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Transcrição:

1 Direito Civil V Marcelo Milagres Camila Fabiana 05 08 Provas e Trabalhos 21 08 trabalho 10 pts 25 09 prova 20 pts 21 10 prova 20 pts 04 e 11 11 trabalho 10 pts 25 11 prova final 02 12 exame especial Ver filme Dandara Enquanto morar for um privilégio ocupar é um direito (youtube) Ler Teoria simplificada da posse - Jehing Conceitos iniciais: DIREITOS REAIS Direitos reais x Direitos das coisas: Direitos reais refere-se aquilo que pode ser objeto de apropriação, e a determinados bens que merecem proteção. Já o direito das coisas é uma visão mais ampla, abrangendo além dos direitos reais propriamente ditos, o estudo da posse, direitos de vizinhança. Ambos regulam o poder do homem sobre determinados bens. Direitos reais é o complexo das normas reguladoras das relações jurídicas referentes às coisas suscetíveis de apropriação pelo homem Clóvis Beviláquia Bem x coisa: A relação de bem e coisa é de gênero e espécie. Bem é todo objeto que é suscetível de proteção e tem um valor para o direito. Há bens imateriais, como a liberdade, que não insuscetíveis de apropriação, mas, também, bens que são dotados de materialidade (bens corpóreos), e é essa a característica que diferencia bem e coisa, de forma que coisa são os bens dotados de materialidade. A coisa subdivide-se em: a) coisas sem apreciação econômica. b) coisas com apreciação econômica. Assim, o objeto pode ou não ter economicidade (aqueles com apreciação econômica), podendo o objeto dotar de um valor financeiro e ser comercializado. Direito patrimonial é o direito das trocas e da gestão do patrimônio, e daquilo que possui aferição econômica. Refere-se a toda utilidade econômica da gestão da coisa. Já o Direito extrapatrimonial, é aquilo que não possui aferição econômica, como os direitos da personalidade. Direito das coisas é um conceito restrito, mas toda relação material e econômica não necessariamente fecha no direito das coisas, pois podem haver relações híbridas. Apropriação: traz os conceitos de domínio e subordinação. Domínio é uma relação material de subordinação da coisa ao poder do titular. A grande relação presente nos direitos reais é a de titularidade, ou seja, deve haver subordinação. Obs: Recentemente, tem-se buscado ampliar os direitos reais, pois há várias relações de domínio que não são auferíveis, como a internet e as patentes. Seria uma forma de proteção aos direitos reais para além da materialidade.

2 Direito Civil V Marcelo Milagres Camila Fabiana Propriedade x domínio: domínio e propriedade são conceitos autônomos. A propriedade refere-se apenas à titularidade, sendo a relação do titular com a coletividade, que impõe a esta um dever de abstenção, e reúne os atributos de uso, gozo, disposição e reinvindicação da coisa, ou seja, é o desdobramento das faculdades contidas no domínio. Já o domínio implica situação de poder do titular sobre a coisa, com todas as faculdades de usar, fruir e dispor. Seria a apreensão sobre a coisa, caracterizando uma subordinação, e não está restrito à propriedade, podendo estar presente na posse. Cada poder de domínio se desmembra em um direito real. Apesar do direito brasileiro não admitir pluralidade de domínios, pode este ser desdobrado em diversas parcelas, de forma que nada impede que o titular fracione o seu poder em favor de usufrutuário, simultaneamente. Nesses casos a propriedade será limitada, mas não reduz a condição de proprietário, apenas reduz o domínio. Esse direito em coisa alheia é temporário, pois a lei não admite esse fracionamento por tempo infinito. Art. 1.410. O usufruto extingue-se, cancelando-se o registro no Cartório de Registro de Imóveis: II - pelo termo de sua duração; Assim, a propriedade é o direito real por excelência (é o direito real sobre coisa própria), mas pode haver direito real sobre coisa alheia. É o exemplo do contrato de locação, em que o locatário exerce o domínio real e efetivo sobre a coisa (tem a posse direta), enquanto o locador continua com a posse indireta do imóvel. Os direitos reais propriamente ditos são aqueles em que se dá o exercício desse domínio. Já a posse tem uma natureza muito controversa, havendo dúvida se é direito das coisas ou não, pois a posse tem ganhado autonomia em relação à propriedade. Art. 1196 CC. Art. 1.196. Considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade. Para alguns autores, o direito das coisas não abarcaria nem posse nem vizinhança. A vizinhança possuiria uma natureza jurídica híbrida, das obrigações complexas, e decorre de direitos obrigacionais. Obs: Nos Direitos Reais, há um direito à coisa (ius in re), enquanto nos Direitos obrigacionais, há um direito sobre a coisa (ius ad rem) Obs: os direitos reais podem nascer de negócios jurídicos. Mas eles irão apenas aumentar a eficácia dos direitos obrigacionais, como ocorre nos direitos reais de garantia, ou conferir uma eficácia real aos contratos, como a exigência da averbação do contrato de locação no registro imobiliário. Nem todos os títulos registrados geram direitos reais. Alguns direitos obrigacionais precisam de registro, visando atribuir publicidade ao ato e conferir efeito erga omnes ao negócio. Assim, direito erga omnes é diferente de efeitos erga omnes. Temos como exemplo o contrato de locação, que só atinge terceiros se for averbado. Da mesma forma, as cláusulas de inalienabilidade, impenhorabilidade alcançam a coisa onerada, mas nem por isso são direitos reais. Os meios de proteção processual também não têm relação com a origem do direito real. A proteção visa a eficácia do registro. Isso nos mostra que a publicidade não é característica exclusiva dos Direitos Reis. Teorias: Clássica Realista: conforme essa teoria, nos direitos reais a relação jurídica envolve dois elementos: o titular, que é o sujeito, e a coisa. B (pessoa) teria uma relação jurídica com A (coisa). Já o direito obrigacional, possui uma estrutura diferente, e teria três elementos: o sujeito ativo (credor), o sujeito passivo (devedor) e a coisa. Nos direitos reais a relação se dá diretamente com o objeto. Essa teoria não é adotada pela maioria da doutrina, superada pelas seguintes: Personalistas: A relação jurídica não existiria entre um indivíduo e uma coisa. Existiria entre eles apenas uma relação material, que é o domínio. A relação jurídica existe entre pessoas, não entre pessoa e coisa. A relação jurídica, na verdade, teria o titular, que é o sujeito ativo que exerce o domínio sobre a coisa, a coisa e um sujeito passivo. A sociedade seria o sujeito passivo, pois o direito real concede uma relação com outras pessoas. A sociedade seria todos aqueles não detêm a titularidade, e a relação jurídica gera

3 Direito Civil V Marcelo Milagres Camila Fabiana direitos ao titular e deveres aos demais da sociedade. Toda a sociedade não deve interferir na relação de subordinação do titular, de forma que a sociedade possui um dever geral e negativo de abstenção de intervenção no direito material do titular. Direitos Reais x Obrigacionais: Direitos Reais Absoluto, com eficácia erga omnes Atributivo, um só sujeito Imediatividade Permanente Numerus clausus Jus in re (direito à coisa) Objeto: coisa Direitos Obrigacionais Relativo, com eficácia inter partes Cooperativo, conjunto de sujeitos Mediatividade Transitório Numerus apertus Jus ad rem (direito a uma coisa) Objeto: prestação Obs: Relatividade x oponibilidade: relativo é quando a conduta é exigível de terceiro. É oponível quando obriga terceiros não interferir, mediante abstenção de atos prejudiciais. a) Em relação ao sujeito: nos direitos reais, não necessariamente há uma especificidade sobre o polo passivo, que é todo aquele que não deve interferir na propriedade do titular, já no direito obrigacional, os sujeitos são determinados ou determináveis. b) Em relação ao objeto (coisa): Os direitos reais são suscetíveis de apropriação, pois o objeto é a coisa, dotada de materialidade, de existência atual, já os direitos obrigacionais tem como objeto uma prestação, uma conduta, que é bem incorpóreo, existindo em abstrato. Não há, nesse caso, poder jurídico sobre o objeto, apenas uma faculdade do credor em exigir uma conduta do devedor. c) Em relação ao exercício dos direitos: Nos direitos obrigacionais, a realização da prestação, ou seja, a sua eficácia, depende do terceiro elemento (sujeito passivo), ou seja, depende de uma relação de cooperação (mediata) na realização dos negócios, ligada à boa fé objetiva. A concretude da obrigação depende do sujeito passivo realiza-la. Já os direitos reais, a natureza do exercício é o domínio, uma relação de subordinação (imediata). O titular detém a coisa sobre o seu poder e a utiliza, dando finalidade a ela ou não, sendo esta finalidade econômica ou não, e não depende de uma intervenção de terceiro. d) Em relação à eficácia: nos direitos reais, há um sujeito passivo universal, não necessitando que essa pessoa seja previamente determinada. Tem-se assim, uma eficácia erga omnes, ou seja, absoluta, que decorre do princípio da publicidade dos direitos reais. Temos como exemplo os bens imóveis, que concretizam o direito real através do registro. Já no direito obrigacional a eficácia é inter partes, ou seja, possui eficácia relativa. Obs: No negócio jurídico há uma expectativa de adquirir a propriedade de alguma coisa, mas o contrato ainda não é um direito real. Ex: a entrega das chaves é a entrega da posse, material, mas não necessariamente é uma relação de titularidade. A titularidade só é adquirida com o registro do bem no cartório (com a publicidade do ato). Se o contrato é apenas assinado, sem registro, caso haja um descumprimento, seria uma hipótese inadimplemento obrigacional, pois o comprador ainda não tem a titularidade do bem. A titularidade estaria relacionada à propriedade, não necessitando da posse, que pode ser direta ou indireta. A ação de despejo é um mecanismo para o proprietário voltar a exercer a posse sobre o bem. A proteção do direito real é maior que a do direito obrigacional.

4 Direito Civil V Marcelo Milagres Camila Fabiana e) Em relação à duração: o vínculo obrigacional nasce para ser extinto, é transitório, pois ambas as partes cooperam para realização do negocio jurídico através da boa fé objetiva, que determina certas condutas para que a realização da prestação vise se concretizar ao máximo. Nos direitos reais a boa fé é subjetiva e a relação não tem intenção de ser transitória, mas exercer uma continuidade na subordinação Ex: não compro uma casa para depois vender. A subordinação, portanto, é uma relação imediata, exercendo o poder direto sobre a coisa, e tende a ser permanente. Antes o poder de propriedade era absoluto sobre a coisa, sendo a coisa usada do jeito que o titular bem entender, não havendo necessidade de uma contraprestação. Hoje, não pode se exercer um direito indiscriminado sobre a coisa, pois deve visar à função social da propriedade, prevista no art. 5º da CR. A função social estabelece um dever do titular perante a coletividade. A CR introduziu novos contornos para o exercício do direito, para que ele não seja linear e sem conteúdo, buscando preservar a função social coerente com a natureza da coisa. Ex: O estatuto da cidade determina quais regiões da cidade são voltadas para o comércio e quais são voltadas para a moradia, mas deve ser dada função social para cada coisa, e por isso o poder não é mais ilimitado, exercido de forma absoluta, de forma que a parte absoluta passou a abarcar a sua eficácia, que é erga omnes. Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: XXII - é garantido o direito de propriedade; XXIII - a propriedade atenderá a sua função social; Já a função social da posse, tem gerado autonomia à posse pela perda da propriedade pelo proprietário, quando a pessoa exerce a posse continuada durante grande lapso de tempo, conferindo finalidade econômica à coisa e exercendo a função social quando o proprietário se mostrou inerte. Quanto maior a qualidade da posse, menor o tempo para adquirir à propriedade. O direito de sequela também é uma característica dos direitos reais, que é o direito de seguir o bem a onde quer que esteja. Os direitos reais aderem à coisa, de forma que seu titular possa perseguilo em poder de terceiros onde quer que se encontre. Pressupõe a submissão do bem ao titular do direito real. Ex: A B: A concede seu imóvel em hipoteca para B, como garantia de débito, mas A vende o bem, posteriormente, à C. O negócio será válido (pois A pode dispor da coisa), mas será ineficaz pela proteção da hipoteca (caso A não pague a hipoteca). Nesse sentido, se A não paga a hipoteca, B, que é o credor, poderá retirar o imóvel do poder de C, com declaração de ineficácia da compra e venda, baseando-se na sequela, pois a hipoteca é registrada em cartório e vale erga omnes, havendo um direito real de buscar o bem onde quer que ele esteja. A hipoteca é gravada na matricula do imóvel no cartório. Em princípio, a sequela não alcança os direitos obrigacionais, tendo em vista que as obrigações vinculam apenas as partes. Se A, por exemplo, compromete entregar um veículo a B, mas entrega o objeto a C, B não poderá atingir C, pois este não era vinculado ao contrato, devendo B se contentar com a indenização do inadimplemento da obrigação. Excepcionalmente, terá os credores quirografários direito de pleitear ação revocatória (art. 158 e 171,II do CC), mas o titular do direito real pode exercer a sequela sem a ação pauliana. 12 08 Direitos reais x obrigacionais: Os direitos reais são erga omnes, e nesse sentido seriam absolutos, mas não significa que não está suscetível a nenhuma restrição. Já os obrigacionais são relativos, com eficácia inter partes.

5 Direito Civil V Marcelo Milagres Camila Fabiana A prestação é o objeto do direito obrigacional, e pode ser determinado, ou determinável. Já os direitos reais recaem apenas sobre objetos determinados, porque é exigência da segurança jurídica. A coisa deve existir concretamente para que o titular possa exercer seu poder sobre ela. Não posso atribuir a qualquer direito a robustez dos direitos reais, que são taxativos (art. 1225 do CC), diferentemente dos direitos obrigacionais que não são numerus clausus. Só são direitos reais o que a lei determina. O fato dos direitos obrigacionais não serem taxativos, não significa que haverá absoluta liberdade na criação dos negócios, devendo ser observadas as regras gerais do CC (art. 425). A função social da propriedade é um conceito aberto e histórico. Na nossa concepção, a propriedade deve servir a um propósito maior de interesse público. Ela não pode servir ao interesse privado prejudicando o interesse público, de forma que a propriedade está inserida em uma coletividade onde vigora principio da solidariedade. Classificação: Direitos reais sobre coisa própria: é a propriedade. Dele derivam os demais direitos reais. Direitos reais sobre coisa alheia: é o direito real do sujeito sobre uma coisa que não é dele. São manifestações derivadas dos direitos reais, mas nunca será exclusivo. Ex: o usufrutuário terá o uso e gozo do bem, mas não terá o direito de dispor, direito este que é unicamente do proprietário. Direitos reais de uso e fruição: é o exemplo do usufruto. O usufrutuário não é o dono, nem proprietário da coisa, mas tem direito de usar e fruir dela. Outro exemplo é o direito real de servidão. Nesse caso, temos o prédio A e B, por exemplo, e um está ao lado do outro, mas B não tem acesso à rodovia e precisaria passar por dentro do prédio A para ter acesso. Assim, a passagem pelo prédio A, fazendo com que B tenha acesso à rodovia, não deixa de ser de propriedade do prédio A, mas possui uma relação de servidão de passagem em favor de B. Outro exemplo é a habitação. É o caso do cônjuge sobrevivente, que independente do regime de bens, ou do direito de herança, tem direito real de habitação sobre o imóvel residencial do casal, desde que seja o único que tenha essa finalidade. Direitos reais de garantia: as garantias podem ser pessoais; fidejussórias; ou reais. As duas primeiras servem para garantir determinada obrigação, ou seja, o patrimônio de uma pessoa vai responder pela obrigação. Já nas garantias reais, uma coisa (bem) específica irá responder pela obrigação (penhor, hipoteca, anticrese). Ex: carro. Pode haver garantias reais que não são direitos reais. Se for direito real será erga omnes, e terá maior força. Mas como transformar a coisa em direito real de garantia? A constituição do direito real deve ser pública. O registro público dá publicidade a esse direito real. Ex: é o caso da alienação fiduciária em garantia (que também é resolúvel). B pede um empréstimo do banco para pagar um carro, mas caso não pague as prestações, o banco poderá tomar o carro. Só será erga omnes se tiver um registro público, caso contrário, valerá como direito obrigacional. Obs: o direito de preferencia está presente nos direitos reais de garantia. Nesse caso, o titular do direito real terá preferencia em relação às demais relações que sucederam com a coisa, sendo uma consequência do direito de sequela, de forma que o direito real vai prevalecer sobre o obrigacional. Direitos reais de aquisição: o contrato de compra e venda é feita por escritura pública. Já o contrato que as partes fazem, antes do registro, é na verdade uma promessa de compra e venda. Enquanto não for lavrada a escritura, o comprador não será proprietário. O direito de aquisição é um direito de adquirir o bem. Esse direito já tem na perspectiva obrigacional, mediante a promessa, mas para ser real, deve ser erga omnes, dada publicidade à promessa, através do registro público. A relação jurídica pressupõe direitos contrapostos e deveres recíprocos. Nos direitos reais essa relação é de subordinação do objeto ao seu titular e pressupõe um dever geral de abstenção do

6 Direito Civil V Marcelo Milagres Camila Fabiana sujeito ativo e a satisfação do interesse do ativo, visando ainda concretizar a função social. A coisa é o objeto pelo que se exerce situações jurídicas de poder e de domínio. Não há relação entre pessoa e coisa, mas um direito de dominação. Já os direitos obrigacionais são relações cooperativas, em que não há subordinação de devedor ao credor, mas o objetivo de obter uma prestação ao credor. É uma relação de crédito entre pessoas determinadas ou determináveis e o credor visa exigir um comportamento do devedor, de fazer, não fazer ou dar, para satisfação do seu débito. Obs: direito subjetivo x pretensão: o direito subjetivo é o poder concedido ao titular para exigir a satisfação de seu interesse. Já a pretensão nasce com ameaça ou lesão ao direito subjetivo, que, nos direitos reais, nasce quando há ofensa aos direitos absolutos (erga omnes), enquanto nos obrigacionais nasce quando o devedor não viola o direito de crédito do credor. PROPRIEDADE É um direito que um determinado sujeito tem sobre determinada coisa e que permite a esse sujeito, usar, gozar e fruir, dispor da coisa ou reivindicar a coisa. Esse direito real é exclusivo, em regra, pois apenas um sujeito seria dono da coisa. Em razão da função social da propriedade, o titular não poderá dispor da coisa como convier, podendo haver limitações. O direito de propriedade é assegurado pela CR, mas esse direito não é absoluto, pois os princípios são ponderáveis quando em conflito com demais princípios. Características: Complexo, pois tem um feixe de atribuições: pode usar, gozar, dispor, reivindicar a coisa; Elástico, pois continua sendo direito de propriedade, sem perder essa característica, ainda que desloque ou tire determinadas atribuições. Ex: quando é inalienável, tira-se do proprietário o direito de dispor da coisa, mas continua tendo o direito de reivindica-la. Posso também ser proprietário e não usar o imóvel: o direito obrigacional se perde com a inércia do titular, pois o direito caduca, ou a pretensão prescreve. Já nos direitos reais, a ordem jurídica permite ao proprietário não fruir da coisa; Absoluto, na perspectiva erga omnes; Perpétuo: nos direitos obrigacionais, o direito tem uma duração limitada no tempo, não podendo obrigar uma pessoa de forma perpétua a uma determinada obrigação. Já os direitos reais tendem a ser perpétuos. A exceção é o direito de propriedade resolúvel que é uma propriedade sujeita a uma condição resolutiva, e quando realizada essa condição, a pessoa deixa de ser proprietário: é o caso da alienação fiduciária; Exclusivo. No entanto, pode haver vários sujeitos com direito de propriedade sobre a mesma coisa, como o condomínio. O proprietário perde a propriedade se não exerce a função social? A ordem jurídica não penaliza com a perda da propriedade de modo sancionatório para aquele que não exerce a função social. O máximo que pode acontecer é a perda da propriedade mediante desapropriação, que é um ato do poder público de intervenção na propriedade privada, em que o titular perde a propriedade em nome do poder publico, mediante uma indenização. Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem- estar de seus habitantes. Formas híbridas: Obrigação propter rem: são obrigações impostas a um titular de um determinado direito real. O devedor ou o credor é individualizado por ser titular de um direito real. Assimila características tanto do direito real quando do obrigacional. O titular do direito real pode transmitir o débito fora das hipóteses dos direitos reais, ou seja, poderá impor a obrigação a todos que sucederam a posição de titular. Como obrigação proptem rem temos como exemplo: a obrigação do condômino em concorrer, na proporção de sua parte, para as

7 Direito Civil V Marcelo Milagres Camila Fabiana despesas de conservação ou divisão da coisa comum (art. 1.315, do CC); as do proprietário de apartamento, num edifício em condomínio, de não alterar a forma e a cor da fachada, das partes e esquadrias externas (art. 1.336, III, do CC), etc. Ônus reais: são obrigações que limitam o uso e gozo da propriedade constituindo gravames ou direitos oponíveis erga omnes. Tradicionalmente, os ônus reais surgem nos casos em que o proprietário de um imóvel se encontra obrigado, nessa qualidade de proprietário, ao cumprimento de certa prestação, reiterada ou periodicamente, em gêneros ou em dinheiro e, por esse pagamento responde sempre o imóvel, seja quem for o respectivo proprietário à execução. Fica obrigado às prestações anteriores por suceder a titularidade da coisa vinculada a uma obrigação. São encargos da própria coisa: se o titular adquirir imóvel com dividas art. 1345 CC. É a obrigação que limita o uso e o gozo/fruição da propriedade, constituindo verdadeiro gravame oponível erga omnes. O ônus se deve à coisa, e não ao titular do direito real. 14 08 Direito das Coisas x Direitos Reais Personalidade: É possível ser, sem ser pessoa, como a massa falida e o condomínio edilício. Bens: é impossível ser, sem ter algo, mas em nosso ordenamento, o ser deve possuir um mínimo existencial. Bens x coisas: bem é gênero (parte geral) e coisa é espécie. Bens são todos os valores corpóreos e incorpóreos, materiais ou imateriais, essenciais para realização do próprio sujeito. Coisas são bens corpóreos, materiais, dotados de economicidade. Assim, a nossa disciplina possui uma restrição do objeto. A coisa é objeto dos relacionamentos, e as relações jurídicas se dão entre pessoas. Negócios Jurídicos: estuda o agir e o interagir humano. Direitos obrigacionais x reais: Os direitos obrigacionais são relativos, e a relação se dá entre credor e devedor, pressupondo a capacidade dos indivíduos. Já os direitos reais não possuem essa pressuposição. As relações jurídicas possuem um titular definido, sendo que o sujeito passivo é universal. O caráter absoluto é quanto à eficácia, pois os direitos reais são oponíveis erga omnes e o sujeito ativo possui a titularidade sobre a coisa, além do direito de sequela. A forma mais primitiva de sequela é a autotutela e a forma mais avançada é tutela judicial. Enquanto nos direitos obrigacionais o descumprimento gera pretensão, nos direitos reais gera autotutela. A autotutela pressupõe uma reação imediata à agressão. Caso tenha cessado a agressão, o direito de sequela continua, devendo ser exercido de forma judicial. Ex: se A foi coagido a entregar seu bem por B, poderá exercer seu direito de autotutela no momento da agressão. Caso tenha decorrido vários dias, e A tenha reconhecido B em via pública, não poderá mais exercer a autotutela para retomar a coisa, porque caracterizaria um exercício arbitrário das próprias razões. Desta forma, a única forma de reaver o bem seria mediante tutela judicial. O caráter absoluto dos direitos reais não pressupõe um exercício ilimitado. Se há subjetividade nas relações também há alteridade, pois vivemos em sociedade, e seu direito termina quando começa o do outro. Ao exercer o seu direito não pode violar normas, princípios e valores. O poder do titular sobre a coisa (jus) requer não ação de outrem, mas a omissão da coletividade, um dever geral de abstenção. Ao contrário do direito das obrigações, em que o credor espera uma ação do devedor.

8 Direito Civil V Marcelo Milagres Camila Fabiana Os direitos reais também possuem um caráter de imediatidade, proporcional e contemporânea. Os direitos reais também são apenas aqueles previstos em lei, sendo taxativos. Já os direitos obrigacionais não são numerus clausus, pois os contratos são diversos. Problema: a posse não está prevista no art. 1225, que elenca as hipóteses de direitos reais. No entanto, milagres considera que a posse é um instituto implícito nessas hipóteses. Os direitos reais é um ramo inserido no direito das coisas. Direito das coisas vem de res. Art. 1.225. São direitos reais: I - a propriedade; II - a superfície; III - as servidões; IV - o usufruto; V - o uso; VI - a habitação; VII - o direito do promitente comprador do imóvel; VIII - o penhor; IX - a hipoteca; X - a anticrese. XI - a concessão de uso especial para fins de moradia; XII - a concessão de direito real de uso. Domínio: Ter é sinônimo de domínio. Muitos autores dizem que domínio é sinônimo de propriedade, mas, na verdade, domínio é o poder sobre as coisas. A propriedade é uma manifestação muito restrita de domínio. Todo poder não é ilimitado e corresponde a um dever. Esse domínio possui elasticidade. É também um complexo de atributos que pressupõe usar, usufruir, dispor e reaver a coisa. O ato de disposição não é alienação, mas a transferência definitiva ou temporária da coisa, como a permuta, o mútuo, etc. É também absoluto quanto à eficácia e limitado quanto ao exercício. Esse domínio poderá ser pleno se o sujeito puder exercer todos os seus atributos, incluindo poderes e deveres, e a faculdade de dispor definitivamente da coisa. Qual o ser que poderá exercer o domínio pleno? Apenas o proprietário. Ex: os pais doam um imóvel para os filhos com cláusula de usufrutuários vitalícios: nesse caso, os filhos passam a ser proprietários, mas essa cláusula impede que os filhos vendam o imóvel enquanto os pais morarem no imóvel. A Venda a non dominu é a disposição definitiva feita por quem não tem o poder pleno. Quem vendeu não é proprietário e a venda torna-se inválida. Domínio não se confunde com a posse. A posse é uma manifestação de domínio. A posse pode ser natural ou civil. O Art. 1196 não definiu diretamente posse, pois partiu não do objeto, mas do sujeito, demonstrando que o legislador não consegue desvincular a posse da propriedade. Art. 1.196. Considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade. A posse tem autonomia? Ou depende da propriedade? A posse é uma forma de domínio e uma manifestação de poder. É um direito que tem como antecedente um fato, mas qual fato? É um fato que possui efeito jurídico e que pressupõe controle sobre a coisa. A posse é um direito subjetivo patrimonial e real, apesar de não estar expressa nas hipóteses elencadas no art. 1.225. Todo proprietário é possuidor, mas nem todo possuidor é proprietário.

9 Direito Civil V Marcelo Milagres Camila Fabiana 19 08 POSSE Natureza Jurídica: É uma forma de estudo de domínio, e antecede o estudo da propriedade porque é uma forma primária de domínio. É um direito subjetivo de conteúdo patrimonial. Há uma grande discussão se é ou não direito real. Para o professor, a posse se sustenta no absoluto, na sequela e na imediatidade, próprios dos direitos reais. É o exemplo do locatário que não é proprietário, mas exerce poder imediato sobre a coisa, e espera do locador o dever de abstenção, característico dos direitos reais. Pelo principio da taxatividade, a posse está prevista em lei, mas seu conteúdo se encontra implícito no art. 1225. Conforme Ihering, todo proprietário é possuidor, podendo até não ter o controle direto e imediato sobre a coisa, mas terá no mínimo, o controle indireto. A posse é o meio pelo qual a propriedade se manifesta, podendo existir posses paralelas, coexistindo manifestações de posse sobre o mesmo objeto. Se posse é poder, não é necessariamente físico: Art. 80. Consideram-se imóveis para os efeitos legais: I - os direitos reais sobre imóveis e as ações que os asseguram; II - o direito à sucessão aberta. Teorias: Subjetiva: Savigny elaborou a teoria subjetiva da posse, pressupondo corpus + animus para existir a posse. Corpus está relacionado à matéria, devendo haver um objeto de controle. Seria, então, a apreensão física, fática, do sujeito sobre a coisa. Já o animus é a intenção de ser proprietário, a vontade. Problemas: Há hoje teorias que consideram a imaterialidade do objeto, como usufruto, perdendo esse caráter físico do corpus. Ainda, se não houver contato ou apreensão física sobre a coisa, não quer dizer que a pessoa perdeu o poder sobre o objeto. Com relação ao animus, o problema é que a vontade é algo muito subjetivo, ao contrário da declaração de vontade, que é a intenção declarada. Assim, nos levaria a conclusão de que, para Savigny, o locatário, para ser possuidor teria que ter intenção de ser dono e não poderia sair de casa. Porém, nem todo possuidor tem intenção de ser proprietário. Apesar de todos os problemas, essa teoria auxiliou o instituto do usucapião, que é um mecanismo pelo qual a pessoa exerce atos de posse, e pela intenção de ser dono, adquire a propriedade da coisa com o decurso do tempo. No entanto, a pessoa deve exteriorizar essa intenção de ser proprietário, cuidando da coisa, pagando as despesas, etc. Objetiva: Ihering identifica os problemas da teoria subjetiva e pressupõe que a posse teria os elementos corpus + animus, mas alterando o conteúdo desses elementos. O corpus seria o poder sobre a coisa, não necessariamente apreendida fisicamente. A coisa pode sair da esfera imediata do possuidor, a exemplo de um empréstimo. Assim, a posse pode ser direta ou indireta. O locador, por exemplo, possui uma posse indireta, já o locatário possui o poder imediato sobre a coisa (posse direta). Todo proprietário será, no mínimo, possuidor indireto, porque tem um poder ainda que indireto sobre a coisa. Quem é possuidor direto não necessariamente será proprietário da coisa. É o exemplo do leasing, do arrendamento, da locação, etc. E o que seria animus? O que interessa é a sua análise extrínseca, não a subjetiva. O animus seria um comportamento como se fosse proprietário, não a intenção de ser proprietário.

10 Direito Civil V Marcelo Milagres Camila Fabiana Problema da teoria: não consegue definir a posse, senão a partir do instituto propriedade. Assim, não reconhece a autonomia à posse, que seria uma manifestação de domínio num patamar inferior à propriedade. O possuidor é aquele que exterioriza o comportamento de proprietário. A posse é a exteriorização da propriedade. Segundo o art. 1196, posse é um poder exercido inerente à propriedade, podendo ser pleno ou não. Mas nem todo possuidor é proprietário. Esse artigo abarca a teoria do Ihering. Art. 1.196. Considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade. Para Nelson Rosenvaldi, posse seria uma situação de fato, em que um sujeito pode ou não ser proprietário, exerce atos de poderes ostensivos sobre uma coisa, conservando-a e defendendo-a, e exercendo ingerência socioeconômica sobre ela. A posse direta não anula a indireta, e ambas convivem entre si. É também a teoria de Ihering. Isso demonstra que o CC adota preponderantemente a teoria objetiva. Mas adota também a teoria subjetiva, como o caso do usucapião. Art. 1.197. A posse direta, de pessoa que tem a coisa em seu poder, temporariamente, em virtude de direito pessoal, ou real, não anula a indireta, de quem aquela foi havida, podendo o possuidor direto defender a sua posse contra o indireto. Jornada Direito Civil Enunciado 76 Art. 1.197: O possuidor direto tem direito de defender a sua posse contra o indireto, e este, contra aquele. Sociológica: A posse tem autonomia sobre a propriedade. Ela tem uma realidade social e manifestação autônoma de domínio. O que as pessoas realmente querem é o poder de uso sobre a coisa, o acesso à internet, à música, etc. As pessoas não querem o domínio pleno, tendo em vista que a tecnologia muda a todo instante. É a teoria de Salielles. Temos como exemplo a locação, em que o locatário tem posse direta sobre a coisa, se colocando na condição de usuário, com a finalidade de moradia. Essa visão autônoma da posse é construída, tendo em vista a preponderância da teoria objetiva no direito brasileiro. A posse é uma realidade social que independe do direito de propriedade. Jornada Direito Civil Enunciado 492 A posse constitui direito autônomo em relação à propriedade e deve expressar o aproveitamento dos bens para o alcance de interesses existenciais, econômicos e sociais merecedores de tutela. O que nos traz segurança é o título de propriedade sobre a coisa, mas o direito possui um conteúdo multissecular, não interessando a propriedade formal, e sim a material. Assim, se eu estiver morando há 15 anos em uma propriedade, e o verdadeiro dono só aparecer no transcorrer desse lapso temporal com ação de reintegração de posse, quem irá ganhar será o morador, aquele que possui a posse direta sobre a coisa, ou seja, a propriedade material. Art. 1.196. Considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade. É possuidor todo aquele. Que todo aquele? Não fala se deve ser pessoa com capacidade de fato e de exercício. O Condomínio edilício, por exemplo, é um ente despersonalizado. Assim, o professor considera que para ser possuidor deve possuir capacidade fática, natural, de poder sobre a coisa, não necessariamente poder físico. Não é aquele que possui capacidade reconhecida pelo direito porque tanto as pessoas jurídicas quanto os entes despersonalizados podem ostentar a qualidade de possuidor. Jornada Direito Civil Enunciado 236 Arts. 1.196, 1.205 e 1.212: Considera-se possuidor, para todos os efeitos legais, também a coletividade desprovida de personalidade jurídica.

11 Direito Civil V Marcelo Milagres Camila Fabiana A posse antes de ser um direito é um fato, um exercício, um poder de domínio, e pressupõe um controle. A posse é uma manifestação de poder, mas somente o proprietário pode exercer esse poder de forma plena. Nem todo aquele que exerce o poder pleno é possuidor direto. A posse direta não anula a indireta: Art. 1.197. A posse direta, de pessoa que tem a coisa em seu poder, temporariamente, em virtude de direito pessoal, ou real, não anula a indireta, de quem aquela foi havida, podendo o possuidor direto defender a sua posse contra o indireto. A posse se dá em razão de direito pessoal ou real. Direito pessoal pressupõe uma relação subjetiva, é o caso do direito obrigacional, como a alienação fiduciária (que desencadeia na posse). A posse pode advir, também, de um direito real, independentemente da relação subjetiva. É o exemplo de invasão de propriedade. Esse ato jurídico desencadeia na posse, no poder sobre a coisa, ainda que contra a vontade do titular. Assim, atos ilícitos podem gerar posse. A posse seria um poder fático sobre a coisa. Alguns autores consideram que é cabível estender o exercício do poder de fato sobre bens imateriais, como os direitos autorais e patentes, que também são dotados de economicidade. Mas o CC adota a teoria objetiva de Ihering, considerando a posse como exteriorização da propriedade. Na era da virtualidade, caracterizada pela desmaterialização dos acontecimentos, pela complexidade própria do fenômeno jurídico, devemos perceber que os bens incorpóreos da sociedade da imagem detêm grande importância. Tanto é que os direitos autorais de uso de marca e patente, são formas de propriedade passíveis de cessão inter vivos e sucessão mortis causa. Nos termos da súmula 228 do STJ, não seria admissível o interdito proibitório para proteção do direito autoral, tendo em vista a existência de medidas específicas de proteção. Não haverá posse sobre as coisas postas fora do comércio, que não são nem objeto de propriedade particular, como os bens públicos de uso comum do povo e de uso especial. Súmula 228 STJ: É inadmissível o interdito proibitório para a proteção do direito autoral. Art. 100. Os bens públicos de uso comum do povo e os de uso especial são inalienáveis, enquanto conservarem a sua qualificação, na forma que a lei determinar. Classificações: Exercem influencia sobre a eficácia e proteção jurídica da posse. a) Direta ou Indireta: Direta é quando incide imediatamente sobre a coisa corpórea, enquanto a direta decorre de uma relação jurídica de direito real ou pessoal. Desdobramento da posse: quando o proprietário, efetivando uma relação jurídica negocial com terceiro, transfere-lhe o poder de fato sobre a coisa. O proprietário continuará sendo possuidor, só que indireto. É o caso da locação, usufruto, comodato, etc. Quando o proprietário estiver exercendo diretamente a posse, será uma posse plena, e não estará caracterizado o desdobramento da posse. O desmembramento verifica-se quando o proprietário transfere faculdades que integram o domínio a outra pessoa, e baseia-se em uma relação jurídica transitória de transferência de poderes dominiais. Essa noção é incompatível com a teoria subjetiva de Savigny. Nelson Rosenvaldi considera que não haverá desdobramento da posse em direta ou indireta quando a posse de fato for de posse originária, independente de relação jurídica, como é o caso de ocupação de imóvel abandonado. Nesse caso a pessoa seria pura e simplesmente possuidor. Essa não é a posição do professor. Assim, a posse direta seria para Rosenvaldi subordinada ou derivada, tendo em vista que é limitada ao âmbito de poderes dominiais que poderá exercer, de acordo com o negocio jurídico celebrado entre o possuidor e o proprietário. Já a posse indireta seria a que o proprietário conserva quando temporariamente cede a outrem o poder de fato sobre a coisa. Para Rosenvaldi, nem sempre o

12 Direito Civil V Marcelo Milagres Camila Fabiana possuidor indireto será o proprietário, pois terá posse indireta aquele que transferir certas faculdades dominiais ao possuidor direto (podendo ser o sublocatário, por exemplo). A coexistência pacífica, decorrente do desdobramento da relação possessória, dá-se o nome de posses paralelas. O possuidor direto também poderá defender a posse contra o possuidor indireto, no caso de descumprimento do negocio jurídico entre eles celebrado. A posse direta não se confunde com detenção. O detentor não exerce atos possessórios, pois a sua atuação sobre a coisa não provêm da relação jurídica, não praticando atos de posse em nome próprio, mas em nome alheio. Art. 1.198. Considera-se detentor aquele que, achando-se em relação de dependência para com outro, conserva a posse em nome deste e em cumprimento de ordens ou instruções suas. Parágrafo único. Aquele que começou a comportar-se do modo como prescreve este artigo, em relação ao bem e à outra pessoa, presume-se detentor, até que prove o contrário. Art. 1.204. Adquire-se a posse desde o momento em que se torna possível o exercício, em nome próprio, de qualquer dos poderes inerentes à propriedade. Posse e detenção não se distinguem por um elemento volitivo, como da teoria de Savigny, pois o detentor também teria animus, mas é recusada a sua condição de possuidor por critérios objetivos. A detenção é uma posse desqualificada, não podendo manejar ações possessórias, nem adquirir a propriedade por usucapião. Temos quatro hipóteses de detenção: 1- Servidores da posse: art. 1198 do CC. São os gestores da posse. Detém o poder físico sobre a coisa em razão de uma relação de subordinação com terceiro, em cumprimento de ordens ou instruções. Também conhecidos como fâmulos da posse, exercitam atos de posse em nome alheio, como mero instrumento da vontade de outro (ex: caseiro). Pode se revelar sobre coisas móveis ou imóveis (ex: o policial é detentor da arma que porta). Não é necessário um contrato formal de trabalho, apenas uma relação de subordinação. Não há desdobramento de posse. Art. 62 - CPC. Aquele que detiver a coisa em nome alheio, sendo-lhe demandada em nome próprio, deverá nomear à autoria o proprietário ou o possuidor. O detentor tem o ônus de indicar o verdadeiro possuidor, sob pena de perdas e danos, na forma do art. 69 do CPC. O detentor não possui legitimidade para ajuizar ações possessórias em defesa de esbulho, turbação ou ameaça sobre o bem, mas poderá exercer a pretensão defensiva pelo desforço imediato, limitando-se a atos de autotutela. Enunciado 301 Art. 1.198, c/c o art.1.204: É possível a conversão da detenção em posse, desde que rompida a subordinação, na hipótese de exercício em nome próprio dos atos possessórios. Enunciado 493 O detentor (art. 1.198 do Código Civil) pode, no interesse do possuidor, exercer a autodefesa do bem sob seu poder. 2- Atos de permissão ou tolerância: art. 1208 do CC. Esses atos seriam aqueles exercidos tendo em vista uma relação de vizinhança, parentesco ou mera complacência. A permissão nasce de uma conduta positiva, de uma autorização expressa do possuidor para utilizar a coisa, enquanto a tolerância seria um consentimento tácito ao uso (que não se confunde com desídia, inércia), sendo ambos marcados pela transitoriedade. Ex: A permite que seu vizinho B utilize sua vaga de garagem. Art. 1.208. Não induzem posse os atos de mera permissão ou tolerância assim como não autorizam a sua aquisição os atos violentos, ou clandestinos, senão depois de cessar a violência ou a clandestinidade.

13 Direito Civil V Marcelo Milagres Camila Fabiana 3- Atos de violência ou clandestinidade: art. 1.208 CC. Os ilícitos seriam atos de detenção. Todavia, terá posse no momento de cessada a violência e a clandestinidade. É uma forma de detenção independente, diferente das anteriores. 4- Bens públicos de uso comum e de uso especial do povo: art. 100 do CC: são bens fora do comércio, não suscetíveis de apropriação, nem usucapião. O particular não pode exercer ações possessórias contra o poder público. No entanto, Rosenvaldi, assim como o professor, admitem a posse sobre bens públicos dominicais ou patrimoniais, que são utilizados pelo Estado na forma dos particulares, esvaziando sua destinação pública. A destinação a uma finalidade pública dirá se o particular será mero detentor ou possuidor. Art. 100. Os bens públicos de uso comum do povo e os de uso especial são inalienáveis, enquanto conservarem a sua qualificação, na forma que a lei determinar. Apesar de não possuir legitimidade ativa, terá legitimidade passiva nas ações reivindicatórias. No entanto, Nelson Rosenvaldi considera que essa legitimidade poderá ocorrer apenas na hipótese de detenção por atos de violência ou clandestinidade. Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha. b) Justa ou injusta: Cuidado: a ideia de justiça normalmente está ligada a uma posse legítima ou lícita, mas a posse justa não necessariamente é aquela que se dá de acordo com o ordenamento jurídico, ou seja, não é necessariamente posse legítima ou lícita. Essa classificação decorre de um critério puramente normativo. Art. 1.200. É justa a posse que não for violenta, clandestina ou precária. O legislador não definiu a posse justa ou injusta, mas determinou quais os vícios objetivos da posse. A posse seria injusta quando violenta, clandestina e precária. Clandestina é quando é oculta, e precária é quando é instável. Seria então justa a posse pacífica, mansa, pública, estável. A violência injusta é a do momento da aquisição da coisa, quando a pessoa exerce agressão física ou moral contra outra pessoa para adquirir a posse da coisa. A violência, para que a posse seja injusta, deve ser contra uma pessoa, mediante uso da força ou ameaça. E se a violência for contra a própria coisa, no caso de atear fogo na propriedade? Não será injusta. Divergências: alguns autores dizem que, caso a violência tenha cessado, e a pessoa que a praticou ter a posse da coisa, a posse passaria a ser uma posse mansa e pacífica, sendo, portanto, justa. Outros, porém, dizem que mesmo se a violência cessar será a posse injusta, pois no momento de aquisição, foi usada a violência: Art. 1.203. Salvo prova em contrário, entende-se manter a posse o mesmo caráter com que foi adquirida. Para Rosenvaldi, só terá aquisição da posse quando cessar a reação de defesa (autotutela-art. 1.210, 1º do CC). No período de embate, o agressor será mero detentor da coisa. A posse também pode ser clandestina, quando ocorrer uma subtração, por exemplo, sem o conhecimento da vítima. A posse é adquirida às ocultas, sem publicidade, mas será oculta em relação a pessoa que tem interesse em recuperar a coisa. Assim há um problema: esse vício só é relativo à vítima e pode cessar, pois em relação a terceiros, a posse poderá ser pública, então ela seria justa. Assim, a posse tem um caráter dinâmico, e essa classificação não é estática. O arrebatador deve ter agido sorrateiramente, desejando camuflar o ato de subtração de quem é esbulhado. O possuidor ignora a instalação da nova posse, traduzido em meios ocultos. Essa situação poderia gerar uma redução do instituto do usucapião, em que as pessoas alegariam em defesa a

14 Direito Civil V Marcelo Milagres Camila Fabiana ignorância do ato. No entanto, isso deve ser analisado no caso concreto, observando o transcurso do lapso temporal e se o antigo possuidor poderia ter conhecimento ou não do fato. Art. 1.224. Só se considera perdida a posse para quem não presenciou o esbulho, quando, tendo notícia dele, se abstém de retornar a coisa, ou, tentando recuperála, é violentamente repelido. A clandestinidade não pode ser confundida com o abandono da posse. O abandono importa em perda da posse por aquele que é desidioso com a coisa, bem como não implica em posse viciosa por terceiro. A precariedade é um vício que ocorre na violação do dever de restituição da coisa, frustrando a expectativa e confiança da pessoa que emprestou a coisa, por exemplo. Para alguns autores, diferencia da violência e da clandestinidade, pois não refere-se ao momento aquisitivo da coisa, mas a momento posterior. Resulta do abuso de confiança do possuidor, que indevidamente retém a coisa além do prazo avençado par ao término da relação jurídica e recusa a restituição do bem. A precariedade requer uma prévia posse justa. Assim, se X for mero detentor da coisa e decide não entregar o bem, não será a posse precária, mas será viciada por ato de violência ou clandestinidade. Há um dever de restituição decorrente de um ato ilícito? Moralmente sim, mas juridicamente quem deve exercer a sequela é o Estado, e se houver prescrição punitiva não terá mais como exigir o poder sobre a coisa. O art. 1.233 do CC determina expressamente a obrigação de restituição da coisa perdida. Se a pessoa não restituir, sua posse será precária, ou seja, injusta. Art. 1.233. Quem quer que ache coisa alheia perdida há de restituí-la ao dono ou legítimo possuidor. Parágrafo único. Não o conhecendo, o descobridor fará por encontrá-lo, e, se não o encontrar, entregará a coisa achada à autoridade competente. Para a precariedade cessar, deve haver a extinção da posse daquele que possui a precariedade, devendo a coisa ser devolvida. Um dos efeitos da posse é a possibilidade de sua conversão em propriedade. Obs: a posse violenta ou clandestina pode ser objeto de usucapião extraordinária (art. 1.238 do CC); esses vícios objetivos são relativos, não produzindo efeitos erga omnes. Assim, se A for esbulhado por B, e cessada a violência, B for agredido por C, B poderá exercer proteção possessória contra C. O conceito de posse injusta é fundamental para a legitimação passiva nas ações possessórias, de forma que só terá legitimidade em ações de reintegração quando a posse for injusta. Esse conceito de injusto é mais restrito, de forma que não pode ser confundido com o injusto do art. 1.228 do CC, que possui acepção mais ampla (será injusto quando não houver titulação, ou seja, o possuidor não se identifica com proprietário ou não tem relação com este). No entanto, mesmo não sendo a posse injusta, poderá o proprietário pleitear ação reivindicatória com base na titularidade do bem. As hipóteses de posse injusta são numerus clausus, caso contrário, autorizaria o proprietário, a qualquer tempo, ajuizar ação possessória de recuperação do bem, pois toda a posse contrária ao seu interesse seria considerada injusta, mesmo não exercendo a função social. c) Com justo título ou sem justo título: nem toda posse justa será com justo título. O que é título? Alguns dizem que é documento, mas é na verdade a causa, o fundamento, e não necessariamente é escrito ou instrumentalizado, pois não se confunde com o contrato. Justo título não é título perfeito, mas é aquele que tem aparência de validade, mesmo inválido. Ex: se alguém rouba uma garrafinha, e depois a vende, conforme o art. 104 do CC, a venda será inválida porque o objeto é ilícito, mas o comprador terá um justo titulo, pois possui aparência de validade. Da mesma forma, ainda que o contrato que gerou a aquisição de um carro seja nulo, e ele tinha aparência de validade, terá justo titulo. Exemplo de posse injusta com justo título é o empréstimo de um livro, com o dever de devolvê-lo em determinado período. Nesse caso, se a pessoa não devolver o livro, a posse passa a ser precária, ou seja, será injusta, mas o título será justo, pois o contrato pré-estabelecido é valido.