PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5.ª REGIãO Gabinete do Desembargador Federal Marcelo Navarro
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- Alessandra Pinhal Candal
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1 RELATÓRIO O Senhor DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO NAVARRO: Cuida-se de apelação criminal interposta pelo Ministério Público Federal contra sentença proferida pelo MM. Juízo da 37ª Vara de Pernambuco, na qual o douto magistrado julgou procedente a acusação, para condenar José Heleno Bezerra pela prática do crime previsto no art. 304 do CP. A apelação do Parquet (fls. 120/128) refere-se unicamente à dosimetria, sob o primeiro argumento de que o acusado, ao utilizar-se de dois documentos falsos, quis produzir dois resultados diversos e, portanto, deve ser condenado, em concurso formal impróprio, nas penas dos dois crimes de uso de documento falso. Por sua vez, sob o argumento de que as circunstâncias judiciais justificam uma pena mais severa, o apelante requer a majoração da pena-base fixada na sentença. Apresentadas, às fls. 153/166, as contrarrazões ao recurso, a defesa pugna pela absolvição do acusado com esteio na tese de que se tratou de crime impossível e, quanto ao mérito do recurso do MPF, espera o improvimento do recurso, com a manutenção da tese de crime único. 180/184). Nesta instância, opina o MPF pelo provimento do apelo (às fls. É o relatório. Ao revisor. ACR nº PE 1 MACBCL
2 VOTO O Senhor DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO NAVARRO: Consoante relatado, cuida-se de recurso ministerial por meio do qual o apelante visa a majoração da pena imposta a José Heleno Bezerra, seja através do pedido de reconhecimento do concurso formal impróprio entre as condutas típicas imputadas ao acusado, seja por meio da revisão da penalidade aplicada, à luz das circunstâncias judiciais do art. 59 do CP. Das provas constantes nos autos, apurou-se que o acusado, José Heleno Bezerra, apresentou Carteira Nacional de Habilitação - CNH material e ideologicamente falsa e Certificado de Registro e Licenciamento de Veículos- CRLV ideologicamente falso, quando abordado, em 10/12/2013, pela Polícia Rodoviária Federal em São Caetano/PE A materialidade delitiva encontra-se evidenciada pelo Auto de Apresentação e Apreensão e Laudo da Perícia nº 008/2014, respectivamente, às fls. 08 e 78/89 do IPL em anexo. Já a autoria restou demonstrada por meio do Auto de Prisão em Flagrante (fls. 02/07 do IPL), bem como pelo depoimento dos Policiais Rodoviários Federais que realizaram a abordagem do acusado. No primeiro momento, o MPF sustenta a tese de que, ao utilizarse de dois documentos contrafeitos, o apelado praticou, em concurso formal impróprio, dois crimes de uso de documento falso, previstos no art. 304 do CP. Ao dispor sobre a matéria, o art. 70 do CP prevê que quando o agente, mediante uma só ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, configura-se o chamado concurso formal. A doutrina, por sua vez, esquematizou duas espécies de concurso formal, o próprio e o impróprio. Enquanto aquele decorre da unidade de desígnios, este estaria configurado quando a ação ou omissão é dolosa e os crimes concorrentes resultam de desígnios autônomos. Na espécie, o MPF argumenta que o réu fez uso da CNH falsificada com a finalidade de ludibriar terceiros, fingindo que estava ACR nº PE 2 MACBCL
3 legalmente habilitado para dirigir, e fez uso do CRLV contrafeito, com o intuito de assegurar a impunidade de crime anterior (roubo de veículo). Ou seja, como, para o apelante, o réu teria, com uma só ação, praticado dois crimes, com intuitos diversos, deve ser reconhecido o concurso formal impróprio ao invés de crime único como entendeu o magistrado sentenciante. Não há, todavia, como prosperar a tese acusatória. Primeiro, porque, considerando as informações constantes nestes autos, não é possível proceder à análise da suposta participação do acusado no assalto do veículo. Referido crime não é objeto deste processo, já que a competência para processar e julgar o feito é da justiça estadual, de maneira que não se tem acesso à denúncia e às provas que ensejariam a persecução penal do Estado contra o acusado por esse delito. Segundo ponto, os antecedentes criminais do acusado (fls. 33 e 35/36) noticiam que ele responde ao processo nº , perante a Justiça Estadual, por receptação, e não por roubo, processo que se sequer foi julgado, o que implica na impossibilidade de utilização dessa informação, neste juízo, para valorar a pena em prejuízo do réu, consoante Súmula nº 444 do STJ. Acrescente-se que a mera utilização de mais de um documento falso na mesma ocasião não é suficiente para caracterizar a prática de dois crimes. Como já decidiram outros Tribunais Regionais Federais, não é o número de documentos que há de contar aqui para caracterização do crime contra a fé pública, sem que se leve em conta também a sua teleologia lógica e objetiva em relação ao bem protegido, que é a fé pública (Precedentes: ACr9631 TRF2ª Região; ACr TRF1ª Região). Neste caso, em que pese apresentados dois documentos contrafeitos, o fato juridicamente relevante a ser alterado era um só: driblar a fiscalização dos policiais rodoviários federais. Para tanto, era necessária a utilização dos dois documentos que são exigidos em toda fiscalização da polícia rodoviária: a CNH e o CRLV. Para a finalidade pretendida, não adiantaria o uso de apenas um desses documentos. Diversamente da tese acusatória, não vislumbro a ocorrência de dois delitos, ainda que em concurso formal, mas sim de um único crime de uso de documento falso, praticado mediante a apresentação de dois objetos contrafeitos. Ainda quanto à penalidade, prossegue o apelante argumentando que a culpabilidade, como circunstância judicial do crime, permite a fixação de uma sanção mais rígida contra o acusado. Segundo o MPF, o acusado ACR nº PE 3 MACBCL
4 aproveitou-se de um instante de distração dos policiais e tentou empreender fuga, o que denota que as circunstâncias dos crimes não podem ser consideradas próprias à espécie. Como circunstância judicial, a culpabilidade deve ser analisada em sentido lato, entendida como a reprovação social que o crime e o autor merecem. Refere-se ao grau de censura social que incide sobre o agente e o fato cometido e deve ser avaliada em intensa, média ou reduzida. Em sua avaliação, devem ser consideradas as particularidades do caso concreto, o modo como o crime foi praticado, a forma como a execução foi conduzida, enfim, os elementos que permitam aferir a reprovação social da conduta. Neste caso, a tentativa de fuga do réu, depois da abordagem dos policiais, não interfere na avaliação da culpabilidade, especialmente quando confrontada com a notícia de que, quando os policiais mandaram o réu parar o veículo para ser abordado, ele prontamente atendeu à determinação policial. A tentativa de fuga, sem ter praticado qualquer ato de violência contra os policiais, é uma reação normal à espécie e não apresenta qualquer relevância na avaliação da culpabilidade como circunstância judicial. Ainda quanto a este ponto, a culpabilidade a ser aferida refere-se à reprovação social do crime imputado ao acusado, mais precisamente às particularidades do uso da CNH e do CRLV falsos pelo acusado e, neste aspecto, o delito não apresentou nenhum elemento diferenciador aos normais à espécie. Finalmente, como já ressaltado, a suposição de que o réu participou do crime de roubo do veículo não pode ser elemento apto a valorar a pena, seja porque não há, nos antecedentes, referência à instauração de ação penal por crime de roubo, seja porque no processo estadual a que o réu responde por receptação sequer fora prolatada a sentença. Nestes termos, NEGO PROVIMENTO à apelação criminal do Ministério Público. É como voto. Recife, 26 de março de Desembargador Federal MARCELO NAVARRO RELATOR ACR nº PE 4 MACBCL
5 EMENTA: PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO. CONDENAÇÃO DO DENUNCIADO NAS PENAS DO ART. 304 DO CP. APRESENTAÇÃO DE DOIS DOCUMENTOS FALSIFICADOS PERANTE A POLÍCIA RODOVIÁRIA FEDERAL. CRIME ÚNICO. CIRCUNSTÂNCIA JUDICIAL DA CULPABILIDADE DEVIDAMENTE ANALISADA NA SENTENÇA. RECURSO NÃO PROVIDO. 1. Julgada procedente a acusação, diante das provas que demonstraram que o acusado apresentou Carteira Nacional de Habilitação CNH material e ideologicamente falsa e Certificado de Registro e Licenciamento de Veículos - CRLV ideologicamente falso, quando abordado pela Polícia Rodoviária Federal, em São Caetano/PE. Condenação nos termos do art. 304 do Código Penal, à pena de 02 (dois) anos de reclusão, além de multa. 2. Consoante dispõe o art. 70 do Código Penal, quando o agente, mediante uma só ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, configura-se o chamado concurso formal. Na espécie, a apresentação simultânea, na mesma conduta, de mais de um documento falso não configura o concurso formal, mas crime único. Precedentes do TRF 2ª Região (ACr9631) e do TRF-1ª Região (ACr ). 3. Não se justifica a majoração da pena com base na circunstância judicial da culpabilidade, tendo em vista que a conduta do acusado de utilizar-se da CNH e do CRLV falsos não apresentou qualquer elemento diferenciador à espécie. 4. Apelação criminal não provida. A C Ó R D Ã O Decide a Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação criminal, nos termos do voto do relator, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes nos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. Recife, 26 de março de Desembargador Federal MARCELO NAVARRO RELATOR ACR nº PE 5 MACBCL
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