A FASE DE DESINVESTIMENTO PASSOU? A pecuária de corte brasileira inicia o ano com boas expectativas de sustentação dos novos patamares de preços do boi gordo. Essa recuperação se dá num momento oportuno para o setor. A pecuária passou um longo período de desinvestimento, tendo em vista a perda em rentabilidade que sofreu para outras atividades. A combinação de aumento de custos e queda de preços reais no período de 2003 a meados de 2007 foi muito forte no setor. O produtor foi convidado a diminuir os investimentos, uma vez que os custos cresceram e a receita reduziu. Em boa parte de 2005 e 2006, por exemplo, os preços do boi em São Paulo - Indicador ESALQ/BM&F - estiveram inferiores à média de março de 2003 quando os custos começaram a ser medidos pelo Cepea em parceria com a CNA. A situação agravou-se em setembro de 2006, com o foco de febre aftosa em Mato Grosso do Sul. O processo de recuperação dos preços foi interrompido e o sistema de preços relativos do mercado brasileiro virou de cabeça para baixo. O mercado paulista, tradicional balizador dos preços internos, sofreu com o embargo do mercado europeu, e as cotações em Goiás tornaram-se maiores que as de São Paulo. Isso desorganizou consideravelmente o mercado como um todo. A previsibilidade possível do mercado acabou dando lugar a uma seqüência de incertezas. Os primeiros meses de 2007 seguiram sem grandes alentos. Embora os preços se mantivessem em níveis superiores aos do início de 2006, ainda eram menores que os praticados em 2004 em termos nominais se considerada a inflação do período, a perda se torna bem maior. A análise do mercado de boi deve considerar também a evolução dos preços de vaca e de bezerro. Em junho de 2006, o preço da vaca em Mato Grosso do Sul representava 85% do valor nominal de março de 2003. Isso indicava que a oferta de vaca gorda no estado do Mato Grosso do Sul estava maior que a procura, o que, por sua vez, poderia indicar que o bezerro estava gerando uma baixa rentabilidade para a atividade de cria. Entre 2003 e meados de 2006, os preços do bezerro apresentam estabilidade e depois queda na média do Mato Grosso do Sul, comportamento que, certamente, ajuda a explicar a desvalorização da vaca. É no primeiro semestre de 2007 que os preços do bezerro iniciam recuperação acentuada, antecipando o que iria ocorrer com os preços do boi. Sinais de ano de preços firmes para boi e bezerro O processo atual de elevação dos preços da arroba está em parte ligado ao longo período de perda de poder de compra do pecuarista que desmotivou investimentos. No início deste ano, o mercado futuro (BM&F) apontava para a continuidade do novo patamar de preços, com a arroba girando em torno de R$ 70,00. Já o mercado futuro de bezerro, embora com poucos negócios, sinalizava novas altas, com preços de R$ 523,00 para abril e R$ 517,00 para maio (valores negociados em meados de jan/08), ou seja, valores 30% superiores aos praticados nos mesmos meses de 2007.
A sustentação dos atuais patamares do boi e os novos aumentos do bezerro indicam que o desencontro entre a oferta e a demanda pode continuar impulsionando os preços. Paralelamente, contudo, não podem ser deixados de lado fatores externos ao setor, como a evolução da crise internacional, o comportamento de importadores da carne brasileira e a capacidade da economia interna de sustentar o crescimento sem pressões inflacionárias. A crise externa deve reduzir o ritmo do comércio internacional, e crescimento com inflação gera bolhas de consumo que não resultam em base sólida de desenvolvimento. Evolução do preço do boi gordo, do bezerro e da vaca em diferentes regiões. Comparações com inflação (IGP-DI), custos de produção e contrato futuro (BM&F) 160% 140% 120% 100% 80% Mercado Futuro 60% 40% 20% jan/03 jul/03 jan/04 jul/04 jan/05 jul/05 jan/06 jul/06 jan/07 jul/07 jan/08 jul/08 BG - Ind. bez BG - GOIANIA VG - MS IGP - DI COT - Br COE - Br Fontes: Cepea, BM&F e FGV RECUPERAÇÃO DA PECUÁRIA FAVORECE GERAÇÃO DE EMPREGOS A valorização da arroba do boi gordo em 2007 deu novo ânimo para a produção dentro da porteira. O recriador se sente estimulado a aumentar a reposição, e o criador, a aumentar o seu plantel de matrizes, vislumbrando a retomada de lucros com a pecuária. Entretanto, para garantir a sanidade e a alimentação do rebanho que, nesta perspectiva, irá aumentar, o fazendeiro tem de sair às compras. Mais pastos deverão ser formados e reformados, mais medicamentos e suplementos devem ser comprados, aquecendo todo o mercado de insumos, conseqüentemente. Nesse contexto de ganhos dentro da fazenda e fora dela, a oferta de empregos, diretos e indiretos, também aumenta. Em outras palavras, a fazenda precisará de mais
peões, o comércio agropecuário, de mais funcionários e as próprias cidades tendem a crescer. A expansão da pecuária brasileira atualmente está concentrada nas regiões de fronteira agrícola, nas quais essa atividade é a principal propulsora da economia local. Por isso, quando a pecuária aumenta a geração de divisas, o crescimento econômico dessas regiões aumenta consideravelmente. Na média de 24 regiões distribuídas nos estados do Rio Grande do Sul, Paraná, São Paulo, Mato Grosso do Sul, Goiás, Mato Grosso, Pará, Tocantins e Rondônia onde predominam os sistemas de recria-engorda e de engorda, a arroba valia cerca de R$ 66,00 em dezembro/07. Em termos médios, esse valor seria suficiente para cobrir os custos operacionais, mas não os totais, que consideram também depreciações e formação das pastagens. Os reajustes obtidos pela arroba na entressafra de boi gordo em 2007 tiveram fortes reflexos em 2008. Um destes foi a redução considerável da diferença do preço da arroba entre as regiões. Em períodos normais de oferta, as indústrias frigoríficas costumam atuar num raio de aproximadamente 300 quilômetros a partir da planta industrial. Já no atual cenário de falta de boi e de ampliação do parque de abate o que aumenta a competição entre as empresas, essa distância tem aumentado para até 800 quilômetros, segundo informações obtidas pelo Cepea. Essa alteração tem favorecido, principalmente, a pecuária do Pará, Tocantins e Acre este estado foi visitado pela equipe Cepea/Embrapa recentemente. Essas regiões apresentam os menores custos de produção e, agora, têm contado com bons reajustes. Em 2007, a arroba em Tocantins acumulou alta de 41,5% e, no Pará, de 46,6%. Preços nominais da arroba do boi gordo nas regiões pesquisadas R$ 80.0 R$ 75.0 R$ 70.0 R$/@ R$ 65.0 R$ 60.0 R$ 55.0 R$ 50.0 Holambra -SP Andradina - SP Alvorada - TO Paraíso do Tocantins - TO Colinas do Tocantins - TO Araguaína - TO Santo Antonio da Platina - PR Umuarama - PR Paranavaí - PR Guarapuava - PR Uberlândia - MG Uberaba - MG Montes Claros - MG Governador Valadares - MG Santa Maria - RS Lavras do Sul CDesPrec - Lavras do Sul C - RS Bagé RE - RS Bagé CRE - RS Alegrete E - RS Alegrete CRE - RS Barra do Garças - MT Pontes e Lacerda - MT Cáceres - MT São Miguel do Araguaia - GO Rio Verde - GO Uruaçu - GO Porangatu - GO Nova Crixás - GO Niquelândia - GO Jataí - GO Ceres - GO Catalão - GO Tupã C - SP Tupã RE -SP Ji Paraná -RO Santana do Araguaia - PA Redenção - PA Paragominas - PA Alta Floresta - MT São Gabriel do Oeste - MS Ribas do Rio Pardo - MS Paranaíba - MS Nova Andradina - MS Naviraí - MS Miranda - MS Dourados - MS Chapadão do Sul - MS Chapadão do Sul CRE - MS Brasilândia - MS Bonito - MS Amambai - MS Camapuã - MS Fontes: Cepea/CNA
AUMENTOS DO CUSTO E DA ARROBA SÃO RECORDES Os aumentos de custos da produção da pecuária brasileira em 2007 são os maiores dos últimos cinco anos esta pesquisa mensal iniciou em 2003. No correr do ano passado, produzir boi ficou 11,64% mais caro, considerando o acumulado dos custos operacionais totais nos 12 meses, nos 10 estados da pesquisa. Em compensação, a receita do pecuarista também se fortaleceu, obtendo aumento de 36,74% no ano também média ponderada dos 10 estados. Esse cenário estimulou o produtor a retomar os investimentos na atividade após anos amargando custos maiores que reajustes da arroba. Por sinal, a volta do pecuarista às lojas agropecuárias aqueceu todo o setor e, com ele, os preços dos insumos. Não bastasse essa demanda, também o aumento das vendas em outros setores do agronegócio (cana, milho e soja), em ramos distintos da economia, como a construção civil e o automobilístico, e ainda alguns eventos internacionais também contribuíram para o aumento recorde do custo de produção. A desvalorização de quase 17% do dólar considerando valores diários no correr do período, aparentemente, não teve o mesmo impacto que teria sobre os preços dos insumos caso o movimento fosse de valorização da moeda norte-americana. Os preços das máquinas e implementos agrícolas oscilaram bastante durante o ano, mas as boas vendas no segmento agrícola influenciaram para que houvesse valorização de 7,3% no balanço do ano. Segundo a Anfavea, em 2007, foram vendidos 30.691 tratores de roda no atacado brasileiro, aumento de 52,4% sobre 2006. O aquecimento da construção civil, por sua vez, encareceu em 6,83% itens como tijolos, cimentos e ferragens, que são utilizados em construção e manutenção das casas e galpões de propriedades pecuárias. Durante o ano, os reajustes do ácido fosfórico encareceram os fertilizantes fosfatados, que são utilizados em formação de pastagens. Os nitrogenados também subiram, puxados pela maior demanda dos Estados Unidos para os campos de milho e também pela diminuição da oferta desse insumo devido ao encarecimento do gás natural naquele país. As fontes potássicas também valorizaram no mercado internacional em função de problemas operacionais com as unidades de extração na Rússia, que é o principal produtor mundial. No acumulado do ano, os adubos e corretivos ficaram 30,6% mais caros. A valorização do ácido fosfórico também onerou os suplementos minerais, que tiveram reajuste anual de 12,75%. Para os pecuaristas recriadores, a aquisição de bezerros, que representa o maior desembolso efetivo nesse sistema, ficou 20,11% mais caro na média ponderada dos 10 estados da pesquisa em 2007. As sementes forrageiras utilizadas na formação e na reforma das pastagens foram reajustadas em 9,29% no ano. A valorização desse insumo, em especial, é um forte indicativo da retomada dos investimentos nesse setor.
Evolução acumulada do Custo Operacional Total (COT), Efetivo (COE) e da arroba do boi gordo em 2004, 2005, 2006 e 2007. 45.0% 35.0% 25.0% 15.0% 5.0% -5.0% 2004 2005 2006 2007-15.0% COE COT Arroba do boi gordo Fonte: Cepa/USP - CNA INSUMOS Maior alta anual: Adubos e corretivos: 27,16% Quanto representa nos custos totais: 5,83% Quem é prejudicado? Principalmente pecuaristas do Rio Grande do Sul, 41,64%, do Paraná, 28,59% e de São Paulo, 33,93%. Menor aumento anual: Insumos para reprodução animal: 0,26% Quanto representa nos custos: 0,57% Quem é beneficiado? Pecuaristas paulistas. REGIÕES Onde os custos (efetivos) aumentaram mais em 2007? São Paulo: 19,1% Quanto representa do rebanho amostrado? 8% Onde a arroba valorizou menos em 2007? Rio Grande do Sul: 27,29% Onde os custos (efetivos) estão mais controlados em 2007? Tocantins: 6,15% Quanto representa do rebanho amostrado? 4,7% Onde a arroba subiu mais em 2007? Pará, 46,61%, Tocantins, 41,5% e em Goiás 38,38%
MELHORIA DA RENTABILIDADE AINDA NÃO É SUFICIENTE Depois de um longo período de apreensão, o pecuarista está sanando as perdas de rentabilidade mensuradas por esta pesquisa. Os resultados de 2007, porém, ainda não são suficientes para ressarcir as perdas de quatro anos anteriores período desta pesquisa. No acumulado de março de 2003 a dezembro de 2007, o Custo Operacional Total subiu 47,5% enquanto a arroba, 23,1% - média ponderada dos estados da pesquisa. Em Tocantins, onde o aumento do custo tem sido mais controlado em 2007, acumulou alta de 7,11% no COT e a arroba do boi gordo teve a segunda maior valorização da pesquisa, de 41,5% no ano. No Pará, estado com a maior valorização da arroba em 2007, de 46,61%, o custo de produção (COT) aumentou 10,5%. Em Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, estados que detêm juntos 30,4% do rebanho abrangido por esta pesquisa, o custo operacional total e a receita tiveram comportamentos semelhantes. O COT subiu cerca de 10% e a arroba, entre 36 e 37%, em ambos estados. Já no Rio Grande do Sul, Rondônia e principalmente em São Paulo e Paraná, a rentabilidade melhorou bem menos que nos demais estados da pesquisa. Os pecuaristas paulistas e paranaenses sofreram com os aumentos do custo de produção bem acima da média geral. Em São Paulo, estado recordista em encarecimento da produção em 2007, o custo operacional total subiu 17,66% e quase 20% quando considerados apenas os desembolsos efetivos (COE). No Paraná, COE e COT subiram 14% e 15,06%, respectivamente, nesse período. Variações dos Preços dos Principais Insumos da Pecuária de Corte Média Ponderada para GO, MT, MS, PA, RO, RS, MG, PR, TO e SP Ponderação Variação acumulada do COT dezembro/07 jan/07 - dez/07 dezembro/07 Combustíveis e Lubrificantes 3.15% 1.03% 0.61% Adubos e Corretivos 5.95% 30.60% 2.71% Sementes forrageiras 4.55% 9.29% -0.24% Suplementação Mineral 14.44% 12.75% 3.23% Medicamentos - Vacinas 1.52% 0.57% 0.16% Medicamentos - Controle Parasitário 1.03% 3.35% 0.53% Medicamentos - Antibióticos 0.51% 6.31% 1.06% Medicamentos em geral 0.57% 15.83% 0.66% Insumos para reprodução animal 0.57% 0.11% -0.14% Insumos para construção/manutenção de cercas 1.12% 5.65% -0.07% Construções em geral 9.04% 6.83% 0.99% Máquinas e implementos agrícolas 7.74% 7.30% 5.62% Serviço terceirizado de máquinas pesadas 3.35% 0.82% 0.00% Compra de animais bezerro 12.17% 20.11% 3.56% Mão-de-obra 22.16% 9.26% 0.00% Fonte: Cepa/USP CNA
Variação Mensal e Acumulada COE (1) COT (2) Boi Gordo R$/@ Ponderações Estados dezembro-07 jan/07 dez/07 dezembro-07 jan/07 dez/07 dezembro-07 jan/07 dez/07 Goiás -0.02% 12.47% -0.01% 12.40% 2.46% 38.38% 12.4% Minas Gerais 0.72% 9.72% 1.02% 10.77% 3.40% 33.55% 12.7% Mato Grosso 3.02% 11.27% 2.69% 10.32% -1.00% 37.66% 15.8% Mato Grosso do Sul 0.82% 10.07% 0.85% 10.98% -0.53% 36.15% 14.5% Pará 1.43% 9.94% 1.31% 10.50% 4.12% 46.61% 10.7% Paraná 1.52% 14.00% 1.89% 15.06% 1.80% 33.22% 6.0% Rio Grande do Sul 1.40% 8.02% 1.44% 9.41% 0.48% 27.29% 8.5% Rondônia 0.74% 8.97% 0.72% 14.11% -1.09% 33.13% 6.7% São Paulo 1.24% 19.10% 1.17% 17.66% 1.72% 38.13% 8.0% Tocantins 0.72% 6.15% 1.22% 7.11% -1.02% 41.50% 4.7% Brasil* 1.23% 11.02% 1.25% 11.64% 1.11% 36.74% *- Referente a 81,38% do rebanho nacional segundo o Rebanho Efetivo Bovino PPM / IBGE 2005. 1 - Custo Operacional Efetivo (COE) Fonte: Cepea/USP-CNA 2 - Custo Operacional Total (COT) Variação dos Principais Indicadores Indicadores IGP-M 1.76% Acumulado_Janeiro IGP-M 7.75% Taxa de Câmbio 1.13% dezembro-07