Setor de Recursos Extraordinários e Especiais Criminais Modelo da Tese nº 320



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Transcrição:

OBS: Na jurisprudência citada, sempre que não houver indicação do tribunal, entenda-se que é do Superior Tribunal de Justiça. Índices Ementas ordem alfabética Ementas ordem numérica Índice do CD Tese 320 CORRUPÇÃO ATIVA. EMBRIAGUEZ VOLUNTÁRIA. DOLO. CARACTERIZAÇÃO A embriaguez voluntária não afasta o elemento subjetivo do crime de corrupção ativa. (D.O.E., 11/02/2010, p. 64) 1

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DA SEÇÃO CRIMINAL DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO, nos autos do HABEAS CORPUS Nº 990.09.096975-0, comarca de Santos, em que figuram como impetrantes R.T.N. E P.L.Y. e como paciente O.B.V.J., vem à presença de Vossa Excelência, com fundamento no art. 105, inciso III, alínea a, da Constituição Federal; art. 541 do Código de Processo Civil; e art. 26 da Lei nº 8.038/90, interpor RECURSO ESPECIAL para o Colendo SUPERIOR TRIUBNAL DE JUSTIÇA, pelos seguintes motivos: 1 RESUMO DOS AUTOS 2

O.B.V.J. foi denunciado perante a 5ª Vara Criminal da comarca de Santos (autos nº 195/09), por infração ao art. 333, caput, do Código Penal, porque, nas circunstâncias de tempo e fato descritas na denúncia, ofereceu vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo a omitir ato de ofício. Segundo a denúncia (fls. 13/15), Odair envolveu-se em um acidente de trânsito e policiais militares foram acionados para comparecer no local, quando encontraram um automóvel da marca Peugeot, placa DXQ 8879, dirigido por aquele, colidido com o poste de sinalização do canteiro central, após ter derrubado, também, duas placas de propaganda. Como o motorista apresentava sinais de embriaguez, o miliciano Walter Tadeu Martins solicitou que o mesmo fizesse o teste do bafômetro, porém o mesmo se recusou e ainda perguntou ao policial se existia alguma maneira de resolver a situação. O miliciano respondeu que não e avisou a Odair que seria levado ao Distrito Policial. Neste momento, Odair ofereceu ao policial a quantia de R$ 2.000,00 (dois mil reais) para aliviar a situação. Em razão disso, Odair foi preso em flagrante. A denúncia foi recebida (fls. 161). 3

Os advogados R.T.N. e P.L.Y. impetraram um pedido de habeas corpus em favor de O.B.V.J., apontando como autoridade coatora o Meritíssimo Juiz de Direito (fls. 2/12). A autoridade impetrada prestou suas informações (fls. 135/137). A douta Procuradoria de Justiça opinou pela denegação da ordem (fls. 164/168). Contudo, a Egrégia 12ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, por votação unânime, concedeu a ordem de habeas corpus, convalidando a liminar concedida, para trancar a ação penal, por falta de justa causa, de conformidade com o voto do relator Des. Vico Mañas (fls. 177/180), a seguir transcrito: Os advogados R.T.N. e P.L.Y. impetram habeas corpus, com pedido de liminar, em favor de O.B.V.J., apontando como autoridade coatora o MM. Juiz de Direito da 5ª Vara Criminal da Comarca de Santos. Alegando falta de justa causa, pretendem o trancamento de ação penal em que se imputa ao paciente a prática do delito de corrupção ativa, já que configurada hipótese de crime impossível. A liminar foi deferida apenas para sobrestar o andamento do feito (fl. 126). 4

A autoridade apontada como coatora prestou informações (fls. 135/137), fornecendo documentação pertinente. A D. Procuradoria da Justiça opina pela denegação da ordem. É o relatório. Segundo a denúncia, o paciente, após envolver-se em acidente de trânsito, teria oferecido R$ 2.000,00 aos policiais que atenderam a ocorrência, para que deixassem de praticar ato de ofício. Em visível estado de embriaguez, não aceitou realizar o teste do bafômetro e, por isso, pretendiam levá-lo à delegacia. No entanto, peças do inquérito e documentação ora juntada aos autos pelos impetrantes demonstram que o paciente não dispunha da importância oferecida. Tal fato, aliado ao estado de completa embriaguez do acusado, circunstância comprovada por exame clínico (fl. 54), indica que nem ao menos em tese se caracterizou o delito de corrupção ativa, pois desprovida de seriedade a oferta. Nesse sentido, a jurisprudência tem ressaltado que, se a promessa feita pelo agente ao funcionário público era absolutamente inviável e impossível de efetivar-se, não se configura o crime (TJRJ, RT 565/352). Este E. Tribunal, na mesma linha, já decidiu que, embora, delito unissubsistente e formal, a aperfeiçoar-se com o simples oferecimento ou promessa de vantagem indevida, a corrupção ativa reclama seja essa oferta ou promessa, além de certa, factível em relação ao agente e idônea de molde a agredir a consciência do funcionário (JTJ 240/291). Ademais, o crime de corrupção ativa exige dolo específico, ou seja, consciência e vontade de oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício. 5

Ora, parece claro que assim não age aquele que, em estado de absoluta embriaguez e depois de envolver-se em acidente de trânsito, procura se safar de abordagem policial, prometendo vantagem impossível de ser efetivada no momento. Por isso, afirma-se que, na integração do delito de corrupção ativa, o dolo específico não se compadece com o estado de embriaguez do agente (RT 467/321). Vale ressaltar que, com o entendimento ora esposado, não se está a negar vigência ao art. 28, II, do Código Penal, segundo o qual a embriaguez voluntária ou culposa não exclui a culpabilidade do agente, mas sim se reconhecendo que, no caso, a circunstância interferiu na própria tipicidade da conduta, pois ausente o indispensável elemento subjetivo para a configuração do crime. Assim, visualizando-se de pronto a atipicidade do comportamento imputado, de rigor o trancamento da ação penal, por falta de justa causa. Frente ao exposto, convalidada a liminar, concede-se a ordem para, reconhecida a falta de justa causa, trancar a ação penal, cancelada, por conseguinte, a determinação de indiciamento do paciente. Assim decidindo, a douta Corte Estadual contrariou ao disposto nos artigos 28, II, e 333, caput, ambos do Código Penal. 6

2 contrariedade à lei federal Assim dispõem os artigos 28, II, e 333, caput, do Código Penal: Art. 28. Não excluem a imputabilidade penal:... II a embriaguez, voluntária ou culposa, pelo álcool ou substância de efeitos análogos. Corrupção ativa Art. 333. Oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício. 7

O núcleo do tipo do art. 333 do CP é oferecer ou prometer vantagem indevida. Na primeira conduta, há a apresentação desta, enquanto na segunda ação o agente obriga-se com uma ação futura. Para a configuração do delito, não se exige que o funcionário público aceite a proposta. Mesmo que este a repila, haverá a corrupção ativa sem a passiva (cf. MAGALHÃES NORONHA, Direito Penal, São Paulo, ed. Saraiva, vol. 4, 17ª ed., atualizada por Dirceu de Mello e Eliana Passarelli Lepera, 1986, p. 319). A corrupção ativa é considerada pela doutrina um delito formal, isto é, consuma-se com o ato de oferecer ou prometer vantagem indevida, desde que o funcionário público tome conhecimento direto ou indireto da proposta (cf. MAGALHÃES NORONHA, Direito Penal, ob. Cit., p. 319; DAMÁSIO E. DE JESUS, Direito Penal, São Paulo, ed. Saraiva, vol. 4, 12ª ed., p. 234; CEZAR ROBERTO BITENCOURT, Tratado de Direito Penal, Parte Especial, São Paulo, ed. Saraiva, vol. 4, 2004, p. 481); MIRABETE, Manual de Direito Penal, São Paulo, ed. Atlas, vol. 3, 2005, 20ª ed., atualizado por Renato N. Fabbrini, p. 385). Como bem explica DAMÁSIO E. DE JESUS (cf. Direito Penal, ob. Cit. p. 234), o tipo só menciona o comportamento do agente, sem fazer menção ao resultado visado. 8

Por tais motivos, não se justifica o trancamento da ação penal, porque o recorrido não trazia consigo (supostamente) o que havia oferecido aos policiais. O delito se consuma com a oferta ou promessa da vantagem ilícita, independentemente se esta se concretiza, com o aceite do funcionário público e a sua efetiva entrega. O delito é formal, e não material. Aliás, se fosse imprescindível para a caracterização do delito de corrupção a pretérita posse da vantagem ofertada, não existiria a figura da promessa, quando o agente se compromete com uma ação futura em benefício do servidor público. Nesse sentido a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça já se posicionou: ARTIGO 333 DO CÓDIGO PENAL. - O crime de corrupção ativa é formal. Hipótese que afasta a impossibilidade do crime. - Recurso especial que recebeu provimento. (REsp 277.067/DF, Rel. Ministro FONTES DE ALENCAR, SEXTA TURMA, julgado em 02.12.2003, DJ 16.02.2004 p. 355) No Supremo Tribunal Federal: 9

'HABEAS CORPUS' - CORRUPÇÃO ATIVA - ART-333 DO CÓDIGO PENAL. ALEGAÇÕES DE ATIPICIDADE CRIMINAL NOS FATOS OBJETO DA DENUNCIA. IMPROCEDENCIA - FATOS TIPICOS, DEVIDAMENTE EXPLICITADOS, OBJETIVANDO A PRATICA DE ATOS DE OFICIO, CONFIGURADORES DO DELITO. ININCIDENCIA DO ART-27 DO C.P. - DELITO FORMAL, DE CONDUTA EM SI, CONSUMA-SE MESMO QUE O FUNCIONÁRIO RECHACE O SUBORNO. 'HABEAS CORPUS' INDEFERIDO. (HC Nº 62.080/SP, Primeira Turma, rel. Min. OSCAR CORREA, j. em 30/11/1984, DJ 01/02/1985) Por outro lado, se o recorrido efetivamente não tinha consigo toda a quantia ofertada aos policiais, é possível cogitar que o correto fosse constar na denúncia o verbo prometer, ao invés de oferecer. Contudo, tal circunstância seria uma mera irregularidade e não poderia implicar a absolvição do agente, uma vez que o fato está descrito na denúncia. Desse modo, não merece prosperar o fundamento da absolvição do recorrido, espelhado no julgado da Corte Estadual, no sentido de que o fato era atípico. Do mesmo modo, não convenceu o argumento do v. acórdão de que a embriaguez do agente excluiu o dolo. 10

Inicialmente, convém salientar que a perícia de verificação de embriaguez (laudo a fls. 54) anotou que o recorrido estava embriagado, e não completamente embriagado, diversamente do afirmado pelo v. acórdão. Além disso, o recorrido teve o suficiente discernimento para recusar-se a se submeter ao teste do bafômetro e a fornecer material do seu sangue para realizar as conhecidas perícias para avaliar o grau de embriaguez. Tais circunstâncias somente demonstram a consciência da ilicitude da conduta de oferecer aos policiais militares a quantia de dois mil reais, para não ser autuado pela embriaguez. Mas não é só. No dizer de MIRABETE, O dolo, no crime de corrupção ativa, é a vontade de praticar a conduta inscrita no tipo: oferecer ou prometer a vantagem indevida, incluindo o elemento subjetivo que é o fim de conseguir do funcionário a omissão, retardamento ou prática do ato de ofício (dolo específico) (cf. Manual de Direito Penal, Parte Especial Arts. 235 a 361 do CP, São Paulo, Ed. Atlas, 2005, vol. 3, p. 385). O art. 28, II, do CP é inequívoco, a embriaguez, voluntária ou culposa, não exclui a imputabilidade do sujeito ativo. Somente a 11

embriaguez decorrente de caso fortuito ou força maior pode excluir o elemento subjetivo. Como ensina NELSON HUNGRIA,... o legislador brasileiro não podia ter hesitado em equiparar a vontade do ébrio à vontade condicionante da responsabilidade e, consequentemente, da punibilidade. No caso de embriaguez preordenada, o agente responderá sempre a título de dolo (e com a pena agravada); no caso de embriaguez não preordenada, mas voluntária ou culposa, responderá por crime doloso ou culposo, segundo o indicarem as circunstâncias, ou seja, segundo a direção ou atitude da residual vontade que existe no estado de ebriedade. Não é necessária uma relação finalística entre a embriaguez e a conduta aberrante: basta o nexo de causalidade entre aquela e esta, de par com a previsão ou possibilidade de previsão dos anarquizantes efeitos da ingestão do álcool ou substância análoga (cf. Comentários ao Código Penal, Rio de Janeiro, Ed. Forense, 1978, vol. I, Tomo II, p. 386). Também na lição de DAMÁSIO E. DE JESUS: Se o sujeito comete uma infração penal sob efeito de embriaguez, voluntária ou culposa, não há exclusão da 12

imputabilidade e, por conseqüência, não fica excluída a culpabilidade. Ele responde pelo crime (cf. Direito Penal, São Paulo, Ed. Saraiva, 1988, 1º vol. 12ª Ed., p. 447). A doutrina nacional não diverge, bastando citar MIRABETE (cf. Manual de Direito Penal, Parte Geral Arts. 1º a 120 do CP, São Paulo, Ed. Atlas, vol. 1, 2005, 22ª Ed., p. 222) e GUILHERME DE SOUZA NUCCI (cf. Código Penal Comentado, São Paulo, Ed. Revista dos Tribunais, 2002, 2ª Ed. pp. 159/161). Especificamente, a doutrina assenta que a embriaguez do agente não exclui o dolo, nem mesmo quando o elemento subjetivo exige a forma específica (MIRABETE, cf. Manual de Direito Penal, Parte Especial Arts. 235 a 361 do CP, São Paulo, Ed. Atlas, 2005, vol. 3, p. 385; GUILHERME DE SOUZA NUCCI, Código Penal Comentado, São Paulo, Ed. Revista dos Tribunais, 2002, 2ª Ed, p. 905, nota 15 ao art. 329, e 918, nota 73). Eis alguns precedentes da jurisprudência: EMENTA: APELAÇÃO. ART. 306 DO CÓDIGO DE TRÂNSITO. EMBRIAGUEZ AO VOLANTE. ART. 333, CAPUT, DO CP. ABSOLVIÇÃO MANTIDA. CORRUPÇÃO ATIVA. 13

CONDENAÇÃO MANTIDA. Deve ser mantida a absolvição, quando não comprovada uma das elementares do tipo penal, haja vista a não realização do chamado "teste do bafômetro. Por outro lado, o estado de embriaguez voluntária não afasta a imputabilidade penal, quanto ao delito de corrupção ativa. Art. 28, II, do CP. Recursos improvidos. (Apelação Crime Nº 70030621916, Quarta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Gaspar Marques Batista, Julgado em 20/08/2009, Diário da Justiça do dia 22/09/2009) EMENTA: CRIME. CORRUPÇÃO ATIVA. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO. ABOLITIO CRIMINIS. ATIPICIDADE. INOCORRÊNCIA. CORRUPÇÃO ATIVA. AUTORIA E MATERIALIDADE. COMPROVAÇÃO. EMBRIAGUEZ VOLUNTÁRIA. IMPUTABILIDADE. APELO DEFENSIVO IMPROVIDO. No caso, a hipótese de abolitio criminis não alcança a conduta imputada ao apelante, transportar arma de fogo. E isso porque os arts. 30 e 32 do Estatuto do Desarmamento afastaram temporariamente a eficácia do tipo incriminador do art. 12 e de PARTE do art. 16, na modalidade de possuir, situação ao qual não se enquadra o paciente. Demonstrado que o acusado ofereceu vantagem aos policiais militares para que estes não lavrassem o flagrante, impõe-se a confirmação do veredicto condenatório. A embriaguez voluntária não exime o agente da responsabilidade penal, presumindo a lei a imputabilidade. Descabimento da concessão do benefício da substituição por pena restritiva de direitos quando o quantum da carcerária ultrapassa o limite legal previsto. Apelo improvido. (Apelação Crime Nº 70027840024, Quarta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Eugênio Tedesco, Julgado em 04/06/2009, Diário da Justiça do dia 19/02/2009) 14

EMENTA: APELAÇÃO-CRIME. CORRUPÇÃO ATIVA. EMBRIAGUEZ VOLUNTÁRIA. Não exclui a imputabilidade penal, art. 28, inciso II do CP. Condenação mantida. Apelo improvido. Unânime. (Apelação Crime Nº 70025414848, Quarta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Aristides Pedroso de Albuquerque Neto, Julgado em 02/10/2008, Diário da Justiça do dia 20/10/2008) CORRUPÇÃO ATIVA EMBRIAGUEZ VOLUNTÁRIA - A embriaguez voluntária não elide a configuração do delito de corrupção ativa (Revista Forense 188/326). CORRUPÇÃO ATIVA EMBRIAGUEZ DOLO Não há incompatibilidade entre o escopo finalístico do agente com o estado de inconsciência oriundo da embriaguez plena (Revista Forense nº 195/356). CORRUPÇÃO ATIVA Acusado que dirigia veículo em rodovia oficial sem habilitação e embriagado Oferecimento de dinheiro ao guarda rodoviário, ao ser por ele interceptado Desnecessidade do dolo especifico Condenação imposta Inteligência do art. 333 do CP O delito do art. 333 do CP não exige dolo específico do agente. Assim, a embriaguez, salvo se fortuita, não o exime de pena se, nesse estado, oferece propina ao guarda rodoviário que o interceptou por dirigir veículo naquele estado e sem possuir habilitação legal (RT 531/327). 15

Como se vê, é irrelevante para a caracterização do elemento subjetivo do crime de corrupção ativa o estado de embriaguez (que não era completo) do agente. Por tais motivos, ao trancar a ação penal, o v. acórdão contrariou o disposto nos artigos 28, II, e 333, caput, ambos do Código Penal. 3 razões do pedido de reforma Diante do exposto, demonstrada a negativa de vigência à lei federal, aguarda o Ministério Público do Estado de São Paulo a admissibilidade do presente recurso especial pela E. Presidência e, remetidos os autos ao C. Superior Tribunal de Justiça, seja conhecido e provido, cassando-se o v. acórdão, para que seja retomada a ação penal dos autos nº 195/09 da 5ª Vara Criminal da comarca de Santos, em face de O.B.V.J., por infração ao art. 333, caput, do Código Penal. São Paulo, 25 de setembro de 2009. 16

JORGE ASSAF MALULY Procurador de Justiça Índices Ementas ordem alfabética Ementas ordem numérica Índice do CD 17