CAPÍTULO 9 Transições de fase
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- Rafael Francisco Lage Vieira
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1 UFABC - BC0205 Princípios de Termodinâmica - Curso Prof. Germán Lugones Birth of the Universe, Antoine Pevsner, CAPÍTULO 9 Transições de fase
2 Os critérios de estabilidade devem ser satisfeitos pela equação fundamental de todo sistema para ele permanecer homogêneo e estável. Se não se satisfazem os critérios de estabilidade, o sistema se separa em duas ou mais partes. Esta separação recebe o nome de transição de fase. Exemplos: À pressão de 1 atm e temperatura de O C, a agua fica instável e se separa em una parte sólida (gelo) e uma parte líquida, as quais coexistem em equilíbrio. À pressão de 1 atm e temperatura de 2.18 K, o hélio líquido se separa em duas fases: hélio líquido I e o hélio líquido II. Ambas fases são líquidas; o Hélio II é superfluido.
3 Outras transições de fase são as transições polimórficas nos sólidos (por exemplo, a transformação do sistema tetragonal ao cúbico), a ebulição dos líquidos e a aparição do ferromagnetismo e ferroeletricidade.
4 Exemplo: equação de van der Waals Para muitas substancias simples que sofrem transições líquido-gás, a equação de estado de van der Waals representa bastante bem sus propriedades acima e abaixo do ponto de ebulição. Esta equação pode ser obtida através de modelos de Mecânica Estatística ou por ajuste de dados experimentais: onde a e b são constantes que caracterizam a substancia considerada.
5 Na figura vemos a pressão P em função do volume molar v para diversos valores da temperatura. Veja que a equação de estado não satisfaz o critério de estabilidade
6 Especificamente, a condição ( P/ V) T < 0 não se verifica no intervalo FKM de una isoterma típica: Portanto, nesta substancia se deve produzir uma transição de fase.
7 Podemos obter uma perspectiva i n t e r e s s a n t e a t r a v é s d e u m a representação alternativa da equação de van der Waals. Pela relação de Gibbs- Duhem temos Integrando a temperatura constante, temos onde φ(t) es una função indeterminada da temperatura, que aparece como constante de integração. O integrando v(p) para temperatura constante, é dado na figura.
8 Assignamos arbitrariamente um valor ao potencial químico do ponto A. Assim, podemos calcular o valor de μ em qualquer outro ponto da mesma isoterma, e.g. no ponto B: Dessa forma obtemos a seguinte figura
9 A figura anterior é uma s e ç ã o p l a n a d a representação tridimensional de μ em função de P e T, como se mostra na figura. Nas curvas μ(p) há um laço fechado que resulta do fato de que v(p) é uma função com valor triplo de P. Este comportamento desaparece a temperaturas altas.
10 Consideremos um sistema que se encontra no estado A em contato com uma fonte de temperatura. Aumentamos a pressão do sistema mantendo a temperatura constante. El sistema evolui ao longo de uma isoterma desde o ponto A até o ponto B. Para pressões menores que P B o volume do sistema (para P e T dadas) é uniforme e único. Porém, a medida que a pressão aumenta acima de P B ficam accessíveis ao sistema três estados com valores iguais de P e T, e.g., os estados C, L, N. Desses três estados, L é instável, mas em C e N o equilíbrio é estável e a função de Gibbs possui um mínimo (local).
11 Esses dois valores da função de Gibbs (ou de μ = G / N) podem ser visualizados na figura abaixo. O sistema seleciona o estado C ou o N dependendo de qual desses dois mínimos locais da função de Gibbs seja o mínimo mais baixo, i.e. o mínimo absoluto. No caso, o estado C é o estado físico verdadeiro correspondente a esses valores de P e T. Se aumentamos a pressão, chegaremos a um ponto único D. A partir desse ponto o mínimo corresponde ao outro ramo da curva. Assim, para a pressão P E = P Q, o estado físico é Q.
12 Portanto: Abaixo de P D, o sistema escolhe o ramo direito da isoterma. Acima de P D, o sistema escolhe o ramo esquerdo. A isoterma física adota a forma da seguinte figura: Os pontos D e O são determinados pela condição de que μ D = μ O, portanto: µ O µ D = Z O onde a integral deve ser realizada ao longo da isoterma considerada. D v(p )dp =0
13 A integral anterior tem uma una interpretação gráfica direta se decompomos a integral em várias partes: A isoterma física é aquela na qual a porção de curva OMKFD é substituída pela reta horizontal que verifica que a área I é igual à área II.
14 O volume molar apresenta um cambio descontinuo na transição de fase. Analogamente, diversas propriedades cambiam descontinuamente na transição, e a substancia pode parecer totalmente diferente para pressões maiores e menores que P D. As duas formas da substancia se denominam fases. Os estados do ramo direito da isoterma pertencem a una fase do sistema, e os estados do ramo esquerdo da isoterma pertencem a uma fase diferente. No ramo horizontal temos a coexistência de ambas fases. A fase de P pequena e v grande tem inclinação pequena no diagrama Pv; i.e. ( P/ v) T é pequena em valor absoluto e a substancia é facilmente compressível. Na fase de P grande e v pequena, ( P/ v) T é muito maior, i.e. esta fase é relativamente incompressível. É isso que esperamos da isoterma para uma transição gás-líquido. O ramo direito da isoterma corresponde à fase gasosa, e o ramo esquerdo à fase líquida.
15 Descontinuidade do volume: regra da alavanca Consideremos os câmbios de volume associados com a transição. O volume é uma função descontínua da pressão ao longo de uma isoterma. A descontinuidade se apresenta à pressão P O = P D (ver figura). Quando a pressão P O = P D é alcançada, o sistema pode estar tanto no estado D quanto no estado O; também, qualquer fração arbitrária do sistema pode estar no estado D e o resto no estado O. v-
16 Se a fração x D de um sistema está na fase menos densa, em equilíbrio com a fração x O = 1 - x D da fase mais densa, o volume molar médio v T do sistema total é: O estado dessa mistura se representa convencionalmente por um ponto na reta horizontal que une os pontos O e D (ver figura). v-
17 A relação entre esse estado, que representa um sistema de duas fases, e as frações molares de cada una das fases é: (x, + x0)v, = x,tl, + x0u, REGRA DA ALAVANCA o A grandeza (v D -v T ) está representada pela distância TD. o A grandeza (v T -v O ) está representada por la distancia OT. Assim, a regra da alavanca estabelece que as frações molares das duas fases representadas pelo ponto T estão em relação inversa às distâncias de T aos pontos O e D. v-
18 Estados metastáveis nas transições de fase Consideremos um sistema que se encontra no estado A em contato com uma fonte de temperatura. Aumentamos a lentamente a pressão do sistema mantendo a temperatura constante. Quando chegamos no ponto D, o sistema se separa em duas fases: uma parte do sistema permanece no estado D, mas aparece uma parte no estado O. Podemos nos preguntar como é que o sistema, que chegou lentamente até o estado D, consegue saber da existência de um estado O que é igualmente conveniente do ponto de vista energético (igual energia de Gibbs molar).
19 A resposta está nas flutuações do sistema : apesar de que temos um sistema em equilíbrio termodinâmico, o microestado do sistema não permanece estático, mas sofre permanentemente flutuações rápidas. por exemplo, quando o sistema está no ponto D, há flutuações locais de densidade de forma que a densidade média é sempre a correspondente ao ponto D. Em geral, as flutuações pequenas de densidade são as mais prováveis, e as flutuações grandes, como a necessária para levar uma pequena parte do sistema ao estado O, são raras.
20 Assim, o sistema pode permanecer longo tempo no ponto D, até que finalmente se produz uma grande flutuação espontânea, que leva uma pequena parte do sistema ao estado O. Essa flutuação, ao contrario das outras, não decai, já que sua energia de Gibbs molar é igual à do estado inicial. Essa parte do sistema se converte em um núcleo para o crescimento da segunda fase. Em geral, as flutuações são induzidas por agentes externos (e.g. ondas de som que comprimem a matéria) e o sistema não fica muito tempo no estado D.
21 Porém, se o sistema é comprimido lentamente e com muito cuidado; evitando as perturbações externas, podemos levá-lo além do ponto D até o ponto E, e em princípio, até F. La parte DEF da isoterma corresponde a estados metastáveis do sistema, assim como a porção ONM. O segmento intermédio MKF viola os critérios de estabilidade intrínseca e corresponde a estados instáveis. Não é possível que um sistema fique neles mesmo que o processo seja realizado com extremo cuidado. Exemplo de estados metastáveis: água super-resfriada: à pressão de 1 atm possui temperatura inferior a 0º C. Água superaquecida: à pressão de 1 atm possui temperatura superior a 100º C.
22 Descontinuidade da entropia: calor latente Numa transição de fase de primeira ordem, não apenas o volume molar é descontínuo, mas também a energia molar e a entropia molar. A variação na entropia pode ser determinada integrando a relação: ao longo da isoterma hipotética OMKFD. Usando a relação ( s/ v) T = ( P/ T) v temos
23 A variação da entropia molar está associada a uma troca de calor entre o sistema e a fonte. Esse calor é T Δs, e é denominado calor latente molar l. I DO = T (s D - s O ) Assim, I DO é o calor cedido por um mol de matéria que experimenta a transição de D a O. Se a transição de fase acontece entre as fases: o sólida e líquida calor de fusão. o líquida e gasosa calor de vaporização. o sólida e gasosa calor de sublimação. Quando o sistema se transforma (a T e P fixas) desde a fase pura O até a fase pura D: o absorbe uma quantidade de calor por mol igual a l = T Δs. o a variação do volume por mol é Δv = (v D - v O ). o há uma transferência de trabalho igual a P Δv. Por tanto, a variação total na energia molar é: Δu = u D u O = T Δs - P Δv.
24 Equação de Clausius-Clapeyron Os critérios de estabilidade permitem uma isoterma em três partes. A parte à esquerda de O está associada com uma fase (e.g. a fase líquida). A parte OMKFD da isoterma é rejeitada por ser instável, A parte à direita de D está associada com outra fase (e.g. a fase gasosa).
25 O diagrama total P-v pode dividir-se traçando uma curva através dos pontos O e D de cada isoterma (ver figura). Existe uma isoterma, denominada isoterma crítica, acima da qual não é possível estabelecer um limite definido entre as regiões líquida e gasosa. 1 Liquido Y gas I Um sistema que passe desde a região líquida até a gasosa por um caminho que evite a área parabólica invertida da figura, se transforma de maneira continua e uniforme sem sofrer nenhuma variação descontinua de suas propriedades.
26 As fases de um sistema podem ser representadas no espaço μ-t-p. Os pontos de interseção na superfície μ (como os pontos D ou O da figura) determinam o lugar geométrico dos estados onde ocorre a transição de fase. Podemos projetar a curva de intersecção dos dois ramos da superfície μ no plano P-T. P-
27 A curva de coexistência de fases termina em um ponto, denominado ponto crítico, que corresponde ao vértice da região parabólica no plano P-v. A temperatura crítica e a pressão crítica são os valores da temperatura e da pressão no ponto crítico. Se um sistema tem mais de duas fases, o diagrama de fases pode ser mais complexo. T -+
28 A inclinação de uma curva de fases em um diagrama P-T pode ser relacionada com o calor latente e com a descontinuidade do volume pela equação de Clausius-Clapeyron. Consideremos os quatro estados que se mostram na figura: os estados A e A são coincidentes mas correspondem a fases diferentes. O mesmo ocorre com os estados B e B'. Suponhamos que a diferença de pressão é infinitesimal dp = P B - P A = P B P A Também supomos que a diferença de temperatura é infinitesimal: dt = T B - T A = T B T A A inclinação da curva é dp/dt. f P Estado B Estado B' Estado A Estado A'
29 Por outro lado, o equilíbrio de fases requer que: μ A = μ A μ B = μ B Portanto, Mas, μ B μ A = μ B μ A μ B - μ A = s dt + v dp μ B - μ A = s dt + v dp onde s, s' são as entropias molares, e v, v' são os volumes molares em cada uma das fases. Combinando as duas últimas equações temos: onde Δs e Δv são as descontinuidades na entropia molar e o volume molar associadas com a transição de fase.
30 Introduzindo o calor latente l = T Δs, obtemos: que é a equação de Clausius-Clapeyron.
31 Transições de fase de primeira ordem em sistemas multicomponentes: regra das fases de Gibbs Se um sistema tem mais de duas fases, o diagrama de fases pode ser bastante complexo. Por exemplo, num sistema multicomponente, o diagrama de fases têm várias dimensões. No entanto, a complexidade do diagrama é severamente limitada pela regra das fases de Gibbs. Para um sistema de um componente a relação fundamental é da forma ou, na forma molar: U = U(S, V, N), u = u(s, v). Para um sistema de um multicomponente a relação fundamental é da forma ou, na forma molar: U = U(S, V, N 1, N 2,..., N r ), u = u(s, v, x 1, x 2,..., x r-1 ).
32 A soma das frações molares x j = N j / N é sempre 1. Portanto, existem apenas r-1 frações molares independentes. Por exemplo, consideremos um recipiente a uma temperatura T e uma pressão P, contendo uma mistura de dois componentes. Se observa que o sistema contém duas fases: uma líquida e uma sólida. Queremos encontrar a composição de cada una de elas. Neste caso temos: µ (L) 1 (T,P,x (L) 1 )! potencial qco. do componente 1 na fase Líquida µ (S) 1 (T,P,x (S) 1 )! potencial qco. do componente 1 na fase Sólida µ (L) 2 (T,P,x (L) 2 )! potencial qco. do componente 2 na fase Líquida µ (S) 2 (T,P,x (S) 2 )! potencial qco. do componente 2 na fase Sólida Como as fases estão em equilíbrio temos: µ (L) 1 (T,P,x (L) 1 )=µ (S) 1 (T,P,x (S) 1 ) µ (L) 2 (T,P,x (L) 2 )=µ (S) 2 (T,P,x (S) 2 )
33 A fração molar do componente 2 sempre pode ser determinada a partir da fração molar do componente 1, já que x 1 + x 2 = 1 em cada fase. Por outro lado, graças às duas equações de equilíbrio químico, podemos determinar x 1 (L) e x 1 (S) em função de P e T.
34 Consideremos novamente o sistema anterior de dois componentes. Suponhamos que agora se observa a coexistência de três fases: I, II e III. Neste caso, as condições de equilíbrio são: µ I 1(T,P,x I 1)=µ II 1 (T,P,x II 1 )=µ III 1 (T,P,x III 1 ) µ I 2(T,P,x I 2)=µ II 2 (T,P,x II 2 )=µ III 2 (T,P,x III 2 ) Como x 1 + x 2 = 1 em cada fase temos apenas três variáveis de composição: x 1 I, x 1 II e x 1 III. Por outro lado, temos agora temos quatro equações de equilíbrio químico que permitem relacionar as variáveis T, P, x 1 I, x 1 II e x 1 III. Portanto, não podemos especificar a priori T e P simultaneamente. Se especificamos T, as quatro equações determinarão P, x 1 I, x 1 II e x 1 III. É possível selecionar arbitrariamente uma temperatura e uma pressão e encontrar assim um estado bifásico; Mas, se especificamos T, um estado trifásico pode existir apenas para uma pressão particular.
35 No mesmo sistema, poderíamos preguntar pela existência de um estado no qual coexistam quatro fases. Agora teremos três equaciones de equilíbrio químico para o componente 1 e mais três para o componente 2. Assim, dispomos de seis equações envolvendo as variáveis T, P, x 1 I, x 1 II, x 1 III e x 1 IV. Isto significa que podemos ter quatro fases coexistentes apenas para uma temperatura e uma pressão únicas, nenhuma das quais pode ser préselecionada arbitrariamente pelo experimentador: são propriedades intrínsecas do sistema. Finalmente, vemos que em um sistema de dois componentes não podem coexistir cinco fases, já que as oito equações resultantes sobredeterminaríam as sete variáveis T, P, x 1 I... x 1V, e em geral não seria possível nenhuma solução.
36 O raciocínio anterior pode ser repetido para um sistema multicomponente de várias fases. o Num sistema com r componentes, os potenciais químicos na primeira fase são funções das variáveis T, P, x 1 I, x 2 I... x r-1i. o Os potenciais químicos na segunda fase são funções das variáveis T, P, x 1 II, x 2 II... x r-1 II. o Se existem M fases, o conjunto completo de variáveis independentes está constituído por T, P e M(r 1) frações molares. Portanto, temos em total 2 + M(r 1) variáveis. o Mas, existem M 1 equações de equilíbrio químico para cada componente, ou seja, um total de r(m 1) equações. o Logo, o número f de variáveis que podem ser fixadas arbitrariamente é [2 + M(r 1)] - r(m 1), i.e. f = r M + 2. REGRA DAS FASES DE GIBBS: do conjunto total de variáveis {T, P, x 1 I, x 2 I... x r-1m } de um sistema multifásico; temos apenas f = r M + 2 variáveis independentes que podem ser fixadas arbitrariamente. A grandeza f é também denominada número de graus de liberdade termodinâmicos, i.e. o número de parâmetros que podem variar de maneira independente.
37 Exemplo 1: Sistema de 1 componente; e.g. água: Temos um componente r=1. o Consideremos a coexistência de 3 fases (sólido, liquido e gás) M=3. Portanto, obtemos f = 0, ou seja, nenhuma variável pode ser fixada arbitrariamente se queremos que as três fases coexistam. Isso indica que o ponto triplo da água é de fato um único ponto no diagrama de fases. o Se consideramos a coexistência de 2 fases (M=2), obtemos f = 1, ou seja, uma variável pode ser fixada arbitrariamente. Se fixamos um valor para a temperatura T podemos obter uma curva ao longo da qual há coexistência entre duas fases. T -+
38 O diagrama de fases da água é na verdade mais complexo; mas os critérios anteriores continuam sendo válidos. Presión, millares de kg/cm2
39 Exemplo 2: Para um sistema de dois componentes; r=2. Se consideramos a coexistência de 4 fases; M=4 f=0. podem coexistir apenas em um ponto singular. As quatro fases Se consideramos a coexistência de 3 fases; M=3 f=1. Logo, a temperatura pode ser fixada arbitrariamente para o sistema com três fases. Se consideramos a coexistência de 2 fases; M=2 f=2. Logo, tanto T quanto P podem ser fixadas arbitrariamente para o sistema com duas fases.
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