A MEDIÇÃO DE DESEMPENHO COMO SUPORTE PARA O PROCESSO DE MELHORIA CONTÍNUA: UM ESTUDO DE CASO EM UMA EMPRESA BRASILEIRA

Documentos relacionados
A Influência da Lógica de Gestão Organizacional na Evolução do Sistema de Medição de Desempenho

A MEDIÇÃO DE DESEMPENHO COMO BASE PARA A EVOLUÇÃO DA MELHORIA CONTÍNUA: UM ESTUDO TEÓRICO

Gestão da Tecnologia da Informação

Capítulo 8 Análise crítica do desempenho global

Profª Valéria Castro V

Universidade de São Paulo Faculdade de Economia Administração e Contabilidade. Balanced Scorecard

Gestão de Cultura e Clima Organizacional

Fatores que afetam o suporte da medição de desempenho para o processo de melhoria contínua: estudos de caso em empresas certificadas ISO 9001

BSC. Aula de hoje. Balanced Scorecard. Planejamento Estratégico.

(ADMINISTRAÇÃO GERAL. Organização, Sistemas e Métodos. Gestão de Processos Parte 4. Prof.ª Karen Estefan Dutra

Analista de Negócio 3.0

3) Qual é o foco da Governança de TI?

SLA Aplicado ao Negócio

MEDIÇÃO DE DESEMPENHO VIA BSC

Autoria: Raïssa Alvares de Matos Miranda, Claudio de Souza Miranda

FACULDADE DE TECNOLOGIA SENAC-GO. Projeto Integrador

Promover a competitividade e o desenvolvimento dos pequenos negócios e fomentar o empreendedorismo para fortalecer a economia nacional

Balanced ScoreCard Professor Flávio Toledo

Responsabilidade da Direção

Uma proposta de sistema de medição de desempenho aplicado à área de desenvolvimento de sistemas em empresas de serviços financeiros

AO aula 12 GESTÃO E BENCHMARKING. Prof. Wilson LAPO

Disciplina: SEP0701 Gestão da Qualidade Prof. Luiz C. R. Carpinetti Monitor: Lucas D. Calache

Marli de Oliveira Macedo¹, Michele Rodrigues². Introdução

Documento de Referência Programa Sebrae de Excelência

Gestão da Produção. Análise SWOT Balanced Scorecard Mapa Estratégico. Prof. Dr. Marco Antonio Pereira Empresas Classe Mundial

Ementas. Certificate in Business Administration CBA

ISO 9001: Abordagem de processo

DIFUSÃO DO BALANCED SCORECARD: UM ESTUDO DE CASO

Interpretação da norma NBR ISO/IEC 27001:2006

BSC. deve contar a história da estratégia, começando. relacionando-se depois à seqüência de ações que precisam ser tomadas em relação aos

Gestão da Tecnologia da Informação

Gerencial Industrial ISO 9000

Processos do Projeto 1

Universidade de São Paulo Faculdade de Economia Administração e Contabilidade. Balanced Scorecard

Sistema integrado qualidade nos negócios (ISO 9001 PNQ 2003)

ITIL v3 Desenho de Serviço Parte 1

Medir é importante? O que não é medido não é gerenciado.

Proposta de alinhamento de modelos conceituais para melhoria contínua dos processos da manufatura

Gestão Estratégica da Qualidade

2. MODELO EVOLUCIONÁRIO Incerteza Adaptação aos ambientes interno e externo

A Busca da Eficiência. BSC Balanced Scorecard

Plataforma da Informação. Fundamentos da Excelência

Gerenciamento Objetivo de Projetos com PSM

AULA 02 Qualidade em TI

Indicadores de Desempenho

Gestão de pessoas e desempenho organizacional

O desafio da profissão da qualidade

CERTIFICAÇÃO ISO 9001:2015 E MEDIÇÃO DE DESEMPENHO: BENEFÍCIOS E DESAFIOS PARA IMPLANTAÇÃO DE UM SISTEMA DE GESTÃO ROBUSTO

Definição / Abordagem de Processos

MODELO PARA IDENTIFICAÇÃO DE AÇÕES DE MELHORIA DE DESEMPENHO ALINHADAS À ESTRATÉGIA

NAGEH Pessoas. Eixo: Capacitação e Desenvolvimento de Pessoal 28/09/2015. Compromisso com a Qualidade Hospitalar

Treinamento e-learning. Interpretação e implantação da ISO 9001:2015

Agenda da aula. 1 Indicadores de desempenho. 2 Desenvolvendo indicadores de desempenho para toda a empresa

Sistemas de Medição de Desempenho

DICAS DE COMO CONSTRUIR UM PLANEJAMENTO DE MARKETING DE SUCESSO

Por Carolina de Moura 1

Gestão Estratégica. 7 Implementação da Estratégica - BSC. Prof. Dr. Marco Antonio Pereira

BSC - Balanced Scorecard

AULA 8 - MONITORAMENTO E CONTROLE

Aula 7 Monitoramento e Avaliação em OSFL

PROGRAMA DE MONITORAMENTO, AVALIAÇÃO, CONTROLE E ATUALIZAÇÃO DO PLANO

Tema 3. Planejamento Estratégico na Administração Pública. Ricardo Naves Rosa

Mestrado em Engenharia Alimentar. ISO (Métodos Quantitativos em melhoria de processos) Six Sigma

GESTÃO DE CLASSE MUNDIAL. José Goldfreind DIRETOR LEAN SEIS SIGMA

Descubra qual o nível de maturidade do seu Catalogo de Serviço? Valtomir Santos (Kid)

A Tecnologia na Gestão de Talento e Performance

PROPOSTA DE INDICADORES DE DESEMPENHO PARA A CADEIA EÓLICA DO BRASIL. Haroldo Coutinho Varella Filho UFRN Universidade Federal do Rio Grande do Norte

Capacitação ForRisco. Estudos de Caso e Metodologia ForRisco

Modelagem de Processos

Mostra-se que a Petrobras evoluiu em sua maneira de Planejar o futuro de modelos informais, baseados em diretrizes do Governo Federal, até atingir o

Gestão da Qualidade. Profa. Ms. Ana Cabanas 02/09/ Aula 2 - QUALIDADE TOTAL QUALIDADE TOTAL QUALIDADE TOTAL

MEDIDAS DE DESEMPENHO EM GESTÃO DE OPERAÇÕES: Uma visão para o futuro Barbosa, Romerytto Gledson da Silva Soares 1

DESENVOLVIMENTO DE UM SISTEMA DE MEDIÇÃO DE DESEMPENHO PRODUTIVO PARA INDÚSTRIAS MOVELEIRAS

Aplicação Prática do Balanced Scorecard

Portfólio de Produtos...better companies for a better world

Planejamento e Gerenciamento Estratégico. Balanced Scorecard

COMPORTAMENTAL. Turma 1: 25 de abril e 02 de maio / Turma 2: 27 de abril e 04 de maio

O DMAIC é um método sistemático, baseado em dados e no uso de ferramentas estatísticas, para o desenvolvimento dos projetos Lean Seis Sigma.

SLA Aplicado ao Negócio

ADMINISTRAÇÃO DE SISTEMAS DE INFORMAÇÃO. Unidade VI Planejamento Estratégico de TI. Luiz Leão

Gestão de Talentos Tupy RH -Projetos e Processos

Qual o nível de maturidade da Gestão de Configuração e Eliminação de Problemas na sua TI? Descubra nesta palestra!

Rio de Janeiro 16/08/2011. Modelo de Excelência da Gestão (MEG) para Micro e Pequenas Empresas. Francisco Teixeira Neto

Módulo Contexto da organização 5. Liderança 6. Planejamento do sistema de gestão da qualidade 7. Suporte

PROCESSO DE IMPLEMENTAÇÃO DE ESTRATÉGIAS: O CASO DO POSTO ANDRIOLLI 1

Balanced scorecard na gerência de projetos

Armadilhas na gestão do processo de melhoria contínua numa pequena empresa: um estudo de caso

Aula 14. Controle Total da Qualidade EAD 762

A força para transformar riscos em resultados

Balanced Scorecard. Daciane de Oliveira Silva. Referências: Livro Estratégias de Empresas: Lobato et.al (Cap. 7)

Trata-se do processo de auditoria dos requisitos e da qualidade, assim como dos resultados das medições de controle de qualidade, de maneira a

MONITORAMENTO E AVALIAÇÃO APSUS

Orçamento Empresarial Unidade 01

CSC Shared Services. Módulo 2 A Engrenagem do Como Funciona. Texto e Consultoria de Alessandra Cardoso

Funções da Administração. Administrar é a tarefa de tomar decisões sobre recursos para atingir objetivos.

RAD1504 GESTÃO DA QUALIDADE I

O desafio da transformação pela excelência em gestão

Transcrição:

A MEDIÇÃO DE DESEMPENHO COMO SUPORTE PARA O PROCESSO DE MELHORIA CONTÍNUA: UM ESTUDO DE CASO EM UMA EMPRESA BRASILEIRA KLEBER TOLEDO GAMA (DEP/UFSCAR ) kleber_toledog@hotmail.com Roberto Antonio Martins (DEP/UFSCAR ) ram@dep.ufscar.br O conceito de melhoria contínua não é novo. Para muitos, a melhoria contínua pode ser visto como um modismo, para outros, pode ser vista como um meio para aumentar a competitividade das organizações. Nas últimas décadas, métodos e técnicas para a melhoria contínua foram desenvolvidas, tais como Total Quality Management, Lean Manufacturing, Seis Sigmas e Lean Seis Sigmas. É observado neste campo do conhecimento que pesquisas focam no desenvolvimento e aplicação de métodos e técnicas para a melhoria contínua. Portanto, o propósito deste artigo é investigar o uso do sistema de medição de desempenho no processo de melhoria contínua por meio de um estudo de caso longitudinal. O modelo teórico da Medição de Desempenho para Suportar a Evolução do Processo de Melhoria Contínua desenvolvido por Attadia e Martins é a base para o desenvolvimento desta investigação. Neste modelo há cinco estágios dos sistemas de medição de desempenho para a melhoria contínua. Um empresa Brasileira de manufatura com um processo estruturado de melhoria contínua foi selecionada como estudo de caso único. Para o estudo de acso, um protocolo preparado contendo três fases - visitas, análise documental e entrevistas para verificar como essa prática de gestão funciona. Com o estudo empírico, foi possível constatar que a medição de desempenho tem uma função fundamental no processo de melhoria contínua. Um aspecto que foi possível perceber no estudo de caso foi o uso da medição de maneiras diferentes pelas pessoas envolvidas no processo de melhoria contínua, assim como foi possível identificar com base no modelo de referência desenvolvido por Attadia e Martins, diferentes estágios da medição de desempenho na organização. Palavras-chaves: Sistema de Medição do Desempenho, Melhoria Contínua, Estudo de Caso

1. Introdução Nas últimas décadas, é notório no campo da Gestão de Operações o interesse sobre medição de desempenho e melhoria contínua. Por um lado, a medição de desempenho tem sido um dos desafios das organizações, pois ela precisa mostrar que as empresas estão no caminho certo e que suas ações permitam que seus objetivos sejam alcançados. Por outro lado, a busca pelo o aumento da competitividade forçam as empresas a revisarem antigos modelos de gestão,e comecem a adotar novas filosofias, como por exemplo, a melhoria contínua. Essa expressão vem se tornando popular nas últimas décadas e esta associada principalmente com o movimento da Qualidade Total e também presente em outras abordagens, como por exemplo, a Lean Production (ATTADIA; MARTINS, 2003). No campo da medição do desempenho é possível notar os esforços de acadêmicos em desenvolver modelos de sistemas de medição de desempenho para que os mesmos possam auxiliar as organizações na implementação de suas estratégias. Entre os pesquisadores sobre esse assunto, há aqueles que acreditam que a medição de desempenho pode suportar o processo de melhoria contínua (ATTADIA; MARTINS, 2003; NEELY, 1998). Dentro do contexto apresentado, o objetivo desse artigo é investigar como o uso da medição de desempenho pode suportar o processo de melhoria contínua por meio de um estudo de caso. Este trabalho está dividido em 3 partes. Na primeira parte é realizada uma revisão de pontos relevantes na literatura sobre a medição de desempenho e melhoria contínua e a relação entre esses dois temas. Ainda nessa seção será mostrado um modelo de referência que será usado no desenvolvimento do estudo de caso juntamente com outros aspectos relevantes identificados nessa revisão. Na segunda parte, será apresentado o estudo de caso que foi realizado em três fases em uma empresa de manufatura brasileira. E por fim, serão realizadas as considerações finais sobre essa pesquisa. 2. Revisão da literatura 2.1. Medição de desempenho 2

A palavra desempenho é amplamente usada em todos os campos da gestão e apesar de seu uso frequente, raramente seu significado é precisamente definido pelos autores (LEBAS; EUSKE, 2007). Neely et al. (1995), definem medição de desempenho como o processo de quantificar ação, onde a medição é o processo de quantificar ação que conduz ao desempenho. Para esses autores, medição de desempenho é um conjunto de indicadores usados para quantificar a eficiência e eficácia das ações, onde eficácia refere-se ao entregar as exigências dos clientes e eficiência é uma medida de quão economicamente os recursos da empresa foram utilizados para fornecer a satisfação do cliente. Franco-Santos et al. (2007), propõem cinco funções para um sistema de medição de desempenho monitorar progresso e medir desempenho; gestão da estratégia; comunicação; influenciar comportamento; e aprendizado e melhoria. Um bom sistema de medição de desempenho, para Kaplan e Norton (1997), deve ser coerente com a estratégia estabelecida, tendo medidas de desempenho alinhadas com a estratégia, sendo fundamental para a comunicação, disseminação e implementação dessa estratégia. O objetivo deste processo é fornecer um sistema de controle completo em que as estratégias corporativas e funcionais sejam desdobradas para todos os negócios, atividades, tarefas e todo o pessoal, em que feedbacks sejam obtidos por meio do sistema de medição de desempenho para capacitar as decisões e ações apropriadas. Para Neely et al. (1995), desenvolver um sistema de medição de desempenho é o processo de selecionar e organizar indicadores para medir a eficiência e a eficácia das ações do passado e do futuro. Segundo Neely et al. (1997), o uso é um dos elementos mais importantes de uma medida de desempenho, pois mostra que o ciclo gerencial se fecha devido a aceitação ou não do desempenho e quais serão as ações tomadas a partir das informações fornecidas pelos indicadores. 2.2. Melhoria contínua É possível entender a melhoria contínua como um processo de introdução de melhorias incrementais por toda a organização, com baixo investimento, pequenas melhorias, frequência 3

elevada e ciclos curtos de mudanças e por ser um conceito simples, a melhoria contínua tem se consagrado como uma das formas mais eficientes de aumentar a competitividade de empresas (BESSANT et al., 1994). Este conceito de melhoria contínua está relacionada à capacidade de resolução de problemas (BESSANT et al., 2001). Para Shiba et al. (1997), há três tipos de melhoria: controle de processo, melhoria reativa e melhoria proativa. Bessant et al. (2001), definiram cinco diferentes estágios para a melhoria contínua os quais são mostrados no Quadro 1. Quadro 1 Estágios da evolução da melhoria contínua Fonte: Bessant et al. (2001) Com esse modelo as organizações podem identificar em que nível de melhoria contínua se encontram e serve também como orientação para melhorar a capacidade do processo de melhoria contínua. 4

2.3. A função da medição de desempenho na melhoria contínua A medição de desempenho pode ser utilizada em seus diferentes níveis como parte da linguagem da melhoria contínua para induzir os membros da organização à ação em prol do alcance dos objetivos de melhoria em nível individual e organizacional (ATTADIA; MARTINS, 2003). Para Bititci et al. (1997), um dos componentes que um sistema de medição de desempenho deve ter é o foco na melhoria. Este sistema deve identificar as lacunas de melhoria e conjuntos de estratégias para cumprir os objetivos estratégicos. Os sistemas de medição de desempenho devem estimular a melhoria contínua e também deve haver o alinhamento dos objetivos organizacionais com todas as áreas e níveis da empresa de forma que os indicadores sejam utilizados por todos membros do grupo para que realizadas correções no desempenho (LEE; DALE, 1998). Para Bititci e Nudurupati (2002), a partir da perspectiva da melhoria contínua, um sistema de medição de desempenho deve auxiliar em: Identificar áreas chave que necessitam de melhorias; Diagnosticar e analisar as razões por trás do baixo desempenho; Planejar e implementar mudanças necessárias para melhorar desempenho de uma maneira quantificável ou mensurável; Monitorar os resultados para verificar se eles alcançaram os resultados esperados; Desenvolver um sistema de controle de ciclo fechado para promover a melhoria contínua. Tipicamente, há dois tipos de indicadores de desempenho lagging e leading. Indicadores do tipo lagging fornecem apenas uma história; indicadores leading permitem criar as condições para fomentar o desempenho (LEBAS; EUSKE, 2007). Nesse aspecto ambos indicadores são necessários, porém em um ambiente de melhoria contínua é necessário desenvolver indicadores leading, pois geralmente esses indicadores relacionam- 5

se aos inputs e outputs dos processos e necessitam ser monitorados para assegurar que o processo não sairá de controle (BITITCI; NUDURUPATI, 2002). Para direcionar a melhoria contínua, as equipes operacionais deveriam agir com o conjunto certo de indicadores lagging e leading para monitorar o desempenho de suas atividades e focar seus esforços de melhoria. A gestão deve assegurar que a ênfase seja dada ao desempenho futuro, ou seja, usar os indicadores leading para direcionar melhorias que resultariam em melhorias nos indicadores de desempenho lagging. Uma das atividades chave que causam impactos significantes na melhoria contínua é a definição dos indicadores de desempenho e a modelagem de seus interrelacionamentos (BITITCI; NUDURUPATI, 2002). Para analisar o desempenho é necessária uma análise integrada entre os diferentes indicadores de desempenho, examinando-os a partir de uma visão holística (NEELY; NAJJAR, 2006). 2.4. Medição de desempenho suportando a evolução da melhoria contínua um modelo teórico Attadia e Martins (2003), desenvolveram um modelo teórico que visa demonstrar como a medição de desempenho deve ser estruturada para suportar os diferentes estágios do processo de melhoria contínua. O modelo de medição de desempenho para suportar a evolução do processo de melhoria contínua foi proposto pelos autores a partir de uma revisão da literatura tendo como base o trabalho de Bessant et al. (2001), que define cinco estágios da evolução da melhoria contínua. Para cada um desses estágios, foram definidas características referentes a medição do desempenho e esse modelo é apresentado no Quadro 2. Attadia e Martins (2003), destacam que os estágios da melhoria contínua do modelo de Bessant et al. (2001) constituem-se em arquétipos genéricos e pode não traduzir a realidade vivida pelas empresas, pois cada uma tem a sua própria experiência em relação à melhoria contínua. Neste sentido, o modelo desenvolvido por Attadia e Martins (2003), também pode não representar também a realidade da medição de desempenho das organizações com processos de melhoria contínua. 6

3. Estudo de caso Essa pesquisa busca investigar de maneira empírica a relação entre a medição de desempenho e o processo de melhoria contínua. Para que isso, o método de pesquisa que será utilizado neste trabalho é o estudo de caso. A questão de pesquisa para este trabalho é: como na prática, a medição de desempenho pode suportar o processo de melhoria contínua? Quadro 2 Modelo de medição de desempenho para suportar a melhoria contínua Fonte: Attadia e Martins (2003) A revisão da literatura permitiu construir um referencial teórico de modo a identificar aspectos necessários que devam existir em um sistema de medição de desempenho de forma a apoiar a melhoria contínua. Além de alguns aspectos identificados, será utilizado o modelo 7

desenvolvido por Attadia e Martins (2003) como modelo de referência para a realização do estudo de caso. 3.2. Planejamento do estudo de caso Esse estudo de caso foi realizado em três fases para explorar a questão de pesquisa, as quais são resumidas no Quadro 3 e detalhadas nas próximas seções. Quadro 3 Fases na realização do estudo de caso Fonte: os autores 3.3. Fase 1 a empresa O objeto de estudo deste trabalho é uma empresa brasileira de grande porte que atua no setor metalmecânico. Atualmente essa empresa é líder em seu segmento de mercado. Há alguns anos, a empresa passou a enfrentar uma série de dificuldades, como por exemplo, crises econômicas, declínio de seus rendimentos, aumento da concorrência, perda da credibilidade perante os clientes devido aos atrasos na entrega e qualidade do produto,perda acentuada do retorno sobre o investimento e margens de lucro reduzidas. A organização também identificava processos ineficientes, desperdícios de recursos materiais e humanos, grandes estoques e pagamentos de multas ocasionados pelos atrasos nas entregas de produtos. Diante 8

desse contexto, a direção da empresa decidiu criar seu programa de melhoria contínua com o foco na eficiência dos processos, tendo como base o modelo da Produção Enxuta (Lean Production). O programa de melhoria da empresa dividiu a organização em unidades de melhoria contínua (UMC) para compreender e fazer a gestão por fluxos de valor. Para o funcionamento do programa, a empresa estabeleceu normas que devem ser utilizadas por todas as UMC. Esses requisitos definem níveis de evolução pelos quais uma UMC deve passar e em cada um desses níveis há exigências diferentes no que tange a medição do desempenho. Inicialmente, uma UMC deve identificar seus produtos, processos, clientes, entradas e fornecedores. Assim, as UMCs devem trabalhar numa relação cliente x fornecedor conforme demontrado na Figura 1. Figura 1 - a relação entre as unidades de melhoria contínua UMC Fornecedora UMC Cliente Fonte: os autores Essa relação apresentada na Figura 1 define o primeiro requisito quanto à medição de desempenho, pois cada UMC após identificar as expectativas das UMCs clientes, as quais deverão ser traduzidas em características que sejam mensuradas por indicadores de processos. Um outro requisito a ser atendido por uma UMC é a definição dos seus indicadores de resultados que obrigatoriamente devem atender a seis aspectos pessoas, meio ambiente e segurança, entrega, qualidade, financeiro e clientes. 3.4. Fase 2 análise documental 9

Nesta fase, foram analisadas as normas do programa de melhoria contínua que estabelecem os requisitos obrigatórios para a medição de desempenho. Nesse sentido, foram disponibilizadas três normas da empresa que definem os requisitos que devem ser utilizados e cumpridos por todas as UMCs da organização. São elas: Requisitos para a Excelência, Indicadores de Resultados e Gestão de Processos. A norma de requisitos para a excelência definem critérios que devem ser cumpridos pela UMC, entre eles há os que estabelecem os níveis de evolução com base nos indicadores de resultados, os quais são demonstrados no Quadro 4. Quadro 4 - requisitos quanto aos indicadores da matriz de resultados Fonte: os autores A norma de indicadores de resultados estabelece regras para definição dos indicadores de desempenho que são considerados como os principais resultados da UMC. Segundo a norma, os indicadores dessa matriz devem estar alinhados e desdobrados com os objetivos estratégicos da organização, além de regras para o cálculo das metas desses indicadores. A norma de gestão de processos tem entre seus requisitos a definição de indicadores de desempenho dos processos. Os indicadores dos processos também devem atingir percentuais pré-estabelecidos de suas metas, que são demonstrados no Quadro 5. Quadro 5 - requisitos quanto aos indicadores de processos Fonte: os autores A partir dessas análises, foi possível identificar os principais requisitos do programa de melhoria contínua quanto à medição de desempenho. 10

3.5. Fase 3 Entrevistas Para a realização das entrevistas, foram entrevistados dez empregados de diferentes UMCs da empresa. Para isso, foram definidos três grupos de entrevistados conforme mostrado na Tabela 1. Tabela 1 - grupos de entrevistas Fonte: os autores Com base no referencial teórico, foi desenvolvido um questionário para as entrevistas com perguntas abertas e fechadas. Essas perguntas foram desenvolvidas para analisar a percepção dos indíviduos quanto ao papel da medição do desempenho no suporte à melhoria contínua. As perguntas são para as entrevistas são: Como as melhorias de processos são identificadas? Como os indicadores de desempenho podem auxiliar na evolução da melhoria contínua? Como são definidos os principais indicadores de desempenho utilizados pelas UMCs? Como é garantido que os mesmos são relevantes para a organização? São analisadas as relações de causa e efeito entre os indicadores no momento da definição dos mesmos? Os indicadores permitem identificar as possíveis causas de variações dos processos? Uma vez que os indicadores são atualizados, qual o uso que se faz com a informação fornecida pelos indicadores de desempenho? Todas as pessoas envolvidas na UMC entendem os indicadores de desempenho que são utilizados? Como as equipes utilizam as informações fornecidas pelos indicadores? Quais os tipos de indicadores utilizados na UMC leading ou lagging? Se são identificados indicadores de ambos os tipos, é possível identificar relações de causa e efeito entre eles? 11

Outras duas perguntas foram realizadas, porém para que essas pudessem ser respondidas, foram dadas alternativas aos respondentes, pois o objetivo era verificar os estágios do modelo desenvolvido por Attadia e Martins (2003) sob a perspectiva dos indivíduos. As perguntas foram as seguintes: Qual é a principal finalidade dos indicadores de desempenho utilizados na gestão da UMC? Quais são as principais características dos indicadores de desempenho utilizados na gestão da UMC? Para essas últimas perguntas, foram dadas seis alternativas, sendo cinco com base no modelo da medição de desempenho para a melhoria contínua e uma alternativa denominada de outras, no caso do respondente não identificar uma alternativa mais adequada a sua percepção. Para a primeira pergunta Como as melhorias de processos são identificadas? foi possível constatar que a maioria dos entrevistados definem ações para a melhoria de processos a partir dos resultados dos indicadores de desempenho. Além dos resultados de indicadores, os entrevistados citaram outras origens para as melhorias como necessidade de reestruturação de processos, desperdícios que são observados pelas equipes e também a necessidade de aumentar a satisfação das UMCs clientes. Todavia, três entrevistados não citaram a medição de desempenho como uma fonte de informação para a identificação de melhorias de processos. Para a pergunta Como os indicadores de desempenho auxiliam na evolução da melhoria contínua? a maioria dos respondentes entende que o monitoramento dos indicadores de desempenho permite identificar os processos que necessitam de ações de melhorias e também mostrar que as ações realizadas estão refletindo em resultados melhores. A pergunta Como são definidos os principais indicadores de desempenho utilizados pelas UMCs? Como é garantido que os mesmos são relevantes para a organização e que há alinhamento com outros níveis da organização? Quanto à definição dos indicadores foi possível verificar que a prática não é uniforme. Para alguns, os indicadores são definidos com base nas expectativas dos clientes. Para outros, deve-se buscar atender as metas da alta direção. Ao questionar sobre a relevância dos indicadores, foi possível avaliar que há uma sistemática para verificar e garantir a relevância dos indicadores. 12

Para a pergunta São analisadas as relações de causa e efeito entre os indicadores no momento da definição dos mesmos? a maioria dos entrevistados respondeu que no momento da definição dos indicadores não são analisadas as relações de causa e efeito entre os indicadores. Entre as respostas está que a percepção da relação entre os indicadores surge com o tempo a partir da experiência e das análises dos resultados dos indicadores. A pergunta Os indicadores permitem identificar as possíveis causas de variações dos processos? teve como objetivo identificar a existência de indicadores leading. Os entrevistados responderam que os indicadores não permitem identificar as causas que levaram à variação, destacando-se assim a ausência de indicadores desse tipo. Para verificar o ciclo completo de gestão, tendo como fim as definições de ações para melhorar o desempenho dos processos, foi realizada a pergunta Uma vez que os indicadores são atualizados, qual o uso que se faz com a informação fornecida pelos indicadores de desempenho? a qual os entrevistados confirmaram que usam essas informações para definir ações necessárias visando a melhoria do desempenho. Ao responderem essa questão, surgiu o efeito que a meta tem sobre a tomada de decisão, pois mesmo que sejam identificadas oportunidades para melhorar os resultados dos indicadores, se estes estiverem atingindo as metas que atendam ao programa de melhoria, frequentemente é tomada a decisão de não realizar ações que possam melhorar ainda mais esses resultados. Quanto à pergunta Todas as pessoas envolvidas na UMC entendem os indicadores de desempenho que são utilizados? Como as equipes utilizam as informações fornecidas pelos indicadores? as respostas demontraram que as práticas de gestão não são homogêneas na organização. A maioria dos entrevistados respondeu que não são todas as pessoas da UMC que entendem os indicadores que são utilizados. Surgiu um aspecto para essa pergunta: o efeito que o pagamento das recompensas pode gerar nos empregados quando esses recebem um baixo valor do prêmio, gerando assim o interesse em entender os indicadores, Ao realizar a pergunta Quais os tipos de indicadores utilizados na UMC leading ou lagging? Se são identificados indicadores de ambos os tipos, é possível identificar relações de causa e efeito entre eles? os entrevistados identificaram que a maior parte dos indicadores é apenas para constatar o resultado e não para monitorar as variações de processos que comprometem os resultados principais da UMC. Duas UMCs foram exceções ao responderem ter indicadores dos dois tipos. 13

Para as próximas duas perguntas Qual é a principal finalidade dos indicadores de desempenho utilizados na gestão da UMC? e Quais são as principais características dos indicadores de desempenho utilizados na gestão da UMC? foram dadas alternativas de modo que os entrevistados pudessem escolher mais de uma e foi solicitado que os mesmos justificassem o motivo pela escolha das mesmas. A quantidade de respostas da pergunta referente a principal finalidade dos indicadores estão resumidas na Tabela 2. Tabela 2 - respostas quanto as finalidades da medição de desempenho Fonte: os autores As resposta concentraram-se em três estágios do modelo de referência Melhoria Contínua Estruturada, Melhoria Contínua Orientada e Capacidade Total de Melhoria Contínua. Durante as entrevistas, por mais que a percepção de que a finalidade dos indicadores era controlar processos ou implementar melhorias reativas, para quatro entrevistados o objetivo principal dos indicadores era mudar e transformar o negócio os quais os mesmos estão envolvidos. Outro aspecto relevante identificado ao realizar essa pergunta, foi que as características das atividades e processos da UMC podem interferir na percepção dos entrevistados quanto a finalidade dos indicadores de desempenho. As respostas da pergunta referente as principais características dos indicadores de desempenho estão resumidas na Tabela 3. Semelhante a pergunta anterior, a percepção dos entrevistados é que as características do sistema de medição de desempenho utilizado pela empresa concentram-se na existência de um 14

conjunto de indicadores voltados para o controle de atividades e dos resultados dos processos e indicadores alinhados com outros níveis organizacionais com a finalidade de implementação de melhorias reativas. Tabela 3 - respostas quanto as características da medição de desempenho Fonte: os autores 3.6. Análise do estudo de caso O estudo de caso permitiu analisar a função da medição de desempenho em um programa de melhoria contínua. Nas visitas realizadas nas diferentes UMCs foi possível verificar que o programa foi implementado em toda a organização ficando evidente que as normas que definem os requisitos do programa e medição de desempenho são utilizadas pelas UMCs. Foi possível identificar que os indicadores de desempenho são definidos sem que haja uma análise de causa e efeito entre eles. Outro ponto é a cobrança pela sustentação dos resultados por períodos de tempo conforme o nível de evolução o que pode levar à questões comportamentais e a escolha por não revisar a relevância dos indicadores para a organização, principalmente por ter surgido a relação entre indicadores de desempenho e o pagamento de recompensas. Notou-se também que o uso da medição de desempenho não é homogêneo pelos empregados, assim como as percepções quanto às funções da medição de desempenho 15

são diferentes, o que foi possível perceber por meio das últimas perguntas das entrevistas que foram resumidas nas Tabelas 2 e 3. Com relação aos indicadores de desempenho, também foi possível observar que há oportunidades de melhorias no que tange a utilização de indicadores leading, pois por definição, esses indicadores podem propiciar mais facilmente a identificação de problemas e as causas de variações dos processos. Com base no modelo de evolução de Attadia e Martins (2003) e nas respostas das entrevistas, constatou-se que a medição da organização concentra-se nos estágios Melhoria Contínua Estruturada e Melhoria Contínua Orientada. Contudo, a percepção das pessoas permeiam diferentes características e finalidades da medição de desempenho, podendo isso ser caracterizado pelo modelo de gestão utilizado pelas lideranças e também por características das atividades e processos das áreas da organização, surgindo assim, uma oportunidade de aprofundamento dessa pesquisa. 4. Conclusões Este artigo teve como objetivo investigar a relação existente entre a medição de desempenho e processo de melhoria contínua. O relacionamento entre esses dois constructos de pesquisa foi estabelecido pelo referencial teórico e foi possível confirmar essa relação por meio da aplicação do estudo de caso. O estudo de caso permitiu observar que a medição de desempenho é um dos aspectos que promovem a melhoria contínua e sua função é fundamental para identificar processos que necessitam de ações de melhoria, evidenciando que a medição de desempenho pode suportar a melhoria contínua. Todavia alguns aspectos precisam ser considerados e há a necessidade de pesquisas mais aprofundadas no que tangem o fator comportamental a partir da utilização dos indicadores e o estabelecimento de metas, características funcionais de áreas das empresas que podem interferir no uso da medição de desempenho. Foi possível verificar que o modelo teórico de Attadia e Martins pode ser usado como referência para avaliar a medição do desempenho e o processo de melhoria contínua,, porém o mesmo define as funções, finalidades e características de maneira genérica, também sendo necessário que pesquisas sejam realizadas para refiná-lo. Essa pesquisa tem como restrição a 16

generalização dos resultados, sendo necessário que mais estudos empíricos sejam realizados para estudar o papel da medição de desempenho no contexto da melhoria contínua. REFERÊNCIAS ATTADIA, Lesley Carina do L.; MARTINS, Roberto Antonio. Medição de desempenho como base para a evolução da melhoria contínua. Revista Produção, v. 13, n. 2, p. 33-41. 2003. BESSANT, J.; CAFFYN, S.; GILBERT, J.; HARDING, R., WEBB, S. Rediscovering continuous improvement. Technovation, v. 14, n. 10, p. 17-29. 1994. BESSANT, John; CAFFYN, Sarah; GALLAGHER, Maeve. An evolutionary model of continuous improvement behavior. Technovation, v. 21, p. 67-77. 2001. BITITCI, Umit S.; CARRIE, Allan S.; MCDEVITT, Liam. Integrated performance measurement systems: a development guide. International Journal of Operations and Production Management, v. 17, n. 5, 522-534. 1997. BITITCI, Umit S.; NUDURUPATI, Sai S. Driving continuous improvement. Manufacturing Engineer, n. 81, p. 230-235. 2002. FRANCO-SANTOS, Monica; KENNERLY, Mike; MICHELI, Pietro; MARTINEZ, Veronica; MASON, Steve; BERNARD, Marr; GRAY, Dina; NEELY, Andrew. Towards a definition of a business performance measurement system. International Journal of Operations and Production Management, v. 27, n. 8, 784-801. 2007. KAPLAN, Robert S.; NORTON, David P. A estratégia em ação: Balanced Scorecard. Rio de Janeiro: Campus, 1997. LEE, R.; DALE, B. Policy deployment: an examination of the theory. International Journal of Quality and Reliability Management, v. 15, p. 520-540. 1998. LEBAS, Michel J., EUSKE, K. A conceptual and operational delineation of performance. In: NEELY, Andy (Org.) Business performance measurement - unifying theories and integrating practice. Cambridge: Cambridge University Press, 2007. 125-140. NEELY, Andy; AL-NAJJAR, M. Management learning not management control: the true role of performance measurement. California Management Review, v. 48, p. 101-114. 2006. NEELY, Andy; RICHARDS, Huw; MILLS, John; PLATTS, KEN; BOURNE, Mike. Designing performance measures: a structured approach. International Journal of Operations and Production Management, v. 17, n. 11, 1131-1152. 1997. 17

NEELY, Andy; GREGORY, Mike; PLATTS, Ken. Performance measurement system design a literature review and research agenda, International Journal of Operations and Production Management, v. 15, n. 4, 80-116. 1995. SHIBA, S.; GRAHAM, A.; WALDEN, D. TQM: quatro revoluções na gestão da qualidade. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997. 18