OS ESPAÇOS NO COTIDIANO DAS CRIANÇAS NAS ESCOLAS DE EDUCAÇÃO INFANTIL Carmen Isabel Pieper Universidade Federal de Pelotas belpiper@hotmail.com INTRODUÇÃO O trabalho consiste em um ensaio que discute algumas ideias que circulam a cerca dos espaços e das crianças dentro das escolas de Educação Infantil. A partir de uma preocupação para com a pouca visibilidade que ainda é dada aos alunos socialmente e a falta de reconhecimento sobre a importância dos espaços para os mesmos, para seus usos e apropriações é que surge a proposta de uma reflexão no qual consiste em capturar fragmentos de estudos que apresentam contribuições sobre os espaços no cotidiano das crianças nas Escolas de Educação Infantil. As relações do indivíduo com o espaço fazem parte dos primeiros aprendizados culturais e não cessam de se desenvolver. Na infância os lugares possuem um valor significativo, um valor que é compartilhado pelas crianças. Os espaços são importantes na socialização dos indivíduos, sejam eles o espaço familiar ou escolar (sala de aula, pátio, pracinha). O espaço escolar é uma construção social que possui relações com as atividades realizadas na escola. Atualmente os espaços destinados para as criança encontram-se limitados devido a uma série de justificativas, as crianças estão confinadas nas escolas, dentro das casas ou pátios, perdem não apenas o espaço físico, mas sobretudo altera estruturalmente suas condições de produzir e de se relacionar com a cultura e com a sociedade, da mesma
forma que limita-se também o espaço para os sonhos e fantasias, e isso não favorece o processo de desenvolvimento e formação das crianças, desrespeitando-os como sujeitos de direitos. Essa discussão respalda-se em Wallon (1989) e Vygotsky (1984) pois, para ambos autores o meio social é fator preponderante no desenvolvimento dos indivíduos, as modificações no plano mental e social, físico e intelectual das crianças estabelecem novas e complexas relações e incidem em modificações também no meio em que estão inseridas. Inicialmente as crianças possuem a concepção do espaço centradas no corpo, uma percepção de si mesma, só depois que elas descentralizam partindo para novas fronteiras, para o não eu, e enquanto alunos eles percebem o espaço como algo que existe em torno dele. O espaço corporal é a base cognitiva sobre a qual se delineia a exploração do espaço. A consciência do corpo constrói-se, lentamente até a adolescência, quando há a elaboração completa do esquema corporal em função do amadurecimento do sistema nervoso, da relação eu-mundo e da representação que a criança faz de si mesma e do mundo em relação a ela. Lembrando-se que o corpo constitui-se como peça fundamental de organização do espaço-tempo (PIAGET, 1936). Logo, o corpo configura-se como o primeiro elemento de organização no espaço e no tempo. Segundo Piaget (1973) a representação do espaço para a criança é uma construção internalizada a partir das ações e das manipulações sobre o ambiente espacial próximo do qual ela faz parte. METODOLOGIA O presente trabalho será uma pesquisa bibliográfica. Inicialmente desenvolvemse os conceitos os quais são importantes para a fundamentação do texto. Os conceitos e
definições descrevem a investigação, sendo construídos com base na prática de campo e na bibliografia referente à área estudada. Para elaborar o trabalho, será realizado um levantamento bibliográfico, ou seja, buscarei conceitos e bases em material já elaborado, no qual se realizará um momento de leitura em busca de elementos relevantes, que serão recolhidos para reforçar e fundamentar meu trabalho. As referências bibliográficas são imprescindíveis para o aprofundamento da pesquisa, uma vez que trazem informações para a reconstrução do conhecimento. O QUE É O ESPAÇO? O espaço não é simplesmente físico, é parte das relações. O espaço adotado aqui é o espaço social, na perspectiva de que o indivíduo o produz. No dizer de Carlos (1992, p.15) o espaço geográfico deve ser concebido como um produto histórico e social das relações que se estabelecem a sociedade e o meio circundante. Não se trata de um qualquer espaço, genérico, mas de um espaço concreto, real. É interessante a explanação de Lima: Integrando às primeiras sensações do ser humano, o espaço é o elemento material através do qual a criança experimenta o calor, o frio, a luz, a cor, o som, e, numa certa medida a segurança o espaço material é, pois, um pano de fundo, a moldura, sobre o qual as sensações se revelam e produzem marcas profundas que permanecem, mesmo quando as pessoas deixam de ser crianças.
É através dessa qualificação que o espaço físico adquire nova condição: a de ambiente. (1989, p. 13) Conforme Vieira (2011, p.210): A importância dessa concepção, que incorpora a ideia do espaço como um produto social, que a um só tempo é resultado e condição do processo de produção, é fundamentalmente para a análise do espaço produzido na atualidade. Somente assim será possível entender a significação que tem o espaço, como gerador de valores e comportamentos, de vivências, enfim de elementos integrantes da cultura. Ainda neste sentido França discorre da seguinte maneira: Não há uma definição que possa ser tomada como mais abrangente ou a mais correta, pois elas estão ligadas a uma série de questões epistemológicas, ao desenvolvimento das ciências e a reorganização social do homem. Há sempre um componente circunstancial envolvido, como a falta de conhecimento de um determinado aspecto, causada pela insuficiência de meios disponíveis e/ou pelas barreiras culturais estabelecidas. (1994, p.17)
O espaço e o tempo estão ligados a um carácter exclusivamente subjetivo. A superação da exclusividade do seu próprio ponto de vista permite a superação progressiva e gradual do egocentrismo (SILVA, 2010, p. 104). O espaço das crianças pode ser tão subjetivo que eles não compreendem a diferença do ponto de vista dos outros. Conforme Rosa e Nisio (2002) apud Silva (2010, p. 107): As noções de espaço estão diretamente ligadas às noções de tempo, pois o nosso corpo se coordena no espaço de acordo com o tempo. Para a criança desenvolver a percepção espacial, é importante que ela saiba reconhecer as partes de seu próprio corpo e situá-las no espaço. Horn aborda o espaço como: O espaço é entendido sob uma perspectiva definida em diferentes dimensões: a física, a funcional, a temporal e a relacional, legitimando-se como um elemento curricular. A partir desse entendimento, o espaço nunca é neutro. Ele poderá ser estimulante ou limitador de aprendizagens, dependendo das estruturas espaciais dadas e das linguagens que estão representadas. (2004, p.35)
Todos os tipos de espaços unem o indivíduo a sociedade: Os espaços que frequentamos emitem ondas antropológicoculturais, às quais não somos refratários. O ambiente que nos envolve exerce uma influência direta na criação de uma concepção de mundo, assim como essa concepção interfere na formação do ambiente. (França 1994, p. 98) Ao analisar o espaço, deve-se ter em mente as relações sociais que ali se desenvolvem. O conceito de espaço é muito basilar, análises desse objeto de estudo que lhes define é justamente a possibilidade de serem espacializados. APROPIAÇÃO DO ESPAÇO PELAS CRIANÇAS O espaço utilizado é onde é realizado as atividades, é o espaço conjugado ao ambiente. Diante disso, França (1994, p.36) aborda sobre a interação do homem em multi-espaços fora do seu território, o ser humano é obrigado a equacionar suas relações espaciais e ajustar comportamentos-padrão para os diferentes tipos de lugar, o que dificulta uma convivência lúdica com cada situação. Ainda neste contexto Horn (2004, p.28) afirma que é no espaço físico que a criança consegue estabelecer relações entre o mundo e as pessoas, transformando-o em um pano de fundo o qual se inserem emoções. Essa qualificação do espaço físico é que o transforma em ambiente. As noções de espaços e tempo apresentadas, em geral, pelas crianças da educação infantil estão em estreito relacionamento com seu desenvolvimento intelectual, constituem uma ferramenta ao pensamento. Muitas condutas observadas na
educação infantil sofrem enorme influência do egocentrismo, pois envolvem a dificuldade de se pôr no lugar do outro. (Silva, 2010, p106). O lúdico pode se tornar elemento que auxilia na construção de noção de espaço. Várias brincadeiras estimulam essa construção, nelas é preciso organizar o movimento do corpo e também a dos deslocamentos de objetos, há juntamente uma coordenação espacial. O brincar exercita a capacidade de produção e compreensão do conhecimento. Na apropriação do espaço pelas crianças as mesmas podem desenvolver sentimentos ambivalentes por certos lugares (...) que lhe pertencem. (Tuan 1983, p51). Ainda que a criança pequena não tenha plena consciência do desenvolvimento da noção de espaço, ela está coordenando ações que são importantes para o desenvolvimento da inteligência. Algumas brincadeiras desenvolvem a organização espacial coletiva, além de permitirem o desenvolvimento de atividade de coordenação motora, reflexo e a cooperação entre o grupo. As brincadeiras são exemplos que trazem o corpo como elemento central de construção da noção de espaço, atravessada pela ludicidade própria da educação infantil, suas necessidades físicas, sociais e intelectuais, ao se modificarem, incidem em modificações também no meio que estão inseridas ( Barbosa & Horn, 2008, p.50). A apropriação de um espaço pela criança acredita-se que ela possa colocar suas marcas e alterá-la de alguma forma. A participação na escola se ocorre com a valorização da capacidade de transformação de cada indivíduo. São os mesmos espaços que lhes asseguram identificação, transição e passagem para o ser adulto, ou seja, é um elemento ativo de condicionamento da criança para o futuro adulto Portanto, a educação infantil, no que tange a construção do espaço e do tempo, pode se configurar como um importante momento no qual as crianças exploram as possibilidades do meio, encontram desafios para chegar de um ponto ao outro, aprendem os elementos sequenciais para realizar uma tarefa (Silva, 2010, p. 102). Na
escola as crianças brincam conforme os espaços permitem, retratando as condições do lugar e nem sempre são de acesso livre e espontâneo para os alunos. CONSIDERAÇÕES FINAIS Diversos tipos de atividades envolvem a jornada dos professores e das crianças em uma escola. A utilização e a organização de espaço e do tempo refletem a concepção pedagógica e interferem diretamente na construção da autonomia. É nesse espaço interno e externo que as crianças exercem suas criatividades e também podem contestarem o que desaprovam, onde possam movimentar-se com liberdade interagindo com a cultura que os rodeiam, contribuindo para a construção de linguagens infantis e incentivar experiências corporais, sociais e afetivas, ajudar a estruturar as funções motoras, sensoriais, simbólicas, lúdicas e relacionais. A criança deve ser vista como protagonista, analisando-as como sujeitos ativos, como alguém que vive o próprio tempo, que o utiliza seu espaço como desejar. Com a transformação advinda deste momento livre do uso do espaço a ideia central é que as crianças participem ativamente das atividades planejadas, assim tanto os professores quantos os alunos têm muito a ganhar. O professor de educação infantil em sua prática tem o espaço como um parceiro, um recurso e um instrumento para seu trabalho, faz parte da ação pedagógica, pois ele é configurado com símbolos, signos e lugar, e essa configuração não é criada mas sim descoberta e apropriada pelas crianças, o docente deve aproveitar para construir um trabalho tendo como suporte o espaço que irá ocupar. Deve-se considerar o espaço das crianças como provocadores e desafiadores de interações e não como aliados ao controle dos corpos e dos movimentos, uma imobilidade artificial, que propiciem ações autônomas por parte das mesmas, que
tenham iniciativas que garantem a sua autonomia, que possam se movimentarem com total liberdade. Desse modo, as crianças diante dessa realidade possam relacionar a brincadeira, o tempo, as culturas com suas experiências. As crianças devem interagir com o meio e com os parceiros descentralizando a figura do professor, utilizando todos os espaços das instituições. Levar em consideração suas necessidades básicas e suas potencialidades, promover a autonomia moral e intelectual, despelando curiosidades, imaginações e ideias, possibilitando também interações mais complexas. Motivando suas vontades, as crianças assumem diferentes papéis e aprendem a se conhecer melhor. A partir das relações que se estabelece com a realidade ao longo da existência constrói-se as próprias concepções de espaço e de mundo. Portanto, esses protagonistas devem viver seu próprio tempo, fazendo explorações do mundo para assim representálo. Além disso, as crianças mostram conhecer as peculiaridades de cada lugar que convivem. REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS BARBOSA, Maria Carmen Silveira; HORN, Maria da Graça Souza. Projetos Pedagógicos na Educação Infantil. Porto Alegre: Artmed, 2008. CARLOS, Ana Fani Alessandri. Espaço e Indústria. 5 ed. São Paulo: Hucitec, 1996. FORNERO, L.I. A organização dos espaços na educação infantil. In: ZABALZA, M. Qualidade na educação infantil. Porto Alegre: Artmed, 1998. FRANÇA, Lilian Cristina Monteiro. Caos-Espaço-Educação. São Paulo: Annablume, 1994.
HORN, Maria da Graça Souza. Sabores, cores, sons, aromas: a organização dos espaços na educação infantil. Porto Alegre: Artmed, 2004. LIMA, Mayumi Souza. A cidade e a Criança. São Paulo: Nobel, 1989. PIAGET, Jean, INHELDER, Barbel. (1948). A representação do espaço na criança. Porto Alegre: Artes Médicas, 1993. PIAGET, Jean. A noção de tempo na criança. Rio de Janeiro: Record, 1973. SILVA, João Alberto da. Brincadeiras, espaços e tempo: um estudo sobre as práticas pedagógicas na Educação Infantil. IN: FIGUEIREDO, Márcio Xavier Bonorino. Diários Educativos: cultura, infância e educação infantil. Pelotas: Ed.Universitária da UFPEL, 2010. (97-113). VIEIRA, Sidney Gonçalves. Praticando o conceito de espaço. IN: RODRIGUES, Paulo Roberto Quintana. Geografia: textos, práticas e reflexões. Pelotas: Editora da UFPEL, 2011. VYGOTSKY, L.S. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1984. WALLON, Henri. Origens do pensamento na criança. São Paulo: Manole, 1989.