DO EXTRATO AQUOSO DA POLPA DO FRUTO DO JATOBÁ

BIOCARVÃO COMO COMPLEMENTO NO SUBSTRATO PARA A PRODUÇÃO DE MUDAS DE TOMATE CEREJA

5004 Acetalização catalisada por ácido de 3-nitrobenzaldeído ao correspondente 1,3-dioxolano com etanodiol

AVALIAÇÃO DO POTENCIAL ALELOPÁTICO DO ADUBO VERDE (CROTALARIA SPECTABILIS) NA PRODUÇÃO DE MUDAS DE TOMATE (LYCOPERSICON ESCULENTUM MILL)

Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária Embrapa Amazônia Oriental Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento

4026 Síntese de 2-cloro-2-metilpropano (cloreto de tert-butila) a partir de tert-butanol

QUÍMICA FARMACÊUTICA

RENDIMENTO DE SUCO E TEOR DE SÓLIDOS SOLÚVEIS TOTAIS EM GENÓTIPOS DE MARACUJAZEIRO AMARELO

2030 Reação do brometo de (carbometoximetil) trifenilfosfônio com benzaldeído

Avaliação de Tratamentos Utilizados na Superação de Dormência, em Sementes de Quiabo.

em função da umidade e rotação de colheita

MATERIAL SUPLEMENTAR. Benzamidoxima

2023 Redução da D-(+)-cânfora com hidreto de lítio e alumínio para uma mistura isomérica de (+)-borneol e ( )-isoborneol

O lado bom de uma samambaia vilã. Carina Hayakawa Pereira*; Rosana Marta Kolb

ESTÁDIO DE DESENVOLVIMENTO E ESTRESSE HÍDRICO E AS POTENCIALIDADES ALELOPÁTICAS DO CAPIM-MARANDU 1

4025 Síntese de 2-iodopropano a partir do 2-propanol

ESTUDO DA INFLUÊNCIA DA TEMPERATURA SOBRE OS ESPECTROS DE RMN DE

EFEITO INIBITÓRIO DO ÓLEO DE Azadirachta indica A. Juss. SOBRE PLANTAS DANINHAS 1

ANÁLISE COMPARATIVA DO POTENCIAL ALELOPÁTICO DO EXTRATO HIDROALCOÓLICO E DO ÓLEO ESSENCIAL DE FOLHAS DE CIPÓ-D ALHO (BIGNONIACEAE) 1

3012 Síntese do adamantilideno (adamantanilideno) adamantano a partir de adamantanona

Disciplina: Práticas de Química Orgânica. Materiais e Reagentes

1001 Nitração do tolueno para 4-nitrotolueno, 2-nitrotolueno e 2,4-dinitrotolueno

Ação Inseticida de Óleo Essencial e Extrato Alcoólico de Carapa guianensis Aubl. contra Tenebrio molitor em laboratório

EXTRATO ALELOPÁTICO DE RAIZ DE CRAMBE SOBRE SEMENTES DE MILHO

Preparação do cloreto de t-butila. Carina de Freitas Vellosa Daiane Cristina Romanini

Efeito alelopático de óleo essencial de plantas medicinais sobre sementes e plântulas de pimentão

Efeitos alelopáticos de Brachiaria brizantha cv. Marandu sobre a germinação de espécies daninhas.

Síntese e purificação de um corante com potencial tratamento do cancro

METODOLOGIAS EMPREGADAS EM ESTUDOS DE AVALIAÇÃO DA ATIVIDADE ALELOPÁTICA EM CONDIÇÕES DE LABORATÓRIO REVISÃO CRÍTICA 1

Óleos Essenciais de Capim Citronela e de Alecrim Pimenta na Germinação de Sementes de Emilia sonchifolia, (L.) D.C.

Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária Embrapa Amazônia Oriental Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento

Óleos essenciais de capim citronela e de alecrim pimenta na germinação de sementes de Chloris barbata, Sw.

5001 Nitração do Fenol em 2-nitrofenol e 4-nitrofenol

NOTA CIENTÍFICA / SCIENTIFIC NOTE. EXTRATOS AQUOSOS DE Xylopia aromatica E Annona crassiflora SOBRE CAPIM-MARANDU (Brachiaria brizantha) E SOJA 1

CARACTERIZAÇÃO AGRONÔMICA DA ALFACE SUBMETIDA A DIFERENTES TIPOS DE COBERTURA DO SOLO COM PLANTAS NATIVAS DA CAATINGA COM EFEITO ALELOPÁTICO

Transcrição:

Análise comparativa dos efeitos alelopáticos das... 205 ANÁLISE CMPARATIVA DS EFEITS ALELPÁTICS DAS SUBSTÂNCIAS QUÍMICAS TITNINA E TITNINA ACETILADA 1 Comparative Analysis of the Allelopathic Effects of the Chemical Compounds Tithonine and Acetylated Tithonine SUZA FILH, A.P.S. 2, BRGES, F.C. 3 e SANTS, L.S. 4 RESUM - Este trabalho teve por objetivo estabelecer as variações na atividade alelopática da substância química titonina, em função da acetilação de sua molécula. Bioensaios de germinação (25 o C de temperatura constante e fotoperíodo de 12 horas) e de desenvolvimento da radícula e do hipocótilo (25 o C de temperatura constante e fotoperíodo de 24 horas) foram desenvolvidos. Como planta receptora, utilizou-se a planta daninha Mimosa pudica (malícia). Análise de espectros RMN 1 H e 13 C e técnicas de RMN bidimensionais foram realizadas na molécula acetilada. processo de acetilação produziu a molécula 3 -acetil-7,4 -dimetoxiflavona, que diferiu da molécula original, identificada como 3 -hidroxi-7,4 -dimetoxiflavona. A estrutura da titonina-ac foi confirmada pelos espectros de RMN 1 H, 13 C, DEPT, CSY e HETCR. A titonina foi acetilada com anidrido acético em piridina. A análise comparativa da atividade alelopática das duas substâncias revelou que titonina-ac apresentou maior potencial para inibir tanto a germinação das sementes como o desenvolvimento da radícula e do hipocótilo da planta daninha malícia. A intensidade dos efeitos alelopáticos das duas substâncias esteve positivamente associada à concentração. conjunto das informações obtidas permite sugerir a possibilidade de se aumentar a atividade alelopática de uma substância química sem comprometer suas peculiaridades biológicas desejáveis à natureza e aos interesses da sociedade. Palavras-chave: alelopatia, acetilação, estrutura, inibição, molécula. ABSTRACT - The objective of this paper was to establish the variations in the allelopathic activity of the chemical substance tithonine, in function of the acetylation of its molecule. Germination bioassays, under 25 o C of constant temperature and 12-hour photoperiod, and radicle and hypocotyl development bioassays under 25 o C of constant temperature and 24-hour photoperiod were developed. The receiving plant used was the weed Mimosa pudica. Spectral analysis RMN 1 H and 13 C and bidimensional RMN techniques were carried out on the acetylated molecule. The acetylation process produced the molecule 7,4'- dimethoxy-3'-acetylflavone, which differed from the original molecule, identified as 7,4'-dimethoxy-3'-hydroxyflavone. The structure of the acetylated tithonine was confirmed by the specters of RMN 1 H, 13 C, DEPT, CSY and HETCR. Tithonine was acetylated with acetic anhydride in pyridine. The comparative analysis of the allelopathic activity of the two substances showed that acetylated tithonine presented a greater potential to inhibit seed germination, as well as root and hypocotyl development of M. pudica. Both tithonine and acetylated tithonine showed the same behavior pattern in relation to substance concentration. The data obtained allow suggesting the possibility of increasing the biological activity of a chemical substance with allelopathic activity without compromising its biological peculiarities, desirable to nature and to the interests of society. Keywords: allelopathy, acetylation, structure, inhibition, molecule. 1 Recebido para publicação em 28.7.2005 e na forma revisada em 5.5.2006. 2 Embrapa Amazônia riental, Trav. Dr. Enéas Pinheiro, S/N. 66.095-100 Belém-PA. 3 Pós-Graduando em Química da Universidade Federal do Pará UFPA, Rua Augusto Corrêa, 01, 66075-900 Belém-PA. 4 Professor do Curso de Pós-Graduação em Química da UFPA.

206 SUZA FILH, A.P.S. et al. INTRDUÇÃ Nos últimos anos tem crescido a percepção da importância de estabelecer novos e eficientes métodos de controle de plantas daninhas, que considere a necessidade de preservar os recursos naturais, a qualidade dos alimentos utilizados na dieta dos animais, em geral, e do homem, em particular, e não seja agente fomentador de insatisfações de ordem social. Quando se consideram os problemas decorrentes do uso indiscriminado de herbicidas sintéticos (Anaya, 1999; Killham & Foster, 1996) e o aumento sistemático no número de espécies de plantas daninhas resistentes aos atuais produtos no mundo (Vidal & Meroto, 2001; Heap, 1997; Jasieniuk et al., 1996; Christoffoleti et al., 1994; Leron, 1991; Holt & Leron, 1990), a necessidade de colocar à disposição da agricultura produtos alternativos assume aspecto ainda mais relevante. Teoricamente, as substâncias químicas com atividade alelopática podem ser utilizadas diretamente na formulação de bioerbicidas ou então ser modificadas com vistas a aumentar sua atividade biológica. Embora os aspectos que levem ao desenvolvimento de herbicida sejam claros na literatura, algumas substâncias químicas naturais têm servido como estrutura-modelo para obtenção de novos produtos. Vários herbicidas contendo grupos fenóxidos são análogos às auxinas, além do fato de que substâncias como o ácido benzóico são freqüentemente descritas com atividade alelopática, sendo a utilização de seus derivados como herbicida (TBA, TIBA, dicamba etc.) bem conhecida (Einhellig & Leather, 1988). s procedimentos metodológicos utilizados no isolamento, na identificação e na caracterização da atividade alelopática de substâncias químicas produzidas pelas plantas são demorados e onerosos; além disso, em muitos casos os resultados obtidos fornecem aleloquímicos com baixa atividade inibitória da germinação de sementes e do desenvolvimento da radícula de espécies de plantas receptoras, ou, então, as quantidades obtidas são insuficientes para a realização dos bioensaios, permitindo apenas a realização dos procedimentos de identificação. Bons exemplos desses resultados são encontrados nos trabalhos de Lobo (2004) e Fonseca (2005). Uma alternativa para esse problema seria a manipulação da molécula química de determinadas substâncias com atividades alelopáticas já comprovadas mediante bioensaios, sem que os procedimentos empregados redundassem no comprometimento das propriedades biológicas, que as tornam importantes fontes alternativas para fazer frente aos problemas que surgem em decorrência da aplicação dos herbicidas disponíveis no mercado. Este trabalho teve por objetivo estabelecer as variações na atividade alelopática da substância química titonina, em função da acetilação de sua molécula, em relação às prováveis alterações no potencial alelopático inibitório da germinação de sementes e do desenvolvimento da radícula e do hipocótilo da planta daninha malícia (Mimosa pudica). MATERIAL E MÉTDS Procedimentos utilizados na acetilação da substância titonina Em balão de fundo redondo foram adicionados 100 mg de titonina, 0,35 ml de anidrido acético, DMAP (em quantidade catalítica) e 8,75 ml de diclorometano. A mistura da reação foi agitada sob refluxo e monitorada por CCDC. Após cinco horas, a mistura reacional foi transferida para um funil de separação e lavada com solução aquosa de HCl a 5,0% (em duas ocasiões, cada uma utilizando 20 ml) e, em seguida, com água até ph neutro. A fase orgânica foi seca em sulfato de sódio anidro e, após filtração, a solução foi concentrada sob pressão reduzida, deixando-se em repouso à temperatura ambiente, para cristalização. s sólidos brancos obtidos em forma de cristais foram recristalizados em metanol, obtendo-se 114 mg de cristais (rendimento quantitativo) com ponto de fusão de 170 171,5 o C. Análise da atividade alelopática Bioensaios de germinação: foram desenvolvidos em câmaras de germinação, em condições controladas para temperatura de 25 o C e fotoperíodo de 12 horas. A germinação foi monitorada em período de dez dias, envolvendo contagens diárias e eliminação daquelas sementes germinadas. Consideraram-se sementes germinadas aquelas que exibiam

Análise comparativa dos efeitos alelopáticos das... 207 extensão radicular igual ou superior a 2,00 mm (Duram & Tortosa, 1985; Juntila, 1976). da placa de Petri de 9,0 cm de diâmetro, forrada com uma folha de papel-filtro qualitativo, recebeu 20 sementes, tratadas com ácido sulfúrico, em imersão por 20 minutos, conforme estabelecido por Souza Filho et al. (1998). Bioensaio de desenvolvimento da radícula e do hipocótilo: foram desenvolvidos à semelhança do bioensaio de germinação, com diferença na duração do fotoperíodo, que foi de 24 horas. da placa de Petri de 9,0 cm recebeu três sementes pré-germinadas e, ao final de período de dez dias de crescimento, foram medidos os comprimentos da radícula e do hipocótilo. Procedimentos comuns aos dois bioensaios: para a análise da atividade alelopática das duas substâncias, estabelecera-se as concentrações de 1,0; 2,0; 3,0; e 4,0 mg L -1, tendo como eluente o metanol. da placa de Petri recebeu 3,0 ml da solução, deixando-se evaporar o solvente, adicionando, em seguida, o mesmo volume de água destilada, mantendo, dessa forma, a concentração original. As soluções foram adicionadas apenas uma vez, no início do experimento, sendo adicionado, a partir de então, apenas água destila, sempre que se fazia necessário. Como planta-teste receptora, foi utilizada a planta daninha de áreas de pastagens cultivadas Mimosa pudica (malícia) Análise estatística: o delineamento experimental, para todos os bioensaios, foi inteiramente casualizado, com três repetições. Para efeito de comparação da atividade alelopática, utilizou-se, como tratamento-teste, testemunha, a água destilada. s dados foram submetidos à análise de variância pelo teste F e as médias comparadas pelo teste de Tukey (5%). s dados foram analisados utilizando o sistema SAS (SAS, 1989). RESULTADS E DISCUSSÃ No presente trabalho, utilizaram-se os espectros de RMN de 1 H e RMN de 13 C obtidos por Borges (2003) na identificação da substância titonina nas folhas de Virola michelii, cujos dados são apresentados na Tabela 1. Tabela 1 - dos de RMN de 1 H (300 MHZ, CDCl 3 ) e de 13 C(75 MHz, CDCl 3 ) obtidos para as substâncias titonina e titonina-ac Posição -Ac 1 H 13 C 1 H 13 C 2 163,2 161,99 3 6,65 (1H, s) 106,1 6,65 (1H, s) 106,62 4 178,1 177,62 5 8,08(1H, d, J = 9,0 Hz) 126,9 8,10(1H, d, J=8,7 Hz) 127,05 6 6,91 (H, m) 114,3 6,96(1H, dd, J=8,7 e 2,4 Hz) 114,28 7 164,1 164,14 8 6,69(1H, d, J = 2,4 Hz) 100,4 6,93 (1H, d, J=2,4 Hz) 100,42 9 157,9 158,00 10 117,6 117,83 1 124,8 124,60 2 7,43 (1H, d, J = 2,3 Hz) 112,4 7,61 (1H, d, J=2,3 Hz) 120,93 3 146,1 140,00 4 149,6 153,81 5 6,91 (2H, m) 110,8 7,06 (1H, d, J=8,8 Hz) 112,51 6 7,42 (1H, dd, J = 9,0 e 2,3 Hz) 118,8 7,75 (1H, d, J=8,8 Hz) 125,15 Me 3,90 (3H, s) 3,93 (3H, s) 55,5 56,0 3,90 (3H, s) 3,91 (3H, s) 55,80 55,95 Me 2,36 (3H, s) 20,57 C 168,67

208 SUZA FILH, A.P.S. et al. Após a acetilação, a titonina-ac foi submetida à análise para os mesmos espectros utilizados na determinação da estrutura química da titonina, cujos resultados também são apresentados na Tabela 1. s espectros obtidos para titonina permitiram definir sua estrutura como sendo 3 -hidroxi-7,4 -dimetoxiflavona (Figura 1), enquanto para titonina-ac os espectros indicaram mudança na estrutura para 3 -acetil-7,4 -dimetoxiflavona (Figura 1), ou seja, a diferença entre as duas estruturas foi a presença do grupo acetil na molécula da titonina-ac, mostrando que o processo de acetilação foi realizado com sucesso. A análise dos efeitos alelopáticos das duas substâncias sobre a germinação de sementes (Figura 2) e o desenvolvimento da radícula (Figura 3) e do hipocótilo (Figura 4) indicou que a titonina-ac promoveu inibições superiores àquelas proporcionadas pela titonina original, embora em algumas concentrações diferenças estatísticas (p>0,5) não tenham sido observadas. A tendência geral observada foi de comportamento semelhante entre titonina e titonina-ac em relação ao fator concentração, à exceção dos efeitos promovidos sobre o desenvolvimento do hipocótilo, especialmente nas concentrações de 1,0 e 2,0 mg L -1, em que se observa pequena distorção na intensidade das inibições promovidas pelas duas substâncias. Me Me 6 6 8 A 5 8 A 3 2' 2' 3 5 acetilada H B 6' B 6' 5' CMe 5' Me Me Figura 1 - Estrutura química das substâncias titonina e titonina-ac. Inibição (%) 50 40 30 20 10 0 -Ac Bb Aa 1 2 3 4 Concentração (mg L -1 ) Ab Figura 2 - Efeitos inibitórios sobre a germinação de sementes da planta daninha malícia, efetivados pelas substâncias titonina e titonina-ac. Médias seguidas de letras iguais, maiúscula para efeito de concentração e minúscula para comparação entre as substâncias, não diferem pelo teste de Tukey (p>0,05). Inibição (%) 60 50 40 30 20 10 0 Db -Ac Aa Ab 1 2 3 4 Concentração (mg L -1 ) Figura 3 - Efeitos inibitórios sobre o desenvolvimento da radícula da planta daninha malícia, efetivados pelas substâncias titonina e titonina-ac. Médias seguidas de letras iguais, maiúscula para efeito de concentração e minúscula para comparação entre as substâncias, não diferem pelo teste de Tukey (p>0,05).

Análise comparativa dos efeitos alelopáticos das... 209 Inibição (%) 50 40 30 20 10 0 Db Cb 1 2 3 4 Figura 4 - Efeitos inibitórios sobre o desenvolvimento do hipocótilo da planta daninha malícia, efetivados pelas substâncias titonina e titonina-ac. Médias seguidas de letras iguais, maiúscula para efeito de concentração e minúscula para comparação entre as substâncias, não diferem pelo teste de Tukey (p>0,05). e titonina-ac pertencem à classe das flavonas, diferindo em suas estruturas apenas na posição 3 do anel B, em que a titonina-ac apresenta um grupo acetil e a titonina, um grupo hidróxi. Ao que tudo indica, a posição 3 é importante para a atividade alelopática da molécula; grupos, nessa posição (tipo acetil), que reduzem a densidade eletrônica do Anel B, em relação ao grupo H, tendem a elevar o potencial da substância como agente alelopático. Entretanto, esse procedimento produziu redução na solubilidade da substância, ou seja, titonina-ac tem solubilidade menor que a titonina original. As informações sobre a relação entre a solubilidade de uma dada substância e a intensidade de sua atividade alelopática ainda são limitadas. s monoterpenos, por exemplo, são considerados de baixa solubilidade em água, quando comparados a outros produtos naturais orgânicos mais polares. A solubilidade em água entre os monoterpenos varia consideravelmente, desde <10 ppm até 6.990 ppm. s monoterpenos não-oxigenados têm baixa solubilidade em água todos inferiores a 35 ppm, porém os monoterpenos -Ac Concentração (mg L -1 ) Aa Ab oxigenados, como aldeídos, cetonas, álcoois e éter, têm solubilidade variando de 10 a 100 vezes maior que a dos não-oxigenados, com similar esqueleto (Fischer et al., 1994). s efeitos fitotóxicos dos monoterpenos variam tanto quanto sua solubilidade em água, embora, em muitos casos, a atividade desses compostos esteja abaixo de seu nível de solubilidade (Fischer, 1991). A comparação da bioatividade de dois monoterpenos (borneol e cânfora) com a juglona indicou que, apesar de haver variações entre as substâncias e entre as espécies-alvo, a atividade dos monoterpenos foi igual ou superior àquela promovida pela juglona. A solubilidade do borneol e canfor excedeu a da juglona em 5 a 10 vezes (Harborne, 1988; vis, 1928). Esses dados indicam que generalizações acerca das atividades biológicas e funções ecológicas dos monoterpenos com base nas diferenças na solubilidade em água carecem ser reavaliadas. As informações obtidas no presente trabalho apontam para a possibilidade de se aumentar a atividade alelopática inibitória de uma dada substância química, via alteração da estrutura da molécula, confirmando a hipótese levantada. Note-se que o processo de acetilação não produziu uma substância química com propriedades indesejáveis para a natureza, até porque o processo não envolveu a utilização de metais pesados ou compostos halogênicos. A substância titonina-ac manteve, após o processo de acetilação, as mesmas características da substância original, com pequena diferença no grupo acetil. Naturalmente que outras derivações da molécula precisam ser testadas com vistas à determinação do potencial máximo de aumento da atividade alelopática via manipulação. Um bom exemplo a ser testado é a acetilação simultânea de dois grupos metil presentes na molécula. LITERATURA CITADA ANAYA, A. L. Allelopathy as a tool in the management of biotic resources in agroecosystems. Crit. Rev. Plant Sci., v. 18, n. 6, p. 697-739, 1999. BRGES, F. C. Estudo fitoquímico, alelopático e farmacológico de constituintes químicos das folhas de Virola michelii (Heckel) e Virola surinamensis (Rol. Warb.). 2003. 141 f. Dissertação (Mestrado em Química) Universidade Federal do Pará, Belém, 2003.

210 SUZA FILH, A.P.S. et al. CHRISTFFLETI, P. J.; VICTRI FILH, R.; SILVA, C. B. Resistência de plantas daninhas aos herbicidas. Planta ninha, v. 12, n. 1, p. 13-20, 1994. DURAM, J. M.; TRTSA, M. E. The effect of mechanical and scarification on germination of charlock (Sinapsis arvensis L.) seeds. Seed Sci. Technol., v.13, n.1, p.155-163, 1985. DAVIS, E. F. The toxic principle of Juglans nigra as identified with synthetic juglone and its toxic effects on tomato and alfalfa plants. Am. J. Bot., v. 15, p. 620-621, 1928. ENHELLIG, F. A.; LEATHER, G. R. Potential for allelopathy to enhance crop production. J. Chem. Ecol., v. 14, n. 10, p. 1829-1844, 1988. FISCHER, N. H.; WILLIAMSN, G. B.; RICHARDSN, D. R. In search of allelopathy in the Florida scrub: the role of terpenoids. J. Chem. Ecol., v. 20, n. 2, p. 1355-1379, 1994. FISCHER, N. H. Plant terpenoids as allelopathic agents. In: HARBRNE, J. B.; TMAS-BARBERAN, F. A. (Eds.). Ecological chemistry and biochemistry of plant terpenoids. xford: University Press xford, 1991. p. 377-398. FNSECA, M.L. Potencial alelopático de plantas da família Leguminosae: investigação de aleloquímicos de Parkia perndula. 2005. 121 f. Dissertação (Mestrado em Química) Universidade Federal do Pará. Belém, 2005. HARBRNE, J. B. Introduction to ecological biochemistry. 3.ed. London: Academic Press, 1988. 387 p. HEAP, I. M. The occurrence of herbicide-resistant weed worldwide. Weed Sci., v. 51, p. 2235-2244, 1997. HLT, J.; LeBARN, H. M. Significance and distribution of herbicide resistance. Weed Technol., v. 4, p. 141-149, 1990. JASIENIUK, M.; BRÛLÉ-BABEL, A.; MRRINSN, I. N. The evolution and genetics of herbicide resistance in weeds. Weed Sci., v. 44, n. 1, p. 176-193, 1996. JUNTILA,. Seed and embryo germination in S. vulgaris and S. reflexa as affected by temperature during seed development. Physiol. Plant., v. 29, p. 264-268, 1976. KILLMAM, K.; FSTER, R. Soil ecology. New York: mbridge University Press, 1996. 240 p. LB, L. T. Estudo das propriedades alelopáticas de plantas: investigação de aleloquímicos de Tachigali mymercvophyla (Leguminosae). 2004. 134 f. Dissertação (Mestrado em Química) Universidade Federal do Pará, Belém, 2004. LeBARN, H. M. Distribution and seriousness of herbicide resistant weed infestations worldwide. In: CUSSANS, G. W.; ATKIN, R. N. (Eds.). Herbicide resistances in weeds crops. xford: Butterworth-Heinemann, 1991. p. 27-43. SUZA FILH, A. P. S.; DUTRA, S.; SILVA, M. A. M. M. Métodos de superação da dormência de sementes de plantas daninhas de pastagens cultivadas da Amazônia. Planta ninha, v. 16, n. 1, p. 3-11, 1998. STATISTICAL ANALYSIS SYSTEM SAS. User s guide. Version 6.4. ry: 1989. 846 p. VIDAL, R. A.; MERT, A. Resistência de plantas daninhas aos herbicidas. In: VIDAL, R.A.; MERT, A. Herbicidologia. Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2001. p. 138-148.