PERFIL FUNCIONAL E SÓCIO DEMOGRÁFICO DOS PACIENTES COM PARALISIA CEREBRAL EM REABILITAÇÃO NUM CENTRO DE REFERÊNCIA EM SALVADOR 1

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Transcrição:

ARTIGOS ORIGINAIS PERFIL FUNCIONAL E SÓCIO DEMOGRÁFICO DOS PACIENTES COM PARALISIA CEREBRAL EM REABILITAÇÃO NUM CENTRO DE REFERÊNCIA EM SALVADOR 1 FUNCIONAL PROFILE AND SOCIO-DEMOGRAPHIC OF PATIENTS WITH CEREBRAL PALSY IN REHABILITATION IN A REFERENCE CENTER IN SALVADOR João Leandro Rocha Vieira 2, Janeusa Rita Leite Primo Chagas 3 RESUMO Objetivo: avaliação do perfil funcional e sócio demográfico dos portadores de Paralisia Cerebral (PC) atendidos no Hospital Santo Antônio, CER IV, das Obras Sociais Irmã Dulce. Métodos: Durante 11 meses foram acompanhado em estudo, pacientes portadores de Paralisia Cerebral. Todos foram avaliados segundo aspectos sociodemográficos, etiológicos epidemiológicos, clínico e funcional conforme critérios pré-estabelecidos para avaliação funcional dos diversos sistemas e de capacidade motora. Os dados foram armazenados em bancos de dados e processados pelo SPSS/IBM, versão 21. Resultados: Dos 59 pacientes, portadores de PC encontrou-se presença de PC do tipo Espástica em 55/59 pacientes (93,2%), Discinética em três/59 (5,1%) pacientes e do tipo atáxica em 1/59 paciente (1,7%). A etiologia dos quadros de PC correspondeu em 6/59 (10,2%) a fatores prénatais e em 18/59 (30,5%) fatores perinatais, ficando as causas pós-natais em 17/59 (28,8%). A idade dos pacientes variou de 1 a 16 anos, com média de 6,7 anos e mediana de 6,6 anos. Registrou-se predomínio do gênero masculino (50,8%) pacientes. No que tange ao aspecto evolutivo e funcionalidade dos pacientes estudados pode ser observados ocorrência de mais de um tipo de disfunção por paciente destacando-se na sensorial os déficits visuais; nas funções superiores os déficits da linguagem e comportamental com poucos relatos de déficit cognitivo. O aspecto motor teve expressividade na sua disfunção onde 67,7% dos pacientes não desenvolveram a marcha voluntária. Conclusão: A PC é ainda no século XXI incapacitante do neurodesenvolvimento a despeito dos avanços médicos nos diagnósticos e intervenções pré e perinatais para a preservação da vida dos conceptos. Medidas diagnósticas precoce são importantes para melhorar a eficácia terapêutica com consequente melhoria na qualidade de vida destes pacientes. Palavras-chave: Paralisia Cerebral; Etiologia; Funcionalidade. INTRODUÇÃO A paralisia cerebral (PC) ou Encefalopatia Crônica da Infância (ECI) é uma encefalopatia de caráter essencialmente motor, algumas vezes, associada à perturbação sensorial e mental que repercute seriamente na qualidade de vida dos pacientes e familiares, sendo uma patologia de alto impacto social. O comprometimento neuromotor desta doença pode envolver partes distintas do corpo, resultando em classificações topográficas (quadriplegia, hemiplegia, e diplegia). Outro tipo de classificação é a baseada nas alterações 1 Trabalho realizado no Centro Especializado em Reabilitação (CER IV) das Obras Sociais Irmã Dulce 2 Graduando em Medicina pela Faculdade de Tecnologia e Ciências, Salvador-Ba, Brasil. E-mail: jleandro_vieira@hotmail.com 3 Neuropediatra, doutora, médica supervisora do programa de residência médica em Neurologia Pediátrica do Hospital da Criança das Obras Sociais Irmã Dulce, Professora da disciplina de Sistema Nervoso do curso de Medicina da UNIFACS, Salvador-Ba, Brasil.

clínicas do tônus muscular e no tipo de desordem no movimento podendo produzir o tipo espástico, discinético ou atetóide, atáxico, hipotônico e misto. A gravidade do comprometimento neuromotor de uma criança com paralisia cerebral pode se caracterizada como leve, moderada ou severa, baseada no meio de locomoção da criança.¹ Por definição, a PC, de acordo com o proposto no simpósio de Oxford em 1958, é um distúrbio motor qualitativo persistente, devido à interferência não progressiva no desenvolvimento cerebral, manifestando-se em crianças até os 3 anos de idade. De etiologia multifatorial e em realidade variando de acordo com seus subtipos e com o período em que ocorreu a lesão do córtex motor, num sistema nervoso ainda imaturo, encontramos na sua etiopatogenia fatores de riscos mais prevalentes como: baixo peso ao nascer, prematuridade e afecções maternas. Em geral as ECI ou PC são decorrentes de fatores pré-natais, incluindo aqui as causas infecciosas, tóxicas, vasculares-anóxicas e genéticas e a fatores perinatais em geral, decorrentes de lesões anóxicas e traumáticas do parto. Já as causas pós-natais, na sua maioria, relacionam-se com seqüela das meningoencefalites.² A Incidência da paralisia cerebral vem se mostrando muito elevada nos últimos anos, sendo este fato atribuído à sobrevivência de prematuros de muito baixo peso, onde os distúrbios neurológicos podem chegar a 50% e a ocorrência de PC é de 25 a 31 vezes maior do que nos nascidos a termo.³ Considerando ser a PC agrupada por intervenção reabilitacionista de caráter multidisciplinar, onde a sobrevida e a melhoria na qualidade de vida dos seus portadores ocorrem graças ao diagnóstico e tratamento precoce, questiona-se sobre os aspectos e evolução do tratamento fisioterapêutico na paralisia cerebral em clínicas de reabilitação da cidade de Salvador. MÉTODO Trata-se de um estudo de relato de casos utilizando-se uma amostra por conveniência de pacientes diagnosticados com PC atendidos no período de Setembro de 2014 a Julho de 2015 no Centro Especializado em Reabilitação IV (CER IV) do Hospital Santo Antônio em Salvador. Tem-se como critérios de inclusão: preencher os critérios pré-estabelecidos para o diagnóstico de Paralisia Cerebral e possuir idade até os 18 anos à admissão no serviço. O diagnóstico de Paralisia Cerebral será baseado em critérios previamente estabelecidos e revisados, apoiado na sua definição na literatura de referência¹. 101

Os dados, incluindo os sócio demográficos, foram coletados em prontuário dos pacientes, assim como, os dados clínicos de exame realizado por Neuropediatra. Todos os casos preencheram a ficha epidemiológica. Os dados foram digitados num banco de dados (SPSS 21.0) para a análise estatística. Foram calculados distribuições de frequência e sumários de dispersão e medidas de centro, aplicáveis as variáveis. RESULTADOS No período de Setembro de 2014 a Julho de 2015, foram colhidos os dados de um total de 59 pacientes. A amostra estudada consiste de pacientes diagnosticados com Paralisia Cerebral em reabilitação no CER IV, das Obras Sociais Irmã Dulce, na cidade de Salvador. Em relação ao gênero, observa-se na tabela 1 o registro de 30/59 (50,8%) pacientes do sexo masculino e 29/59 (49,2%) do sexo feminino. A idade dos pacientes variou de 1 a 17 anos, com média de 6,7 anos e mediana de 6,6 anos. A faixa etária mais prevalente foi de 4 a 8 anos (42,4%), seguida da faixa etária de menores que 4 anos (28,8%). A análise dos casos amostrais selecionados a partir de dados secundários em prontuários dos referidos pacientes do CER IV apontou diferentes tipos de PC: Espástica, Discinética e Atáxica. A PC do tipo Espástica esteve presente em 55/59 pacientes (93,2%), a do tipo Discinética em 3/59 (5,1%) pacientes e do tipo atáxica em apenas um paciente (1,7%) (tabela 2). Dentre os casos portadores de PC Espásctica encontrou-se a forma Tetraplégica em 34/55 (61,8%) pacientes, a forma Diplégica em 12/55 (21,8%) e a Hemiplégica em 9/55 (16,4%). RESULTADO DOS ASPECTOS ETIOLÓGICOS Do ponto de vista etiológico da PC, observando na tabela 3, predominou os fatores perinatais em 18/59 casos (30,5%), em 17/59 (28,8%) os fatores pós-natais e apenas 6/59 (10,2%) pré-natais. Em 18/59 (30,5%) dos casos, não foram encontrados estes registro em prontuário e/ou responsável pela criança não dispunham desta informação. Entre as causas perinatais, hipóxia/asfixia ocorreu em 17/18 (94,4%) dos portadores de PC e correspondeu a maior prevalência. Casos de Malformações foram detectados em 3/6 (50%) e Infecções congênitas em 2/6 (33,3%), correspondendo às causas pré-natais. Observou-se também, entre as causas pós-natais, elevado predomínio de encefalopatia 102

hipóxico-isquêmica após parada cardiorrespiratória (PCR) correspondente a 10/17 (58,8%) dos casos, seguida por meningoencefalite em 3/17 (17,6%). ASPECTOS CLÍNICOS E FUNCIONAIS DA PARALISIA CEREBRAL No que tange ao aspecto evolutivo funcional dos pacientes estudados, pode-se observar mais de um tipo de disfunção por paciente (tabela 4). Nos aspecto morfologia foi encontrada desproporção craniofacial associado à microcefalia em 13/59 (22%) dos casos; os aspectos sensoriais e perceptuais encontrados em prontuários tiveram relatos específicos para alterações visuais e evidenciou deficiência visual em 37/59 (62,7%) dos pacientes. Alteração da linguagem com anormalidade na expressão verbal da fala foi encontrada em 26/59 pacientes (44,1%) e transtorno comportamental necessitando de terapia farmacológica em 12/59 (20,3%). Ao se avaliar os padrões funcionais motores que contribuíam à independência dos pacientes foram encontrados: disfagia em 17/59 (28,8%) e alteração do tônus, o qual pode ser observado em mais da metade dos pacientes, ou seja, hipertonia apendicular em 31/59 (52,5%) e Hipotonia axial em 21/59 (35,6%) foram descritas no exame físico da amostra. Alterações funcionais específicas das vias descendentes motoras que participam direta ou indiretamente da motricidade voluntária (antiga vias piramidais e extrapiramidais) estiveram descritas em termos de hiperreflexia dos membros inferiores, correspondente a 26/59 (44%). Em análise funcional para marcha estiveram relatados ausência de marcha em 40/59 (67,8%); presença de marcha em 7/59 (11,8%) e em 12/59 (20,3%) dos casos, não houve registro desta funcionalidade. Avaliando a existência de Comorbidades, observou-se uma casuística de epilepsia em 36/59 (61%) com variados tipos de crises epilépticas. A crise focal foi o tipo mais prevalente no estudo, correspondendo a 11/36 (30,5%) dos casos, seguida de crises focais com generalização secundária em 7/36 (19,4%) dos casos. DISCUSSÃO O presente estudo descreve o perfil sociodemográfico e funcional de 59 casos de paralisia cerebral. Sabe-se que os problemas clínicos e o prognóstico de indivíduos com PC dependem da lesão cerebral e sua associação com comorbidades que acometem a percepção, a comunicação, a sensibilidade, e a presença de outras comorbidades, incluindo epilepsia. 103

No aspecto sócio demográfico deste estudo, notou-se uma mínima discrepância de gênero no estudo entre os pacientes, demostrando que a doença não tem nesta variável, um fator de risco. Esta diferença também não foi encontrada com relevância estatística na prevalência de PC entre os sexos femininos e masculino em outros relatos da literatura. 3 Além deste aspecto, foi observado que a maior prevalência de pacientes acompanhados no centro possuía uma idade entre 4 a 8 anos. O estudo mostrou uma menor parcela de pacientes maiores de 12 anos, que se pode relacionar ao índice de desistência do acompanhamento multiprofissional no decorrer da reabilitação da criança. A idade de início da terapia de reabilitação tem um grande impacto na evolução funcional dos pacientes com PC considerando a necessidade da estruturação familiar a realidade de um filho portador de necessidades especiais. 4 O fator etiológico mais encontrado nos registros de prontuários forma os perinatais e os pós-natais. O estudo mostrou a alta prevalência da hipóxia/asfixia perinatal sendo fator iniciante da doença, o qual corrobora com o já demonstrado por outros estudos, que justifica o fato afirmando que a depressão cerebral é uma forma de proteção na hipóxia severa. 5 Segundo a frequência da presença de diversos fatores no período pré-natal nem sempre é possível dizer com clareza a etiologia predominante. Contudo, as hemorragias predominantes no primeiro trimestre, diabetes gestacional, infecções maternas em especial as do grupo TORCH S (Toxoplasmose, rubéola, citomegalovírus, Herpes Simples) repercutem no acometimento neurológico da criança. Eventos após o nascimento da criança, ou seja, aqueles que ocorrem no período pósnatal, podem contribuir para a paralisia cerebral. Acontecimentos pós-natal podem ocasionar hemorragias intracranianas, encefalopatia hipóxico-isquêmica, encefalopatia por hiperbilirrubinemia e leucomalácia periventricular. 6 Indicando uma frequência muito elevada para o tipo Espástica de PC nesta população do estudo encontramos anteriormente descritos, dados da literatura que corroboram com predomínio dessa variedade. Esse tipo de PC tende a cursar com aumento do tônus muscular global, hiperreflexia e déficits motores, corroborando com a alta presença de achados de hipertonia, hiperreflexia em membros inferiores e dificuldade na aquisição de marcha independente. Contudo, também se observa que esta variedade apresenta melhor evolução funcional na reabilitação quando comparada a atetósica e atáxica que são mais complexas em acordo com as observações dos que não alcançaram níveis de independência motora. 7 104

Uma parcela dos pacientes do estudo portava deficiência visual, o que mostra a necessidade de acompanhamento oftalmológico na reabilitação destes. Estes achados sofrem influência direta tanto dos estados hipóxico isquêmicos onde o reduzido aporte de oxigênio promove a lesão tecidual de estruturas encefálicas como também podem decorrer das sequelas de processos inflamatórios infecciosos do grupo TORCH S ocasionando coriorretinite e paralisia de nervos cranianos. Segundo a literatura, defeitos visuais afetam 50% das pessoas portadoras de Paralisia Cerebral. Estrabismo, a inabilidade de focar os dois olhos ao mesmo tempo sobre o objeto, é problema comum além, da retinopatia da prematuridade. 8 A epilepsia está presente em mais da metade deles, mostrando também que uma boa parte faz uso frequente de medicações anticonvulsivantes para o controle das crises, que mostraram ser predominantemente do tipo focal. O estudo comprava que uma significativa parcela dos pacientes com PC apresentam alterações que interferem diretamente na deglutição. Isso aumenta os riscos de aspiração do bolo alimentar, devendo a família estar atenta nos alimentos mais indicados para essa criança, na forma e na frequência de alimentá-la. Além disso, autores usam esse fator como justificativa para pior nutrição e hidratação de crianças com PC devido diminuição da quantidade ingerida devido disfagia. 9 CONCLUSÃO 1. Na população estudada, a frequência de PC Espástica foi muito elevada. 2. O estudo sócio demográfico dos pacientes demonstrou que em PC a variável gênero não se constitui em fator de risco. 3. O estudo aponta dependência funcional em cerca de 67,8% dos pacientes com paralisia cerebral. 4. Como discutido, os pacientes possuíam idade variável desde a sua admissão no serviço, o que pode ser considerado tardio quando consideradas as medidas preventivas e de orientação. 5. O diagnóstico precoce é importante para melhora do prognóstico funcional, da eficácia terapêutica e consequente melhoria na qualidade de vida destes pacientes. 6. O estudo sócio demográfico e funcional contribui com a literatura científica através do conhecimento dos fatores etiológicos dos quadros de PC que podem tanto promover mudanças tanto no âmbito pré-natal de futuros conceptos quanto promover melhorias nos seguimentos dos neonatos em estados de riscos. 105

TABELAS Tabela 1 Dados demográficos dos pacientes com Paralisia Cerebral (Centro de Reabilitação IV do Hospital Santo Antônio Set/2014 a Jul/2015) DADOS N % Sexo Masculino 30 50,8% Feminino 29 49,2% Idade (faixa) < 4 anos 17 28,8% 4 a 8 anos 25 42,4% 8 a 12 anos 12 20,3% > 12 anos 5 8,5% Idade (anos) Média ± DP Valor Quartil Quartil 50 Quartil 75 Valor mínimo 25 máximo 6,72 ± 3,84 1 3,5 6,6 9,9 17 Tabela 2 Tipos de Paralisia Cerebral (Centro de Reabilitação IV do Hospital Santo Antônio Set/2014 a Jul/2015) TIPO N % Espástica 55 93,2 Tetraplégica 34 61,8 Hemiplégica 9 16,4 Diplégica 12 21,8 Discinética 3 5,1 Coreoatetóide 3 100 Atáxica 1 1,7 106

Tabela 3 Causa de Paralisia Cerebral (Centro de Reabilitação IV do Hospital Santo Antônio Set/2014 a Jul/2015) CAUSA N % Pré-natal 6 10,2 Malformação 3 50 Infecção congênita 2 33,3 Fatores Maternos 1 16,7 Perinatal 18 30,5 Hipóxia / Asfixia Perinatal 17 94,4 Prematuridade 1 5,6 Pós-natal 17 28,8 Encefalopatia Hipóxico- 10 58,8 Isquêmica secundária a PCR Meningoencefalite 3 17,6 Status Epilepticus 2 11,8 AVE 1 5,9 Icterícia 1 5,9 Não informado / Desconhecido 18 30,5 PCR = parada cardiorrespiratória. AVE = Acidente Vascular Encefálico Tabela 4 Dados clínicos dos pacientes com PC (Centro de Reabilitação IV do Hospital Santo Antônio Set/2014 a Jul/2015) DADOS CLÍNICOS N COMPLICAÇÕES Deficiência visual 37 Epilepsia 36 Focal 11 Focal com Generalização 7 Secundária Generalizada 2 Outros tipos 5 Não sabe informar / Ausente 11 Fala anormal 26 Disfagia 17 Microcrania 13 Constipação crônica 10 USO DE MEDICAÇÕES Anticonvulsivantes 35 Neurolépticos 12 TÔNUS E REFLEXOS Hipertonia apendicular 31 Hipotonia axial 21 Hiperreflexia em membros 23 inferiores ASPECTO DA MARCHA % Ausência de marcha independente 40 67,8 107

Marcha com Órtese 4 6,7 Marcha Independente 3 5 Sem relato sobre marcha 12 20,3 REFERÊNCIAS ¹RODRIGUÉZ-BARRIONUEVO, A. C.; VIVES-SALAS, M. A. Clínica de la Parálisis Cerebral Infantil. Rev Neurol Clin. 2 (1): p. 225-235, 2001. ²PASCUAL, J. M.; KOENIGSBERGER, M. R. Parálisis cerebral: factores de riesgo prenatales. Rev Neurol. 37(3): p. 275-280, 2003. ³LEITE, HP, SOUZA, DR, PATO, TR, PATO,TR. Epidemiologia da paralisia cerebral. Acta Fisiatrica, 2002. 4 DANTAS. M. S. A.; COLLET. N.; MOURA, F. M.TORQUATO. I. M. B. Impacto Do Diagnóstico De Paralisia Cerebral Para A Família. Texto Contexto Enferm, Abr-Jun; 19(2): 229-37. Florianópolis, 2010. 5 ROTTA, N. T. Paralisia Cerebral, novas perspectivas terapêuticas. Jornal de Pediatria. v. 78 p. S48-S54. 2002. 6 KOK, F. As Principais Afecções em Neurologia Infantil Encefalopatias Não-Progressivas: deficiência mental e paralisia cerebral. In: NITRINI, R; BACHESCHI, L. A. A Neurologia que Todo Médico Deve Saber. 2. ed. São Paulo: Atheneu, 2003 7 KOMAN, L. A; SMITH, B. P.; SHILT, J. S. Cerebral palsy. Lancet. 363(15):1619-31, 2004. 8 MOURA, T. C., et al. Independência funcional em indivíduos com paralisia cerebral. Rev Pan-Amaz Saude; 3(1):25-32. 2012. 9 VIVONE, G. P. et al. Análise da consistência alimentar e tempo de deglutição em crianças com paralisia cerebral tetraplégica espástica. Rev CEFAC. v. 9 n. 4. São Paulo, 2007. 108